segunda-feira, 21 de novembro de 2022

CUIDADO, “GENERAL”

 

CUIDADO, “GENERAL”

 

            Ele chegou aqui moço e forte. Carregado de sonhos e esperanças. Trazia na mão o pergaminho da ciência e na mente a certeza de um futuro grandioso. Começou a executar a obra que idealizara. Fez dessa cidade o seu campo de luta. Edificou o seu quartel geral. E, aproveitando-se da incapacidade de uns e da ociosidade de outros, hasteou, finalmente, a bandeira da vitória.

            Triunfou, mas no seu triunfo está implicado o sacrifício de um povo. De um povo pacato, submisso, que já começou a se rebelar contra os abusos de que está sendo vítima. Guerrilheiros começam a aparecer aqui e ali. Fabricam armas próprias, como o berimbau. E a revolta vai se fermentando lenta e silenciosamente no selo da população. Até que nós temos pedido o que nos compete exigir. E o general permanece irredutível no seu castelo de ouro e de fios.

            Sr, General: não sei se você lê O Bom Despacho. Ele é tão humilde e tão simples que talvez não chegue às suas mãos, sempre ocupadas com algo importante. As cifras, os cálculos, a inúmeras atribulações da vida, lhe não permitem, provavelmente, a leitura desta e de outras folhas, além disso este jornal já o criticou por diversas vezes. Você se sentiu ofendido e magoado no seu orgulho de homem. E ofendido e magoado, você se concentrou mais no escritório. Passou a ter menos amigos a sentir falta de um cigarro, a falar pouco, a não sorrir nunca, para resistir ao impacto da crítica, você se fechou mais consigo mesmo. Tornou-se mais duro, mais austero, mais solitário, não há nada pior do que viver na solidão quando o mundo está cheio de gente.

            No orgulho, no amor próprio, no laconismo, na diferença está o seu erro. General. Hábil no campo de luta, exímio guerreiro, você é um fracasso no tratar com as pessoas. Você não tem conversa, não tem demagogia. Você não sabe abraçar, nem sorrir. Nem prometer. E isso é muito importante para o povo. Isso é muito importante para quem não pode dar ao povo, o que o povo precisa. Prive a população de energia elétrica aos domingos, à noite, a qualquer hora, mas não lhe negue, Sr. General, o sorriso, um cumprimento, uma promessa, castigue os habitantes dessa cidade com uma das mãos, mas afague-os com outra.

 Aos domingos, a gente para onde ir. Não tem Praça de Esportes, não tem cinema. Não temos onde nos divertir. Ligamos o rádio. O rádio não funciona. Saímos. Entramos no bar. Pedimos um sorvete. Não tem. Pedimos alguma coisa gelada. Não tem. Não tem café. Não tem água. Por que? Porque a cidade está o dia inteiro sem energia elétrica.

Sem saber o que fazer, para onde ir. Ficamos perambulando pelas ruas, enquanto passa a caminhonete nova, bonita, fazemos barulho no calçamento, ou levantando poeira do chão. E no seu interior, imponente, e esbelto como um general prussiano, vai o homem que nos maltrata, que nos priva até mesmo de um pouco d´água.

Sr. General, não seja tão cruel. Prive-nos da água, da luz, mas nos dê pelo um cumprimento, um sorriso. De nós a ilusão de uma promessa, o autor do berimbau poderá voltar. Se já não voltou, cuidado, Sr. General.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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