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segunda-feira, 8 de junho de 2009

Diogo Mainardi X Glauber Rocha: Maranhão 2009

O Diogo agora implicou com o Maranhão 66, do Glauber, que ele acha favorável ao Sarney. Diogo, não "intertrepa" errado de novo, não!

Muito curioso Arnaldo Carrilho virar esquerdista modelo! Na biografia do João Carlos Teixeira Gomes, ele é extremamente crítico em relação a todo mundo que aparecia no enterro de Glauber. Ele os chama de esquerda festiva em espetáculo de mau gosto, ressaltando a solidão de Glauber no ato de montar Idade da Terra. E eles são Jabor, Zé Celso, Barreto, etc. Insinua mesmo que todos estavam, como se diz na gíria estudantil, "trepando no cadáver". E na biografia está escrito que Glauber ria do azedume de Carrilho com relação a Roland Barthes e Foucault.

Claro que o Sarney e quem é amigo dele tem direito a dizer que o filme é favorável a quem o financiou. Mas esse foi um caso anômalo de documentário encomendado que virou obra de arte. O choque entre o discurso floreado e as imagens de miséria no sertão é crítico em 66 e hoje com a miséria provocada pelo aquecimento global. Porém, acho salutar o Diogo comentar o Glauber. Ele tá de parabéns. Ele precisa mesmo se digladiar com um adversário de verdade.

DO PERSONAGEM
“Tomava eu posse no Governo do Maranhão e fiz uma ousadia que não deveria ter feito com um amigo da estatura de Glauber Rocha. Eu lhe pedira que documentasse a minha posse. Glauber fez o documentário que foi passado numa sala de cinema de arte, há 15 anos. E quando o público viu que numa sessão de cinema de arte ia ser passado um documentário que podia ter o sentido de uma promoção publicitária, reagiu como tinha que reagir. Mas aí, o documentário começou a ser passado, e quando terminaram os 12 minutos o público levantou-se e aplaudiu de pé, não o tema do documentário mas a maneira pela qual um grande artista pôde transformar um simples documentário numa obra de arte: ele não filmou a minha posse, ele filmou a miséria do Maranhão, a pobreza, filmou as esperanças que nasciam do Maranhão, dos casebres, dos hospitais, dos tipos de ruas, e no meio de tudo aquilo ele colocou a minha voz, mas não a voz do governador. Ele modificou a ciclagem para que a minha voz parecesse, dentro daquele documentário, como se fosse a voz de um fantasma diante daquelas coisas quase irreais, que era a miséria do Estado”.

Senador José Sarney, no Jornal do Brasil, (Rio de Janeiro, 25 de Agosto de 1981).



Vejam o filme e tirem suas próprias conclusões.





Se Glauber estivesse vivo, acho que seria direto: diria algo como: fazer filme no Brasil é mais difícil que escrever na Veja: Mainardi, sua coluna é uma MERDA!

Terra em Transe, Nelson Rodrigues, etc.

Contrera me pede para falar mais sobre o Glauber. OK!

Bom, o artigo do Diogo Mainardi continha uma cena do Glauber, a uma discussão entre Paulo Martins e Porfírio Diaz. Depois ele citava uma explicação do diretor sobre o filme que dizia que era uma obra sobre a metáfora, ópera e metralhadora.

Ora, pelo que me lembro, a cena entre Paulo Martins é parte da relação tempestuosa desse poeta com o político que o apoiou no início de carreira: a ruptura. Paulo, que é jornalista e poeta, queria trabalhar com ideais políticas reformistas e comunistas e para isso passou a trabalhar com o governador Vieira, traindo Diaz, traição duramente cobrada por ele com aquelas palavras: "sozinho, Paulo, sozinho". Tudo isso dá a entender que Mainardi tem o DVD de Terra em Transe, o que em si já é surpreendente, espantoso. Quem tem esse DVD aí, dentre meus leitores? Você tem, Contrera?

A jogada de Paulo se mostrou desastrosa é desse tipo de imagem dolorosa que o filme tratou: Paulo era aliado de Diaz e poeta e jornalista protegido dele. Diaz é um político oportunista que Paulo biografou em um filme (que aparece no próprio Terra em Transe) chamado Biografia de um Aventureiro, um esculacho em Diaz. Mas logo ele pagará caro: Fernández, político reformista, caiu diante do golpe de Diaz e da grande empresa Explint. Paulo saiu enlouquecido dando tiros e relembrando os últimos acontecimentos: e essa é a narrativa de Terra em Transe.

Era um filme que, em sua época, estava em cima da notícia: o golpe de 64, que a esquerda estava tentando entender melhor em 67. Curiosamente, ao ler os textos de uma coletânea da UNE de 64 a 79, vi que de início, em 65, os documentos eram bem escritos e claros, analisando a conjuntura e traçando que 64 tinha sido uma aliança do capital estrangeiro e do latifúndio. Depois, nos anos 70, passa-se a pedir apenas direitos humanos.

Mainardi diz que Nelson Rodrigues gostou só da cena em que Paulo Martins tampa a boca de Jerônimo e diz olhando para o espectador, numa cena que exercita o distanciamento crítico brechtiano: "tá vendo o que é o povo? Um ignorante, um imbecil, um despolitizado"! É um grito contra uma certa idealização do povo corrente na esquerda da época, e que até mobilizou Augusto Boal a distribuir panfletos contra o filme nas portas dos cinemas (diz a lenda). Mas, como acabo de ler no Questão de Crítica, se Boal não viu Os Inconfidentes do Joaquim Pedro então é possível. Era uma denúncia construtiva e não uma pirraça infantil como faz Mainardi: "mamãe, eu sou reaça!"

A opinião de Nelson sobre Glauber é algo muito especulado. Nunca li nas crônicas dele algo mais aprofundado sobre Glauber --existe algo sobre Terra em Transe, parece que em A Cabra Vadia. Ele diz só brevemente que Terra era um ideograma chinês de cabeça para baixo. Eu esperava encontrar um comentário muito repetido por muita gente, de que o filme era um vômito triunfal, um tabuleiro de xadrez de cabeça para baixo. Não encontrei. Mesmo Ruy Castro já disse que Nelson é mau crítico de cinema e isso recentemente foi confirmado por uma postagem engraçadíssima de Marcelo Coelho a respeito das mulheres em Antonioni comentadas pelo Nelson: ele dizia que a mulher em Antonioni era a anti-mulher, que Antonioni não gostava de mulher. Logo em seguida, Marcelo postou as deslumbrantes mulheres dos filmes do diretor italiano, a começar pela sensual Monica Vitti e sua famosa boca...

O fato é que a postura de Glauber diante do teatro brasileiro era radical: Rei da Vela era todo copiado de Terra em Transe, exagerava ele. Glauber muitas vezes provocou o teatro brasileiro, como arte que precisava se atualizar diante do cinema e acusava a classe teatral de desprezar de maneira forçada o Cinema Novo, movida por inveja. Vejam o que encontrei no Tempo Glauber:

Nelson Rodrigues fala de "Terra em Transe": ("Correio da Manhã, RJ, 16 de maio de 1967

“Durante as duas horas de projeção, não gostei de nada. Minto. Fiquei maravilhado com uma das cenas finais de Terra em Transe. Refiro-me ao momento que dão a palavra ao povo. Mandam o povo falar, e este faz uma pausa ensurdecedora. E, de repente, o filme esfrega na cara da platéia esta verdade mansa, translúcida, eterna: o povo é débil mental. Eu e o filme dizemos isso sem nenhuma crueldade. Foi sempre assim e será assim eternamente. O povo pare os gênios, e só. Depois de os parir volta a babar na gravata (...) Terra em Transe não morrera para mim (...) sentia nas minhas entranhas o seu rumor. De repente, no telefone com o Hélio Pelegrino, houve o berro simultâneo: ‘Genial!’ Estava certo o Gilberto Santeiro (...) Nós estávamos cegos, surdos e mudos para o óbvio. Terra em Transe era o Brasil. Aqueles sujeitos retorcidos em danações hediondas somos nós. Queríamos ver uma mesa bem posta, com tudo nos seus lugares, pratos, talheres e uma impressão de Manchete. Pois Glauber nos deu um vômito triunfal. Os Sertões de Euclides da Cunha também foi o Brasil vomitado. E qualquer obra de arte para ter sentido no Brasil precisa ser essa golfada hedionda.” (cit. Por Tereza Ventura, em A Poética Polytica de Glauber Rocha. Funarte, Rio de Janeiro, 2000)


E o Rei da Vela era um horror para Nelson: Oswald detestava Nelson e o criticou violentamente sempre que pode: Oswald disse que o teatro de Nelson era um "disco voador de besteira" e o autor um "convento do Aretino" (um hipócrita). Nelson também desprezou explicitamente o teatro de Oswald, que possui o mérito de ter sido publicado -- mas não montado--dez anos antes de Vestido de Noiva e que disputa --embora não no maistream-- o título de renovador do nosso teatro.