segunda-feira, 5 de abril de 2021

Saga de um Combatente Machadiano

 

Saga de um combatente machadiano

 

Lúcio Emílio do Espírito Santo (texto de meu pai)

 

            Poucas pessoas fazem ideia do que é a vida na linha de frente do policiamento, em todas as suas modalidades. O amplo espectro da segurança pública vai desde o socorro e salvamento de pessoas em grandes catástrofes até a repressão ao crime organizado. Muitas vezes, essas graves anormalidades ultrapassam as forças e os meios dos Estados federados. Até 2004, essas demandas eram atendidas pelas Forças Armadas, com muitas críticas, porque significava um desvio de finalidade, com sérios riscos para o cidadão. Para evitar que o Exército fosse empregado na segurança pública, criou-se a Força Nacional de Segurança Pública, capaz de atuar prontamente em qualquer ponto do território brasileiro, nos casos de graves perturbações da ordem ou na prevenção, sem necessidade de mobilizar as Forças Armadas.

            De Bom Despacho saíram vários combatentes voluntários da Força Nacional, como 1º Sgt PM José Antônio Diniz, 3º Sgt PM Clécio de Paulo da Silva, 2º Sgt PM Frederico Roger Couto, Cabo PMTiago Geraldo de Oliveira e o Major PM João Eudes dos Santos. Este último resolveu relatar no livro Sentinelas de Upatakon e Pau da Fome, sua experiência como integrante da Força Nacional. O Major Eudes, torcedor do Verdão, o Famorine Esporte Clube, é formado em Letras e Direito, com vários cursos de pós-graduação nessas áreas, professor de Direitos Humanos, Língua Portuguesa, Operações de Choque, em várias instituições, inclusive Força Nacional.

            Seu livro é quase um documentário. Ali está o cotidiano de dois anos de trabalho operacional nas mais diversase conturbadas linhas de frente. A primeira delas é o cenário sempre conflagrado da cidade do Rio de Janeiro, recobrindo vulnerabilidades do policiamento local durante os Jogos Pan-Americanos, Campeonato Mundial de Judô e outras localidades, onde se presumia a eclosão da violência, naquele Estado. Nosso conterrâneo teve o seu batismo de fogo nas verdadeiras guerras que ocorrem permanentemente no afamado Morro do Alemão, infestado, como se sabe, de traficantes, que abrem caminho para outras modalidades criminosas altamente rentáveis, como o roubo de carga, achaques a moradores e comerciantes.

            Nosso herói saiu dali ileso dos tiroteios, emboscadas e muitas balas perdidas. Por essa participação na batalha em prol da preservação da ordem no Morro do Alemão mereceu, com honra, o diploma de “FN Destaque Operacional”. Como política de movimentação da própria Força Nacional, foi parar no outro lado do Brasil, no longínquo Estado de Roraima, para participar da operação ali em andamento, denominada Upatakon III, que, na língua indígena, significa “minha terra, nossa terra”. Estava em disputa a imensa área da Raposa do Sol, ocupada pelos chamados arrozeiros, fazendeiros não-índios plantadores desse cereal. Por decisão judicial, os invasores da área indígena teriam que ser retirados. O clima era de vida ou morte, prenunciando-se derramamento de sangue, o que deveria ser evitado.

            João Eudes ilustra o seu trabalho com fotografias, notícias e documentos.Valendo-se de uma linguagem comedida, sóbria e verdadeira, nos dá uma clara descrição da precariedade dos alojamentos da Força Nacional, todos improvisados, como o 2º Batalhão “Pau da Fome”, localizado na periferia do Rio de Janeiro. Uma enchente invadiu as dependências da unidade, levando pertences e destruindo as suas já acanhadas instalações. Cada um se virou do jeito que pôde, valendo até dormir sobre mesas de sinuca.

            Todas essas situações são descritas com uma boa dose de humor. A leitura se torna leve e agradável, além do clima eletrizante de filme de ação. Sentinela de Upatakon e Pau da Fome é um livro machadiano no sentido literário e também pela origem do seu criador, saído das fileiras do 7º BPM, conhecido como “Machado de Prata", um dos ícones históricos e culturais da nossa terra.

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