Acompanhando as eleições para gerente da semi-colônia Brasil, acho justo pontuar a atual subida de Marina Silva ao segundo lugar nas pesquisas eleitorais.
É preciso desmistificar as tais pesquisas! O caminho de mostrar como essas pesquisas tornaram-se uma informação que visa o controle foi a eleição de 89, que culminou na disputa entre Lula e Collor.
Pontuo que agora, retrospectivamente, dou razão ao MR-8 quando pichava: nem Collor nem Lula! Ambos iriam praticar uma política de privatização acaso eleitos. Lembro-me claramente de Aluísio Mercadante, possível ministro da economia de Lula, sendo pressionado pela mídia e admitindo que ia privatizar, sim, "pois o estado tem até fábrica de alfinetes". Esse detalhe não é fortuito. O PT iria privatizar, mas antes de tomar o poder ele precisou passar por um processo de abrandamento. Expurgou-se a Convergência Socialista, o atual PSTU, assim como criou-se as condições para expulsar alguns outros grupos e pessoas que mantinham-se fiéis tanto à social-democracia quanto a um trotsquismo mais aguerrido e que não tolerariam ou criariam problemas num governo neoliberal assistencialista, submisso ao capital estrangeiro e ao latifúndio.
Ora, nas eleições de 89 o recurso às pesquisas foi escandalosamente manipulatório. Alguém precisa urgentemente pesquisar a mídia da época para observar isso. Observando aquelas pesquisas, fica bem evidente que elas representam quais os candidatos estão mais cotados para os vários setores empresariais brasileiros. O desafio que fazia convergir os empresários era encontrar um candidato viável para a direita e que continuasse a tarefa de privatizar, iniciada por Sarney e possivelmente muito desejada internacionalmente. Primeiramente, a mídia entrou em campo como braço político do estado, buscando influenciar a favor de um candidato "novo", mas que continuasse as políticas privatizantes inauguradas por Sarney ao privatizar Volta Redonda. Estrategicamente, o estado anulou a militância peemedebista, deixando Ulisses Guimarães com uma candidatura fantasma. Pode-se supor que tanto o PMDB quanto o PSDB, já existentes, trabalharam em surdina a favor de Collor já no primeiro turno. O baque da aplicação das políticas neoliberais não interessava tanto a Mário Covas, que falava nelas nessa época, mas sempre de forma nebulosa e nada clara.
A mídia, então, comportou-se como partido político, como militância da direita. Ela tentou com Afif Domingos, a quem atribuía maior percentual de votos nas pesquisas. Ao ver que ele não colou, arriscou-se com Sílvio Santos, mas verificou que seria, também, uma perigosa aventura fadada a uma possível derrota frente a Lula e Brizola, os verdadeiros favoritos então. Logo, a mídia encontrou um candidato ideal em Fernando Collor, associando a ele a imagem de um galã de novela e, ao promovê-lo ao primeiro lugar das pesquisas, de fato conseguiu colocá-lo num lugar privilegiado. O problema é que não obteve sucesso completo. Houve um segundo turno.
No segundo turno, lembro-me claramente, as pesquisas davam apenas um por cento de diferença a favor de Collor contra Lula. Ora, todos sabem que a margem de erro em pesquisas é bem maior do que isso. Nesse ponto, evidentemente entrava o fator subjetivo: AS EMPRESAS DE PESQUISA QUERIAM COLLOR!
Foi a partir daí que houve a guerra psicológica de Collor contra Lula, utilizando-se da propaganda da queda do Muro de Berlim, associando Lula ao comunismo, ao aborto usando sua ex-mulher, etc. Como Lula de fato fez aquela mulher sofrer ao deixá-la grávida aos seis meses, ele ficou impactado com aquela vingança monumental, evidentemente servida fria.
No entanto, apesar desses fatores, creio que o que mais pesou foi a real natureza das eleições: não se trata nunca de mudança estrutural, apenas gerenciar de outras maneiras e com outras manobras a condição semi-colonial. Enquanto quadro do estado, Collor já estava muito mais capacitado e cobra criada do que Lula. Lula nasceu do sindicalismo pragmático formado pela ditadura militar, triunfando na paz dos cemitérios criada pela ditadura após o esmagamento, muitas vezes violento, do trabalhismo janguista e dos partidos comunistas. Lula era, desde sempre, tratado com simpatia pela mídia do tempo de Geisel, afinal um braço ideológico do estado. Sem isso, jamais teria adquirido aquela notoriedade de líder nacional. No entanto, Collor, ex-governador do tempo da ditadura, eleito governador na democracia, era um quadro do estado muito mais traquejado e ativo, sendo sócio da Rede Globo em seu estado, longa tradição de mando em função da tradição oligárquica, "boa aparência" (ser branco e rico, etc).
Uma vez no poder, Collor impôs um programa econômico neoliberal duríssimo, que em pouco tempo o tornou impopular, mas que era um remédio amargo que os empresários sabiam que alguém teria que ministrar. Diante das sérias consequências, Collor comportou-se como playboy mimado. Passou a permitir invasão de jornais, como fez com a Folha, quebrando sua aliança com sua principal militância, os jornalistas da mídia monopolizada. Sem partido consistente e com o ego inflado, contanto apenas com adesistas, foi deixado pela Globo ao se aproximar de Brizola e, já tendo realizado a tarefa mais dura, que era implantar a receita amarga do neoliberalismo e sua dolorosa reação na estrutura produtiva do país, foi descartado pela classe política como uma fruta chupada.
Os rearranjos a seguir deixaram claro que, em troca do fim da inflação, seria bastante fácil para a classe empresarial conseguir privatizar até mesmo os setores estratégicos da economia. Com o carisma inegável de um velho estudioso e, agora, administrador da condição dependente do país, traquejado ao ter detonado o marxismo-leninismo usando a linguagem marxista em seu Seminário de O Capital, FHC levou a termo o projeto neoliberal no Brasil.
O projeto estava instalado, mas havia um problema: os sindicatos, ainda irredentos, na mão da CUT e do PT. Seguiu-se, então, um processo de adaptação do PT a gestor da dependência. Sua principal moeda de troca era introduzir o neoliberalismo nas centrais sindicais, campo onde esse pensamento não tinha a penetração total e consensual que ele persegue.
Lula levou o pensamento neoliberal a um ponto de consenso que ele jamais voltará a atingir, pois coincidiu com um bom momento internacional. Dilma, política sem expressão, é a continuação de Lula sob uma face mais tecnocrática, aplicando o remédio amargo sem destruir o capital político do líder.
As pesquisas continuam apontando o mesmo que apontavam anteriormente: que Dilma, nesse tempo de crise, é a preferida dos empresários. O PT consegue a façanha de, ao mesmo tempo, neutralizar adversários como os comunistas e ainda utilizar retórica de esquerda. A coalização que Lula gerou, aliado ao seu capital político inalterado, é um grande triunfo para os empresários brasileiros, em especial o setor burocrático.
O setor burocrático da classe empresarial nasceu com as inversões dos latifundiários no início do século. Durante um tempo, aliou-se a Vargas, JK. O "namoro" terminou com Jango, quando esse quis impelir esse setor a assumir a hegemonia enquanto burguesia nacional e ele recuou, aliando-se a setores do capital estrangeiro e agro-exportadores e manobrando uma quartelada para afastar o presidente e seu grupo reformista do estado. O setor burocrático está firmemente atado ao latifúndio desde nascença, assim como à dominação estrangeira. O real desconhecimento do que é a burguesia burocrática leva o PCB, há cinquenta anos, a comprar gato por lebre, ou seja, a sucessivamente aliar-se à burguesia burocrática acreditando que está se aliando a um setor burguês nacional que é capaz de fazer uma revolução nacional e democrática. O PCB fez isso em 1961-64, repetiu o erro entre 1967-1989, assim como não resistiu ao repeteco em 2002-2005. O PCB confunde os rearranjos do setor burocrático com uma etapa da revolução burguesa e, feitas umas microrreformas, quando ela não precisa mais dele, passa a hostilizá-lo ou a abertamente adotar políticas conservadoras, botando o pé no freio, que o desgastam e o repelem até um novo relacionamento mais adiante.
A relação do setor burocrático com o capital estrangeiro, o setor agro-exportador e com o latifúndio é sempre maior e de maior fidelidade do que a um movimento de trabalhadores. As diferenças com esse não tardam a ficar evidentes.
Note-se a resposta de Dilma no que diz respeito a uma das mais ruidosas ações desse setor, o porto realizado pela Odebrecht em Cuba com apoio de verba estatal do BNDES. Dilma alegou, ao ser atacada pelo representante do setor agro-exportador, Aécio, que o porto será "gerido por empresas holandesas". Isso desvela o caráter do setor burocrático ao qual hoje aliou-se o PT. Esse setor está sempre aliado a empresas estrangeiras como sócio menor e ao latifúndio. Ele usa o estado para lucrar, por isso precisa de um estado minimamente estruturado, levando adiante ações que o empresário privado não consegue fazer, pois não lucra. Assim, o setor burocrático precisa de uma universidade para produzir quadros para as empresas, assim como de uma estatal para fazer as pesquisas e desenvolver a tecnologia e a ciência com a qual ele vai lucrar. O estado encontra o mapa da mina, põe na mão do empresário burocrático e fica com o prejuízo.
Por fim, a militância da mídia agora elegeu Marina como a segunda candidata nas pesquisas, movida pela "bolha emocional" causada pela morte de Eduardo Campos, segundo afirmam revistas como a Veja. Será que existe esse voto "fiquei com dó, vou votar na vice dele"? Ora, ela já estava no páreo! Mas o que se trata é bem uma outra política. A política do setor da mídia é não dar um cheque em branco ao PT, que tem claro apetite de hegemonia. Assim, ele eleva Marina a um segundo lugar, como representante dos setores agro-exportadores que não têm seus interesses totalmente contemplados pela coalizão de Lula e Dilma.
Minha aposta, no entanto, é que no futuro haverá a polarização entre o aglomerado de Lula/Dilma, engordando ao máximo, polarizando com a esquerda não petista, a Frente Independente Popular ou algum similar. A "frente de esquerda" inexistente, composta por PCB-PSOL-PCO-PSTU, tenderá mais e mais a ficar atomizada e perder força, sendo engolida pelos dois lados ao ficar no centro. Randolfe Rodrigues, do PSOL, já teve anunciada sua ida ao PC do B, mas que não se concretizou. Creio que após a derrota de Luciana Genro esse tipo de coisa se tornará mais e mais comum.
A polarização do futuro será, portanto, entre os movimentos de junho e o gigantesco bloco lulista-dilmista. A sobrevida do projeto de Lula e Dilma dependerá do tempo de vida ativa de Lula. Como se verificou no projeto de Eduardo Campos/Marina, dificilmente é possível agregar tantos oportunistas sem a figura do líder.
Marina não é líder e pratica a mitose trotsquista: ambicionou ser a sucessora de Lula, mas não conseguiu, buscou ser alternativa interna ao sistema, o mesmo caso de Eduardo. Rachou no PT, entrou no PV, rachou o PV com exigências tais como riscar os direitos dos gays e lésbicas, gerando o Partido dos Livres, buscou dominar totalmente o PV dando um golpe e chamando uma convenção fora do tempo, ao estilo do de Roberto Freire no PCB em 92. No entanto, a direção do PV conseguiu isolá-la e expulsá-la a tempo, ao contrário do que se deu com Freire. Marina não conseguiu criar seu partido próprio e criou a "Rede" de oportunistas, levando agora o seu "ebola" trotsko para dentro do PSB. Marina é tudo o que se diz de Stálin: personalista, centralista, autoritária, amante do culto da personalidade e afeita a reunir-se a uma patotinha que resolve tudo na cúpula, embora discurse a favor da democracia e a "velha esquerda". Por baixo das vestes novas e da retórica sustentável, Marina tem uma face encarquilhada de continuidade da velharia e dos pandarecos.
Ela tinha marcado a data para completar uma nova fase e rachar novamente, mas o acaso quer agora que ela complete sua infecção. Lá, ela já começou a rachar. Com a derrota nas eleições, o que será bastante provável, pode-se prever consequências atomizantes para o PSB e um novo racha de Marina para ir construir aquele que deveria chamar-se "PM", Partido da Marina.
A expectativa de que um rearranjo futuro incorpore Marina é grande, ela de está certa ao candidatar-se sucessivamente, de fato, é promissor ser alternativa interna do presidencialismo de coalizão. Ela preparou isso minuciosamente, por exemplo, a espelhar a aliança entre o capital e o trabalho de José de Alencar/Lula em sua chapa Marina/Guilherme Leal. Derrotada uma primeira vez e obrigada ceder espaço a um coronel carismático que obteve espaço também como face alternativa ao sistema, Marina tem agora uma sobrevida como cabeça de chapa.
Marina não é líder e pratica a mitose trotsquista: ambicionou ser a sucessora de Lula, mas não conseguiu, buscou ser alternativa interna ao sistema, o mesmo caso de Eduardo. Rachou no PT, entrou no PV, rachou o PV com exigências tais como riscar os direitos dos gays e lésbicas, gerando o Partido dos Livres, buscou dominar totalmente o PV dando um golpe e chamando uma convenção fora do tempo, ao estilo do de Roberto Freire no PCB em 92. No entanto, a direção do PV conseguiu isolá-la e expulsá-la a tempo, ao contrário do que se deu com Freire. Marina não conseguiu criar seu partido próprio e criou a "Rede" de oportunistas, levando agora o seu "ebola" trotsko para dentro do PSB. Marina é tudo o que se diz de Stálin: personalista, centralista, autoritária, amante do culto da personalidade e afeita a reunir-se a uma patotinha que resolve tudo na cúpula, embora discurse a favor da democracia e a "velha esquerda". Por baixo das vestes novas e da retórica sustentável, Marina tem uma face encarquilhada de continuidade da velharia e dos pandarecos.
Ela tinha marcado a data para completar uma nova fase e rachar novamente, mas o acaso quer agora que ela complete sua infecção. Lá, ela já começou a rachar. Com a derrota nas eleições, o que será bastante provável, pode-se prever consequências atomizantes para o PSB e um novo racha de Marina para ir construir aquele que deveria chamar-se "PM", Partido da Marina.
A expectativa de que um rearranjo futuro incorpore Marina é grande, ela de está certa ao candidatar-se sucessivamente, de fato, é promissor ser alternativa interna do presidencialismo de coalizão. Ela preparou isso minuciosamente, por exemplo, a espelhar a aliança entre o capital e o trabalho de José de Alencar/Lula em sua chapa Marina/Guilherme Leal. Derrotada uma primeira vez e obrigada ceder espaço a um coronel carismático que obteve espaço também como face alternativa ao sistema, Marina tem agora uma sobrevida como cabeça de chapa.