segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

Testemunho de Pierre Doury: Abril em Jenine

Testemunho de Pierre Doury: Décima Terceira missão Civil em Defesa do Povo Palestino, 18 e 19 de Abril de 2002 (Parte 1)

Traduzido por Lúcio Emílio do E. S. Júnior

(Nota: este texto é um depoimento escrito por Pierre Doury, professor de História na cidade francesa de Toulose e militante comunista. Pierre fez parte dessa missão organizada com a finalidade de enviar civis a cidades palestinas conflagradas, para que pudessem fazer relatórios e tentassem ajudar a contar ao mundo a história de cidades como Jenine, devastada pelos tanques israelenses. Esse depoimento faz parte do livro Abril em Jenine, inédito no Brasil e me foi enviado pelo próprio autor, que reside hoje na ilha de Réunion).

Dizem que a memória mais tenaz, a última a apagar-se, é a memória dos odores. Eu creio que, do ano de 2002 em Jenine, guardarei a lembrança do odor. O cheiro doce e enjoativo da morte e da guerra, um odor de coisas podres ao sol mesclado com o da carne humana em decomposição. Este odor sentimos quando ainda não sabíamos, todavia, se poderíamos chegar à cidade e ao campo de refugiados. Nós já tínhamos atravessado aquilo que existia de mais difícil: o cordão militar ao redor da zona, depois de duas frustradas tentativas e uma pequena loucura que poderia ter sido trágica, quando cruzamos escondidos o bosque. Se uma patrulha tivesse cruzado conosco, teria seguramente disparado, nos tomando por “terroristas”. No táxi que nos trouxe de Taibeh, onde os palestinos nos haviam recebido e organizado a partida até Jenine, recebemos na cara o mau cheiro desse ar que iríamos respirar dois dias seguidos, até chegarmos ao ponto de não prestarmos mais atenção a ele. Até o último momento, não estávamos seguros de chegar ao nosso destino, e havíamos repartido, um por táxi, nossos fotógrafos, principalmente os de fala árabe: eles é que poderiam ajudar se acaso um de nossos táxi fosse parado pelo exército israelita. Em cada povoado cruzado, nosso chofer se informava sobre a presença e os deslocamentos dos tanques de Tsahal, parava, mudava de rota. Nosso líder, Bruno, esgotado pelas precedentes jornadas, dormia ao meu lado apesar do estresse, despertado regularmente pelos toques de seu celular. Finalmente chegamos, carregados de frutas e legumes comprados no caminho para ajudar as crianças do campo.

Nas imediações do lugar, as primeiras casas destruídas com as paredes carbonizadas me recordaram a terrível razão de nossa presença nesse lugar, quando já tinha me deixado embriagar pela beleza das paisagens no caminho. Corremos até a entrada do campo: a cidade segue sob o toque de recolher, quase ninguém conseguiu entrar em Jenine, e ignoramos totalmente a atitude que o exército de Israel terá se nos encontrar. Cruzamos com uma equipe de repórteres mexicanos, me perguntam e digo em espanhol que é horrível, que o exército queria quebrar o povo palestino, mas que não conseguiram. No entanto, nesta altura ainda não tinha visto nada!

Quando enfim consegui entrar, as primeiras que nos receberam foram as mulheres. Aplaudiram-nos, desejaram-nos boas vindas em árabe, responderam a todos os nossos “salam alsikum”. Querem levar-nos a suas casas, mostrar em que estado ficaram, mas sorrimos comiserados e fomos rapidamente para o centro do campo, o nosso ponto de encontro com os amigos do outro grupo. Quanto mais nos aproximamos desse ponto, mais impressionantes são os sinais da destruição. E finalmente chegamos a um lugar totalmente desolado, onde as paredes estão de pé, mas não tampam a luz, onde o chão está coberto de escombros. Penso em imagens de terremotos vistas na TV. Estou aturdido, um estado em que tudo me parece irreal, parece que seguramente uma defesa de minha mente. Uma frase volta e meia me aparece na cabeça e é uma frase do judeu sobrevivente do nazismo Primo Levi: “o que alguns homens fizeram a outros homens...”

sábado, 23 de fevereiro de 2008

Contos do Cineasta e Escritor Leandro: Guardem Esse Nome

Um linque para os contos do Leandro, um grande escritor:

http://leandroide.blogspot.com/

De origem gaúcha, radicado em Floripa, acredito que esse sujeito será um grande escritor ou cineasta. Uma aposta minha no futuro. Uma descoberta.

sábado, 16 de fevereiro de 2008

Tradução do Artigo de Jay Weissenberg na revista Variety

Tropa de Elite

Jay Weissenberg (Variety)

A poderosa polícia brasileira foi elevada a um heroísmo no estilo Rambo no filme Tropa de Elite. Uma celebração da violência gratuita que serve como um filme de recrutamento para paramilitares fascistas. Um pouco do estilo de Weinstein foi injetado na base do roteiro, mas depois do fim da edição, o diretor José Padilha decidiu incluir a narração onipresente para aumentar a identificação, mas alienou os espectadores inteligentes. O filme foi um grande assunto do Brasil em 2007, porém algumas nuances aqui e ali não conseguiram amenizar a inescapável visão direitista que esse recurso da narração onisciente trouxe.
No Brasil, o sucesso do filme foi acompanhado por grandes debates sobre a glorificação dos brutais métodos policiais, especialmente se levarmos em conta que os policiais brasileiros realmente possuem uma reputação de desonestidade. Por outro lado, “Tropa de Elite” foi uma honesta representação da violência nas favelas e bairros pobres do Rio de Janeiro, assim como da corrupção policial que a sustenta. Mas o caso é que esse tópico é apresentado em meio a uma celebração de policiais psicopatas, ridicularizando todo esforço de ativisimo social, ou até mesmo de emoção diante das violências e mortes. As reações dos críticos de esquerda, perguntando-se sobre o possível fascismo ali presente, não foram vazias, mas sim a inescapável constatação de um fato.
BOPE é o esquadrão de elite em questão, uma pequena força tática mandada para as favelas para matar sem pensar (não é mera coincidência que a caveira e as roupas pretas lembrem a SS, brigada nazista da morte). O Capitão Nascimento (Wagner Moura) está se preparando para passar o bastão para outra pessoa. Com sua esposa Rosane (Maria Ribeiro) grávida, ele sente um certo amolecimento paternal que poderia prejudicar a linha dura que seu trabalho exige.
Paralela à história de Nascimento está aquele par de policiais honestos, o intelectualizado André Matias (André Ramiro) e o impulsivo Neto (Caio Junqueira). A narração de Nascimento comenta continuamente o progresso dos dois como dois corpos estranhos dentro do esquema policial corrupto. Quando são mandados a um baile funk na favela, era um gesto de um comandante corrupto que esperava que fossem mortos, mas foram salvos no mesmo momento em que o BOPE os resgatou, justamente no momento em que a bolsa da mulher de Nascimento se rompeu, o que pareceu ser, pelo menos, uma curiosa associação temporal (o nascimento do filho de Nascimento ocorreu simultaneamente ao “nascimento” de outros dois de seus seguidores). Neto e Matias ficaram tão impressionados com a dedicação do BOPE que decidiram-se a unir-se a eles, passando por um previsível treinamento sádico, após o quê Nascimento escolheria um dos dois para sua substituição. Neste meio tempo, Matias tentou conciliar seus estudos e sua relação com uma universitária bonita da esquerda festiva, Maria (Fernanda Machado) e a necessidade de não ser “emotivo” exigida pela Tropa de Elite. Neto parece predestinado a ser capitão, mas então uma luta com o traficante Baiano muda a hierarquia.
“Ou o policial se corrompe ou vai para Guerra”, entoa Nascimento em sua incessante voz que sobrepaira, enquanto ele explica como funciona o sistema: os policiais regulares são bobos, os militantes de Direitos Humanos são desesperadamente ineficazes e ingênuos, assim como os ricos garotos maconheiros são ruins como os traficantes. Enquanto os demais policiais entram nas favelas para pegar seu dinheiro por fora, o BOPE arrebenta as favelas para matar, porque, afinal, é isso que essa escória merece, não é mesmo? O roteiro foi escrito conjuntamente com Rodrigo Pimentel, ele mesmo formalmente um oficial do BOPE, portanto Padilha encorajou a improvisação durante a filmagem. Bráulio Mantovani (“Cidade de Deus”) assinou o roteiro principal, mas Pimentel e Padilha mudaram toda a estrutura no processo de edição, adicionando a problemática voz que sobrepaira, presumivelmente apostando em trazer para o primeiro plano a mente e os pensamentos do personagem de Capitão Nascimento.
Os retratos dos personagens traçados foram intensos, no entanto, absolutamente sem nuances. A câmera de Lula Carvalho, nervosa, nunca pára de se mover, dificultando o trabalho de captar o áudio, captação essa que fez milagres. Se fosse mais equilibrada, a construção seria mais delicada, mas “Tropa de Elite” não vai ganhar nenhum prêmio por sua delicadeza. As cores fortes, sombrias, ajudam a manter o clima geral de perigo e militarismo frio.

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2008

Matéria da Variety sobre Tropa de Elite (Jay Weissberg)

The Elite Squad

Tropa de elite (Brazil)

By JAY WEISSBERG

'The Elite Squad'

'The Elite Squad'

A Weinstein Co., Zazen Producoes, Posto 9, Feijao Filmes production, in association with the Latin American Film Company, Costantini Films, Quanta, Universal. (International sales: The Weinstein Co., New York.) Produced by Marcos Prado, Jose Padilha. Co-producers, Eliana Soarez, James D’Arcy. Executive producers, Maria Clara Ferreira, Bia Castro, Genna Terranova, Scott Martin, Eduardo Costantini. Directed by Jose Padilha. Screenplay by Padilha, Rodrigo Pimentel, Braulio Mantovani.

Capitain Nascimento Wagner Moura

Andre Matias Andre Ramiro

Neto Caio Junqueira

With: Milhem Cortaz, Fernanda Machado, Maria Riberlo, Fabio Lago, Fernanda de Freitas, Paulo Villa, Marcelo Valle, Marcello Escorel, Andre Mauro, Paulo Hamilton, Thogun, Rafael d’Avila, Emerson Gomes, Patrick Santos, Erick Maximiano Oliveira, Bruno Delia, Andre Santino, Ricardo Sodre.

Brazil’s powerful military police are elevated to Rambo-style heroes in “The Elite Squad,” a one-note celebration of violence-for-good that plays like a recruitment film for fascist thugs. Weinstein coin was injected on the basis of the script only, but after editing was over, tyro features helmer Jose Padilha decided a rewrite was in order, tacking on an omnipresent narration that’s meant to strengthen identification but instead will alienate intelligent viewers. Though pic was Brazil’s top grosser of 2007, arthouse auds elsewhere won’t coddle to the inescapable right-wing p.o.v.

Boffo biz at home was accompanied by major debates over the glorification of brutish police methods, especially since Brazilian cops already have a reputation for Dirty Harry-style vigilantism. On the one hand, “Elite Squad” is an honest picture of violence in the favelas, or slums, of Rio de Janeiro, and the rampant official corruption that sustains it. But pic presents its case by celebrating police psychopaths and ridiculing any attempts at social activism, or even emotion. Charges of fascism by pic’s critics aren’t merely knee-jerk liberal reactions, but an unimpeachable statement of fact.

BOPE is the elite squad in question, a small tactical force sent into the favelas to kill without thinking (not coincidentally, black uniforms and the group’s skull symbol recall the SS Death’s Head Brigade). Capt. Nascimento (Wagner Moura) is getting ready to pass the baton of command to someone else. With wife Rosane (Maria Ribeiro) pregnant, he’s feeling a tinge of paternal warmth that could jeopardize the hard-ass heartlessness his job requires.

Parallel to Nascimento’s story is that of a couple honest police rookies, intellectual Andre Matias (Andre Ramiro) and impulsive Neto (Caio Junqueira). Nascimento’s narration continuously comments on their progress as the two chafe under the police force’s systemic corruption. When their commander sends them into a slum rave, fully expecting their deaths, BOPE comes to the rescue, ending the battle just in time for Nascimento to get a call from his wife telling him her water broke — how’s that for timing?

Neto and Matias are so impressed with BOPE’s righteous dedication they decide to switch forces; after passing them through predictably sadistic basic training, Nascimento considers one of them as his replacement. Meanwhile, Matias tries to reconcile his studies, and relationship with namby-pamby NGO do-gooder Maria (Fernanda Machado), with the “no emotion” requirements of the elite squad. Neto seems poised for the captaincy, but then a battle with drug dealer Baiano (Fabio Lago) changes the hierarchy.

“Either a cop stays dirty or he chooses war,” intones Nascimento’s incessant voiceover as he explains the way the system works: Regular policemen are simply on the take, social workers are hopelessly ineffectual and naive, and pot-smoking rich kids are as bad as the dealers. Whereas the cops enter the favelas to get their payoff money, BOPE raids the slums to kill, no questions asked. After all, that’s what these scum deserve, isn’t it?

Script was co-written by Rodrigo Pimentel, himself a former BOPE officer, though Padilha encouraged improvisation throughout the shoot. Braulio Mantovani (“City of God”) was signed as script doctor, but together with the helmer, they changed the entire structure in the editing process, adding the problematic voiceover, presumably in a bid to bring one character’s mindset to the fore.

Perfs are suitably intense but, like the pic itself, lack any kind of nuance. Lula Carvalho’s camera never stops moving, bouncing and swerving with such unmodulated motion that auds will need to find their sea legs. More tempered lensing would have created a smoother build-up, though “Elite Squad” isn’t exactly out for the subtlety prize. Darkly saturated colors are in keeping with the general air of danger and militaristic cool.

More than one option

* (Person) M Scott Martin

* (Person) Scott Martin

Executive Producer, Editor, Production Assistant

* (Person) Scott R Martin

* (Person) Scott Martin

Assistant Location Manager

Camera (color), Lula Carvalho; editor, Daniel Rezende; music, Pedro Bromfman; production designer, Tule Peake; costume designer, Claudia Kopke; sound (Dolby Digital), Leandro Lima; assistant director, Rafael Salgado; casting, Fatima Toledo. (Reviewed at the Berlin Film Festival — competing), Feb. 11, 2008. Running time: 114 MIN.

Variety is striving to present the most thorough review database. To report inaccuracies in review credits, please click here. We do not currently list below-the-line credits, although we hope to include them in the future. Please note we may not respond to every suggestion

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2008

Uma Mentirinha da Pilar Fazito

Para não dizer que não falei das flores: procurei o nome da Pilar Fazito no google e não encontrei o comentário do meu outro blog (www.emiliojunior.zip.net), onde disse que o blog dela era decepcionante. Portanto, foi ela quem fuçou no meu blog. O post dela foi o seguinte:

mingo, Janeiro 13, 2008

Decepcionante para uns...

Certa vez, o Marçal (o Aquino) disse que "todo escritor deveria freqüentar sebos para ver o que os ácaros e a poeira fazem com a gente".

Como ainda não publiquei nada em papel e a internet é mais prática, vez por outra jogo meu nome no google para ver o que há de novo sobre a minha pessoa; ver o que os críticos, os plagiadores e os vírus fazem com a gente.

Demorou, mas finalmente achei minha primeira crítica negativa declarada. Oba! Diz o douto blogueiro que me achou por conta de um texto que enviei para o primeiro concurso de frases da Piauí. Veio fuçando e acabou parando aqui, neste blog "decepcionante". O curioso é ter deixado um comentário simpático num dos meus posts anteriores e deixar o "decepcionante" apenas no dele.

O blogueiro em questão, ao menos, é muito corajoso. Depois desse vídeo, achei o "decepcionante" um enorme elogio. (Nada pessoal, colega.)


http://www.google.com/search?hl=pt-br&q=*Pilar+Fazito*&btnG=Buscar

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2008

Danaide no Francisco Nunes

Seguinte é esse, eu e Maísa vamos apresentar o concerto poético-musical Danaide pela última vez em Belo Horizonte. Vai ser no Teatro Francisco Nunes na próxima terça, dia 29 de janeiro a partir das 21h.

Para quem não conhece o teatro fica dentro do Parque Municipal, no hiper-centro da cidade. Os ingressos custam R$ 10,00 inteira e R$ 5,00 meia e podem ser adquiridos na portaria antes do início do espetáculo.

Se você não conhece nosso som e ficou curioso, acesse: www.myspace.com/projetodanaide

Aguardamos você lá!

Abraços,
Makely
www.autofago.blogspot.com

Carta ao Sr. M.

Caro Sr. M...


Por que fazer um blógue, Mr. M, se você acredita nessa babaquice liberal que cada um tem a sua verdade, e elas não devem atritar, pois isso não é elegante? Quando você vê um filme com amigos, meu caro Mr. M, trata-se de um entretenimento coletivo por excelência, mas você não quer escutar o que os amigos querem dizer, opinar, porque você tem sua opinião, que você quer guardar no interior de seu ser, como uma rosa pura. Então pegue um vídeo e vá ver um filme de terror horroroso! Esse recato "mineiro" parece coisa de Mário de Andrade, que não foi a Paris para não perder sua identidade brasileira, algo assim tão frágil que poderia se dissolver só no deslocamento.

Bom, seu negócio é fazer brodagem, relationship? No final de ano, mandar cartas elogiosas aos amigos, puxando o saco de todo mundo. Ah. ´Tá muito em moda mesmo e precisamos realmente fazer muitos cursos de mercadologia (Marketing) para saber quais as novas tendências da Administração, ir à bolsa de valores, etc. Essencial.

Você me diz que a Linguística, Mr. M., é melhor que a Teoria Literária, pois você gosta de borboletas, "borboletras" vivas, não mortas e empalhadas com o instrumental teórico estruturalista e pós-estruturalista, além de pós-colonial e pós-pós-pós, tome pós. Ora, isso é romantismo ultrapassado, não é não? Por que tanto medo da Teoria? A mera teorização emborataria aquilo que você tem por dentro, essa essência profundamente genial, esse sonho que vive num ninho interior e que não quer sair para o mundo, batalhar a dura realidade?

Mr. M...Hein? Você quer escrever um livro coletando suas resenhas?