Não vejo problema algum na presença de Ahmadinejad no Brasil. Se ele não vier, não poderemos apresentar a ele nossas críticas ao tratamento dos gays e outras minorias no Irã.
O governo Lula e a nossa diplomacia são bastante pragmáticos e penso que, se fosse apenas provocação aos USA, ele não viria, não. A questão que move essa visita é que existem negócios a fazer com o Irã. Quem pode com o pragmatismo econômico, não é mesmo?
Penso que, se ele tiver mesmo a bomba atômica, isso equilibra o cenário internacional e fará com que o Irã não seja invadido a partir do Iraque, Israel ou do Afeganistão. Parece especulação, mas o complexo industrial-militar não se prende a um liberal como Obama. Age quase que por moto contínuo. Se for interessante que invadam o Irã, o complexo mobilizará seus recursos para invadi-lo; se a escassez de petróleo forçar, ocorrerá uma invasão.
Esse tipo de questão poderia ser pensado com a filosofia política; no entanto, a filosofia política de nosso tempo está viciada, absolutamente alienada ao repetir clichês de Hannah Arendt tais como o conceito de totalitarismo. Meu professor, José Chasin, escreveu um artigo revendo esse conceito, mas sem sucesso. Trata-se de uma praga: a última Veja tachou até mesmo Robespierre de "inventor do totalitarismo". Esse conceito confuso faz com que seja necessário atacar a obra de Hannah Arendt em bloco: detratadora sofisticada do marxismo, tal como provei em um artigo chamado Observações sobre a crítica de Marx em Hannah Arendt, Arendt também me parece equivocada ao ver banalidade em Eichmann. Ela parece ter tolamente acreditado que Eichmann era um burocrata dobrado pelo desejo de obedecer e que qualquer um de nós, cidadão comum, pode de repente tornar-se "MAL". Ora, Eichmann era um nacionalista absolutamente fanático! Como pode Arendt ter acredito em sua defesa naquele tribunal? Até mesmo Eli Wiesenthal não concorda com ela. Aliás, que negócio é esse de mal em si? Deve-se tentar ir para além do bem e do mal!
Outra enorme confusão: desde então, usa-se os conceitos de Arent assim: a Espanha de Franco era autoritária, a Inglaterra é democrática, a URSS era totalitária. Imperialismo, para Arendt, foi só no século XIX. Para Edward Said, Arendt foi teórica comprometida com o imperialismo, pois ela eximia as democracias imperialistas de hoje em dia de qualquer continuidade daquilo que fizeram no século XIX; para ela, imperialismo não era "etapa superior (e parece, insuperável) do capitalismo"...
Em primeiro, façamos um desvio nietzschiano. O que Nietzsche diria desse contexto? Devemos abstrair Heidegger, para quem Hannah Arendt tornou-se morada do ser, na acepção ginecológica do termo. Nietzsche diria que os judeus deixaram a moral dos escravos e de vítimas do imperialismo alemão hitlerista e adquiriram a moral dos senhores, bebendo o leite de loba dos USA e da Inglaterra, aprendendo que o bom é ser amigo do imperador. E Israel fez-se base americana e inglesa no Oriente Médio. O difícil será cair se o império cair. O que é horrível mesmo é que as ex-vítimas, ao desejarem proximidade com o império, viram verdugos: os israelenses construíram muros para cercar as regiões habitadas pelos palestinos, muros que deram a essas regiões aspectos de...guetos! Os próprios palestinos escrevem nesses muros: bem-vindos ao GUETO!
Aliás, hoje se pergunta para quê o julgamento de Eichmann. Nos anos 90, os multiculturalistas afirmaram que toda nação é comunidade imaginária, construída com base em mitos e ficções, entre as quais as respectivas literaturas nacionais. E se aplicássemos essa teorização a Israel, quais seriam seus mitos fundadores? Um deles seria a narrativa bíblica. O outro seria o fato histórico da Shoah interpretado de uma determinada maneira, daí a necessidade do julgamento de Eichmann, praticamente um dos atos fundadores.
Mas vamos refletindo. Enquanto isso, bem-vindo Ahmadinejad, viva a revolução islâmica!
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