terça-feira, 26 de maio de 2009

O Itamaraty de Celso Amorim

O Itamaraty de Celso Amorim e Samuel Pinheiro Guimarães

por Gilberto Felisberto Vasconcellos



Itamaratizão... ironizava Darcy Ribeiro. No período Collor foi um puteiro pop; em seguida lobby de privatização internacional do território para FHC descolar prendas honoris causa no exterior. Agora o presidente Lula acertou na escolha de um patriota, nacionalista, culto, idôneo, intelectual conhecedor da história do Brasil não só do ponto de vista econômico, mas estético.

A ALCA não passará! Los gringos no passaron com a ALCA!

Tiremos o chapéu para o chanceler Celso Amorim. Nascido em Santos, a cidade do patriarca José Bonifácio de Andrade e Silva que viu cinema, estudou e meditou sobre o bom, recusando o “bad movie” pornochique. O jovem Amorim fez a cabeça lendo o filósofo húngaro marxista, Georg Lukàcs, sendo mais tarde influenciado por Glauber Rocha, de quem foi amigo e sobre quem escreveu coisas profundas, tal qual João Carlos Texeira Gomes, o biógrafo do cineasta na versão barroca revolucionária que o diferencia de outros cineastas. Para Celso Amorim, o cineasta queria “abarcar a totalidade do universo”. Essa é a bela ambição estética de cada filme seu a refletir o que é o Brasil dentro do cosmos. É isso o que tece o diálogo glauberamorim na "nova new geopolítica” materializada em A Idade da Terra (1980), o filme da fotossíntese vegetal, assim como Deus e o Diabo na Terra do Sol (1964) indigitava onde havia petróleo na Bahia. Cinematograficamente ele experimentou todas as etapas energéticas. Barravento. Montagem nuclear. A estesia cinematográfica da biomassa energética. Em A Idade da Terra Celso Amorim teve participação criativa na montagem. Eu lembro seu artigo de 1980 destinado aos intelectuais. Glauber insistiu para que Lula visse A Idade da Terra, a obra prima do século XX sobre o imperialismo, “a tirania decorrente da dominação estrangeira”, segundo Amorim. O nacionalismo do cinema novo repercutirá no Itamaraty de 2003 com Samuel Pinheiro, para quem a periferia é o centro do mundo, insurgindo contra a peste resignada da sociologia cepalina até o Cebrap, a justificação ideológica do inexorável domínio anglosaxônico, no qual o eminente Celso Furtado foi tragado por Wall Street: a história começou na Grécia e acabou nos Estados Unidos!

Samuel Pinheiro consignou o verdadeiro desígnio da política externa: “A América do sul é a circunstância inevitável, histórica e geográfica do Estado e da sociedade brasileira”. Como dizia Oswald de Andrade, é a América do sol situada no trópico úmido. A política externa com uma matriz energética e tecnológica adequada à natureza física do país, a qual ainda não foi dimensionada pelo governo Lula, pois este recusa o ideário da escola da biomassa energética preferindo repercutir a melancólica alienação da Cepal, ou seja, a concepção equivocada da tecnologia como variável externa, pacotes tecnológicos agregados fora do país, o que hoje corresponde ao truque de substituir o desenvolvimento social e econômico pelo combate assistencial à pobreza e à fome com teologias caridosas da má consciência.

Samuel Pinheiro mostrou o ardil sociológico feagaceano - “país injusto” e não “país subdesenvolvido” - que colocou em nosso peito a culpa exclusiva pela miséria. Os brasileiros somos culpados. A culpa mora é dentro de casa. Triste é a substituição do príncipe da moeda pelo príncipe da esmola. A esmola como o antídoto do desenvolvimento. A substituição da miséria da filosofia pela filosofia da miséria. O sacolão da caridade foi criticado pela “estética da fome” glauberiana desde 1965. O grande lance é erradicar a pobreza, e não governar para pobres.


http://onacional.zip.net/arch2005-09-01_2005-09-30.html


Gilberto Felisberto Vasconcellos é doutor em sociologia pela USP e professor na Universidade Federal de Juiz de Fora.

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