Busquei a memória recente da
cidade e fui ao Salão do Pedro Cabeleireiro entrevistar esse verdadeiro
artista: em sua opinião, Bom Despacho já
foi culturalmente mais evoluída, segundo ele: eram menos habitantes do que
hoje, mas havia, cinema, teatro, e quatro boates: Cantuá, Circus, Jacaré
e Auê.
Pedro lembrou-se da simplicidade:
desde criança, o carnaval exerceu sobre ele um grande fascínio. As pessoas iam
para casa, jogavam uma purpurina, um vestido velho virava fantasia, os amigos
saíam vestidos de mulher.
Naquele tempo, no carnaval, a
prefeitura fazia um concurso de escolas de samba e dos blocos. Eles eram: Prisioneiros
do Álcool, Pilek, Sem Compromisso, Damas e Valetes,
Catfully, Babi Gole, Tropicália. Eram doze turmas.
As escolas de samba eram duas: Estrela
de Ouro e Sinal de Alerta. Eram duas turmas e famílias: a Tiana (da
Tabatinga) e o Krim (da rua São Paulo). Krim era caminhoneiro: o caminhão dele,
no carnaval, virava carro alegórico. Não havia, no entanto, rivalidade e sim
amizade entre eles.
Outra lembrança é o carnaval de
1990, no qual a figura do marajá estava na moda graças a Fernando Collor. O
sobrinho do Krim, um negro alto, saiu com um grande turbante, causando grande
impressão: um verdadeiro marajá! Krim tinha percussão, mas não composições,
enquanto Tiana exibia uma forte mística africana: eram sambas compostos por
eles mesmos “Estrela de Ouro, é da Tabatinga, que é”. Antônio, marido de Tiana,
vestia-se de lorde inglês, com peruca branca, enquanto as meninas sambavam com
paetês e guarda-chuvas. Era uma escola completa, insuperável. Ganhava todo ano.
A prefeitura fazia a apuração.
Existiam troféus, bem como prêmios diferentes para a escola de samba e os
blocos. Quase sempre, Estrela de Ouro ganhava como escola de samba,
enquanto Catfully, Damas e Valetes e Tropicália ganhavam o
concurso dos blocos.
Paulinho e Manoel eram dois
personagens fundamentais do Estrela de Ouro. Adoravam vestir-se de
mulher no carnaval, o que não podiam fazer habitualmente, apenas de forma muito
discreta, mas no carnaval desbundavam, usavam apenas provocantes tapa-sexos.
Pedro recorda-se da forma impressionante como eles eram respeitados por todos.
Como a cidade era evoluída em termos culturais!
Os desfiles eram na Praça da Matriz
e desciam para a rua Dr. Miguel Gontijo, as famílias reuniam-se ali. Era um
orgulho, a glória: turistas vinham de Divinópolis e de toda a nossa região para
pular o nosso carnaval.
Por
fim, Pedro lembra-se do último carnaval ao estilo antigo (1988). Era uma
ansiedade esperar a apuração dos votos em frente à câmara dos vereadores, mesmo
debaixo num tempo chuvoso, mas depois da vitória, todos comemoraram loucos de
alegria, cantando e dançando na chuva! Pedro conta que seu peito parecia
explodir de uma energia, uma alegria indescritível!
Mesmo tantos anos depois, aquele
fascínio do carnaval permaneceu dentro de Pedro. Querendo reviver as emoções,
entrou em contato com a Estação Primeira de Mangueira e desfilou na
Sapucaí. Ele conta que seu domínio do samba fez com que ele fosse uma
referência no desfile: os organizadores apontavam que quem vinha atrás deveria
seguir seus belos passos. Foi um momento de glória em sua vida, todas as
imagens passaram em sua cabeça naquela apoteose maravilhosa: sua infância no
carnaval bom-despachense, a Estrela de Ouro, Tiana e Krim. Pedro foi,
literalmente, da Estrela de Ouro para a Sapucaí.