Socorro
Santiago: O Romance de uma Icamiaba
Maria do Socorro de Farias Santiago
é o nome dessa mulher guerreira, pra mim sempre associada à figura das
“icamiabas”, nome que era dado às índias guerreiras que habitavam as margens do
rio Nhamundá, afluente do Amazonas. Supostamente foram essas mulheres que deram
o nome ao rio Amazonas, pois o navegador Francisco Orellana, chegando
juntamente do frei Gaspar de Carvajal, um cronista, confundiu essas mulheres
com as amazonas gregas. Socorro Santiago mesmo definiu-se em uma memória que
escreveu:
Meu
Deus, quem sou eu? Hoje posso dizer que sou uma mulher que assumiu, pelo
casamento, um compromisso com um artista, Nivaldo Santiago, de oferecer suporte
para que ele pudesse realizar sua arte. Foi o que tentei fazer ao longo de 60
anos e... acho que até certo ponto consegui.
Meu
nome é Maria do Socorro de Farias Santiago, nasci na cidade de Itacoatiara e a
partir dos três anos de idade fui criada ora em Manaus, ora no sítio Roseiral,
casa da minha família, às margens do rio Amazonas. A cidade de Manaus da minha
infância sofria a influência da debacle [derrocada] da borracha. Era muito
pobre. Eu fiz o curso primário no Colégio Santa Dorotéa e a partir do ginásio
fui transferida para o Instituto de Educação do Amazonas, onde me formei
normalista. Assim, cumpri um projeto do meu pai. Eu cresci ouvindo meu pai
dizer que eu ia ser professora.
Eu e Socorro Santiago
conhecemo-nos em nosso trabalho na então UNIPAC. Na época, escrevemos ensaios
para o primeiro número da revista da universidade, a revista UNImpacto,
revista de ensino, pesquisa e extensão. A data presente no exemplar é
“Primavera de 2002”. Curiosamente, a biblioteca da UNA atual não conta com
nenhum exemplar dessa revista. Eu escrevi um ensaio sobre um livro de
vanguarda, PanAmérica, que tinha então sido relançado, já Socorro
escreveu sobre um tema que muito revela suas raízes. Um dia desses, Socorro
ofertou-me um exemplar (raridade!) dessa revista onde ela escreveu sobre “Uma
Leitura Mítica do Poema Romance das Icamiabas”, tratando de um poema de
João de Jesus Paes Loureiro, um paranaense de Abaetetuba, poeta e professor da Universidade
Federal do Pará, caracterizando as Icamiabas como heroínas míticas lunares.
Esse número da revista contou com
inúmeros nomes importantes entre os professores locais: Ilka Miglio, Jairo
Melgaço (já falecido), Samira Araújo, Maria Angélica Cardoso Lobato, Tânia
Teixeira Nakamura, Valter Mesquita, irmão do amigo Boleka (Geraldo Mesquita).
A trajetória dessa artista e
professora confunde-se com sua história de amor com o Maestro Nivaldo, cuja
obra Socorro Santiago continua e preserva aqui em Bom Despacho. Ouçamos, mais
uma vez, suas belas palavras:
Nos
últimos dezoito anos, em Bom Despacho, Minas Gerais, Nivaldo dirigiu o Coral
Voz e Vida constituído por pessoas voluntárias da comunidade. Ali também não se
contentou só com o coral, criou o Projeto “Crescendo com Música” e eu assumi
com ele, o ensino da música para crianças e adolescentes. Em Bom Despacho,
Nivaldo pode realizar o sonho acalentado desde os anos 70, quando ele fez
estágio sobre o método Suzuki, criado no Japão, que introduziu o ensino da
música em grupo, logo disseminado no mundo inteiro. O método foi adaptado e com
pouco tempo, contando com a imensa musicalidade das crianças e a capacidade dos
professores, todos recém saídos da universidade, formamos a Orquestra de Câmara
de Bom Despacho, em pleno florescimento! Hoje, temos jovens que iniciaram os
estudos aos sete anos concluindo cursos de graduação em universidades e,
sobretudo, tocando. Tocando em orquestras, em casamentos, etc.
Outro
fato que vem confirmar o exposto é o número de alunos dos cursos superiores de
música que o procuraram em Bom Despacho em busca de subsídios para seu trabalho
acadêmico.
Para Socorro Santiago,
essa Amazona, guerreira lunar, mestra admirável que é uma honra termos
residindo em Bom Despacho, só me lembro do grande professor de teatro na
educação, Bertolt Brecht, e é a ele que recorro para homenageá-la: “Ela deu
sugestões, nós as aceitamos”!
Nenhum comentário:
Postar um comentário