quarta-feira, 2 de agosto de 2023

Socorro Santiago: O Romance de uma Icamiaba

 

Socorro Santiago: O Romance de uma Icamiaba

 

            Maria do Socorro de Farias Santiago é o nome dessa mulher guerreira, pra mim sempre associada à figura das “icamiabas”, nome que era dado às índias guerreiras que habitavam as margens do rio Nhamundá, afluente do Amazonas. Supostamente foram essas mulheres que deram o nome ao rio Amazonas, pois o navegador Francisco Orellana, chegando juntamente do frei Gaspar de Carvajal, um cronista, confundiu essas mulheres com as amazonas gregas. Socorro Santiago mesmo definiu-se em uma memória que escreveu:

 

Meu Deus, quem sou eu? Hoje posso dizer que sou uma mulher que assumiu, pelo casamento, um compromisso com um artista, Nivaldo Santiago, de oferecer suporte para que ele pudesse realizar sua arte. Foi o que tentei fazer ao longo de 60 anos e... acho que até certo ponto consegui.

Meu nome é Maria do Socorro de Farias Santiago, nasci na cidade de Itacoatiara e a partir dos três anos de idade fui criada ora em Manaus, ora no sítio Roseiral, casa da minha família, às margens do rio Amazonas. A cidade de Manaus da minha infância sofria a influência da debacle [derrocada] da borracha. Era muito pobre. Eu fiz o curso primário no Colégio Santa Dorotéa e a partir do ginásio fui transferida para o Instituto de Educação do Amazonas, onde me formei normalista. Assim, cumpri um projeto do meu pai. Eu cresci ouvindo meu pai dizer que eu ia ser professora.

 

            Eu e Socorro Santiago conhecemo-nos em nosso trabalho na então UNIPAC. Na época, escrevemos ensaios para o primeiro número da revista da universidade, a revista UNImpacto, revista de ensino, pesquisa e extensão. A data presente no exemplar é “Primavera de 2002”. Curiosamente, a biblioteca da UNA atual não conta com nenhum exemplar dessa revista. Eu escrevi um ensaio sobre um livro de vanguarda, PanAmérica, que tinha então sido relançado, já Socorro escreveu sobre um tema que muito revela suas raízes. Um dia desses, Socorro ofertou-me um exemplar (raridade!) dessa revista onde ela escreveu sobre “Uma Leitura Mítica do Poema Romance das Icamiabas”, tratando de um poema de João de Jesus Paes Loureiro, um paranaense de Abaetetuba, poeta e professor da Universidade Federal do Pará, caracterizando as Icamiabas como heroínas míticas lunares.

            Esse número da revista contou com inúmeros nomes importantes entre os professores locais: Ilka Miglio, Jairo Melgaço (já falecido), Samira Araújo, Maria Angélica Cardoso Lobato, Tânia Teixeira Nakamura, Valter Mesquita, irmão do amigo Boleka (Geraldo Mesquita).

            A trajetória dessa artista e professora confunde-se com sua história de amor com o Maestro Nivaldo, cuja obra Socorro Santiago continua e preserva aqui em Bom Despacho. Ouçamos, mais uma vez, suas belas palavras:

 

Nos últimos dezoito anos, em Bom Despacho, Minas Gerais, Nivaldo dirigiu o Coral Voz e Vida constituído por pessoas voluntárias da comunidade. Ali também não se contentou só com o coral, criou o Projeto “Crescendo com Música” e eu assumi com ele, o ensino da música para crianças e adolescentes. Em Bom Despacho, Nivaldo pode realizar o sonho acalentado desde os anos 70, quando ele fez estágio sobre o método Suzuki, criado no Japão, que introduziu o ensino da música em grupo, logo disseminado no mundo inteiro. O método foi adaptado e com pouco tempo, contando com a imensa musicalidade das crianças e a capacidade dos professores, todos recém saídos da universidade, formamos a Orquestra de Câmara de Bom Despacho, em pleno florescimento! Hoje, temos jovens que iniciaram os estudos aos sete anos concluindo cursos de graduação em universidades e, sobretudo, tocando. Tocando em orquestras, em casamentos, etc.

Outro fato que vem confirmar o exposto é o número de alunos dos cursos superiores de música que o procuraram em Bom Despacho em busca de subsídios para seu trabalho acadêmico.

 

            Para Socorro Santiago, essa Amazona, guerreira lunar, mestra admirável que é uma honra termos residindo em Bom Despacho, só me lembro do grande professor de teatro na educação, Bertolt Brecht, e é a ele que recorro para homenageá-la: “Ela deu sugestões, nós as aceitamos”!

 

 

 

 

 

 

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