Entre a cura e o veneno: dificuldades do trabalho em Farmácia
Lúcio Emílio do Espírito Santo Júnior
A rotina de trabalho em uma farmácia sempre me pareceu divertida e interessante, principalmente devido a histórias pitorescas que um colega, que trabalhava numa delas, me contava: clientes que reclamavam do sabor amargo do medicamento ingerido, para depois descobrirem ter ingerido um supositório; senhoras que compravam anticoncepcionais e colocavam no filtro; gente que comia pomada com colher; loiras esculturais que pediam para tomar uma injeção, para então se revelarem travestis, entre outras excentricidades que dariam para escrever um livro.
Contando esses casos para o atendente da Farmácia Inconfidência, fui informado de que meu amigo exagerou e inventou bastante. Na prática, não é nada tão piadesco assim e existem, ainda, muitos riscos para quem atende o cliente. Ocorrem alguns casos em que a letra dos médicos é ininteligível e muitos medicamentos possuem nomes parecidos. Em caso de dúvida, o dono da Farmácia Inconfidência orientou seus funcionários a não venderem o produto, pois estão pondo em risco o bem estar da pessoa.
A maioria dos clientes não lê nem a bula nem a receita e confia totalmente no atendente da farmácia, que não é farmacêutico. O farmacêutico, que toda farmácia deve ter, ocupa-se dos remédios de tarja preta, chamados psicotrópicos. Os medicamentos numa farmácia são divididos em três grupos: os de venda livre, chamados OTC, os de tarja vermelha, que são vendidos somente com prescrição médica e finalmente, os que usam a tarja preta por causarem dependência: ansiolíticos, anti-depressivos, inibidores de apetite, derivados do ópio, entre outros. Eles devem ter sua receita retida para fins de fiscalização. Os efeitos colaterais desses são mais sérios.
Com freqüência, as pessoas pensam que podem usar o mesmo medicamento para o ser humano e para um animal. Eu mesmo pude presenciar um rapaz pedindo um calmante (Dramin) para um cachorro que estava agressivo. Um gesto assim pode sedar o animal ou até matá-lo. Para tratar dos animais, deve-se procurar orientação de um veterinário e não tentar experimentar por conta própria. Outra dica é que os injetáveis não são aplicados sem receita. Favor não insistir, conta o atendente, avisando que existem casos de pessoas que morreram após uma injeção inadequada. A propósito, todas as proibições surgiram depois que existiu um mau uso dos remédios: muitos foram usados junto com bebidas alcoólicas, produzindo efeito de droga. Por isso, a Secretaria de Saúde e o Conselho Regional de Saúde fiscalizam tudo: as notas, as compras, os livros de registro.
Muitas vezes, a mesma pessoa roda inúmeras farmácias, buscando alguém que resolva aquele quebra-cabeça. Os atendentes muitas vezes ligam para os médicos buscando decifrar tais enigmas. Quando as receitas são provenientes de médicos que atendem no serviço público, elas são ainda mais ilegíveis, rabiscadas com pressa, denotando um provável excesso de pacientes. E os profissionais, ao serem questionados a respeito, demonstram ainda maior impaciência.
A equipe da Farmácia Inconfidência sugere aos médicos locais que se rendam às delícias da era da Informática. Por enquanto, na cidade ainda são poucos os que usam desse recurso que facilita o trabalho nas farmácias e nas próprias profissões da área.
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