Em seu romance Widu, Muito Além do Silêncio, romance da história da
Filosofia, o especialista em hipnose, coronel da PM e mestre em aikidô Alcino Lagares enfrenta um desafio: trazer a Filosofia de uma forma
ágil e facilitada para os jovens. E é bem sucedido. O livro tem muitos
diálogos, ilustrações, adota todo um formato editorial atraente e arejado.
A narrativa conta a viagem de um
grupo de sábios brasileiros à Nova Guiné, selva selvagem onde são aprisionados
por um grupo de antropófagos. Uma vez presos, são submetidos a um desafio por
parte do sacerdote local: ou respondem o motivo pelo qual existe tudo ao invés
de existir nada ou são devorados num ritual antropófago. Essa provocação motiva
os sábios a saborosas discussões sobre o ser e o nada para não serem comidos.
Ora escrito num tom de pornochanchada
filosófica, ora história da Filosofia de uma forma ao mesmo tempo digestiva e
com sabor brasileiro, esse banquete homérico onde Alcino reina nos diverte e instrui.
Retomando indiretamente o conceito filosófico brasileiro mais bem sucedido
mundialmente (a antropofagia de Oswald de Andrade) a uma narrativa ao mesmo
tempo máscula e sexy, consegue misturar monadologia e sexo. Sendo assim, em sua prosa
gostosa aprendemos muito sobre as “mônicas”, como dizia Caio Fernando Abreu,
também ele um antropofágico escritor estudante de Filosofia. Com uma desenvoltura e irridescência tropical que surpreenderia muito o filósofo de Konigsberg, as antinomias
masturbatórias kantianas são temperadas com bastante sexo, Freud e Lord Byron.
As divagações, no entanto, não
chegam a bom termo, uma vez que surge um conflito entre o líder político e o
líder religioso dos antropófagos. O ponto aqui parece-me ser um seguinte: os
discursos se esbatem e não sabemos ao certo em que ponto finalizou a discussão,
o livro a deixa em aberto. Ou melhor: pode-se depreender que as conclusões são,
como as do filósofo platônico Russel Blade, alter
ego do Cel. Lagares, agnósticas, ou seja, não se pode dizer nem que Deus
existe ou não existe. Porém, pode-se supor que, atualmente, no embate entre
ciência e fé, a ciência e a razão estão num estágio tal que conseguem vencer a
religião.
A
meu ver, Alcino obteve sucesso em seu intento: a grande discussão que ele
focaliza é uma discussão comum entre adolescentes e jovens hoje em dia: a
oposição entre ciência e fé, entre materialismo e idealismo. E essa discussão é
que forma o clímax de seu romance, quando debatem um rabino, um cientista ateu,
um arcebispo e um professor de Filosofia agnóstico, é bem interessante, ágil e
azeitada, podendo efetivamente atrair o interesse do público que ele visa ao
escrever um livro.
O livro possibilita um interessante
confronto com Mundo de Sofia de
Jolstein Gaarder. Enquanto o Mundo de
Sofia é um livro para uma moça, Widu é masculino: há golpes de aikido,
confrontos com nativos antropófagos, viagens internacionais a um país como a
Nova Guiné, muito sexo, antropofagia e aventuras. Há muita ação, enfim,
elemento que é sacrificado em prol das discussões filosóficas em O Mundo de Sofia. Além da derrota dos
nativos com golpes de aikidô em sequências ao estilo do cinema norte-americano,
há também uma história de amor e sexo em uma ambiência como a do filme “Lagoa
Azul”. O livro tem todo um vocabulário próprio, numa mistura filosófica eclética
e trepidante.
Em suma, ao final do livro não há
como não terminar gritando: “Kakhua! Laleô!” “Kakhua, laleô”, Alcino!
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