sábado, 16 de fevereiro de 2008

Tradução do Artigo de Jay Weissenberg na revista Variety

Tropa de Elite

Jay Weissenberg (Variety)

A poderosa polícia brasileira foi elevada a um heroísmo no estilo Rambo no filme Tropa de Elite. Uma celebração da violência gratuita que serve como um filme de recrutamento para paramilitares fascistas. Um pouco do estilo de Weinstein foi injetado na base do roteiro, mas depois do fim da edição, o diretor José Padilha decidiu incluir a narração onipresente para aumentar a identificação, mas alienou os espectadores inteligentes. O filme foi um grande assunto do Brasil em 2007, porém algumas nuances aqui e ali não conseguiram amenizar a inescapável visão direitista que esse recurso da narração onisciente trouxe.
No Brasil, o sucesso do filme foi acompanhado por grandes debates sobre a glorificação dos brutais métodos policiais, especialmente se levarmos em conta que os policiais brasileiros realmente possuem uma reputação de desonestidade. Por outro lado, “Tropa de Elite” foi uma honesta representação da violência nas favelas e bairros pobres do Rio de Janeiro, assim como da corrupção policial que a sustenta. Mas o caso é que esse tópico é apresentado em meio a uma celebração de policiais psicopatas, ridicularizando todo esforço de ativisimo social, ou até mesmo de emoção diante das violências e mortes. As reações dos críticos de esquerda, perguntando-se sobre o possível fascismo ali presente, não foram vazias, mas sim a inescapável constatação de um fato.
BOPE é o esquadrão de elite em questão, uma pequena força tática mandada para as favelas para matar sem pensar (não é mera coincidência que a caveira e as roupas pretas lembrem a SS, brigada nazista da morte). O Capitão Nascimento (Wagner Moura) está se preparando para passar o bastão para outra pessoa. Com sua esposa Rosane (Maria Ribeiro) grávida, ele sente um certo amolecimento paternal que poderia prejudicar a linha dura que seu trabalho exige.
Paralela à história de Nascimento está aquele par de policiais honestos, o intelectualizado André Matias (André Ramiro) e o impulsivo Neto (Caio Junqueira). A narração de Nascimento comenta continuamente o progresso dos dois como dois corpos estranhos dentro do esquema policial corrupto. Quando são mandados a um baile funk na favela, era um gesto de um comandante corrupto que esperava que fossem mortos, mas foram salvos no mesmo momento em que o BOPE os resgatou, justamente no momento em que a bolsa da mulher de Nascimento se rompeu, o que pareceu ser, pelo menos, uma curiosa associação temporal (o nascimento do filho de Nascimento ocorreu simultaneamente ao “nascimento” de outros dois de seus seguidores). Neto e Matias ficaram tão impressionados com a dedicação do BOPE que decidiram-se a unir-se a eles, passando por um previsível treinamento sádico, após o quê Nascimento escolheria um dos dois para sua substituição. Neste meio tempo, Matias tentou conciliar seus estudos e sua relação com uma universitária bonita da esquerda festiva, Maria (Fernanda Machado) e a necessidade de não ser “emotivo” exigida pela Tropa de Elite. Neto parece predestinado a ser capitão, mas então uma luta com o traficante Baiano muda a hierarquia.
“Ou o policial se corrompe ou vai para Guerra”, entoa Nascimento em sua incessante voz que sobrepaira, enquanto ele explica como funciona o sistema: os policiais regulares são bobos, os militantes de Direitos Humanos são desesperadamente ineficazes e ingênuos, assim como os ricos garotos maconheiros são ruins como os traficantes. Enquanto os demais policiais entram nas favelas para pegar seu dinheiro por fora, o BOPE arrebenta as favelas para matar, porque, afinal, é isso que essa escória merece, não é mesmo? O roteiro foi escrito conjuntamente com Rodrigo Pimentel, ele mesmo formalmente um oficial do BOPE, portanto Padilha encorajou a improvisação durante a filmagem. Bráulio Mantovani (“Cidade de Deus”) assinou o roteiro principal, mas Pimentel e Padilha mudaram toda a estrutura no processo de edição, adicionando a problemática voz que sobrepaira, presumivelmente apostando em trazer para o primeiro plano a mente e os pensamentos do personagem de Capitão Nascimento.
Os retratos dos personagens traçados foram intensos, no entanto, absolutamente sem nuances. A câmera de Lula Carvalho, nervosa, nunca pára de se mover, dificultando o trabalho de captar o áudio, captação essa que fez milagres. Se fosse mais equilibrada, a construção seria mais delicada, mas “Tropa de Elite” não vai ganhar nenhum prêmio por sua delicadeza. As cores fortes, sombrias, ajudam a manter o clima geral de perigo e militarismo frio.

Um comentário:

Leandróide disse...

Olá Lucio, como vai? Primorosa a tua tradução da famosa crítica do Weissenberg. Mostrei-a para minha mãe que é mestranda em estudos da tradução e ela concordou comigo.

Crítico também erra e aqui foi o caso. O filme levou o prêmio máximo do festival. Mas eu não posso falar de erro. No meu blogue previ que Sangue Negro ganhava o Oscar de Melhor Filme e errei. Tenho que calibrar a bola de cristal para o ano que vem.

Abraço.