CUIDADO,
“GENERAL”
Ele chegou aqui moço e forte.
Carregado de sonhos e esperanças. Trazia na mão o pergaminho da ciência e na
mente a certeza de um futuro grandioso. Começou a executar a obra que
idealizara. Fez dessa cidade o seu campo de luta. Edificou o seu quartel geral.
E, aproveitando-se da incapacidade de uns e da ociosidade de outros, hasteou,
finalmente, a bandeira da vitória.
Triunfou, mas no seu triunfo está
implicado o sacrifício de um povo. De um povo pacato, submisso, que já começou
a se rebelar contra os abusos de que está sendo vítima. Guerrilheiros começam a
aparecer aqui e ali. Fabricam armas próprias, como o berimbau. E a revolta vai
se fermentando lenta e silenciosamente no selo da população. Até que nós temos
pedido o que nos compete exigir. E o general permanece irredutível no seu
castelo de ouro e de fios.
Sr, General: não sei se você lê O
Bom Despacho. Ele é tão humilde e tão simples que talvez não chegue às suas
mãos, sempre ocupadas com algo importante. As cifras, os cálculos, a inúmeras
atribulações da vida, lhe não permitem, provavelmente, a leitura desta e de
outras folhas, além disso este jornal já o criticou por diversas vezes. Você se
sentiu ofendido e magoado no seu orgulho de homem. E ofendido e magoado, você
se concentrou mais no escritório. Passou a ter menos amigos a sentir falta de
um cigarro, a falar pouco, a não sorrir nunca, para resistir ao impacto da
crítica, você se fechou mais consigo mesmo. Tornou-se mais duro, mais austero,
mais solitário, não há nada pior do que viver na solidão quando o mundo está
cheio de gente.
No orgulho, no amor próprio, no
laconismo, na diferença está o seu erro. General. Hábil no campo de luta, exímio
guerreiro, você é um fracasso no tratar com as pessoas. Você não tem conversa,
não tem demagogia. Você não sabe abraçar, nem sorrir. Nem prometer. E isso é
muito importante para o povo. Isso é muito importante para quem não pode dar ao
povo, o que o povo precisa. Prive a população de energia elétrica aos domingos,
à noite, a qualquer hora, mas não lhe negue, Sr. General, o sorriso, um
cumprimento, uma promessa, castigue os habitantes dessa cidade com uma das
mãos, mas afague-os com outra.
Aos domingos, a gente para onde ir. Não tem
Praça de Esportes, não tem cinema. Não temos onde nos divertir. Ligamos o rádio.
O rádio não funciona. Saímos. Entramos no bar. Pedimos um sorvete. Não tem.
Pedimos alguma coisa gelada. Não tem. Não tem café. Não tem água. Por que?
Porque a cidade está o dia inteiro sem energia elétrica.
Sem
saber o que fazer, para onde ir. Ficamos perambulando pelas ruas, enquanto
passa a caminhonete nova, bonita, fazemos barulho no calçamento, ou levantando
poeira do chão. E no seu interior, imponente, e esbelto como um general
prussiano, vai o homem que nos maltrata, que nos priva até mesmo de um pouco
d´água.
Sr.
General, não seja tão cruel. Prive-nos da água, da luz, mas nos dê pelo um
cumprimento, um sorriso. De nós a ilusão de uma promessa, o autor do berimbau
poderá voltar. Se já não voltou, cuidado, Sr. General.
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