Quero
Ver Irene Rir: O Sol nas Bancas de Revista
Quando vou a uma banca comprar
revistas e jornais, que aprecio muito no formato físico, lembro-me com
frequência da canção de Caetano Veloso: “Alegria, Alegria”. Nessa canção
Caetano comenta, na verdade, que via nas bancas de revista o jornal de
vanguarda O Sol, onde escrevia Nelson Rodrigues, dentre outros. O Sol
não brilhou muito tempo, mas foi eternizado nessa incrível marchinha.
Hoje nossa cidade tem somente duas
bancas de revista. Uma delas vende revistas e também passagens de ônibus e é
comandada por Alberto. A outra fica na Praça de Matriz, comandada pela
simpática Irene, irmã de Alberto. Alberto é um senhor bastante sério e
surpreendeu-me um dia, quando contei a ele que sou socialista. Ele disse que é
socialista também e que o maior socialista do mundo foi Jesus Cristo!
Eu
sempre achei um prazer ler as notícias e ver as capas de revista e manchetes. Ela contou que trabalha há quarenta anos com
banca de revista, mas que essa época da internet é a época mais difícil
para esse empreendimento. Ela mostrou-me alguns brinquedos: a distribuidora
passou a entregar até brinquedos para vender em bancas. Contei a ela que vi, em
Belo Horizonte, bancas cobertas de roupas para vender, num espetáculo
melancólico. Falei a ela que, mesmo na biblioteca pública e na escola onde
trabalho, as assinaturas de jornais e revistas foram cortadas. Um dia encenamos
uma peça teatral onde o pai de família lia um jornal. O jornal encontrado pelos
alunos foi esse Jornal de Negócios, cujos exemplares eu levo para a
biblioteca da escola com bastante frequência. Ela contou-me, com tristeza, que
não abre mais a banca em dias de domingo: nada de comércio, nem o Xuá
Lanches abre mais aqui na praça, ela fica ali sozinha e tem medo, restam da
madrugada alguns bêbados, ela acabou preferindo não abrir mais. Uma pena, pois
o domingo era, no passado, um dia onde, tradicionalmente, as pessoas tinham
mais tempo de ler jornais e revistas.
Minha mãe é ávida leitora de
jornais. Eu contei a Irene que eu tentei assinar o jornal O Tempo para
minha mãe, mas a empresa desistiu de renovar assinaturas para o interior. A
ideia deles é concentrar a venda apenas na região metropolitana de Belo Horizonte,
conforme fiquei sabendo ao entrar em contato com a empresa. Um carro vinha
trazendo os exemplares para o interior, mas com a queda nas vendas, passou a
ser inviável. O Tempo passou a chegar apenas às sextas-feiras. Numa
sexta passei lá e encontrei o último exemplar. São apenas quatro, comenta a
sempre atenciosa Irene.
Igualmente, soube que algo semelhante ocorreu
ao jornal Aqui, que era muito barato e vendia bem diariamente, passou a
ser semanal e as vendas despencaram. O poeta, editor da Literatura em Cena
e psicanalista Eduardo Andrade, personagem frequente dessa minha coluna,
explicou-me, recentemente, que o preço do papel aumentou com a venda on-line
de mercadorias durante a pandemia. É muito mais lucrativo vender papel para
embalar mercadorias do que para fazer jornais e revistas, daí a crise do papel.
Outra revista que eu compro com
Irene é a revista Piauí. Eu sou um dos poucos compradores da cidade.
Como assim da cidade? Irene disse que vem um rapaz de Dores do Indaiá que passa
ali para comprar. “Mas lá não tem banca?”, perguntei eu, perplexo. “Não, não
tem”. Diante do meu espanto, completa ela: “não tem mais banca de revista em
Luz, Nova Serrana e nem Moema”. Que triste realidade, a do nosso interior!
E assim, angustiado, pensando em
como a vida é breve e tudo acaba, peço aos meus leitores apoio às nossas duas
bancas, para que apoiem os vendedores e para que elas não fechem. É um apelo...E
ao fazê-lo penso em outra canção de Caetano, Irene: “Quero ver Irene rir! Quero
ver Irene dar sua risada...”
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