Quem
sou eu? Sou Lúcio Junior Espírito Santo, formado em filosofia pela UFMG
e atualmente leciono esta disciplina na cidade de Bom Despacho, Minas. Atualmente sou simpatizante do PCB e sempre me causou
interesse a Teologia da Libertação. Tendo tido acesso ao Blog A Nova
Teologia da Libertação e observado que as postagens nele, não obstante
manter certa relação com a Teologia da Liberação, no que diz respeito ao
Marxismo, todavia o mesmo tem me surpreendido por trazer aspectos
impossíveis de serem encontrados em qualquer teólogo da Libertação, ora,
por isso me senti compelido a tomar a iniciativa de me dirigir ao
proprietário do Blog para que ele explicasse com mais detalhes o que é
essa Nova Teologia da Libertação e o que a difere da tradicional, que
ganhou fôlego a partir do Concílio Vaticano
II. O
meu objetivo, claro, é compartilhar com membros do PCB e de outras
correntes de esquerda o conteúdo desta resposta, pois, até aqui, naquilo
que pude ler e analisar, esta Nova Teologia da Libertação alarga ainda
mais os caminhos pelos quais cristãos e marxistas podem se unir e
trabalhar conjuntamente para a criação de uma nova sociedade. Mais do
que isto que a emancipação da sociedade só pode vir na razão direta
desta união. Abaixo segue as perguntas que formulei a Adamir Gerson,
proprietário do Blog, e as respostas que o mesmo deu.
Lúcio Junior Espírito Santo.
Adamir Gerson, eu gostaria que você me explicasse qual a diferença que
há entre esta Nova Teologia da Libertação e a atual Teologia da
Libertação.
Adamir Gerson.
Para uma
compreensão do que seja esta Nova Teologia da Libertação, ou
simplesmente Teologia do Reino, são muitos os caminhos de sua explicação
e compreensão. Acredito que o começo se faz necessário reportarmos ao
teólogo Clodovis Boff de 2007, com as suas críticas contundentes à
Teologia da Libertação, com as réplicas e a sua tréplica. Numa análise
crítica e imparcial do embate que o teólogo e frei Clodovis Boff travou
nos anos de 2007 e 2008 certamente que irá aflorando o que é esta Nova
Teologia da Libertação.
Lúcio Junior Espírito Santo.
Você está se referindo ao artigo que ele publicou neste ano na REB –
Revista Eclesiástica Brasileira, com o título “Teologia da Libertação e
volta ao fundamento”, no qual ele apontou desvios fundamentais na
Teologia da Libertação e pretendeu retomá-la ao projeto originário onde,
na sua visão, ela teria se afastado.
Adamir Gerson.
Certamente. As críticas de frei Clodovis Boff à Teologia da Libertação
foram feitas em vários níveis. Como era de se esperar surgiram réplicas –
Luiz Carlos Susin, Érico Hammes, Leonardo Boff, Sandro Magister – e
chama à atenção que as réplicas, não obstante a sua lógica
esclarecedora, não sensibilizaram frei Clodovis Boff que na tréplica
repetiu tudo que havia dito, e agora de forma ainda mais radical, pois
então já se entendia como alguém já fora da Teologia da Libertação e que
não havia mais necessidade de economizar palavras.
Lúcio Junior Espírito Santo. O que você quis dizer com lógica esclarecedora por parte destes teólogos que responderam a Clodovis Boff?
Adamir Gerson.
Uma das críticas que frei Clodovis Boff endereçou à Teologia da
Libertação, e que as réplicas tomaram como principal questionamento,
embora tenham havidos outros questionamentos também de suma importância,
foi que a Teologia da Libertação tinha colocado o pobre no lugar de
Deus como fundamento da Teologia. Deus teria sido relegado a um segundo
plano. No entanto a resposta que estes teólogos deram a frei Clodovis
Boff foi satisfatória. Argumentaram de que não existe uma teologia pura,
neutra, mas que toda teologia chega ao publico mediada. E é um fato.
Toda teologia sofre a mediação do sujeito que a faz, a mediação do tempo
cultural e histórico, e da temática que suscita. É impossível uma
teologia tratar de Deus tal como ele é. E nisto é uma verdade o Isaías
de
4.1. De modo que cabe à crítica isto sim
descobrir qual o grau de aproximação que uma teologia tem com a Palavra
de Deus. E a Teologia da Libertação ter colocado o pobre como
fundamento teológico, o lugar onde se encontra Deus, com certeza ela se
insere no rol das teologias que mais se aproximaram de Deus. Afinal
vaticinou Isaías que Deus reside no alto e no lugar santo, mas também
com o quebrantado e o humilde no espírito, para reavivar o espírito dos
humildes e para reavivar o coração dos que estão sendo esmigalhados
(Isaías 57.15). Deus é encontrado nos pobres sim, e quando um crente e
um não crente extravasam de gozo ao ver o pobre saltitando de
felicidade, correndo de um canto a outro sem as algemas, este gozo é
literalmente a presença de Deus. É Deus gozando porque libertou, e é
Deus gozando porque foi libertado.
Lúcio Junior Espírito Santo.
Se as respostas que os teólogos citados deram a frei Clodovis Boff
foram esclarecedoras, porque na tréplica ele continuou insistindo nas
mesmas críticas, reforçando a sua argumentação por novamente dizer e
realçar que a Teologia da Libertação abandonou o fundamento e que é
preciso retornar a ele? Clodovis Boff que teve participação decisiva na
construção do fundamento que gerou a Teologia da Libertação teria,
então, se revelado um teólogo infantil, como se deduz nas
réplicas?
Adamir Gerson.
A Palavra de Deus prima pelo mistério e ela está sempre envolta em
mistérios. Em mistérios ela é concebida e em mistérios ela chega a nós.
Não é a toa que as ferramentas da hermenêutica e da exegese estão na
posse de todos os crentes. Quando o assunto é a Palavra de Deus a
comunidade dos crentes já sabe estar diante de um mistério. E
é preciso descobrir porque um teólogo do quilate de frei Clodovis Boff
tenha num repente extravasado infantilidade. De modo que é mais crível
crer que ele esteja em mistério e esconda-se em mistério. Há nele um
mistério que quer se revelar. E que mistério seria este que tanto
insiste que a Teologia da Libertação se afastou do fundamento e é
preciso retornar a ele? Que a Teologia da Libertação não é Jesus, mas
Moisés; não está alicerçada na cruz, mas no êxodo. E como há um desnível
entre o nome invocado de Jesus e a sua prática real, o repente que teve
frei Clodovis Boff naquele ano de 2007 só pode ser entendido como
anúncio da Divindade à Teologia da Libertação que tem chegado para ela
novo tempo. Tempo novo que é realmente tempo de Jesus.
Lúcio Junior Espírito Santo.
Uma vez que você acabou de dizer que a Teologia da Libertação está em
Moisés e não em Jesus, então frei Clodovis Boff foi verdadeiro quando
disse que a Teologia da Libertação tinha se afastado do fundamento e que
é preciso voltar a ele? Porque para toda teologia o fundamento dela é
Deus, e para os cristãos em particular, Jesus?
Adamir Gerson.
Temos de ler nas entrelinhas o que foi que quis dizer com afastamento
do fundamento. A questão posta do pobre não pode ter sido. Não houve
afastamento nenhum. Se esta teologia que colocou o pobre como fundamento
foi afastamento o que teria sido a teologia que ganhou corpo a partir
do século IV e que colocou reis e príncipes na missão da construção do
Reino, trabalhando conjuntamente com eles? Então descobrimos nas
entrelinhas que a Revelação chegou a ele de que a Teologia da Libertação
iria mudar de lugar e entendeu tal como a Teologia da
Libertação estando fora de lugar entregou a revelação deste fato real
segundo o seu entendimento. E como o mistério é de Deus e não do homem,
cabe a nós, e já não mais a frei Clodovis Boff que entregou o recado e
já não há mais mister dele, dar as razões reais daquilo que frei
Clodovis Boff entendeu como afastamento do fundamento teológico. E
começamos dizendo que o fato da Teologia da Libertação estar em Moisés e
não em Jesus, estar fundada no exemplo do êxodo e não no exemplo da
cruz, isto de modo algum foi afastamento do fundamento. Jamais foi estar
fora do fundamento. Pelo contrário, ela nasceu e esteve no
fundamento. Porque o fundamento tem duplo alicerce, a lei e a graça.
Alicerces não parados no tempo e no espaço, mas alicerces que se
movimentam dialeticamente de forma progressiva. Em uma palavra, o
alicerce nasce na lei, mas se destina á graça. E a graça só se revela
quando se esgota as
potencialidades e as possibilidades da lei. Jesus foi possível por
causa de Moisés, que não veio negá-lo, mas completá-lo. Então frei
Clodovis Boff de 2007 e de 2008, irado, faz lembrar em muito, e em muito
mesmo, ao irado João Batista que apontava para o povo judeu e com o
dedo em riste lhes dizia que um novo tempo estava prestes a se revelar.
Lúcio Junior Espírito Santo.
Em termos práticos, o que significa a Teologia da Libertação passar de Moisés para Jesus?
Adamir Gerson.
Ora, a práxis da Teologia da Libertação foi de opção única aos pobres.
Como foi opção única aos escravos a práxis de Moisés. Como Moisés não
teve acordo com Faraó, mas se engalfinhou com ele em luta mortal pela
libertação dos escravos, assim foi toda a práxis
da Teologia da Libertação que não teve interesse pelos ricos e pelos
poderosos senão que pelos pobres. Em uma palavra, dos pólos da
contradição ela tomou lado, e o lado dos pobres. Mas, convenhamos, Jesus
não foi o mesmo Moisés. Jesus repetiu Moisés na forma, não, porém, no
conteúdo. Jesus voltando do Egito para Israel realmente repetiu a volta
que Moisés fez para o Egito. Mas Jesus não veio tomar o lado dos judeus
contra Roma, como teria feito Moisés, mas, transcendendo-os, conhecedor
dos limites de sua natureza, ofereceu-lhes um novo paradigma, um novo
relacionamento, que posto em prática com certeza iria dirimir a dor e o
sofrimento, fazendo feliz não só romanos e judeus, mas a todos, gregos e
gentios, escravos e livres. Jesus não veio restabelecer as linhas
demarcatórias das fronteiras de Israel, mas remover toda e qualquer
barreira, as que separavam as nações, os indivíduos e as raças. O
inimigo a ser vencido
não era Roma, mas a Serpente Original que tinha arruinado o plano
original de Deus e exercia o seu domínio por então estar em tudo e em
todos. De modo que Jesus ao não tomar o lado dos judeus contra Roma não
o fez porque fosse apolítico, mas porque conceitos caros aos judeus
como de nação, de pátria, de território para ele era secundário. O que
para ele era importante era o indivíduo, era a pessoa humana. E Jesus
sabia que se Israel fosse liberta do domínio de Roma recuperando a sua
identidade de nação isto não era garantia alguma de que o povo de Israel
estava liberto. Pelo contrário, Jesus entendia que eles iriam deixar de
ser governados e explorados pelos césares de Roma para agora serem
governados e explorados pelos reis de Israel. Por isto ele disse: o meu
reino não é deste mundo. O meu reino não é disto. É do céu. Mas ele vem a
este mundo para acabar com isto. Por isso orou: Pai nosso que estais no
céu;
Santificado seja o Teu nome; Venha a nós o teu reino; E seja feito a
tua vontade; Assim como é no céu, também na terra.
Lúcio Junior Espírito Santo.
Tive a oportunidade de ler um artigo postado na Internet assinado pelo
Professor Felipe Aquino. Não conheço a sua posição a fundo. Mas tenho
suspeitado de que a sua posição vem confirmar uma esperança manifesta do
Professor
Felipe Aquino sobre o futuro da Teologia da Libertação. Isto que você
chama de passagem de Moisés para Jesus grosso modo vai de encontro ao
que espera o Professor Felipe Aquino será doravante a Teologia da
Libertação. Vou transcrever o que ele disse e depois gostaria que você
explicasse essa talvez ligação: “Deus
queira que a sua voz seja ouvida no seio dos seguidores de Gutierrez,
L. Boff, Jon Sobrino, etc, de modo a se criar uma teologia da libertação
como aquela que pediu o Papa João Paulo II, “necessária”, a serviço dos
pobres e oprimidos, desvalidos e excluídos, mas sem usar o veneno
marxista da violência e do ódio de classes como meio de revolução e de
mudança. Se o grito de Boff for ouvido poderemos ter uma TL boa e
“necessária””
Adamir Gerson.
Em primeiro lugar é preciso fazer uma distinção entre Adamir Gerson e o
Professor Felipe Aquino. Pode até parecer que na forma sejam idênticos –
daí a sua
suspeita de serem parecidos – mas com certeza no conteúdo são
completamente distintos. Ora, atrás eu disse que Moisés e Jesus, a lei e
a graça são partes do mesmo processo. Que o Deus que veio estar na
graça, estar em Jesus, antes esteve na lei, esteve em Moisés. Fez ali a
obra necessária ao seu tempo. De modo que fui claro que o fundamento da
Teologia antes de estar na graça e em Jesus esteve na lei e em Moisés.
Passou-se para aquele depois que esgotou as suas potencialidades neste.
Então qualquer rejeição ao Marxismo é uma rejeição do fundamento da
Teologia. Toda e qualquer teologia é feita a partir do fundamento da
Palavra de Deus. E a Palavra de Deus carrega como conteúdo o Marxismo no
conjunto de sua obra. Tanto a obra teórica de Marx, como a obra
insurrecional de Lênin, bem como a obra edificadora do socialismo de
Stálin. O que o Professor Felipe Aquino, no alto de sua sabedoria, chama
de “veneno marxista da violência e
luta de classes” se trata do mesmo veneno com o qual Deus feriu Faraó e
seus primogênitos e que no livro de Jó (20) se achou reservado para a
escatologia, para novamente ser destilado: “(...) Seus próprios filhos
buscarão o favor dos de condição humilde, E suas próprias mãos
restituirão as suas coisas valiosas. Seus próprios ossos estiveram
cheios de seu vigor juvenil, mas com ele se deitará no mero pó. Se
aquilo que é ruim tiver sabor doce na sua boca, Se ele o deixar
dissolver debaixo da sua língua, Se tiver compaixão dele e não o
abandonar, E se o retiver no meio do seu paladar, Seu próprio alimento
se transformará nos seus próprios intestinos; Será dentro dele o fel de
najas. Engoliu riqueza, mas ele a vomitará; Deus a desalojará do próprio
ventre dele. Sugará o veneno das najas; a língua duma víbora o matará.
Nunca verá os cursos de água, Os rios torrenciais de mel e manteiga.
Restituirá a sua propriedade
adquirida e não a engolirá; Como a riqueza proveniente do seu
intercâmbio, mas com a qual não se regalará. Pois tem esmagado, tem
abandonado os de condição humilde; Tem arrebatado a própria casa que não
passara a construir. Porque certamente não conhecerá tranqüilidade no
seu ventre; Não escapará por meio das suas coisas desejáveis. Não lhe
sobra nada para devorar; Por isso é que não perdurará seu bem-estar.
Enquanto a sua fartura está no auge, sentir-se-á aflito; Todo o poder do
próprio infortúnio virá contra ele. Ocorra então que, para encher-lhe o
ventre, Envie sua ira ardente sobre ele E a faça chover sobre ele, pra
dentro das suas vísceras. Fugirá do armamento de ferro; Um arco de cobre
o retalhará. Uma arma de arremesso até mesmo lhe sairá pelas costas, e
uma arma lampejante, pelo fel; Objetos aterradores. Toda a escuridão
será reservada para as suas coisas entesouradas; Será consumido por um
fogo que ninguém
abanou.; Irá mal ao sobrevivente na sua tenda. O céu revelará o seu
erro E a terra estará em revolta contra ele. Um forte aguaceiro levará a
sua casa de roldão; Derramar-se-ão coisas no dia da sua ira. Este é o
quinhão do homem iníquo, da parte de Deus”. Portanto quando falo da
Teologia da Libertação como estando em Moisés, mas que vai se levantar
em Jesus, iniciar uma nova caminhada em sua existência, de modo algum é
na perspectiva do Professor Felipe Aquino, confessar publicamente que
quando lutou para libertar os pobres com as armas do Marxismo esteve
laborando em erros e afastado do fundamento. Mas, ao contrário, é
reconhecer que esteve no caminho certo, posta ali não por homens, mas
pelo próprio Deus. Portanto, se até aqui nenhum teólogo da Teologia da
Libertação o fez, hoje Adamir Gerson proclama que qualquer palavra
proferida contra o Marxismo, para desqualificá-lo como coisa do homem ou
mundanismo político produzido
pelo secularismo, doravante é blasfêmia contra Deus. Porque o Marxismo
no conjunto de sua obra, no conjunto dos seus acertos e erros, tem
origem unicamente em Deus, como o judaísmo no conjunto de sua obra, nos
seus acertos e erros, teve origem unicamente em Deus. E se o ato de
blasfêmia é um mal que se carrega para sempre, e o quer evitar, então se
cale e espera em Deus que é misericordioso para esclarecer seu caminho.
Porque certamente os tempos da ignorância estão passando.
Lúcio Junior Espírito Santo.
O Professor Felipe Aquino foi claro, em sua explanação, ele fala de uma
nova Teologia da Libertação completamente esvaziada do Marxismo.
Gostaria que você também tivesse a mesma clareza e dissesse se nesta
passagem de Moisés para Jesus a Teologia da Libertação, leva consigo o
Marxismo, de modo a trabalhar com as suas ferramentas de luta de classe e
de violência revolucionária.
Adamir Gerson.
Ora, uma vez que disse que o Marxismo pertence ao sagrado. É Deus. E a
Teologia da Libertação em sua existência esteve umbilicalmente ligada a
ele, ora, esta passagem de Moisés para Jesus na vida da Teologia da
Libertação ela vai dar-se também no Marxismo. Esta mudança é porque Deus
decidiu mudanças no Marxismo. Em modo algum
Deus vai reciclar a Teologia da Libertação e deixar o Marxismo
abandonado à própria sorte para que continue a ser pisado pelos homens
como um moribundo. Portanto não só a Teologia da Libertação, mas também o
Marxismo dever-se-ão estar antenados para grandes mudanças que se
aproximam em suas vidas. Por estarem agora em Jesus irão abandonar o
instrumento de luta de classe? Ora, o instrumento de luta de classe tem
função pedagógica. Sem ele é impossível se adquirir a consciência real
da libertação. Como a consciência da libertação não foi abandonada, mas,
pelo contrário, aprofundada, agora não só a sociologia, mas também a
metafísica, o instrumento da luta de classe é, pois, inabondonável. É
uma espada que se carrega à bainha. Mesmo porque se descobriu que o
mesmo faz parte e é conteúdo da Palavra de Deus. Quanto à violência
revolucionária todos terão de se conscientizar que neste novo tempo as
novas forças que
estarão chegando serão guardiães fieis da Democracia. Se por acaso
grupos se articularem para impedir a despotencialização do mal que
impregna as instituições e as relações e que está sendo levado a cabo,
para que funcione mais harmonicamente, mais próximo ao ideal de harmonia
que havia no Paraíso, ora, as novas forças que estão em Jesus, como
guardiães da Democracia, e na sua defesa, terão de tomar medidas
eficazes para que a Democracia seja preservada, porque é sua guardiã. E a
Democracia, vitoriosa, deverá prosseguir em sua caminhada até fazer que
todos no país sejam de uma só fé e de uma só alma. Já não tendo mais
indivíduos gozando privilégios a expensas de outros, mas todos
usufruindo, dos mesmos direitos e dos mesmos deveres. Há incoerência no
que foi falado de que a Teologia da Libertação está deixando para trás o
seu tempo de Moisés e ingressando no seu tempo de Jesus e, no entanto,
levando consigo ferramentas
do Marxismo? Não, porque embora Jesus não tenha tomado o lado dos
judeus contra Roma, tinha para eles novo paradigma, todavia em todas as
situações concretas em que se envolveu Jesus tomou o lado sim, dos
marginalizados socialmente, dos famintos, dos doentes, e até o lado de
uma sociedade em que ela não tem a presença dos que detém riquezas,
quando prescreveu ao jovem rico o que era necessário fazer para se
tornar seu seguidor.
Lúcio Junior Espírito Santo. O Professor Felipe Aquino
parece tem um juízo semelhante, pois não aponta para a Teologia da
Libertação e diz que ela tem de abandonar os pobres, mas sim, que ela
tem de voltar ao fundamento que é Jesus e, então, a partir de Jesus
libertar os pobres.
Adamir Gerson.
Ora, no presente tempo em que estamos vivendo falar da libertação dos
pobres e excluir as ferramentas marxistas é
reduzir esta libertação ao mero campo da caridade. O peso do tempo
atual não suporta isto. A caridade não tem fim em si mesmo, mas foi
meio. Foi de suma importância quando não se conheciam as ferramentas da
libertação. Mas hoje, com o progresso alcançado no campo tecnológico, e a
inserção e obrigação do Estado no social, e a clara disposição das
ferramentas de libertação, a caridade não é mais objeto da Teologia.
Lúcio Junior Espírito Santo. Tal como ocorreu com o judaísmo
que serviu de aio para o cristianismo, assim, então, ocorreu com a
caridade em relação à libertação?
Adamir Gerson.
A analogia é correta. A lei foi de suma importância enquanto a graça
não veio. Mas quando se manifestou a libertação, a lei se tornou
obsoleta. A lei significava a não emancipação do indivíduo, mas a sua
proteção. Havia uma moral e uma ética estabelecidos que falavam pelo
indivíduo e asseguravam as suas relações. E uma vez que a graça
assegurava ao indivíduo a sua própria emancipação, no plano da salvação,
só podemos entender que a lei tornou-se obsoleta. O que por extensão se
estende à
caridade.
Lúcio Junior Espírito Santo.
No seu blog encontrei uma postagem onde você narra uma entrevista que
frei Clodovis Boff teve com o jornal Folha de São Paulo na metade da
década de 90. E na entrevista é abordado um fracasso que teria tido frei
Clodovis
Boff por não ter logrado êxito no seu projeto de criar um partido
revolucionário. Teve o azar de no período ter aparecido Lula e as Cebs
em bloco se decidiram pelo Lula e pela criação do PT, não sobrando
espaço para o Partido Cristão de frei Clodovis. O que aconteceu em 2007
não foi que frei Clodovis Boff teve um repente de retomar o seu projeto
de final da década de 70 e início da década de 80? Afinal no seu projeto
partidário o mesmo estava alicerçado em Jesus e Jesus era o seu
fundamento e guia, de modo que quando acusou a Teologia da Libertação de
ter se afastado do fundamento estava sendo coerente com todo o seu
passado.
Adamir Gerson.
O que você fala tem sentido. Afinal uma idéia e um projeto só morrem
quando são postos em prática e a prática o exclui por não necessário ou
descabido. De modo que seja impossível que frei Clodovis Boff tenha
abandonado o seu projeto de transformação revolucionária. É possível que
sim. Mesmo porque as condições objetivas vieram lhe estar favoráveis.
Por um lado o esgotamento revolucionário do PT, e por outro o
esgotamento revolucionário do Marxismo. É possível que ele tenha
enxergado que com um só cajado pudesse golpear duas situações
distintas. Ou seja, ter o apoio dos setores tidos conservadores e o
apoio da Teologia da Libertação.
Lúcio Junior Espírito Santo.
Faz sentido porque ele não fala em acabar com a Teologia da Libertação,
mas trazê-la de volta ao fundamento e refunda-la em novas
bases. Em novas bases que seriam aceitáveis pelos conservadores.
Adamir Gerson.
É claro que frei Clodovis Boff labora em ambigüidades. O que seria a
Teologia da Libertação ter abandonado o fundamento? O que seria fazê-la
retornar ao fundamento? Se uma
referência direta a Teologia da Libertação o ponto de partida deve
estar focado no período do seu nascimento. Focando o seu nascimento no
encerramento dos trabalhos do Concílio Vaticano II só podemos entender
que ela nasceu sendo o que é. Não nasceu diferente do que é. Mesmo
porque o seu nascimento se deu no momento em que por toda a Europa,
contagiada pelos resultados de aberturas do Concílio Vaticano II,
nasciam teologias políticas, tácito e explícito tendo o Marxismo como
ponto de referência e mediação de suas elucubrações políticas. Por que a
Teologia da Libertação seria diferente? Portanto para ser coerente não
cabe a ele falar em refundação da Teologia da Libertação, mas, sim,
apresentar uma nova Teologia que teoricamente se revele mais atrativa e
mais embasada teologicamente, se é que entende ser fraco o embasamento
teológico da Teologia da Libertação.
Lúcio Junior Espírito Santo.
Não pode ter sido que frei Clodovis Boff não obstante fazer parte da
plêiade de teólogos que criaram a Teologia da Libertação ele, no
entanto, já era uma figura diferente. Já trazia em si uma reserva
teológica e política que o iria fazer diferente dos demais? Apenas para
facilitar a
compreensão, ele seria a águia que na parábola que se conta na Alemanha
foi criada entre galináceos, mas que um dia teve o seu ser de águia
revelado? Não pode mais ficar entre galináceos?
Adamir Gerson.
Analisando frei Clodovis Boff de final da década de 70 e
início da década de 80 realmente destoava dos demais. Entendia que os
cristãos podiam sim construir um projeto político-partidário de
transformação da sociedade exclusivo e imanente ao cristianismo.
Entendia que o Marxismo não detinha o monopólio da libertação, mas que
ela também estava presente na Palavra de Deus. O erro, e volto a
afirmar, foi excluir o Marxismo do fundamento da Teologia. É possível
sim que frei Clodovis Boff tenha sido a águia da parábola, não, porém,
aquele momento em que ela, levada ao alto do penhasco e mergulhada no
vazio, ziguezagueando conseguiu chegar ao alto da montanha. Ainda uma
águia pelo vício ciscando o chão.
Lúcio Junior Espírito Santo.
Entendendo o assunto pelo espírito, segundo os mistérios do espírito,
não pode ser que frei Clodovis Boff seja uma figura teológica e pastoral
singular e privilegiada? O Deus que irrompe na terra fazendo com que os
reinos do mundo se transformem em reinos de Deus; que esmigalha a
estátua reduzindo-a a pó, e que entendemos seja o fim e queda do
imperialismo. Em uma palavra, o Deus que se manifesta em Majestade,
vindo com poder e grande glória para imponentemente governar todas as
nações, não pode ser que o mesmo se
ache em espera do seu momento na alma de frei Clodovis Boff, e que no
ano de 2007 ele teria se agitado no seu nascimento? Afinal, isto vai de
encontro ao projeto claramente messiânico que no final da década de 70 e
início da década de 80 então ostentava? Afinal já li algo assim em um
dos seus escritos onde você liga a figura de frei Clodovis Boff à figura
de Che Guevara; de que os dois estariam inseridos no mesmo processo.
Adamir Gerson. Esse trabalho onde emparelhei
frei Clodovis Boff com Che Guevara, os dois apareceram como parte de um
mesmo processo, pode sim explicar o Clodovis Boff de 2007. E que
trabalho foi este? De que Che Guevara deixando Cuba e indo para a
Bolívia para começar a revolução mundial fora o primeiro momento do
conceito. A revolução mundial em Che Guevara então se iniciou unicamente
que com as armas do Marxismo. Numa das mãos o fuzil e na outra o livro O
Capital. Adormecida em Che Guevara algum tempo depois o espírito quis
novamente re-começar a revolução mundial. E agora o seu artífice sendo
frei Clodovis Boff. Já sofre metamorfose. Já numa outra perspectiva.
Agora se manifesta em antítese, como convém ao movimento do espírito. Em
completa negação ao
Marxismo, e totalmente baseada em motivos cristãos.
Lúcio Junior Espírito Santo.
E qual a explicação do porque da revolução mundial tanto em Che Guevara
como em frei Clodovis Boff não terem ultrapassado o campo do pessoal,
sem a adesão e participação
externa, somente Che Guevara e frei Clodovis Boff estando envolvidos
com ela?
Adamir Gerson.
Porque na verdade a revolução acontecia no espírito de Deus. Era no seu
ventre que ela se gestava. De modo que o esforço de Che Guevara e de
frei Clodovis Boff para que
acontecesse era o seu crescimento no ventre de Deus. Certamente que
iria chegar o tempo em que a revolução mundial iria acontecer e ter a
total adesão externa, e agora não mais conduzida por apenas um líder,
mas uma multidão absorta e envolvida com ela. E neste terceiro momento o
líder que a empunharia certamente que iria resgatar tanto Che Guevara
como frei Clodovis Boff. Se em Che Guevara ela se manifestou em motivos
inteiramente marxistas, e em frei Clodovis Boff em motivos inteiramente
cristãos, certamente que neste terceiro momento o seu líder e todos os
que estarão com ele empunharão numa das mãos o Marxismo e na outra o
Cristianismo.
Lúcio Junior Espírito Santo.
Então o fato da revolução mundial não ter decolado nem em Che Guevara e
nem em frei Clodovis Boff, não tendo saído jamais do seu círculo
pessoal e subjetivo, foi justamente por causa desta construção no
espírito divino? Tinham somente uma asa
Lúcio Junior Espírito Santo.
Isto que você fala de que a revolução mundial em Che Guevara e em frei
Clodovis Boff serem acontecimentos que se desenrolavam no ventre de
Deus, com as ações isoladas de Che Guevara e de frei Clodovis Boff sendo
a sua manifestação externa, ora, quando o profeta Isaías vaticinou eis que o dei como líder e
como testemunhas para os povos,
e no livro do Apocalipse, reiteradas vezes ali há a descrição de um
personagem com a missão de governar as nações, então podemos dizer que
tanto Che Guevara como frei Clodovis Boff quando quiseram começar um
movimento revolucionário de cunho mundial, para libertar totalmente a
terra do domínio imperialista e de outras forças funestas, na verdade
eles agiram por inspiração divina? Era literalmente o Deus Dialético
começando a realizar a idéia de domínio universal?
Adamir Gerson.
Certamente que sim. Apenas que completaria, de libertação universal. E
diria mais, que o fato da revolução mundial não ter decolado nem em Che
Guevara e nem em frei Clodovis Boff, é porque na sua construção
dialética tinham apenas uma asa. Separadas, como tese e antítese. Che
Guevara possuía apenas a asa do Marxismo, e frei Clodovis Boff, a asa do
Cristianismo. Certamente que no terceiro momento o Artífice iria ligar
as duas asas ao corpo. E então a revolução mundial iria decolar e ser
uma verdade na terra, para espanto e medo do domínio
imperialista.
Lúcio Junior Espírito Santo.
Voltando à questão da águia, seria então este o momento em que ela iria
finalmente se destacar dos galináceos, realizando o seu vôo como águia,
até que, ziguezagueando, iria então pousar a planta dos pés no alto
da montanha.
Adamir Gerson.
A idéia da revolução mundial sempre esteve presente no movimento
revolucionário. Todos os revolucionários acalentavam ver o dia em que em
toda a terra a exploração foi banida. Mas a revolução laborava em
dificuldades, externas e
internas. De modo que as dificuldades impunham a ela limites à sua
ação. De modo que a idéia de revolução mundial pode sim ser a águia da
parábola contada na Alemanha que foi criada no meio de galináceos. E
podemos dizer que tem chegado o dia glorioso em que ela irá, então, voar
e pousar as plantas dos pés no alto da montanha.
Lúcio Junior Espírito
Santo.
Começo a perceber importância em você ter relatado esses fatos
relacionados a frei Clodovis Boff totalmente desconhecido não só do
grande público como também de grande parte da militância da Teologia da
Libertação. Visto pelos teólogos da Teologia da Libertação como
trapalhão, fazendo o papel de bobo da corte, no entanto você trouxe à
superfície o Clodovis Boff real, um homem totalmente nos planos de Deus.
De modo que tem chegado o tempo de compreendê-lo na sua inteireza, a
sua grandeza e importância na sua ligação metafísica com Che Guevara. De
modo que as suas trapalhadas foram muito mais porque representava o
segundo momento do espírito, inacabado. Não estava na clareza do
terceiro momento. Mas, como você acha que irão reagir os conservadores
que o elegeram em 2007 como o seu mais novo campeão? O oportunismo
claro de então dará lugar a uma reflexão séria? É possível uma reflexão
séria por parte dos conservadores, em especial sobre o Marxismo, ser
ele tão-somente a ação divina?
Adamir Gerson.
As dificuldades existirão dos dois lados. Pelo lado da ortodoxia
cristã em compreender o Marxismo como sendo a ação de homens, mas
inspirados por Deus, e pelo lado da ortodoxia marxista em reconhecer que
são instrumentos vivos nas mãos deste mesmo Deus. Que o projeto que
executam como sendo seus na verdade é parte de um projeto maior de Deus.
O bom senso e a humildade com certeza serão meio caminho andado. E é
certo que tanto a ortodoxia cristã como a marxista poderão sim traçar
conjuntamente planos e caminhos pelo qual o Reino de Deus será
construído no curto, médio e longo prazo. Como aconteceu com a Renovação
Carismática que no início foi julgada pelos conservadores como invasão
protestante do catolicismo, e aceita porque transformada em instrumento
de luta contra a invasão marxista. Os tidos conservadores poderão sim,
diante de nova luz sobre o real fundamento da Teologia, olhar com novos
olhos tanto aos evangélicos como aos marxistas. Que não se trata de
subtração do Reino de Deus, mas,
pelo contrário, do seu crescimento. O importante é que as massas se
manifestem nas ruas com alegria no coração sobre este novo porvir. As
massas nas ruas farão os homens recobrarem a razão. De modo que estas
três forças, católicos, evangélicos e marxistas, representantes diretos
de Deus, poderão sim sentar-se na mesa e traçar um plano dialético de
construção do Reino. Carismáticos e evangélicos, amolecendo os corações
de pedra com o poder do evangelho, serão de suma importância. O que não
se pode, repito, é deixar que a condução do mundo esteja nas mãos de uma
nação que tem a certeza do seu domínio por confiar no poder das armas
que construiu. O nem por poder e nem por força militar mas pelo poder da Palavra de Deus pode sim ser o interlocutor válido pelo qual estas três forças de Javé traçarão a construção do Reino no tempo e no espaço
(PROSSEGUE)