“Num mundo em luta, ninguém pode vangloriar-se de ter as
mãos puras
” Merleau PontyFilho de um advogado judeu convertido ao protestantismo para poder advogar(judeus não podiam advogar em sua época), Karl Marx estudou Direito em Bonn, masnão conclui o curso. Voltou-se para História e Filosofia e fez doutorado em Filosofia emBerlim, intentando ser professor universitário. No entanto, a universidade alemã de
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seu tempo estava dominada pelo pensamento do idealismo subjetivo de Schelling,arquiinimigo da dialética hegeliana. E Karl Marx era parte do grupo dos jovensestudantes hegelianos de esquerda. Ele partiu, então, para uma carreira jornalística,participando de um jornal chamado Gazeta Renana. Dentro em pouco tempo, aburguesia liberal que apoiava o jornal negociou interesses com o rei da Prússia e Marxe os demais jornalistas da Gazeta tiveram as verbas cortadas. Por ser ativo militantepolítico ao lado dos trabalhadores, teve então de deixar a Prússia, mudando-sesucessivamente para a Inglaterra, Bélgica, Estados Unidos e França, vivendo muitasvezes na pobreza e sofrendo perseguições políticas. Seguiu a seguir para o ativismopolítico no estrangeiro e os estudos de economia, deixando para sempre o sonho dacarreira de professor universitário. Fixou-se na Inglaterra até falecer, tendo então oapoio do amigo Friedrich Engels, rico herdeiro de um industrial e também umintelectual simpatizante do proletariado. Posteriormente, Karl Marx tornou-se umautor muito importante para toda uma vertente filosófica, com grande influência emestudos de Ciências Humanas, assim como na vida pública, chegando a inspirarregimes políticos em um terço do mundo e umas tantas discussões nos dois terçosrestantes.Nesse trabalho vão ser abordados três tópicos do pensamento de Karl Marx:dialética, história e revolução.1.
DialéticaMuitas vezes se fala em “dialética” a propósito de Marx ou do marxismo, de talforma que praticamente um virou sinônimo do outro. No entanto, a dialética é umapalavra de origem grega e de forma alguma foi inventada por Marx e por seusseguidores.A dialética, ou seja, a possibilidade de que o mundo seja formado pela luta doscontrários (
dialegein
) foi primeiramente estudada na Grécia Antiga por Heráclito (e omaterialismo, por Epicuro e Demócrito). Dialética vem da palavra grega “
dialektiké
”que significa conversar, debater. Esses dois últimos foram, inclusive, objeto de estudode Marx em sua monografia de conclusão de curso de doutorado em Filosofia (que erao equivalente à nossa graduação em Filosofia). Os gregos é que esboçaram a dialética.
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O filósofo Heráclito dizia que o todo se transforma: “jamais entramos no mesmo rio”.A luta dos contrários já tinha, para eles, muita importância, principalmente paraPlatão, que acentua a fecundidade dessa luta; os contrários se geram mutuamente. Apalavra dialética vem diretamente de
dialegein
, que significa discutir. Exprime a luta deidéias contrárias.A dialética estuda as leis gerais do universo, leis comuns a todos os aspectos darealidade, desde a natureza física até o pensamento, passando pela natureza viva epela sociedade.A dialética interessou especialmente a Marx porque é uma filosofia que pensaque o mundo está constantemente em transformação, que é a forma que assume essaluta à qual ele se refere.Marx, que, embora originalmente de classe média, a vida toda identificou-seaos trabalhadores, interessou-se em adotar o ponto de vista da classe explorada, daíseu interesse pela dialética e pela transformação do mundo. Ora, quem está exploradointeressa-se em mudar o mundo, sacudir o jugo, encarar o mundo de frente.A classe exploradora necessita de mentiras para perpetuar a exploração; já aclasse trabalhadora necessita da verdade para acabar com a exploração. Precisa deuma concepção justa do mundo, para dar conta de sua tarefa revolucionária. Para vero mundo de frente, ela adotou uma filosofia materialista. A filosofia marxista seria aarma filosófica que permite, junto aos ensinamentos de alguns outros clássicos(dependendo da vertente marxista de que se trata, Lukács ou Debord, Mao ou Stálin,Lênin ou Gramsci) é o pensamento que embasaria a ação de transformação dasociedade, permitindo a tomada do poder por um partido que tomaria o estadoburguês, colocando-o abaixo e instalando a ditadura do proletariado para fazer atransição ao socialismo. Essa seria a revolução, a irrupção de uma insurreição violentaonde uma classe derruba a outra.Materialista quer dizer que o mundo se apresenta como matéria emmovimento, não quer dizer, por exemplo, que Marx ou os marxistas proclamem queDeus não existe. Sobre Deus, não há qualquer conclusão científica. O que foi afirmadopor Feuerbach e que Marx encampou foi que a religião organizada, em nosso mundo, éa transferência das potencialidades do homem para uma outra esfera, a dossacerdotes que são os intermediários de Deus. Analisando Deus da forma como é
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representada pelas igrejas, o marxismo aponta que a religião foi criada pelos homens eque sua criação passou, depois, a governá-los com regras e preceitos para atingir asalvação.Seria preciso, então, negar uma determinada concepção de religião, aquelaque ajuda a esconder a opressão e a exploração do homem pelo homem. A partirdessa crítica negativa, muitos entenderam que o marxismo proclama que “Deus nãoexiste” ou que pretende sumariamente abolir as religiões ou, ainda, que seria legítimofazer uma leitura da arte enquanto “sexo sublimado”. No entanto, os marxistas têmevoluído no sentido de criticar a visão positivista (predominante no tempo de Marx) eque privilegia a ciência em prol das outras formas de conhecimento organizado quesão a arte e a religião, evoluindo no sentido de respeitar o valor e o direito de existirdessas outras formas de conhecimento.O marxismo pretende ser uma ciência, por isso ele fala em dialética e buscaestudar as leis da história. Existe, a rigor, o materialismo dialético e o materialismohistórico. O primeiro seria o pensamento materialista aplicado às ciências da natureza;o segundo seria o pensamento materialista aplicado às ciências humanas.O principal que o marxismo toma da dialética é que ela é o seu método. Omarxismo opõe o método dialético ao método metafísico de pensar. O métodometafísico considera as coisas como feitas em definitivo, o método dialético não. Esseúltimo considera o movimento, assim como as causas da modificação.O método dialético se opõe ao método metafísico, pois esse último rejeita atransformação, separa o que é inseparável, fazendo também uma exclusão sistemáticados contrários.A dialética considera as coisas e os conceitos no seu encadeamento; suasrelações mútuas, sua ação recíproca e as decorrentes modificações mútuas, seunascimento, seu desenvolvimento, sua decadência.Na antiguidade, dialética era a arte de chegar à verdade. O método seria odialético, ou seja, através das contradições do pensamento em um diálogo. Essa formade entender o mundo foi estendida aos fenômenos da natureza. O método dialéticomarxista olha a natureza como um todo unido, coerente, em que os objetos efenômenos estão ligados entre eles de forma orgânica, dependendo uns dos outros econdicionando-se de forma recíproca. Nenhum fenômeno pode, então, ser tomado
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fora das condições que o rodeiam, se for separado das condições. A natureza, para ametafísica, é imóvel, estagnada e imutável. Já para o método dialético, ela anda numestado de movimento e transformação perpétuos, numa renovação edesenvolvimento incessantes. Para o método dialético, o fenômeno tem de serconsiderado também do ponto de vista de seu movimento, transformação,aparecimento e desaparecimento. O dialético focaliza naquilo que nasce e sedesenvolve, não focando na estabilidade como o método metafísico.Toda a natureza está num processo de aparecimento e desaparecimento, numfluxo incessante de transformação perpétua. A dialética observa as coisasprincipalmente no seu encadeamento, no seu movimento, aparecimento,desaparecimento e relações recíprocas.O dialético considera que o desenvolvimento é sempre um processoprogressivo, onde as mudanças quantitativas se sobrepõem às qualitativas; o processopoderia ser ilustrado por uma espiral. São o resultado de mudanças quantitativasinsensíveis e graduais.A natureza é a pedra de toque da dialética. Para o dialético, Darwin mostrouque o mundo existente é um mundo orgânico que se transforma há milhões de anos.Já a concepção metafísica, cada vez mais criticada e desvalorizada entre os cientistas,começou com o Aristóteles e sua idéia de Deus como “motor imóvel”.Nesse trabalho se está falando genericamente em marxismo e marxista, dando-se preferência a esse termo “marxista” ao termo “marxiano”. Marxista seria quem falade Marx no sentido que lhe dá vertente marxista bolchevique ou leninista: seria omarxismo-leninismo de Mao Zedong, Althusser, Stálin. A China de hoje ainda usa aterminologia ligada a essa vertente marxista, focando principalmente no pensamentode Mao Zedong. Já a vertente do chamado “marxismo ocidental” (de Gramsci e Lukács)adota muitas vezes o termo “marxiano”, para diferenciar sua versão da vertentebolchevique e marxista-leninista. Marxólogo seria o estudioso de Marx que não seenvolve com a teoria (e costuma atacá-la) como Raymond Aron, autor do livro
O
Marxismo, Ópio dos Intelectuais
. Existe também a mistura de anarquismo, surrealismoe marxismo proposta pela vertente situacionista francesa, cujo maior teórico é GuyDebord, autor de
A Sociedade do Espetáculo
, livro que inspira principalmente omovimento estudantil e grupos interessados em ações diretas e em propor o chamado
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socialismo autonomista. Há também a vertente frankfurtiana, inspirada na Escola deFrankfurt, na verdade um grupo que se reuniu em torno do Instituto de Pesquisa Socialna Frankfurt dos anos 20, com doação de judeus liberais dessa cidade. Mas só sãobastante influenciados pelo marxismo os marxistas da primeira geração (TheodorAdorno, Horkheimer, Walter Benjamin). Atualmente, a Escola de Frankfurt existe, temestudos em Filosofia do Direito inspirados em Jurgen Habermas, mas sua grandeinspiração não é Marx e sim Hegel.Para Karl Marx e os marxistas, a dialética é um grande instrumento paraentender e transformar a realidade, uma vez que é um tipo de pensamento que desdea Grécia Antiga pensou as transformações e se opôs ao método metafísico. Aliada aomaterialismo, a dialética será o diferencial com que o pensamento materialistamarxista questionará todo tipo de filosofia que lhe for apresentada.2. HistóriaNo curso de Filosofia do Direito que inspirou esse artigo, Eduardo Bittar eGuilherme Assis Almeida tratam da história como prova da ruptura marxista. O próprioexame da história do século XX seria uma prova da influência de Marx. Como dizemeles:
Marx, porém, não surgiu sozinho, em seu momento histórico, e tambémnão lecionou aquilo que não era uma solicitação necessária em sua época(pós-Revolução Industrial), pós-Revolução Francesa, Pós-Codificação doDireito (...). Filho de um advogado e conselheiro de justiça e descendentede judeus, Karl Heinrich Marx (1818-1883) nasceu em Treves, capital daprovíncia alemã da Renânia. Após os estudos preliminares em sua terranatal, matriculou-se na Universidade de Bonn, onde iniciou o curso doDireito, logo interrompido, pois seu interesse maior concentrava-se nosestudos de História e Filosofia. Ingressou posteriormente na Universidadede Berlim, onde se influenciou pelo pensamento ateu e liberal-democráticoda esquerda hegeliana
(Nader, apud: BITTAR, ASSIS, 1999).Marx, em aliança com Friedrich Engels, reviu o socialismo utópico que veioantes dele, dando aos estudos sobre o socialismo um caráter científico.Ele pensa ohomem como força produtiva, como força econômica e historicamente engajado.
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Desde que surgiu, o marxismo influenciou o direito, muito embora Marx nãotenha feito estudos diretamente voltados para essa área. Marx inspirou-se em outrosfilósofos de sua época, fazendo a partir do pensamento deles os seus avanços edescobertas. Como dizem Bittar e Assis:
Sua obra vem marcada por uma dupla influência, de um lado, Hegel, deoutro, Feuerbach. O marxismo não é necessariamente uma corrente quetenta conciliar ambas as tendências, e sim, na verdade, uma proposta querecolhe influências de ambas. Marx não pode aceitar a especulação pura eracional-idealista ao estilo hegeliano, mas, apesar disso, foi formado naleitura de Hegel. Marx haveria de agregar às idéias hegelianas o plus querepresenta Feuerba
ch (BITTAR, ASSIS)Para entender a teoria marxista da história, é preciso entender a distinçãoentre materialismo dialético e materialismo histórico. O materialismo dialético é assimchamado porque considera os fenômenos da natureza, assim como o seu método deinvestigação, que é o método dialético; é um método materialista.O materialismo histórico é a extensão dos princípios do materialismo dialéticoao estudo da vida social, assim como da história da sociedade. Marx e Engels tomaramdo filósofo Hegel uma parte de sua dialética, rejeitando a parte idealista e dando-lhecaráter científico.Para Marx, o movimento do pensamento é que é o movimento real,transportado para o cérebro do homem, enquanto para Hegel a idéia é que cria arealidade. Marx e Engels referem-se a Feuerbach com freqüência, mas isso é porqueFeuerbach colocou o materialismo em seu devido lugar. Eles não são feuerbachianos,só tomaram desse materialismo o seu núcleo central. Para Marx e Engels, existemvários tipos de mudança: a quantitativa e a qualitativa. A água, quando aquecida e viravapor, salta para um novo estado, daí, a quantidade se torna qualidade. Já existiramdiferentes modos de produção até hoje: a comuna primitiva, a comuna primitiva emdecomposição, o escravismo, o feudalismo, o capitalismo da livre concorrência e ocapitalismo monopolista.A sociedade, como a natureza, apresenta contradições entre as classes sociaisem que está dividida. Os marxistas apostam no desenvolvimento da classetrabalhadora, embora aparentemente hoje em dia ela esteja inativa ou dividida. Elaaposta que a luta entre ela e a burguesia levará a sociedade à revolução, ou seja, à
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passagem entre o capitalismo e o socialismo. Para Marx, a filosofia tem de entrar emcontato com a vida prática:
Talvez o acaso tenha ajudado a decidir seu destino, mas foi um acaso que elemesmo vinha buscando. Esse foi outro daqueles marcos de fronteira quebalizam o território inexplorado lá adiante. Hegel tinha servido a seuspropósitos e, desde a saída de Berlim, as idéias de Marx vinha-se deslocandodo idealismo ao materialismo, do abstrato para o concreto, já que toda afilosofia verdadeira é a quintessência intelectual de sua época, escreveu eleem 1842, há de chegar o momento em que a filosofia, não apenasinternamente, por seu conteúdo, mas também externamente, por sua forma,entrará em contato e interação com o mundo real de sua época. Marx haviapassado a desprezar os argumentos nebulosos e indistintos dos liberaisalemães, ´que acham que se honra a liberdade colocando-a no firmamenteestrelado da imaginação, e não no terreno sólido da realidade´. Era graças aesses sonhadores etéreos que a liberdade, na Alemanha, continuava a nãopassar de uma fantasia sentimental. A nova orientação de Marx exigiria, éclaro, outro período exaustivo e fatigante de auto-instrução, mas isso não eramotivo de desânimo para tão insaciável autodidata
” (WHEEN, APUD:BITTAR E ASSIS, 2010 p. 361).O método para chegar à realidade escolhido por Marx, como vimos, foi adialética de Hegel repensada, assim como o conceito de história como um valor para oentendimento de qualquer ciência, arte ou religião. Estudando sua história e situando-a nela, esse saber será bem melhor entendido e mais frutífero. Hegel entendia ahistória do homem como uma sucessão de eras, ordenadas pelo espírito absoluto,chegando ao final dos tempos num continuum inspirado pelo cristianismo. Marxaproveita esse esquema mental, mas adapta-o ao materialismo: a sucessão histórica éde modos de produção: comuna primitiva, escravismo, capitalismo, socialismo,comunismo. E o “espírito absoluto” que move a história, ao invés de ser Deus, é ohomem, através do processo histórico dialético (ou seja, através datese/antítese/síntese), que seria para ele uma das leis fundamentais da natureza e dacultura. Pode-se ler a respeito trecho bastante curioso em Assis e Bittar:
A dialética exerce exatamente a mesma função na mente humana. Umaidéia desnudada engalfinha-se apaixonadamente com sua antítese, criandouma síntese; esta, por sua vez, transforma-se na nova tese, a serdevidamente seduzida por um novo amante demoníaco. Dois erros podemformar um acerto –mas, logo depois do nascimento, esse acerto converte-se num novo erro, que tem de ser submetido ao mesmo escrutínio rigorosoque seus antepassados, e assim vamos avançando. Em si mesmo, o embatede Marx com Hegel foi uma espécie de processo dialético, do qual emergiu
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o bebê sem nome que viria a se transformar no materialismo h
istórico(WHEEN, apud: BITTAR E ASSIS, p. 363).Creio que se poderia objetar que o tal “bebê sem nome” é o marxismo, mastudo bem, mas de fato o fragmento acima explica a relação de aceitação em partes erecusa que Marx tem com Hegel, que também pode se chamar de relação dialética.Marx supera, dialeticamente, Hegel, ou seja, supera conservando.Para poder realizar essa transição, Vladimir Lênin, seguidor de Karl Marx,elaborou uma teoria de como deve funcionar o partido que irá tomar o poder quandoda revolução e destruir o estado burguês. O modelo de tomada do estado burguês deKarl Marx foi a rebelião ocorrida na França em 1870, quando, após a fuga da burguesiacom a guerra, os trabalhadores assu4miram o controle da cidade de Paris, na chamadaComuna de Paris. O partido do proletariado, então, deveria aplicar o método dialéticoao estudo da vida social, assim como à história da sociedade, com vistas à atividadeprática.Um regime deve ser julgado conforme as condições que lhe deram origem enão conforme a “justiça eterna” como muitas vezes fazem os historiadores, usando ométodo metafísico.O regime de escravatura não tem sentido algum nas condições da atualidade,mas no regime da comunidade primitiva em decomposição era um fenômenocompreensível e lógico, mas era um passo adiante em relação à comunidade primitiva.Portanto, para quem analisa do ponto de vista do marxismo, tudo depende dascondições, do lugar e da época. Trata-se da concepção histórica dos fatos sociais. Aciência da História deve se pautar por essa concepção, senão ela será errônea. Não há,então, princípios eternos nem regimes imutáveis. Para Marx, como citam Bittar e Assis,a burguesia se apega a uma “falsa concepção interesseira que vos leva erigir em leiseternas da natureza e da razão as relações sociais oriundas do vosso modo daprodução e da propriedade” (BITTAR, ASSIS, p. 379).Ao analisar o Direito, o marxista observa que a justiça não tem como ser senãode classe. Mas como se dá essa luta para o direito, por que essa luta o afeta? Porque omotor da história é a luta de classes. As classes em luta em nossa época são aburguesia e proletariado. A tendência é, portanto, da justiça ser um órgão burguês,
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ministrando uma justiça que persegue os proletários e protege a burguesia, pela razãomesma que essas classes estão em conflito na sociedade. O estado, conforme a teoriamarxista, é um clube de interesses da burguesia. Ele atende aos interesses da classeque o gerencia; as instituições jurídicas são determinadas por ele. Então, por exemplo,ao julgar o caso de uma lavadeira que processa o ex-marido violento e alcoolista, aautoridade jurídica levanta que a lavadeira conseguiu que o filho estude e entre noseminário. Como sabe que os proventos de uma lavadeira são poucos, pressupõe queela esteja se prostituindo para poder pagar os estudos do filho. A partir daí, umapressuposição baseada em preconceito social passa a influenciar de maneira a produziruma decisão contra a lavadeira, ou seja, contra uma pessoa de classe social mais baixa,com base em uma generalização a respeito das pessoas desse estrato social,produzindo uma sentença desfavorável a essa classe. É assim que opera, no direito, aluta de classes. Engels trata do assunto nos seguintes termos: “O jurista crê manejarnormas apriorísticas, sem se dar conta de que estas normas não são mais do quesimples reflexos econômicos. Daí que toda ideologia se liga conscientemente a umdeterminado material de pensamentos, um material que foi transmitido por seuspredecessores” (ENGELS, apud: POLITZER, 1971, p. 58). Assim, essas tradições e aforma de lidar com elas, o método de sua elaboração, a atitude adotada diante delas,sempre estão determinadas pelas lutas de classe e pelas condições econômicas e lutasde classe que surgem sobre essa base. Donde se subentende que os juristas sabeminstintivamente onde é que está o inimigo, assim como sabem das tendênciasperigosas de seu tempo.A grande questão que surge para o direito a partir do marxismo é que essalinha de pensamento não crê em moral acima das classes, assim com Nietzsche falavaem “moral dos senhores” e “moral dos escravos” (esses dois pensamentos, afinalpertencentes a duas tradições diferentes, afinal coincidem nesse ponto). A moraluniversal é incerta e, em tempos de crise, a solidariedade de classe é bem mais fortedo que os preceitos morais universais, segundo essa linha de pensamento. Por isso éque se fala em “amoralismo” marxista (quando na verdade é recusa em aceitar umamoral superior às classes). Na verdade, para o marxista a moral varia conforme a classesocial. Para os marxistas-leninistas, a decadência do capitalismo em sua fase atual trazconsigo a decadência da sociedade moderna, de suas leis e sua moral. A verdade é
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dominada por critérios imperativos que, analisando-se, mostram ter um caráter declasse.3. RevoluçãoComo a sociedade muda, os marxistas pressupõem que o regime capitalistapode ser substituído pelo regime socialista quando existirem condições sociais paraisso. Algo semelhante aconteceu quando o regime capitalista substituiu o regimefeudal.O direito, para Marx e Engels, pertence à superestrutura, ou seja, àsinstituições jurídico-políticas, Estado, direito, etc. Ou seja, são formas da consciênciasocial que correspondem a uma consciência determinada. Ao definir superestrutura,Harnecker cita Engels no
Anti-Duhring
:
A estrutura econômica da sociedade constitui, em cada caso, o fundamentoreal a partir do qual é preciso explicar, em última instância, toda asobreestrutura das instituições jurídicas e políticas assim como os tipos derepresentação religiosa, filosófica e de outra natureza, de cada períodohistórico
(ENGELS, APUD: HARNECKER, 1983, p. 91).A noção de supereestrutura designa, portanto, dois níveis da sociedade: aestrutura jurídico-política e a estrutura ideológica. O direito pertence, é claro àprimeira (HARNECKER, 1983, p. 92).Como tudo se transforma, Karl Marx apostou nas camadas sociais que estãoainda por se desenvolver. Ele não aposta nas que não se desenvolvem mais. Sendoassim, espera-se que uma camada que no momento não é a força dominante venha ase tornar.A Rússia é um exemplo: entre 1880-1890, os marxistas procuraram ligar-se aosoperários, que ainda eram minoria em relação aos camponeses. Um grupo político, ospopulistas, preferiu ligar-se aos camponeses, que eram maioria. No entanto, a classeoperária estava em ascensão e desenvolvimento, enquanto a classe camponesa sedesagregava. Logo o proletariado tornou-se uma força política de primeira ordem. Issodecorreu do fato de que a teoria do marxismo sobre o estado é uma de suas principaisteorias:
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Vimos, até aqui, como uma das teses fundamentais do marxismo, comrespeito ao Estado, é a necessidade que o proletariado revolucionário tem,quando busca o amparo do poder político, de destruir o aparelhamento deEstado burguês e criar um novo tipo de aparelhamento de estado, algumasde cujas características já vimos ao estudar a Comuna de Paris
(HARNECKER, 1983, p. 127).Para completar a destruição desse aparelho de estado, o partido proletário quetomou o estado instalará a ditadura do proletariado, com o objetivo de construir osocialismo, construir a sociedade sem classes, converter todos os membros dasociedade em trabalhadores, destruir a base sobre a qual descansa a exploração dohomem.Esse objetivo só poderia ser alcançado a termo de um longo processo. Seria,então, um processo longo de transição do capitalismo ao socialismo. A tarefa dereorganizar a produção em todos os campos é uma tarefa árdua, assim comointroduzir mudanças radicais em todos os domínios da vida leva tempo. Existe, além domais, a enorme força do costume e da tradição burguesas e pequeno-burguesas dedirigir a economia. Por isso fala desse longo período de ditadura do proletariado emseu texto
A Crítica do Programa de Gotha
, além do texto
A Guerra Civil na França
(sobre a Comuna de Paris). Sendo assim, muitos perguntam: mas como vamos chegar àdemocracia pela ditadura? Não seria mesmo o que o personagem de
Crime e Castigo
,de Dostoiévski, se perguntar como vamos chegar à virtude através do assassinato eoutros malefícios? A vertente leninista do marxismo responde que não: essa ditaduracontra o grupo minoritário de privilegiados é uma democracia para a maioria do povo.As medidas que Marx sugeriu depois da experiência da Comuna de Paris têm sentidoessencialmente democrático. Isso porque, para vertente leninista do marxismo, ademocracia burguesa, que é a democracia para uma minoria e a ditadura para amaioria do povo, transforma-se agora em democracia para a maioria e ditadura para opequeno grupo que não aceita desfazer-se de seus privilégios.Ao tratar de revolução, portanto, deve-se distinguir o que pensam a respeito asvárias vertentes que reivindicam o marxismo. Uma vertente, que repensa Marx e nãoaceita totalmente a concepção acima de Lênin, propõe uma transformaçãodemocrática lenta e segura no sentido do socialismo, mas sem impor uma ditadura. É a
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alternativa proposta por Lukács e Gramsci. Propõe-se, então, uma longa e lenta lutapara instaurar a democracia, radicalizando-a e ampliando-a. Gramsci propõe,principalmente, que será preciso que os marxistas conquistem a hegemonia. Gramsci,em especial, é a grande influência do Partido dos Trabalhadores, partido que está hojeno poder no Brasil. Como se pode depreender por sua prática, quem se inspira emGramsci deseja introduzir mudanças no aparato jurídico da sociedade. E o PT tem feitoisso, introduzindo inúmeras novas leis: lei da Palmada, Lei Seca, Lei Maria da Penha,assim como tramita também o projeto de lei contra a homofobia e outros. Hegemoniaseria, então, uma larga política de alianças no terreno democrático e das organizaçõespopulares, sem se subordinar, entretanto, aos setores burgueses. O PT pertence a umavertente de socialismo cristão ou socialismo democrática que acredita que se podeevoluir pacificamente do capitalismo ao socialismo. Para a vertente marxista-leninista,é uma hipótese enganosa imaginar que o capitalismo se desmoronará com seu próprioconsentimento. A substituição de um sistema social por outro é processorevolucionário longo e complexo. Não seria um simples processo espontâneo, seriauma luta, seria um processo relacionado com o conflito das classes. O capitalismo estáem decadência, porém não deve ser comparado simplesmente com uma árvore quetenha decaído tanto que irá ao chão por seu próprio peso. Não, a revolução, asubstituição de um sistema social por outro, foi sempre uma luta, luta cruel e dolorosa,luta de vida e de morte. E cada vez que os representantes do mundo novo chegam aopoder, têm de se defender contra os intuitos, do mundo velho, de restaurar pela forçaa ordem antiga; a gente do mundo novo tem sempre de estar alerta, de estarpreparada para repelir os ataques do mundo velho contra o sistema novo.O conceito de hegemonia de Gramsci, acima citado, costuma ser aplicado justamente a essa concepção evolutiva do socialismo, que pensa que o capitalismopode evoluir tranquilamente para o comunismo e que as revoluções acontecemespontaneamente. Essa vertente socialista tem preferido lutar dentro das instituições:conquistando cargos no parlamento, a direção dos movimentos sociais, sindicatos,dentre outros espaços, para fazer evoluir o aparato jurídico e cultural, que é o queamadurece primeiro, para fazer chegar mais rapidamente o socialismo, preparando oterreno.
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Esse conceito, então, implica em conquistar “trincheiras e casamatas” nasociedade civil e política. Essa seria uma conquista de posições, direção deassociações, instituições que viesse ampliar ao máximo a democracia popular direta,seguindo, a partir daí, sem explosões e um enfrentamento direto, para destruir oaparato estatal burguês. Gramsci chamou a essa estratégia de “guerra de posições”.Na prática, resulta em realização de frentes populares e alianças que resultam emconciliação do capital e do trabalho contra o fascismo na Itália; Georg Lukács tambémpensou e propôs estratégia semelhante nos anos 20, para poder lutar contra aditadura autoritária de Horthy na Hungria, que era o regente de um reino sem rei, poisHorthy negou a coroa ao rei Habsburgo e ficou sendo ditador ele mesmo. A estratégiade Lukács foi rejeitada nos anos 20 e historicamente ganhou o nome de “Teses deBlum”. Já Gramsci, numa obra sobre o sul da Itália, manifestou a teoria da hegemoniado proletariado contra o despotismo capitalista italiano nos seguintes termos:
Os comunistas turineses colocaram, concretamente, a questão da hegemoniado proletariado, i.e. a questão da base social da Ditadura do Proletariado e doEstado Operário. O proletariado pode tornar-se classe dirigente e dominantena medida em que consiga criar um sistema de alianças de classe que lhepermita mobilizar contra o capitalismo e o Estado Burguês a maioria dapopulação trabalhadora, isso significa, na Itália, nas relações reais de classeexistentes na Itália, na medida em que consiga obter o consenso das amplasmassas camponesas. Na Itália, a questão camponesa assumiu duas formastípicas e particulares, em decorrência da determinada tradição italiana, emdecorrência do desenvolvimento determinado da história italiana : a questãodo sul e a questão do Vaticano. Conquistar a maioria das massas camponesassignifica, pois, para o proletariado italiano, tornar suas próprias essas duasquestões, desde o ponto de vista social, compreender as exigências de classeque elas representam, incorporar essas exigências em seu programarevolucionário de transição, situar essas exigências entre as suas própriasreivindicações de luta
(GRAMSCI, apud: LAGRASTA, 2010, p. 22).
A ideia de um sistema de aliança de classe, incluindo forças burguesas e liberaisantifascistas, ganhou força apoiado pelo próprio Stálin e tornou-se frente popular emvários países nos anos 30, apoiado pela própria União Soviética no intento decombater o nazismo alemão, o fascismo italiano e o imperialismo japonês. Na França ena Espanha, a política de Frente Popular permitiu até mesmo que os comunistaschegassem ao poder no final dos anos 30. Essa mesma política de alianças entreclasses e partidos, transposta para os anos 80 em termos bastante diferentes e em umoutro contexto, tem sido praticada pelo PT desde 1989.
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A revolução acontece quando mudanças quantitativas lentas levam a umamudança qualitativa brusca e rápida. Afinal, a dialética descobriu essa lei dodesenvolvimento. As revoluções realizadas pelas classes oprimidas são um fenômenonatural e inevitável. Marx diz sobre as suas investigações sobre o estado:
Minha investigação desembocou no seguinte resultado: relações jurídicas,tais como formas de estado, não podem ser compreendidas nem a partir de simesmas, nem a partir do assim chamado desenvolvimento geral do espíritohumano, mas, pelo contrário, elas se enraízam nas relações materiais de vida,cuja totalidade foi resumida por Hegel sob o nome de sociedade civil(burgerliche gesellschaft), seguindo os ingleses e franceses do século XVII;mas que a anatomia da sociedade burguesa (“burgerliche gesellschaft) deveser procurada na economia política
(MARX, apud: BITTAR E ASSIS,2010 p. 374).Assim, para Marx, a história da sociedade até hoje é a história das lutas declasse. O estado é uma superestrutura constante de inúmeros aparatos burocráticosde controle social, sendo por esse motivo, mecanismo de dominação de uma classesocial por outra. O direito apenas ratificaria a vontade dos dominadores sobre osdominados. O estado, criado para defender interesses comuns, teria passado adefender somente os interesses de uma classe. A luta de classe passa ser uma lutapolítica, uma luta dirigida, em primeiro termo, contra o domínio dessa classe. Aconsciência da relação que essa luta política tem para com sua base econômicaobscurece-se e pode chegar a desaparecer completamente (ENGELS, apud: BITTAR EASSIS, p. 377).A área de direito e filosofia de direito se ocupa mais dos textos de Marx do quede seus seguidores Lênin, Stálin, Mao, do chamado marxismo bolchevique. Para osestudiosos do ocidental, o que existiu na URSS e em outros países socialistas foram oschamados “modos de produção asiático” e não o que Marx idealizava.O que há de novo no universo do marxismo mais recente é o estudo de textoscomo os
Grundrisse
, editado pela primeira em 1941, no Instituto de Marxismo-Leninismo em Moscou e que é uma elaboração para
O Capital
que ficou inéditadurante muitos anos. São textos inovadores por analisar formações pré-capitalistas. Háoutros textos publicados posteriormente: os Manuscritos de 44, o chamado
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Manuscrito de Kreuznach (que faz a crítica da teoria do estado de Hegel e também échamado de Manuscrito de 1843), etc.Há também uma relativa influência do marxismo sobre a Igreja Católica, tendoinclusive inspirado uma vertente chamada teologia da libertação, hoje bastanteminoritária. A partir do partido Socialismo e Liberdade está sendo proposta uma novateologia da libertação, como é interessante citar essa nova conciliação de socialismo ecristianismo a partir do teórico chamado Adamir Gerson (mas que tem também comoteóricos Leonardo Boff e Frei Betto:
Adamir Gerson nivela Bento XVI e Leonardo Boff? Que isto nunca aconteça!Leonardo Boff é um cristão que tem de passar pela segunda ressurreição(Tem de atravessar o Jordão), mas Bento XVI um cristão que tem pelafrente duas ressurreições a percorrer (tem de romper com Faraó, tem devencer Faraó na travessia do Mar Vermelho, tem de caminhar no desertoem meio a cobras venenosas e escorpiões, tem de chegar ao Jordão e oatravessar) a fim de vir estar na presença de Deus, face a face, como foi ovaticínio do apóstolo João (I João 3.2). O que deixa Leonardo Boff à suafrente, muitos anos luz. Bento XVI tem de morrer para o capitalismo erenascer no Marxismo (...). Mas o Marxismo é Deus NO CONJUNTO DAOBRA! Como o Judaísmo foi Deus no conjunto de sua obra, não obstante assuas imperfeições (...). Agora chegou o tempo de ela dar novo salto dequalidade, com a condução do bastão revolucionário saindo agora de Lula eindo para Adamir Gerson (...). A título de exemplo, os intelectuais do PTolham no espelho histórico interpolado entre eles e se reconhecem osmesmos mencheviques que vieram a estar no poder. Nem mais nemmenos. Olham na aliança política construída por Lula e reconhecem nela amesma aliança política construída por Kerensky. Nem mais nem menos.Olham em Adamir Gerson e se lembra da chegada de Lênin na estaçãoFinlândia...
(BRASIL, 2011).
Essa passagem foi introduzida acima apenas a propósito da fusão do marxismoe do cristianismo que continua existindo e inspirando teorias e linhas políticas. Bemdiversa é a interpretação que interessa à filosofia do direito e que será enfocada aqui.No geral, aborda-se o marxismo como sendo uma ciência e o cristianismo como sendometafísica.Marx introduz muitas preocupações com o estado e com o direito. O direito,para ele, é parte da superestrutura. As relações jurídicas, para ele, não podem serentendidas de modo formal, isoladamente de fatores sociais e econômicos. Não hácomo fazer uma revolução mudando o direito, mas pode-se ver pela explicação acimaque há uma vertente que utiliza-se principalmente do marxismo de Gramsci para supor
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que pode auxiliar a evolução da sociedade para um socialismo democrático através demudanças no ordenamento jurídico da sociedade. Daí, quem sabe, tantas novas leiscomo as elencadas acima.Para a vertente marxista-leninista do marxismo, a passagem do capitalismo aosocialismo, assim como a libertação operária do jugo capitalista podem ser efetuadas,mas não por transformações lentas, não por reformas, mas por uma revolução. Paranão se enganar em política, é preciso ser revolucionário e não reformista. A luta doproletariado prossegue quando se analisa o conflito das forças contrárias, a base dascontradições internas, gerando um conflito capaz de ultrapassá-las.As contradições do regime capitalista devem ser pesquisadas, colocadas à luz eexpostas, a luta de classe não pode ser abafada e sim levada até o fim. A políticareformista de harmonia com a burguesia é um engano para o proletariado. Esse é ométodo dialético marxista aplicado à vida social, à história da sociedade. O regimecomunista, enquanto existiu, também sofreu de contradições. Na União Soviética, eledurou de 1917 a 1991. Gorbachev, último líder do país, falou de seu fim nos seguintestermos, em um discurso em Ancara, na Turquia:
«O objectivo da minha vida era a eliminação do comunismo, uma ditadurainsuportável sobre o povo. A minha mulher, que tinha compreendido estanecessidade mesmo antes de mim, apoiou-me inteiramente. Foi justamente para o alcance deste objectivo que me servi da minha posiçãono partido e no país. Precisamente por isso, a minha mulher incentivavameconstantemente para que ocupasse sucessivamente posições cada vez maisaltas no país. Quando conheci pessoalmente o Ocidente, percebi que nãopodia renunciar ao objectivo definido. E, para ser alcançado, precisava desubstituir toda a direcção do PCUS e da URSS, bem como a direcção emtodos os países socialistas. O meu ideal nessa altura era a via dos paísessociais-democratas. A economia planificada não permitia realizar opotencial que possuíam os povos do campo socialista. Só a passagem paraa economia de mercado podia proporcionar possibilidades aos nossospaíses de se desenvolverem com dinamismo (...). O mundo sem comunismoterá melhor aspecto. A partir do ano 2000 começará uma era de paz e deprosperidade universal. Mas ainda existe uma força no mundo que iráentravar o nosso avanço para a paz e edificação. Refiro-me à China.(GORBACHEV, apud: GOSWEILLER, 2011, p. 12).
Esse foi o discurso de Gorbachev no contexto de 1991, quando dodesmoronamento da União Soviética. Com a crise econômica mundial e as guerras emvários países (Iraque, Afeganistão, Líbia, Paquistão), novamente fala-se em Marx apropósito da crise e em imperialismo a propósito da política internacional. Nos Estados
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Unidos, principalmente, há um debate entre os historiadores como Grover Furr, MarkTauget e Archie Getty, dentre outros, que fizeram pesquisas desmentindo ahistoriografia anterior sobre a Guerra Fria, constituindo uma nova geração deestudiosos da história da União Soviética que revê esse assunto sem os preconceitosdo tempo da Guerra Fria. É especialmente surpreendente o juízo desses historiadoresa respeito de assuntos como os famosos Processos de Moscou: Archie Getty, em
Origins of Great Purges
, chega à conclusão de que os processos são verdadeiros, foram justos e que os acusados, que faziam parte do alto escalão do governo soviético, nãoforam torturados e os processos não foram encenados. Comentou o historiador GroverFurr, de Montclair State University (New Jersey) a respeito desse assunto:
Um número considerável de documentos dos arquivos soviéticos queformalmente eram secretos foram publicados desde o fim da UniãoSoviética. Isso é uma pequena proporção daquilo que nós acreditamos queexiste. Especialmente em relação à documentação histórica dos anos 30, osProcessos de Moscou, os expurgos militares e as repressões massivas de1937-38, a vasta maioria dos documentos ainda são ultrassecretos,escondidos e inacessíveis até mesmo a privilegiados historiadores. Mastodo sistema de censura tem falhas. Muitos documentos foram publicados.Mesmo esse pequeno número nos permite ver os contornos da históriasoviética nos anos 30 de uma forma bem diferente da versão “oficial”.Durante a última década (o artigo é de 2009) muita evidência documentalemergiu dos arquivos formais soviéticos para contradizer o ponto de vistacanônico desde o tempo de Kruschev de que os réus nos Processos deMoscou e o “Caso Tukachevsky”, conspiração militar foram vítimasinocentes forçadas a fazer confissões falsas. Nós publicamos e escrevemosum grande número de trabalhos ou, ao pesquisar para publicar, podemosdizer que agora temos forte evidência de que as confissões não eram falsase que réus dos Processos de Moscou pareciam ter sido verdadeiros emconfessar as conspirações contra o governo soviético. Esse trabalho nosleva a realizar o presente estudo
(FURR, 2010, p. 7).Fica aqui, portanto, uma sugestão para um artigo sobre os Processos deMoscou em Filosofia do Direito, uma vez que esses processos têm boa bibliografia arespeito e têm interesse filosófico: um dos livros que trata deles é
Humanismo eTerror
, de Maurice Merleau Ponty.3. Conclusão
AD
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Assim sendo, a dialética é o método a ser utilizado pelo partido do proletariadopara transformar a sociedade. Karl Marx sempre tomou o ponto de vista da classetrabalhadora, embora tivesse origem na classe média.O método dialético aplicado à natureza gera o materialismo dialético, enquantose aplicado às sociedades e à história humana, gera o materialismo histórico. O papelda história é grande para Marx, uma vez que só estudando a história se pode entenderas transformações das sociedades humanas.Quando esse partido do proletariado entender bem as contradições dasociedade, assim como quando a classe proletária estiver bastante desenvolvida, podeser que existam condições para uma mudança qualitativa na sociedade, após váriasmudanças quantitativas: ou seja, uma revolução. A revolução socialista terminarácomo o capitalismo da mesma forma como o regime capitalista substituiu ofeudalismo, no entender de uma das vertentes do marxismo, o marxismo-leninismo.Desde que Karl Marx escreveu suas obras, no século XIX, aconteceram váriasrevoluções inspiradas no marxismo. A principal foi a de Lênin em 1917. Mas há outrasvertentes: a dos situacionistas franceses, que misturam marxismo, anarquismo esurrealismo e foi muito ativa em maio de 68; há socialistas cristãos, autonomistas,reformistas. O marxismo-leninismo também tem a vertente maoísta, que leva emconsideração Marx, Engels, Lênin e Stálin. Há a vertente universitária, o marxismoocidental, que rompe com o marxismo acima referido. Ela é composta por socialistasque esperam que a sociedade mesmo evolua e pretendem, enquanto isso, introduziralgumas reformas. O marxismo levou o direito e a filosofia do direito a pensarem oreferencial econômico, pois para eles o direito é superestrutura.
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4. BibliografiaBITTAR, Eduardo C. B. Bittar; ASSIS, Guilherme de Almeida. Curso de Filosofia doDireito. São Paulo: Atlas, 9ª ed. 2010.BRASIL, Lurdinha. Bento XVI, o marxismo e os 100 anos da Assembléia de Deus.<<http://anovateologiadalibertacao.blogspot.com/search?updated-max=2011-08-29T11%3A49%3A00-07%3A00&max-results=7>>. <<Acesso em 3 de novembro de2011>>.FURR, Grover. Evidências da Colaboração de Trotsky com a Alemanha e o Japão.<<http://clogic.eserver.org/2009/Furr.pdf >>. <<Acesso em 3 de novembro de 2011>>.GETTY, Arch
. The Origins of the Great Purges: The Soviet Party Reconsidered, 1935-1938.
. New York: Cambridge University Press, 1995.GOSSWEILER, Kurt. As várias cascas da cebola Gorbachev. <www.hist-socialismo.net>>.<<Acesso em 4 de novembro de 2011>>.
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HARNERCKER.
Princípios Elementais do materialismo histórico
. São Paulo: Paz e Terra,1983.POLITZER, Georges.
Princípios Fundamentais de Filosofia
. Ed. Hemus, 1971.MONASTA, Attilio. Antonio Gramsci. Recife: editora Massangana/MEC, 2010.MERLEAU-PONTY, Humanismo e Terror. Ensaio sobre o problema comunista. Rio deJaneiro: Tempo Brasileiro, 1968.
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