quinta-feira, 31 de março de 2016

O Quadragésimo Golpe

O mensalão foi chamado de golpe de 2005 pelos petistas.
Em 2013, a militância petista também chamou as manifestações de golpe.
Em 2016, o impiximã também é chamado de golpe.

A narrativa existente nos grampos sem nada confirma o discurso da militância. Nada de pré-sal, BRICS, Moro agente da CIA, Rússia de Putin, bolivarianismo, comunismo. Somente pragmatismo puro, deboche e cinismo.

A oposição de direita liberal é chamada de golpista e fascista, mas sua atuação em redundado em progresso em muitos casos: no caso de Chico Botelho, diretor que colocou em seu musical sobre Chico críticas à presidenta, a polêmica provocou interessante discussão sobre teatro e política. Igualmente, a operação Lava-jato tem distorções, mas mesmo assim mostra que ninguém está acima da lei no Brasil, o que é um progresso.

A narrativa de Breno Altman contra Luciana Genro é burra. Breno é um governista e quer dizer que alguém pode ser morto por opiniões políticas contrárias às dele. No entanto, a URSS não condenou Trotsky por suas posições políticas.

Condenou-o à morte por muitos crimes.

Os governistas, ao usarem o termo golpe, impedem que, no futuro, possamos mobilizar contra um verdadeiro golpe. Se tudo é golpe, nada é golpe. O preço do uso dessa retórica será alto.

sexta-feira, 25 de março de 2016

Tropicália

Leiam Meu verbete sobre tropicália no Grupo Cipriano Barata.

quinta-feira, 24 de março de 2016

QUEM ESTIVER PODRE, QUE CAIA!

Nos últimos dias, um delírio coletivo tomou conta do país. Ou melhor, do governo do país.

Um delírio ao qual nós já estamos acostumados aqui nesse blog penetrália e revista cidade sol. Aliás: a primeira vez que ele viralizou, foi partir do meu antigo blog .

Nos dias que correm, nunca vi um fenômeno como esse. A própria presidenta Dilma começou a falar em golpe, como se fosse uma militante política comum.

A esquerda, em peso, dedica-se a defender Lula, dando-lhe carta branca, a ele e ao partido, apesar da corrupção.

A manifestação do dia 15 de março foi contra a corrupção independente do partido, enquanto a do dia 18 foi a favor do partido, independente de corrupção.


Até agora, que eu saiba, somente a tendência CST do PSOL, o MNN, o MEPR, o PSTU, as Brigadas Populares e algumas poucas vozes isoladas como a de Luciano Andrade ergueram-se contra a falácia de que existe um golpe em curso no país. Li também um artigo excelente chamado A Falácia do Golpe ou o Golpe da Falácia. Fora isso, a esquerda em peso apoiou um discurso delirante, odioso, um discurso que incita a violência entre torcidas e que precisa ser combatido sem quartel. O MNN define muito bem a pequena burguesia que apoia o PT:


A única explicação, nos parece, é a seguinte: não só a burocracia vê suas condições de vida como vinculadas ao PT, mas também um setor social mais amplo, não diretamente dependente do Estado, formado por pessoas que construíram suas vidas, carreiras, reconhecimento e prestígio nas últimas décadas de estabilidade política e econômica. Queira-se ou não, tenha-se consciência disso ou não, tais décadas foram estáveis graças ao papel conciliador e traidor do PT na luta de classes brasileira. No seio da estabilidade proporcionada pelo PT à ordem do capital floresceu a pequena-burguesia brasileira, um segmento social pequeno mas não desprezível, pouco estável política e economicamente (pois localizado entre a burguesia e operariado, daí suas oscilações, histeria e confusão).
A pequena-burguesia é formada de proletários melhor remunerados (profissionais liberais, autônomos), pequenos empresários ou pessoas que vivem de renda. Dada a sua condição objetiva — de pessoas não centralizadas pelo processo produtivo, não forçadas a pensar em si mesmas como parte de uma categoria produtiva —, seus membros se veem em geral como autônomos e livres. Essa característica, o particularismo, ela compartilha com a burguesia, o que a torna propriamente a pequena-burguesia.
Assim como o “Lulinha”, a pequena-burguesia é adepta do “paz e amor”, ou seja, da conciliação de classes (justamente por estar entre as duas grandes classes sociais). O que ela mais odeia é a luta de classes, pois acentua sua instabilidade e põe em risco seus projetos pessoais e planos pré-estabelecidos. Ela gostaria que o mundo dos conflitos parasse, para que pudesse seguir em paz em suas pesquisas, suas descobertas e inovações técnicas ou artísticas, em suas salinhas, escritórios, laboratórios ou ateliês. Sua teoria social é uma colcha de retalhos de vários sistemas de pensamento: se nutre do marxismo, da dialética e de tradições revolucionárias do proletariado, mas também do idealismo burguês e da lógica formal. Esse ecletismo — que ela sempre pensa dar base a um novo sistema ou “anti-sistema” científico — expressa-se politicamente ou no utopismo ou no reformismo. Marx e Engels (nas críticas a Proudhon ou a Bakunin, na Crítica ao Programa de Gotha, nas cartas-circulares a Bebel, Liebknecht e Bracke e em vários outros textos) mostraram como esse tipo de teoria corresponde exatamente a esse setor social.
O PT representa e sempre representou essa visão de mundo reformista e pequeno-burguesa. Ele, por si (ou seja, apesar dos sindicatos), nunca foi um partido operário, com programa operário, mas majoritariamente pequeno-burguês e com programa pequeno-burguês. Como todo bom partido reformista e pequeno-burguês, sua função é tirar a centralidade do que é central; apagar a contradição fundamental existente na sociedade capitalista — a extração de mais-valia dos operários pelos capitalistas — e sobrevalorizar o que não deve ser sobrevalorizado. A fórmula é sempre a mesma: o problema central é abstraído em nome de problemas secundários. É como se a questão da mais-valia, o surgimento do capital, já estivesse resolvida e coubesse então reformar as condições de vida, ampliar direitos, melhorar aspectos sócio-culturais, acabar com opressões e o discurso de ódio, o “fascismo” do regime democrático-burguês, a alienação da população pela mídia, a crise na “pedagogia”, e tantos outros inimigos (dezenas ou centenas!) que ela descobre cotidianamente nas “teorias” que ela produz prolixamente.


Muitos, muitos mesmo, estão caindo no conto do operário Lula, no golpe do operário, como dizia Brizola.

Justiça seja feita, Heloisa Helena definiu muito bem: "quem estiver podre, que caia"! A consequência do discurso "não vai ter golpe" é a intolerância, como vimos na PUC de SP, quando os alunos contra o suposto golpe buscaram impedir um ato em favor do impiximã e foram impedidos disso pela PM de Alckmin. O discurso contra o golpe estimula a violência, pois a violência é viável nesse caso, uma vez que o outro quer restringir minha liberdade, ou seja, fazer violência contra mim.

Ou seja: vamos combater o discurso de "não vai ter golpe", pois é apenas mais um discurso de ódio  oportunista e petista ao estilo de Marilena Chauí.







Revolução Cubana (Verbete)



A revolução cubana foi um dos eventos mais importantes do século XX e foi um momento decisivo para todos os americanos. Para os cubanos, a revolução de 1959 foi a verdadeira independência, completando finalmente a revolução de 1898 que pôs fim ao domínio espanhol, ao finalizar também a dominação norte-americana na ilha, uma condição humilhante imposta em 1902.
A revolução cubana foi essencialmente uma revolução democrática de velho tipo, ou seja, uma revolução mais ao modo da francesa, nacional e democrática, do que ao modo da chinesa, uma revolução democrática que transitou ao socialismo.
O movimento que gerou a revolução cubana não foi um movimento marxista-leninista e sim um movimento nacionalista democrático em que  marxista participavam. O pequeno grupo armado de doze barbudos de Sierra Maestra agiu apenas como uma ponta de lança para inúmeros outros movimentos sociais que agiam nas cidades e que, atuando pacificamente, não poderiam derrubar a ditadura de Batista.
Fidel Castro é, antes de ser marxista, um seguidor de José Martí, um nacionalista. Sua adesão ao “marxismo” ocorreu porque, sem o apoio da União Soviética, não havia como manter-se no poder e fazer as reformas prometidas durante a campanha de derrubada de Batista. A União Soviética, no entanto, já estava no processo de voltar ao capitalismo. Igualmente, na crise dos mísseis ela deixou bem claro para os USA que Cuba era negociável.
O grupo de Fidel pôde avançar significativamente porque os USA mesmo passaram a buscar aproximar-se desse grupo, deixando de lado a ditadura de Batista. A busca dos USA era cooptar Castro e o setor nacionalista que ele representava, tornando-o um gestor confiável da condição semicolonial. No entanto, os interesses da burguesia nacional que apoiou Castro entraram em choque com os interesses norte-americanos e, para avançar estatizando as empresas estrangeiras, o grupo de Castro precisou do apoio da União Soviética social-imperialista. Pode-se dizer que o castrismo é um nacionalismo pintado de vermelho. Assemelha-se a um Vargas ou Perón que faz discursos sobre marxismo-leninismo.
As mudanças que Fidel Castro fez, reforma agrária e estatização de multinacionais, estiveram presentes também em revolução de velho tipo como foram a revolução líbia que levou ao poder Khadafi em 69 e um movimento semelhante que deu poder a Saddam Hussein. Essas transformações, radicais para um país como o Brasil, não configuram, na verdade, uma revolução socialista.
Sendo assim, a sistematização que foi feita da revolução cubana nos textos de Regis Debray foi falsa. O foco não funciona, pois um pequeno grupo não pode enfrentar um exército como o norte-americano. A guerra revolucionária é guerra popular, é guerra de massas, nunca é obra de um grupo de super-homens, ideia fora da realidade que é reforçada por Debray. Fidel Castro também fez bravatas nesse sentido, chegando a dizer: “eu, sozinho, posso fazer a revolução no Brasil”. Debray já renegou essa teoria do foco e Cuba também já aderiu, há décadas, ao pacificismo e ao revisionismo oportunista como política internacional para buscar seus interesses nacionais, daí seu apoio ao Partido dos Trabalhadores brasileiro, por exemplo.
Pode-se dizer que o regime de Castro obteve avanços democráticos, mas pouco ou nada avançou no rumo do socialismo: o país permaneceu como colônia da União Soviética e seu bloco, permanecendo como país produtor de produtos primários. Além de bons indicadores nos serviços públicos, Cuba criou vários mecanismos de democracia direta, mas pode-se dizer que o poder na verdade está na cúpula do partido comunista e na burguesia associada ao estado. Esses mecanismos são mais consultivos do que deliberativos.
A classe dominante ainda é a burguesia burocrática. O grande dilema que permanece agora é se o regime permanecerá estável ou avançará no sentido da volta do capitalismo clássico.


sábado, 19 de março de 2016

Com ou sem Dilma, Os Direitos dos Trabalhadores Estão Ameaçados


O discurso de Lula "contra o golpe" na Av. Paulista falando que em seu governo nunca os banqueiros ganharam tanto mostrou que ele continua o mesmo. Ele vem para trazer a paz social, a conciliação capital-trabalho.
Manobra à direita, manobra à esquerda, mas direito algum foi conquistado para os trabalhadores nesses anos e todos estão ameaçados.
O partido "dos trabalhadores" não avançou em obter mais direitos para os trabalhadores. E tem uma inflexão nada desprezível no sentido contrário. E outra: levantou uma séria desconfiança, entre as novas gerações, sobre se os trabalhadores podem realmente governar.
Lula é um liberal de um país que não teve algo como a revolução francesa. Nesse país, um liberal pode admirar, como ele admira, Hitler e Médici e abominar, como ele abomina, receber críticas.
Como bem observou Mario Vargas Lhosa, o lulismo é uma variante dos populismos sul-americanos.
Como a oposição o ataca e obtém avanços graças ao seu comunismo inexistente, ele ataca a oposição inventando um golpe inexistente.
O PT tem sido engolido pela própria legalidade que tanto cantou em verso em prosa. O impiximã caminha a passos largos na "Casa do Povo", nas instituições democráticas nas quais queriam fazer uma maioria para "chegar ao socialismo", supostamente inspirados em Gramsci. A oposição, usando a lei, aproveitou ao máximo as margens para manobras, as brechas na lei, etc. Fez, aliás, manobras ao estilo do que faz Lula. FHC também sempre foi um liberal que manobra ora à esquerda, ora à direita.
A tática do trololó do golpe foi testada já em 2005, quando do mensalão. Inspirado em Chávez (que enfrentou um golpe de verdade), deu muito certo como um cala boca na oposição. Dá para notar que basta espalhar um boatinho na web e os intelectuais aderem, fazem manifestos, fazendo papel de palhaços alegremente.
O destino do projeto pessoal de poder de Lula é apenas a espuminha. Daqui para a frente, com ou sem Lula, como ou sem Dilma, os direitos dos trabalhadores estão ameaçados.

terça-feira, 15 de março de 2016

Conjuntura Bom Despacho 2016


            Façamos uma análise da conjuntura das eleições em Bom Despacho em 2016. Aqui, o PT não se aliou ao PSDB para formar um polo contra a oligarquia mais tradicional que é chefiada por Haroldo Queiroz (que se não me engano é PDT). Haroldo é parente do Coronel Robertinho, oligarca local cujo poder político derivava da posse da terra, tendo alguns traços semifeudais, portanto.
            No entanto, atualmente Haroldo Queiroz não tem fazendas, mas a família ainda tem algumas, assim como algumas empresas. Na última eleição, seu grupo só perdeu porque dividiu-se entre os que apoiaram Joice e Marco Túlio e os que apoiaram Vital. Na última eleição em que se candidatou, Haroldo teve cinquenta por cento dos votos, e é, portanto, ainda um forte postulante à gestão do velho estado.
            Para compreender um sistema político é preciso encontrar sua polarização.  No passado, a polarização era entre PSD e UDN. O PSD estava próximo de Dr. Roberto Queiroz, filho do Coronel Robertinho e a UDN tinha um grupo composto por Nicolau Leite e outros. A ditadura civil-militar aboliu esses partidos em 1965.
O ex-prefeito Geraldo Simão recriou essa polarização a partir do MDB em 1966, polarizando contra a Arena. A polarização passou a ser entre o grupo de Simão e o outro grupo. Nos anos 90, o outro grupo passou a ser o grupo de Haroldo Queiroz, situação cristalizada até hoje.
A principal contradição no passado recente e hoje é entre a política local e a federal. O grupo de Simão, Bertolino, Luquini e Vital implodiu nos anos 90, enquanto no cenário nacional um grupo empresarial semelhante chegava ao poder em 2001. A reorganização desse setor nunca foi completa: Simão afastou-se, Vital ficou fora da gestão atual e Luquini associou-se a um “salvador da pátria”. Sua característica é o oportunismo: sua ideologia implica em tomar o que estiver mais à mão e busca transforma-se naquilo que for, naquele momento, mais conveniente. Em termos de programa social, ele é corporativista: seus gestos mostram que ambiciona que toda a sociedade seja composta harmonicamente por membros de um mesmo corpo. Nisso ele tem a ver com a UNIPAC, universidade na qual ele se formou e que já homenageou publicamente: corre a piada de que a composição de cargos na universidade não é por mérito e sim se compõe de “amigos, parentes e compadres”.
            Na opinião percuciente de um professor local, o líder do grupo burocrático tinha vindo para ser “um Haroldo mais sofisticado, um Haroldo que ninguém vai pegar”. O líder é uma figura complexa, multifacetada, cuja biografia mesmo é nebulosa. O que é certo é que, depois algum tempo na marinha e exército, fixou-se em Brasília, onde criou uma empresa de informática que prosperou durante o governo Collor. Como ele mesmo admite ser deficiente físico (daltônico) ele entrou no Tribunal de Contas da União em uma vaga de deficiente físico. No entanto, como teria sido possível entrar na marinha ou servir o exército em plena ditadura militar, sendo um deficiente físico?
            E é pelo menos hilariante que um deficiente físico viva exibindo-se, como alegou um intelectual de pensamento semifeudal, “em gincanas no Saara”.
            Esse mesmo intelectual semifeudal explicou como supostamente foi feita a composição das secretarias dessa gestão: são em boa parte pessoas que fizeram jogo duplo dentro de outras campanhas ou agiram em prol do grupo burocrático em entidades (jornais, ONGs, entidades organizadoras de debates)  que deveriam ser neutras.
            Sobre a semifeudalidade, é bom observar que não reuni elementos sobre zona rural. Sei que existe o latifúndio moderno que é a fazenda Santa Helena, que possivelmente pode ilustrar a entrada do capitalismo burocrático no campo. No mais, a economia rural é composta por pequenos proprietários pobres e organizados em uma cooperativa que organizou até mesmo um banco, mas posta politicamente sob a hegemonia do latifúndio, pois já foi gerida por um aliado de Kátia Abreu. A produção de leite arruinou-se há alguns anos, embora a região prossiga sendo bacia leiteira. No Mato Seco, distrito da cidade, não há cobertura de celular, há poucas ruas asfaltadas e nem o acesso não se faz por via asfaltada. Isso tudo encarece o preço da produção. A parte urbana, concentrada no setor de serviços, é possivelmente mais rica do que a zona rural.
 Esse político parece de alguma forma exercer influência sobre ele, tanto para o bem como para o mal: bonapartista, personalista, exímio em utilizar o marketing político, por outro lado não sabe trabalhar em equipe e aceitar críticas (elas facilmente o enfurecem, principalmente se feitas publicamente).
            A disputa política local, pendular entre dois grupos oligárquicos, toma em 2016 a forma de disputa entre duas famílias.
 No passado recente, quando um promotor afrontou o grupo de Haroldo, seu carro surgiu todo riscado. Já o grupo burocrático não pratica violência dessa forma e sim indiretamente, através de processos. Igualmente, não pratica nepotismo como Haroldo Queiroz: desde a composição de chapa com o irmão, mostrou como colocar parentes de forma mais sofisticada, mantendo-se dentro da lei. Esse é seu ponto forte: conseguiu evitar escândalos de corrupção. Um dos casos mais efetivos foi denunciado por Zé Ivo, vereador ligado a Haroldo: foram gastos sessenta mil reais em coxinhas pela prefeitura, muito mais do que o dinheiro gasto na pediatria. E existe, mais recentemente, uma chamada ao líder do grupo burocrático para depor na Operação Mainframe da Polícia Federal, em um processo por formação de cartel em empresas de informática.
            O ponto fraco do personagem e do grupo é o personalismo excessivo, assim como um traço acentuado de vaidade, característico dos intelectuais pequeno-burgueses em geral. Isso gera um óbice psicológico (que também podemos chamar de burrice) e o leva a equívocos vergonhosos, como quando elaborou um documento “acadêmico” defendendo que alimentos com validade vencida podem ser consumidos. Sua tendência ao sofisma é insofismável. É irritante até mesmo para os simplórios.
            Outro ponto que enfraquece o líder e ao grupo do setor “burocrático” é que ele vem acirrar todas as contradições: o jornal local mais avançado foi jogado na aventura de apoiar um líder personalista, permitindo que outro mais frágil (e ligado ao PSDB e a Vital) ganhasse credibilidade; o PT local associou-se a um líder neoliberal e privatizante convicto, atirando no atoleiro as poucas pessoas progressistas; como a segurança pública local degradou-se em função da queda de nível de vida das classes trabalhadoras, fruto do arrocho, essa degradação colou-se muito ao atual gestor (cuja mentalidade de guarda-livros e sovinice anal-crematística quase santifica o arrocho).
 Numa cidade onde a cultura predominante é muito ligada à PM, a proliferação de crimes gerou uma situação de pânico e perplexidade gerais, mas cujos reflexos voltam-se contra a gestão em curso. Em determinados períodos, ocorreu em média um homicídio a cada fim de semana. Houve relatos de toque de recolher, tiroteios próximos a escolas, assaltos a mão armada em postos de gasolina diante do batalhão da PM. Agora em 2016 a situação parece ter melhorado, mas a violência urbana e rural é um problema que veio para ficar.
            Igualmente, o arrocho e a pressão sobre o funcionalismo público realizadas pelo grupo burocrático tendem a justificar e a embelezar a imagem do grupo de Haroldo, muitíssimo desgastada devido a escândalos de corrupção, em boa parte denunciados pelo Jornal de Negócios (jornal em que o grupo está encastelado) e pelo líder do grupo burocrático enquanto vereador.
            O que Haroldo dizia em entrevistas em rádio mostrou-se em boa parte como tendo embasamento. Ele chamava seu adversário de “santanás”, “obcecado comigo”. Atualmente, o líder do grupo burocrático processa um intelectual de pensamento semifeudal, supostamente próximo a Haroldo, por preconceito religioso. Mas qual seria a religião em questão, uma vez que o líder, pouco depois de tomar posse, teve até o púlpito franqueado a ele na Praça da Matriz? 
O fato é que, pouco depois de eleito, o líder do grupo burocrático passou a dar declarações muito semelhantes, em seu tom coronelístico, às do grupo agro-exportador. O trato com o baixo escalão (formiguinhas e garis) foi ainda pior do que o trato dado a estes por Haroldo. Foi relatado que a prefeitura queria que os garis assinassem um contrato em que retirava direitos, mas os garis, apoiados por um advogado de Belo Horizonte, mostrou as irregularidades, fazendo que o funcionário responsável da prefeitura se retirasse envergonhado.
            Eleito com apoio dos intelectuais, o grupo logo conseguiu gerar tensões com esse setor, extinguindo a secretaria de cultura logo nos primeiros meses de gestão (a secretaria voltou tendo à frente uma figura altamente destrambelhada e sem ressonância ou liderança entre os intelectuais). Como, após a posse, o líder colocou a face realista do arrocho, disparou palavras duras contra professores e contra um músico local que desejava fazer shows para a prefeitura obtendo remuneração, sua base entre os intelectuais foi abalada, mas não totalmente.
 O líder deixou bem claro que, diante da necessidade do arrocho advinda de Brasília, o amor pela cultura local foi apenas uma forma de tomar o poder e não seria, de forma alguma, uma prioridade, como não foi. O mesmo músico cobrou que o atual clube social fosse transformado em casa de cultura e foi rechaçado. O clube foi retomado pela prefeitura e tornou-se secretaria de saúde (a finalidade alegada foi economizar aluguel). A cultura tinha sido, durante a campanha, o principal instrumento político utilizando pelo grupo que manobra à esquerda. Qualquer grupo que deseje derrotar o grupo capaz de manobrar à esquerda deve dar bastante atenção a esse ponto.
            O grupo conseguiu atritar junto a três intelectuais notáveis e que favoreceram muito sua campanha: um intelectual orgânico do grupo, elo entre esse grupo e o grupo de Simão, colunista do Jornal de Negócios, entrou e saiu da prefeitura, não tendo obtido o cargo anterior que tinha, secretário de cultura, tendo permanecido em um cargo praticamente ornamental durante alguns meses e depois sido demitido. Ele foi o principal formulador da imagem do salvador da pátria enquanto tática de arregimentar votos entre o povão para um líder elitista, arrogante e sem carisma algum. O líder de um grupo skatista e militante fanático durante a campanha, não durou nem três meses enquanto secretário de cultura; e por, fim, a tensão com o músico, em que o músico polemizou pelo fato da prefeitura não pagar cachê para músicos, desejando a participação “espontânea”. Igualmente, houve uma relação tumultuada, de aproximações e afastamentos, com o Bloco de carnaval e com um radialista e blogueiro, que chegou a cognominar o líder de “Hitler Pinóquio”, mas que hoje o apóia. Uma atitude recorrente do grupo é negar apoio ao carnaval (no primeiro e no último ano a festa não teve um centavo de dinheiro público, em outro ano cedeu a custo dois banheiros químicos), mas tentar, através do marketing, faturar algum dividendo político, dando a entender ter dado alguma ajuda.
            O erro de tensionar frente aos intelectuais e artistas, junto ao erro de pressionar excessivamente o funcionalismo, foram dois erros que podem custar ao grupo burocrático sua reeleição. O correto seria agradar aos que já tinham sido ganhos para o grupo e procurar aumentar sua base de apoio (que ainda era pequena). O que foi feito foi justamente o contrário. O efeito disso é que o líder do grupo está tendo que atacar constantemente intelectuais em sua coluna semanal.
 A cidade prossegue com um lixão a céu aberto bem próximo dela e sem nenhum parque, trânsito cada vez mais complicado, violência crescente, desemprego em alta. A média salarial da maioria é de apenas um salário mínimo. A falta de saneamento básico gerou uma epidemia de dengue e zica.
Durante a gestão atual o hospital privado local faliu e passou a abrigar algumas unidades de atendimento municipais. Na prática, a cidade passou a depender de um único hospital que tem parceria com a prefeitura, na verdade gerenciado por alguns médicos, embora se passe por hospital público, utilizando o nome de fantasia de “Lactário Menino Jesus”. Os problemas no Pronto Atendimento continuam. Os médicos alegam que o repasse da prefeitura é insuficiente, mas ao mesmo tempo expandiram seus negócios para uma unidade de hemodiálise, o que representa uma expansão lucrativa em relação ao atendimento dos traumas que é o que geralmente faz um PA.
Dr Bertolino (PMDB) jogou um importante papel tentando resolver a situação desse hospital, reunindo-se com seus pares e comentando que eles tendem a socializar prejuízos e privatizar lucros. Em resposta, houve a acusação de que Dr. Bertolino, ao tempo da gestão Simão, fez um convênio com a FELUMA que teria sido desastroso para tal hospital. Essa alegação parece ter desmotivado Dr. Bertolino de executar mais ações louváveis nesse sentido.
            Durante a atual gestão, que foi precedida por uma campanha supostamente ecológica, a nascente do rio Picão secou e o rio Lambari, que abastece a cidade, praticamente chegou a seu limite, pois há anos está diminuindo sua vazão. No ano de 2015 o racionamento de água tornou-se uma realidade e bem possivelmente continuará sendo.
A característica mais marcante desse setor atualmente no poder é que ele é a ala esquerda da direita, ou melhor, é um setor da direita, apoiado por elementos oligárquicos e empresários, mas que manobra com mais desenvoltura à esquerda. Isso ficou bastante evidente na campanha eleitoral de 2012, mais do que na gestão em si. A gestão, marcada pelo arrocho que parece ter sido ordem de Brasília, foi bem mais conservadora e surgiram bem mais claramente os traços oligárquicos. No entanto, as manobras continuaram, como quando o gestor propôs cota para negros no serviço público. Localmente, no entanto, essas manobras à esquerda são muito mal vistas e mesmo o progressismo retórico foi várias vezes barrado na Câmara (tanto a previsão de estudar gênero na escola e as cotas para negros foram barradas). O conservadorismo local assentado na Câmara Municipal é alérgico a essas manobras e aprovou, na Câmara, um projeto tirado do grupo de extrema-direita Escola sem Partido. Na internet, uma pessoa ligada ao Escola Sem Partido resumiu, grosso modo, o pensamento do grupo: “o professor que não ensinar português e matemática tem que ser espancado”.
Como na esfera nacional, o fato do governo utilizar os direitos civis como massa de manobra abre o flanco para ataques do conservadorismo e cria um clima onde floresce, mesmo entre os jovens, a extrema-direita, com muitos mostrando simpatia pela figura de Jair Bolsonaro. Por outro lado, a oposição extraparlamentar também está presente na cidade, na pessoa dos anarquistas que picham frases como “o capitalismo é a crise”. Desconheço quem seja o grupo, pois parece atuar na clandestinidade, pichando muros (o que é crime conforme a legalidade burguesa). Cumpre registrar que o PT jamais fez algo semelhante na cidade, mesmo no passado.
            O que gera tensão no cenário atual é que a reorganização do grupo ligado ao atual governo federal fez-se apenas em torno do líder, sua família e alguns poucos setores minoritários, entre os quais os intelectuais. E se fez no momento (2012) em que o governo federal passou a sentir mais brutalmente os efeitos da crise mundial.
            A vitória em 2012 derivou nem tanto de sua aceitação (sua rejeição era e é enorme), mas da enorme fragmentação em inúmeros candidatos. Foi muito útil para esse setor a fragmentação do grupo haroldista e a impossibilidade de Haroldo de se candidatar pessoalmente, pois já tinha obtido dois mandatos seguidos.
            A contradição entre o cenário nacional e o municipal voltou a agudizar-se entre 2012-2016. O grupo presente na gestão federal perde forças, deteriorando a situação já frágil do grupo local. O líder do grupo burocrático veio com a ideia de fazer os funcionários públicos trabalharem mais. Já os funcionários queixam-se que, na prática, isso significa arrocho e assédio moral, direcionado principalmente aos funcionários haroldistas. O arrocho é tanto que a prefeitura recentemente abriu edital para procurador do município, exigindo curso superior em Direito, mas propõe-se a pagar menos de um salário e meio por quarenta horas de serviço semanais (!).
 Os funcionários haroldistas, especialmente, queixam-se que o líder do grupo burocrático tem traços megalômanos e paranoicos, por isso busca amedrontá-los e tirá-los da zona de conforto, alegando que reclamam muito e trabalham pouco. Eles alegam que a quantidade de processos administrativos é crescente e o líder nega licenças sem remuneração até em casos de câncer. Eles relatam também que o líder, que, a exemplo de Collor, entrou no curso de direito da UNIPAC e formou-se advogado na UNB (Collor entrou na faculdade em Alagoas e também formou-se pela UNB), não aceitando, no entanto, perder processos na justiça. Há relatos de profissionais que, ao serem empossados após ganho de causa na justiça, são exonerados pelo prefeito, obrigando-os a recorrer. Eles relatam que o mesmo sempre recorre até à última instância.
 No entanto, na cidade quem faz o papel do partido político é o funcionalismo. Esse pareceu-me ser o erro mais fatal do grupo burocrático. Sendo assim, para derrotar o atual grupo seria preciso: 1) conquistar os intelectuais e artistas; buscar atrair a simpatia do grupo anarquista clandestino; 2) enfrentar sua hegemonia na comunicação e imprensa, ventilando seus deslizes; 3) acenar com propostas ao funcionalismo público; 4) centrar forças no meio rural e na periferia do município, onde o grupo é fraco e tem pouca ressonância. 5) Unificar todas as forças opositoras em torno de um ou do menor número possível de candidatos.
            Sendo assim, se a fragmentação anterior ocorrer, o grupo burocrático será, sem dúvida, reeleito. Se a disputa ocorrer somente entre dois candidatos, a vitória, a meu ver, será de Haroldo Queiroz. É bem evidente, também, que ganhe quem ganhar, o arrocho municipal derivado da crise internacional irá prosseguir.


terça-feira, 8 de março de 2016

Lula e o Triste Fim da UDN operária

Uma polarização falsa afeta o país. 

A investigação Lava-Jato finalmente atingiu Lula. E o PT, segundo ele, "levantou a cabeça" --criou um clima de polarização e confronto --propagandeando um suposto golpe.

Lula sempre foi um liberal. Como bem observou Brizola, Lula era a UDN de macacão e tamancos. Esse traço parecia absurdo no passado, dado o radicalismo verborrágico do PT. Eram liberais, católicos e simpáticos ao capitalismo estrangeiro. Pintados de vermelho, cercados de trostquistas berrando slogans de esquerda num bloco de direita, enganaram mesmo muita gente. No entanto, esse diagnóstico de Brizola confirmou-se com o passar do tempo. 

Atualmente a polarização é entre a UDN operária e a UDN entreguista travestida de nacionalista, mas é bem diferente como ambos os grupos de neoliberais apresentam-se.

Eu aponto no PT a direita mais perniciosa, uma vez que travestida de esquerda. Uma vez comprometido o líder, o partido combinou manifestações na mesma hora e no mesmo lugar que as manifestações (já marcadas) do impeachment.

Os entreguistas ultra-liberais abraçam-se na bandeira nacional, mas por trás deles há um repugnante setor empresarial ligado a USA e aos imperialismos. Sua ala mais enlouquecida foi agora banida das manifestações do dia 13 de março, aquela que clama por intervenção militar. 

Nada mais irritante, no entanto, do que o ver o PT fazendo tudo que no passado condenava em nome da esquerda viável: privatizações, escândalos de corrupção.

Os liberais de base operária, desde sempre cacarejando para a esquerda e pondo ovos para a direita, abraçam-se na bandeira da União Soviética. Usam Che Guevara, falam, como Lula, na revolução cubana como coisa nossa. Lula, que dizia que não ia a Havana buscar modelo, acabou aceitando o modelo pronto que lhe veio de Nova York e Londres, moldado pelas mãos de FHC.

O castrismo se aliou ao PT, defendendo-o mesmo agora via sua diplomacia. Eles tendem a apoiar qualquer regime que os sustente, pois o castrismo busca, há muito, a sobrevivência e os seus interesses nacionais. É bem possível que Lula saiba que o castrismo propõe hoje o reformismo pela via eleitoral e que a revolução cubana é muito mais a revolução cidadã do que a revolução socialista.

São a ala esquerda da direita. Lula, o liberal operário, apenas revelou-se liberal agora. Antes, manobrou oportunisticamente entre a direita e à esquerda. Embora seja liberal, é também um autoritário que abraça, ao falar do regime militar, a ideia arquireacionária de que o presidente Médici era "popular" e que seria eleito se fosse presidente. Vejam aqui . Com um líder tão pouco afeito às críticas e com um pensamento assim simpático da ditadura militar fascista, os petistas não estão em boa posição para chamar os ultra-liberais de fascistas e de quererem um golpe, como têm feito incessantemente.

Por outro lado, Lula, o operário antimarxista, o marmiteiro udenista, quer fazer de tudo para não perder o poder, mesmo insuflar uma briga de rua. A alegação é fazer uma revoada de galinhas verdes, repetindo um episódio de 1934.

 Pode-se prever que a disputa entre essas facções neoliberais irá radicalizar-se em breve, fazendo correr sangue como entre torcidas organizadas. E, para ficar registrado aqui para não dizer que ninguém avisou, é a ambição de Lula que está lançando o MST e os movimentos sociais nessa aventura em defesa de um liberal que, se não é comprovadamente corrupto, envolveu-se em tantos escândalos que não pode mais fazer da moralização a sua bandeira como antigamente. Aliás, como a antiga UDN fazia.