A função desse blog é falar das polêmicas culturais e, se possível, provocá-las. José Serra, político do PSDB e "disseminador do bem", criticou em um artigo na Folha de São Paulo o líder do Irã, Mahmoud Ahmadinejad, acusando-o de banalizar o mal, estando Serra claramente inspirado em Hannah Arendt (especificamente, no livro Eichmann em Jerusalém).
A posição de Ahmadinejad foi turbinada pela imprensa, embora penso que desejasse mesmo bater de frente com o Ocidente nesse ponto, uma vez que ele defende os palestinos (e, por isso mesmo, não jogará uma bomba em Isral, pois prejudicaria os palestinos).
Inicialmente, ele dizia que o holocausto um mito. Um mito não representa necessariamente uma mentira. A rigor, todas as nações constroem-se com base em mitos, narrativas, fatos históricos interpretados dentro de um determinado prisma.
Depois, afirmou que existiriam historiadores contra o holocausto, mas que eles foram presos. Estou apenas traduzindo a wikipedia em inglês. Agora, para William Waack da Globo, ele apenas questionou porque o povo palestino precisa pagar por crimes cometidos na Europa (aí a questão fica melhor colocada).
Serra aproveita a chegada (com repercussões negativas) de Ahmadinejad para fazer uma crítica a seus inimigos do governo Lula. Suas estratégias discursivas são: 1) comparar Ahmadinejad e o Irã com o nacionalismo nazista. No entanto, desde sempre quem teve apoio dos colonizadores europeus foram os judeus nacionalistas de direita que fundaram o estado de Israel, os chamados sionistas. 2) Criticar em bloco a política externa de Lula a partir do episódio da visita de Ahmadinejad. Pelo que pude observar, essa estratégia do artigo era, como se fosse combinada, repetida por toda a imprensa ligada indiretamente aos demo-tucanos, ou seja, toda a grande imprensa.
A partir da chegada de Ahmadinejad, Serra prega a aproximação com o governo golpista de Honduras, pois Ahmadinejad seria tão ditador quanto Micheletti. No entanto, embora as eleições que deram o poder a Ahmadinejad possam ser questionadas, Micheletti não enfrentou as urnas e sim tomou o poder juntamente com os militares, expulsando o presidente democraticamente eleito. Ahmadinejad é fruto da revolução islâmica, rebelião popular de fundo nacionalista e religioso que reafirmou a cultura iraniana no final dos anos 70, expulsando o Xá imposto em 1953 pelo Ocidente com a deposição do nacionalista laico Mossadegh. A revolução islâmica derrubou um ditador e possui, sim, mais legitimidade popular do que o regime golpista de Micheletti. O discurso de Serra é estratégia política. Aliás, Ahmadinejad não pode ser acusado de "burocrata dobrado pelo desejo de obedecer" como foi a argumentação de Arendt com relação a Eichmann. Ele é um nacionalista religioso leigo que diz besteiras no que diz respeito aos homossexuais, sim, mas um discurso não-científico que praticamente todas as religiões fazem.
Sou a favor da separação Igreja/Estado, mas não aplico esse princípio ao Irã sem tentar entender o que se passou lá. O estado era monstruosamente corrupto antes da revolução islâmica, assim como antinacional. Ahmadinejad, fruto dessa revolução, não irá atirar uma bomba nos palestinos. Seu discurso foi no sentido de que a política de Israel, de anexar e colonizar novos territórios, não tem futuro a longo prazo. Segundo a Wikipedia, a melhor tradução para a frase que ele disse não seria "varrer Israel do mapa" e sim "o governo de Jerusalém vai ser varrido pelo tempo". Há razões para duvidar do futuro de uma nação muito dependente de uma superpotência como Israel depende dos USA, e com uma relação muito inamistosa com todos os vizinhos mais populosos.
O artigo de Serra, por flertar com os golpistas de Honduras, levanta a mesma dúvida que levantou o artigo de Fernando Henrique Cardoso: diante das péssimas perspectivas de poder para o PSDB nas próximas eleições, será que os pensamentos a respeito de golpe estão ressurgindo nesse partido?
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