quarta-feira, 25 de dezembro de 2013

A Carta Chinesa, uma luta atual: a batalha entre marxismo e revisionismo



                                                 Mao na visão de Andy Warhol


                      O livro A Carta Chinesa, formado por uma coletânea de textos, foi editado no Brasil pelo Núcleo de Estudos do Marxismo-Leninismo-Maoísmo. Editado pela Terra Gráfica (primeira edição, 2003) em Belo Horizonte, o livro é constituído por uma polêmica pública entre o Partido Comunista Chinês e o Partido Comunista da União Soviética. A divulgação desses textos não era interesse do PCB e sim do PC do B. O partido era ilegal e minoritário nos anos 60, quando essa polêmica aconteceu, produzindo, além de outros documentos ali reunidos, também a chamada Carta dos 25 Comentários e Nove Comentários Reunidos. Na fase seguinte, no tempo da ditadura, na difícil fase do pós-golpe de 64, que à ilegalidade se sucederam as torturas, prisões e assassinatos dos militantes, o partido teve pouco dinheiro para republicar esses textos. Igualmente, o atual PC do B não os reedita, por um simples motivo: rompeu com Mao Tsé Tung no final dos anos 70, aliando-se a Enver Hoxha. Igualmente, em 2003 parece ter tido pouca repercussão, mas pela sua forma de polêmica pública, o livro tem grande vivacidade e interesse. Há alguns deslizes, como o nome de Lukács errado no prólogo e o índice de textos que fica ao final e não no início. Fora que os conceitos expostos parecem demandar uma definição mais clara: “social-imperialismo” e “revisionismo” abrangem desde a URSS até os demais países do bloco soviético, incluindo Cuba, além de pensadores como Bernstein, Trotsky, Kautsky, Kruschev, Lukács, Gramsci e muitos outros. No entanto, é uma polêmica vibrante, intensa, muitíssimo atual: é a melhor explicação para a queda da URSS entre 1989-91, chegando até mesmo a ser profético em algumas passagens.
                     O texto, por outro lado, fornece uma hipótese muito melhor para a degeneração da União Soviética em ditadura da burguesia do que a hipótese aventada pelos trotsquistas, adotada pela maioria da academia e das organizações da esquerda, como o PSOL, PCO e PSTU.
                     O prólogo do livro foi turbinado, a meu ver, com as ideias do Pensamento Gonzalo (Abimael Guzmán), do Partido Comunista do Peru. A aplicação do pensamento de Gonzalo no Peru, segundo esse prólogo, a vigência universal do maoísmo e, embora sem vitória, considerou-o a terceira, nova e superior etapa da ideologia do proletariado: a sequência seria: Marx, Lenin, Mao e Gonzalo. A quarta espada seria Gonzalo.
                     De autoria do núcleo carioca do marxismo-leninismo-maoísmo, o prólogo é incisivo e tem observações muito boas: ele denuncia o trotsquismo da esquerda brasileira, assim como é duro em relação ao PC do B. A nota 3 do prólogo diz que: “hoje, o grupo de Amazonas critica severamente o finado socialismo albanês, assim como Stálin, enquanto coexiste pacificamente com o regime burocrático, semifeudal e semicolonial dominante no Brasil, sendo parte integrante da nova gerência de seu velho e podre estado.” Segundo esse prólogo, no Informe Político 6, quando das Resoluções do 8º Congresso do PC do B, A Direção de Stálin, pode-se ler: “nunca fomos stalinistas”. Igualmente, o prólogo considera revisionistas modernos: Kautsky, Browder, Trotsky, Tito, Kruschev, Hoxha e Teng Siao Ping. Os revisionistas contemporâneos seriam os falsos maoístas chineses da China atual, antirevisionistas de boca e capitulacionistas de fato.
                     Por outro lado, o prólogo exagera quando considera o período Brezhnev algo semelhante à “ordem fascista hitleriana” (p. 29). Quando ele fala do filho de Teng Siao Ping, ele também refere-se a ele como representante da “burguesia de Estado, capatazes do capital”. O termo burguesia de estado pareceu-me vago.
                     As divergências se iniciaram com o XX Congresso do PCUS. O partido chinês, ao criticar o XX Congresso do Partido Comunista da União Soviética e seus resultados, não aceitou em especial um ponto: a ideia da transição pacífica do capitalismo ao socialismo. Pelo simples motivo de que existe o exército burguês como espinha dorsal de sua sociedade e que não permite que essa transição aconteça, além do próprio aparelho estatal. E, a partir dessa divergência, outras se sucederam, com o partido chinês acusando o partido soviético de estar reintroduzindo o capitalismo e decapitando o movimento comunista internacional. Para tanto, Kruschev e os revisionistas atacaram tanto o partido soviético quanto os demais, utilizando o conceito de “luta contra o culto da personalidade”. Como é bastante difícil para os trabalhadores formar líderes temperados na luta, acusá-los de culto da personalidade  foi uma forma de provocar divisões entre líderes e as massas. Provocou também o renascimento do trotsquismo, ao considerar os anti-leninistas dos anos 30 inocentes. O livro A Carta Chinesa registra os trotsquistas fazendo até pedido de reabilitação de Trotsky ao partido soviético após o XX Congresso.
              Igualmente, Kruschev mantinha-se perigosamente isolado das massas, sem ter coragem de divulgar abertamente o seu “Relatório Kruschev”. Ao partir para a injúria, chamando Stálin de “tolo”, “bandido” e “assassino”, mostrou que tinha carência de ideias e que era muito fraco, pois o xingamento em política mostra apenas a fraqueza, a frouxidão e a carência de ideias e de argumentos por parte do debatedor.
                     Assim, pode-se definir que o revisionismo age da seguinte forma: revê a teoria e a história, “cortando” Stálin, mas de fato, seu alvo é Marx e Lênin, dos quais apresenta interpretações convenientes para a burguesia e a sociedade capitalista. A partir do abandono do leninismo, a restauração do capitalismo trouxe o pan-eslavismo, o chauvinismo de grande nação, assim como a destruição cada vez maior dos resíduos do poder soviético, tarefa completada entre 1985-91 por Gorbachev.
                     O partido comunista chinês muito bem pontuou que não há, como pretendia Kruschev (e que depois Gorbachev entusiasticamente continuou) a coexistência pacífica com o imperialismo. Igualmente, transformar a ditadura do proletariado em “estado de todo o povo” era transformar o estado proletário em estado burguês, pois todo estado burguês sempre fala em “cidade de todos”, assim como fala, atualmente, o PT, em “Brasil de todos”.
                     A parte mais atual do livro A Carta Chinesa é quando ele critica a Iugoslávia de Tito, que praticamente fornece, enquanto ponta de lança do revisionismo, teorias que são ainda extremamente bem sucedidas no Brasil e hegemônicas atualmente entre a esquerda, fazendo furor nas universidades, movimentos, partidos e organizações: a “autogestão”, “auto-administração operária” são ideias que foram utilizadas com enorme sucesso para fazer a restauração pacífica do capitalismo em países socialistas, eficazes na substituição da economia coletiva por pequenas empresas “autogeridas”. Os tais conselhos não passavam de uma farsa: a camarilha de Tito controlava os conselhos ao nomear seus diretores. Tito também apoiou intensamente a implantação desse caminho na Hungria em 56. Não por acaso, no Brasil e no mundo a mídia divulga intensamente Mészaros e Zizek, respectivamente, um húngaro e um esloveno que sistematizam o revisionismo. Os revisionistas iugoslavos criticam o partido, transformando-o numa Liga. Igualmente, Zizek combate a ideia leninista de que a ideologia do proletariado tem que ser importada do partido, do contrário o proletariado desenvolve apenas ideias social-democratas. Para ele, isso causa a ditadura do partido sobre o proletariado. O foco dos revisionistas é na economia, deixando de lado o partido e projeto político concreto, caindo num economicismo. Isso é bastante visível em Mészaros. O partido comunista chinês teoriza que a política é a economia sintetizada. Apenas por esse capítulo desvendando a farsa da Iugoslávia “socialista” e suas teorias até hoje muito disseminadas, senão hegemônicas, o livro já vale ser adquirido.


                                                      Mao em imagem do blog de Quibia Gaytán

segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

Professor Furr escreve carta para Yoani Sanchez

Dear Ms Sanchez: Someone on Facebook forwarded this Huffington Post review of yours to me.http://www.huffingtonpost.com/.../join-silence-kill... I don't know much about Cuba or Fidel Castro. But I know a lot about Stalin and the Soviet Union during his time. I have not read Padura's book. So I'm responding not to the book but to what you write in your review. You write: "No one can remain calm after reading of the horrors of a Soviet Union we were made to venerate as children. The intrigues, purges, assassinations, forced exiles, even though read in the third person, would rob anyone of their sleep. And if, on top of this, we watched our parents believe that the Kremlin was the guidebook for the world proletariat, and knew that the president of our country, until recently, kept a photo of Stalin in his own office, then the insomnia becomes more persistent. Of all the books published on this Island, I dare say that none have been as devastating to the pillars of the system as this one. I have spent many years, and the last 9 years pretty much full-time, researching the Stalin period and the "horrors" and "crimes" that are widely accepted as historical facts. What I have found is this: They are all, without exception, false. I have made a special point of researching fact-claims about "crimes" of Stalin, and of the USSR during his time. Not a one of them is backed up by evidence. This tidal wave of lies did not begin with Leon Trotsky. But Trotsky added a lot of his own falsehoods, and his writings became well-known. Nikita Khrushchev and his supporters began the great avalanche of lies about the USSR. These stopped when Khrushchev was ousted in October 1964, but Mikhail Gorbachev picked them up again and added yet more falsehoods about the Stalin years. I have given a lot of talks about the Stalin years in the USSR. In all of them, at some point, I say (paraphrasing Weird Al Yankovich): "Everything you think you know about the history of the Soviet Union during Stalin's time -- is wrong." Trotsky himself was involved in underground terrorist groups inside the USSR in the 1930s. His people were allied with those who murdered Sergei Kirov, head of the Communist Party in Leningrad, in 1934. There's a lot of evidence that Trotsky was indeed conspiring with Germany and Japan against the Soviet Union. If you are going to evaluate whether Trotsky should have been assassinated or not, you need to take these matters into account. * * * * * Finally: you should not take history from a novel. Novelists can write whatever they want to write. I assume that Mr Padura has done this. Do not take it as fact. You can read all of my research (much of it done with my Moscow colleague Vladimir Bobrov) on my Home Page:http://www.tinyurl.com/grover-furr-research You can't read my books there. But they are easily obtainable, should you be interested. Bottom line: I began yeas ago, quite ready to find that Stalin was the monster that Khrushchev, then Gorbachev, and now all the anticommunists and Trotskyist said, and still say, that he was. My research has shown: This is all false. None of it is true. I have yet to find one single "crime" by Stalin Yes! That's how bad it is. I think you should know this. Sincerely, Grover Furr Montclair State University Montclair NJ 07043

quinta-feira, 21 de novembro de 2013

Estudantes da UFRRJ protestam contra Ghiraldelli: eu apoio!


Cognominado por mim, nesse Revista Cidade Sol, de "Ron Jeremy da Filosofia Brasileira", Paulo Ghiraldelli Júnior foi objeto de protesto de estudantes contra comentários racistas e homofóbicos supostamente feitos por ele. Ghiraldelli já foi objeto de uma postagem de Luís Nassif, O caso do filósofo Paulo Ghiraldelli, tratando justamente do comportamento agressivo do filósofo, que infelizmente, deturpa a imagem da categoria, pois, embora tenha muitos livros publicados, adota, através da internet principalmente, atitudes estranhas e autoritárias, não praticando o que prega Paulo Freire, de quem diz ter sido aluno. No youtube, o vídeo estava postado em várias contas, uma delas, a de Lívia Miguel, continha um texto esclarecedor:

No dia 18 de novembro de 2013, enquanto ocorreu a abertura da I Semana Acadêmica de Filosofia, grupos organizados e estudantes da UFRRJ, escracharam o Professor Paulo Ghiraldelli. A intervenção foi decisiva, incidimos contra o discurso opressor, homofóbico, racista, machista e misógino do professor, que se naturaliza e se reproduz cotidianamente tanto em suas aulas como em sua produção acadêmica. A reação negativa ao ato por parte de alguns estudantes é a expressão disso, mesmo o ato sendo legítimo, uma vez que os recursos institucionais tem se mostrado insuficientes.
Processos administrativos contra o professor se acumulam nas gavetas silenciosas da administração superior. Aceitar esse silencio é acertar a morte, a morte de um projeto de uma universidade crítica e popular. Por isso, nos manifestamos, gritamos, batemos latas e acusamos as atitudes do professor. Exigimos da administração superior, uma atitude justa ao discurso de ódio alimentado pelo referido professor. O corporativismo que sustenta ele imune aos processos tem que cair, nós o acusamos!
Por fim, a "grande mentira", como foi revelada; é o professor, vulgo filósofo, Paulo Ghiraldelli.

Dou todo meu apoio aos alunos! Como se pode ver pelo vídeo, Ghiraldelli reagiu gritando: "é mentira, é mentira". No entanto, infelizmente, ele tem adotado, na internet, um comportamento de troll, ou seja, um comentarista agressivo e que maltrata verbalmente as pessoas. Há algum tempo, episódio parecido aconteceu no departamento de Sociologia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), também envolvendo comentários machistas de um professor chamado Francisco Coelho dos Santos.

 Segundo a matéria em O Globo, Ghiraldellli a seguir deu queixa na polícia. Circula, pela web, também uma petição (provavelmente lançada por ele) para criminalizar o protesto, tido por ele como atentado à liberdade de expressão. Em seu blog, chamou os manifestantes de "nazistóides" e "energúmenos".


domingo, 10 de novembro de 2013

Pondé, o uso do cachimbo faz a boca torta

Leio com perplexidade o artigo "Eu Acuso", de Luiz Filipe Pondé na Folha de São Paulo. Ele alega estar ocorrendo doutrinação ideológica em nossas universidades, inclusive no ENEM, Exame Nacional do Ensino Médio. 

Será que isso existe mesmo? Afinal, uma denúncia recente, em junho, mostrou a infiltração dos integralistas nas manifestações, batendo e agredindo militantes como os do PSTU. Um dos participantes, responsável pela parte da agitação, era Marcelo Coaradassi Eiras, professor universitário, se não me engano, da UFRJ.


Será que alguém como Pondé, acostumado a fantasiar a realidade para combater o PT, acredita mesmo nisso? Só por estar num jornal, julga ser "não-partidário", neutro. Como ele mesmo é judeu (ele usa Shylock, personagem de Shakespeare, com símbolo dessa minoria), sua grande suposição é a seguinte: não é importante se alguém é ou não fascista, desde que não tome partido contra os judeus e combata a esquerda, em especial o PT.


Observando a prova do ENEM, nota-se a ausência da blogosfera petista e a presença ostensiva da grande mídia. A questão 05 é tirada da Rádio Uol. Uol, comunismo on line! A questão 07 é tirada da Folha. Opa, Folha? É onde Pondé trabalha. Ora, claro, lá dentro mesmo há "bolcheviques travecos" como o cartunista Laerte, contra os quais Pondé bravamente ergue sua clava. Observando outras questões, há outros perigosos ninhos de comunista: Abril Cultural, por exemplo, antro de conspiração do judeu-bolchevique Victor Civita. Há outros judeu-bolcheviques. O entusiasta do gayzismo e do marxismo cultural Carlos Lessa pondera, na questão 20 (seria um código para não colocar 24?): "apoiar uma empresa produtiva que gere emprego é muito mais barato e gera muito mais do que apoiar a reforma agrária". Mas é claro, por trás dessa frase, que até Pondé assinaria, com certeza há um dos grandes agentes da conspiração gramsciana internacional.

Enfim, professor Pondé, continue nessa luta! Os malditos comunas tremerão! Só não pense que está sozinho. Há muita gente "integral" lutando junto a você, mesmo dentro das universidades. Veja a foto abaixo:



                                          Anauê, Pondé! O professor Marcelo te saúda!

quinta-feira, 31 de outubro de 2013

Paródia de Zizek: a dança pervertida


O comediante Klemen Slakonja publicou uma paródia genial do filósofo Slajov Zizek no youtube no dia 18 de outubro passado.

A música e o clipe encenam tanto uma piada que Zizek disse, intitulada "Cortar o Saco" quanto outras de suas análises, como quando compara vegetarianos a macacos e analisa o Kung Fu Panda.  O comediante esloveno também imita seu sotaque e seus tiques nervosos. A piada que gerou a música é a seguinte: Zizek conta que, durante as invasões mongóis, um guerreiro mongol encontrou um casal camponês e disse: "irei estuprar sua mulher e você irá segurar meu saco para que ele não suje". Depois desse monstruoso estupro, o camponês ria e a mulher perguntou: "como você pode rir, fui estuprada monstruosamente". E o camponês disse: "Mas ele ficou com as bolas sujas".

Zizek diz que os dissidentes no Leste Europeu contavam essa piada para mostrar o que deveriam fazer: não somente ficar "enchendo o saco" dos governantes, mas sim cortar seu saco fora. Assim, "Cut the Balls" é o nome dessa hilária paródia, que eu não me canso de ver.

A letra está disponível num blog sobre filosofia na Costa Rica:




The Perverted Dance (Cut The Balls)
(K.Slakonja/K.Slakonja/M.Bezjak)


What's up with this music?!

I am a philosopher, I like to provoke,
we live in perverted times,
so let me tell you a perverted joke!

A famous, dirty, horrible joke,
taking place in 15th century Russia.
A farmer and his wife walk along a dusty country road.
A Mongol warrior on a horse stops and says
"I'm gonna rape your wife and you should hold my testicles,
while I rape your wife, so that they will not get dusty."
When he raped his wife, the Mongol warrior went away,
the farmer started to laugh and jump with joy, his wife said
"Hey, how can you be happy?! I was just brutally raped!
And he says: "But I got him. His balls are full of dust."

Well, in reality we only dirty with dust the balls of those in power.
And now comes the dirty conclusion - the point is to cut them off!

Now let me warn you - this isn't Macarena, not Chicken dance,
not Aserejé, not Gangnam style and so on and so on.

We stand no chance, there's no time for romance,
it's time to dance The Perverted Dance!

Cut the balls,
we need to cut the balls,
we need to cut the balls,
the balls of those in power!
We need to cut the balls
and our faces won't be sour!
Just cut the balls,
make them become Niagara falls.

Cut the balls,
we need to cut the balls,
we need to cut the balls,
the balls of those in power!
We need to cut the balls,
we can train with cauliflower!
Just cut the balls,
make them become Niagara falls.

Oh, my god, why am i doing this?! Singing, dancing?!
I feel like that disgusting guy from Canada, Justin Bieber...

So, the problem with capitalism is that it's in the crisis from its very beginning.
From somewhere, I would say, late 18th century, there are prophets who claim capitalism is nearing its end.
It's like that stupid bird Fenix, the more you, you know, it returns.
I got hungry, let's grab something to eat!
What?! No meat?! Only for vegeterians ?!
Degenerates, degenaretes, they'll all soon turn into monkeys.

I dont say let's do nothing,
I say sometimes doing nothing is the most violent thing to do.
So cut the balls, just cut the balls!
And racism is also a problem,
so be like Kung Fu Panda - be white, black, asian
and cut the balls, just cut the balls!
They call me The Borat of Philosophy,
The Marx Brother and The Elvis of cultural theory.
Cut the crap and cut the balls, just cut the balls!

Hey, I am Slavoj Žižek!
No, I am Slavoj Žižek!
No, I am Slavoj Žižek,
Fuck that, whatever, let's all be Slavoj Žižek!

Grab and pull the imaginary balls from the sky,
cut through the air and say bye, bye, bye.
Let's join together, let's fall in trance,
let's dance The Perverted Dance!

Cut the balls,
we need to cut the balls,
we need to cut the balls,
the balls of those in power!
We need to cut the balls.
and then take the bloody shower!
Just cut the balls,
make them become Niagara falls!

Cut the balls,
we need to cut the balls,
we need to cut the balls,
the balls of those in power!
We need to cut the balls,
let them face the final hour!
just cut the balls,
make them become Niagara falls!

Cut the balls,
we need to cut the balls,
we need to cut the balls,
the balls of those in power!
We need to cut the balls,
we need to cut the balls!
Just cut the balls,
make them become Niagara falls!

This stupid repetative mechanic music!
Stop it!

Thank you, thank you very much!

The problem is maybe not the big act "Cut the balls",
but you make small changes and all of a sudden, balls are no longer there.
Those in power look down and say "Oh, where are my balls?"
and suddenly their voices get higher and so on and so on.
I stand by my joke. The structure of the joke is that this so called progressive intelectual,
in order to score his small narcicistic point, oh, I dusted the balls,
totally ignores the suffering there and that's the whole point of the joke.
So cut the balls, we need to cut the balls!

Music: Klemen Slakonja
Lyrics: Klemen Slakonja
Arrangement: Martin Bezjak
Music production: Martin Bezjak



Screenwriter: Klemen Slakonja
Director: Nikolaj Vodošek
Editing: Mitja Mitruševski
Video production: Mediaspot
Makeup artist: Luka Luka Simšič
Costume designer: Mateja Benedetti

Starring: Klemen Slakonja as Slavoj Žižek, Tara Zupančič as farmer's wife, Goran Hrvaćanin as farmer, Mario Ćulibrk as the Mongol warrior on a horse, Kung Fu Panda, dancers, sea lion, monkeys



segunda-feira, 28 de outubro de 2013

Tinhorão é mutilado por Caetano e Gil




O título dessa notinha é apenas uma ironia a respeito de como uma adaptação pode alterar o sentido de um texto ou frase.  A questão 106 do Caderno Rosa do ENEM fez uma curiosa adaptação de José Ramos Tinhorão, tanto que merece nota. Ela distorceu o pensamento do crítico a favor de Caetano e Gil. Observe o texto da questão:


Mesmo tendo a trajetória do movimento interrompida com a prisão de dois de seus líderes, o tropicalismo não deixou de cumprir seu papel de vanguarda na música popular brasileira. A partir da década de 70 do século passado, em lugar do produto musical de exportação de nível internacional prometido pelos baianos com a "retomada da linha evolutiva", instituiu-se nos meios de comunicação e na indústria do lazer uma nova era musical (J. R. Tinhorão. Pequena História da Música Popular da modinha ao tropicalismo. São Paulo: Art, 1986 (adaptado).


A seguir, veja como o gume do crítico foi amansado em favor de Caetano e Gil, evidente no texto original:



(...) o tropicalismo (...) não deixou de cumprir seu papel de vanguarda do governo de 1964 na área da música popular: rompidas as resistências da parte politicamente consciente da classe média universitária, que tentava a defesa de uma música de matrizes brasileiras, as guitarras do som universal puderam completar sua ocupação do mercado brasileiro. E assim, a partir da década de 70, em lugar do produto musical de exportação prometido pelos baianos com a ‘retomada da linha evolutiva’, instalou-se nos meios de comunicação e da indústria do lazer, definitivamente, a era do rock. O qual, aliás, muito tropicalisticamente, o espírito satisfeito dos colonizados passaria a chamar, a partir da década de 1980, de rock brasileiro (Tinhorão, 1986: 267).

quarta-feira, 16 de outubro de 2013

Lobão: um percurso patafísico de nosso tempo

O Manifesto do Nada na Terra do Nunca é o percurso patafísico de Lobão. Só com o conhecimento das verdades absurdas e ridículas pode-se explicar algo tão "psicodélico" e "esquizofrênico". Só a patafísica pode explicar um texto daqueles. Ele escreveu um ensaio cheio de pretensões acadêmicas. Lobão cita fontes, mas deixa subentendido que leu e acompanha as polêmicas da direita: o artigo de Walter Navarro em O Tempo, debochando do genocídio dos Guarani-Kaiowá (o que Lobão também faz); os ataques do "filósofo" Pondé ao cartunista Laerte, a quem chamou indiretamente, de "frouxo" e "traveco bolchevique". E, finalmente, a metafísica fascista de Olavo de Carvalho em seu Imbecil Coletivo.
 Em sua transmutação da esquerda festiva para o anarcocapitalismo, Lobão parece ter feito uma recuperação da fina flor do pensamento de direita, que ele mistura a delírios paranoicos a respeito de comunistas. Velhos tempos em que quem o perseguia eram as canções de Herbert Vianna!
 Assim, "o carola estatizado" de Olavo de Carvalho encontra um equivalente em seu "Imbecil Coletivo". Sobrenadam também, nessa geléia geral com cocaína, Nelson Rodrigues e Paulo Francis elevados a sacerdotes de ideologia. Outro elemento presente é a reescrita da história de um ponto de vista de extrema-direita fascista, ao estilo de Leandro Narloch.  Por fim, ele resolve criticar Oswald de Andrade, cobrando dele lógica, racionalidade, eficiência e ética do trabalho, como um bom colunista de Veja faria. Lobão acusa Oswald de Andrade ao mesmo tempo de nacionalismo ressentido e copiador de tudo que é estrangeiro. Preso por uso de drogas, ele cobra racionalidade da prosa brilhante de Oswald (que profetizou a contracultura) e pensa que isso é original, mas não cobra esse mesmo racionalismo de sua interpretação da história. Quando é que Fidel Castro condecorou John Lennon, como escreve Lobão? Oswald de Andrade provavelmente riria muito de um roqueiro que defende a mãe dos Gracos, Cornélia, mas que vive contando que a mulher o enganou, entrando à sua revelia na Lei Roaunet!
 As análises de Lobão submetem toda a história da humanidade a seu ego mimado. Para entender o próprio percurso de forma não-patafísica seriam necessários conceitos como indústria cultural e o capitalismo, conceitos que faltam totalmente a esse niilista que chafurda na decadência ideológica da burguesia e no irracionalismo. O objetivo de toda essa fúria lupina é apenas tentar reassumir um protagonismo na indústria cultural que, devido ao corpo que não serve mais de modelo de roupas, é impossível de ser resgatado.
 O grande tema que subjaz a seus livros é outro, não dito: a decadência deselegante e o apodrecimento ideológico de um popstar pretensamente intelectual do terceiro mundo. Lobão virou o nosso Bob Roberts, o roqueiro retrógrado do filme de Tim Robbins. 




                                                                                           Bob Roberts, o cantor de folk-rock reacionário

segunda-feira, 14 de outubro de 2013

Um Espectro ronda Constantino e João Victor Gasparino: o "Marxismo Cultural"




A imagem acima explica, mais do que uma análise de suas tolices, o texto do estudante da UNIVALI, João Victor Gasparino, que recusou-se a escrever um trabalho universitário sobre Marx, vomitando, em uma carta, o velho xingatório ideológico e, a partir do terceiro parágrafo, os inevitáveis chavões da Guerra Fria. E ainda teve o apoio do colunista da Veja, Rodrigo Constantino, que publicou-no em seu blog no site da revista.

Há algum tempo Cristiano Alves publicou em seu site um texto sobre O que as vítimas do comunismo tinham em suas mentes e corpos. De fato, essa montagem acima é semelhante, é bem ilustrativa sociologicamente do pensamento de João Victorino e Rodrigo Constantino. Ela ilustra como a extrema-direita hoje vê a esquerda.  Em primeiro plano, como cães ameaçadores manipulados, por trás, por Marx-Satã-Maçom, estão os seus inimigos ferozes, os representantes dos movimentos de direitos civis: feministas, gays, intelectuais ateus, negros e defensores da legalização das drogas.

Em segundo plano estão os pequenos vampiros que inspiram as agressivas minorias: Stálin, Gramsci, Hitler, Leonardo Boff e Marta Suplicy. Uma cabeça de vampiro maior, sorridente e em destaque é a do ex-presidente Lula, figura detestada por essa extrema-direita.

Assim, a extrema-direita faz uma ligação que na vida real é um tanto quanto ilusória: os comunistas e os modernos movimentos de direitos civis. A verdadeira inspiração desses movimentos são as classes médias da Europa e dos Estados Unidos, ou seja, dos países avançados. Como o Brasil é um país que vai atrás, colonial e dependente, não há como a nossa classe média não sofrer essa influência e não abrir algum espaço de mídia para esses movimentos.

Igualmente, essa extrema-direita não pode esclarecer que o PT, Lula e Boff estão à direita hoje em dia. Lula e Marta estão com o PT, Boff com Marina, etc. Dizer isso seria danoso para essa extrema-direita, pois sua posição ficaria evidente. Seu maior truque é o disfarce de, a partir de um meio de comunicação supostamente neutro, assumir-se como narrativa "natural", voz "da verdade", das massas, do cidadão comum.

O PT no poder irrita profundamente essa extrema-direita, que não pode, sem prejuízo para ela mesma, dizer a verdade sobre seus adversários. Outro fator é que a crise acentuou suas dificuldades. Ela, que, baseada em Von Mises, Hayek e outros ideólogos anarco-capitalistas, alega não querer depender do estado, passa a precisar justamente de apoio do estado para fechar suas contas. Com a maior parte da burguesia apoiando PT e PMDB, ela não tem ilusão de poder ganhar eleições com seus representantes.

Essa mídia de direita está desesperada, pois está e estará mais e mais no colo do odiado PT. Em breve terá que adotar uma linha mais mansa, tirando alguns cães raivosos como aconteceu com Diogo Mainardi, que, depois de um tempo na Europa, possivelmente para evitar ser preso, depois de ter tido o nome citado na operação Satyagraha (Mainardi supostamente plantava notícias para o banqueiro Daniel Dantas), retornou
como escritor ao estilo de Marcelo Rubens Paiva e Cristovão Tezza, fazendo um "testemunho" biográfico. Seus representantes, assim como os da Folha, são obrigados a me ligar pedindo para que eu assine essa porcaria, insistentemente, loucamente. Eu sempre os aborreço propondo assinatura em troca da cabeça ora de Reinaldo Azevedo, ora de Pondé. Agora vou pedir a de Constantino.

A frase que está ao centro da imagem é um pensamento de Paulo Francis, cronista cultural que serve a essa extrema-direita de ideólogo (articulou essa imagem e esse pensamento em seus últimos anos de vida). Ex-esquerdista, a frase simplesmente propõe que o Brasil vive o domínio da loucura, que é governado por loucos, pessoas fora da razão. Isso justifica que se utilize, então, do irracionalismo para combatê-los. Como dialogar com loucos, senão participando da loucura? O uso de Francis é uma busca de uma tradição nobre, uma busca de credibilidade bastante notável na frase em latim que "assina" a imagem e dá a ideia de que ela é de autoria de vários autores, uma possível organização que quer se manter anônima (porque obviamente sabe que precisa se utilizar de mentiras e teme responsabilização judicial).

A direita absorve com dificuldade a ideia de que existe uma outra esquerda que não o PT. Paranoicamente, associa todas as vertentes da esquerda numa só grande conspiração e a atribui, no seu modo de pensar primário, às ações do diabo. Paulo Francis e eles, invisíveis em sua representação, estariam ocultos, são o ponto de vista de quem vê essa cena infernal e, supostamente, estão com Deus e devem ser anjos falando em latim. O diabo usa símbolos maçônicos e comunistas, além de bandeiras de partidos e organizações de esquerda, independente se oposicionista ou não (até mesmo o PSOL entrou). Na Europa de meados do século passado, o diabo era sempre um judeu de nariz grande ou um intelectual com um ar idiota, ou seja, um ser manipulado pelo diabo.

A carta de João Victorino não está escrita em estilo acadêmico, embora se arrogue a argumentar nesse sentido. Não tem fontes, nem referências bibliográficas, não faz citações. E ele faz uma citação falsa, inventada, de um Decálogo atribuído a Lênin. Ele leva ao professor uma das piores pragas da internet, o texto de autoria falsa, como fazem com Shakespeare, atribuindo-lhe textos de Veronica Shoffstall, etc.

O rapaz não sabe ABNT, ignora as normas técnicas. O professor deveria ter lhe dado zero. Ele demonstrou preguiça e desejo de confrontar não só o professor, mas própria a universidade (ele, como aluno, matriculou-se numa disciplina que já tinha uma determinada ementa). Foi ele próprio quem optou por estudar Marx ao matricular-se nessa disciplina. Não foi imposição do estado e nem doutrinação ideológica esquerdista.

 E sim, magister dixit, sou eu, Lúcio Emílio do Espírito Santo Júnior, mestre em Estudos Literários pela UFMG, quem afirma isso: o aluno deveria, para poder obter nota, ter apresentado de forma honesta o pensamento de Marx. Poderia, em seguida, combatê-lo, desde que citasse Olavo de Carvalho, que parece ser a sua única fonte. Ele é desonesto mesmo em relação a Olavo. Mesmo assim, deve ser citado, acaso utilizado. Esse argumento de que "eu estive no Cambodja" não vale em trabalhos acadêmicos. A partir do terceiro parágrafo, ele já começa a falar nas experiências socialistas, não em Marx. Ora..."odeia Marx e tudo o que ele representa". Bom, Fernando Henrique e o ex-colunista da Veja José Arthur Gianotti também estudaram Marx e têm prestígio e autoridade associados a ele (outro dia o professor Bertone Sousa incensou Gianotti como autoridade sobre Marx em uma postagem). Eles são tucanos. Então João Victorino odeia os tucanos e colunistas da Veja, assim como tudo o que representam?








terça-feira, 17 de setembro de 2013

O Festival de Besteira de Bertone: Uma Cartola na Senegâmbia


No blog do Bertone Sousa, o Febeapá continua:

De fato, o Holocausto foi produzido de forma planejada pelos mentores de uma ideologia racista, como os campos de concentração nazista em muitos casos foram mais brutais que os soviéticos, mas as vítimas do comunismo, embora não fossem oriundas apenas de uma classe ou etnia, foram muito maiores do que as do nazismo, até porque o sistema comunista durou muito mais tempo e alcançou uma expansão territorial maior. É preciso compreender as raízes disso na doutrina do centralismo democrático de Lênin, que, como diz o Bauman, transformou a subserviência e o servilismo em virtudes. 

 Um pouco antes, no mesmo texto, Bertone insistia no Holodomor, que seria o genocídio intencional de uma etnia, os ucranianos. Pelo menos, essa é a hipótese que pela web se apresenta. Um artigo argumentado, com dados, mostrando que em outras regiões da URSS existiu fome nessa época, assim como colheitas ruins redundaram em fomes periódicas não servem para convencê-lo. Mas ele "sabe tudo", é uma Cartola na Senegâmbia. Depois que foi citado num vídeo de Olavo de Carvalho, o homem está impossível.

Para ele, o comunismo fez mais "vítimas" do que o nazismo. Mas isso, para ele, adviria do centralismo democrático. Ele não sabe o que está dizendo. Centralismo democrático é um princípio organizativo. O partido discute e vota uma decisão. Aprovada essa decisão, a minoria derrotada é obrigada a segui-la, podendo sofrer pena de expulsão. Claro que esse princípio pode ser mal  utilizado.

Mas o que isso tem a ver com servilismo e subserviência? Só uma mente individualista ao extremo, tosca e refratária a todo tipo de autoridade poderia fazer esse tipo de associação!

E ainda cita Bauman como autor dessa pérola! Que tolice. Bauman pode até ter conceitos úteis (e como sempre, midiáticos) como modernidade líquida. Mas entra também nuns devaneios que são pura besteira, falando em "governo mundial", em geral sob a batuta dos Luiz Filipe Pondé da vida. "Governo mundial", só com o imperialismo, ou seja, o atual sistema político, econômico e social morto e enterrado.

Zizek e os marxianos são até interessantes, mas quando Zizek diz que "as experiências socialistas deram em catástrofes", para mim ele está simplesmente dizendo que não é marxista. Como advogar uma teoria que deu em catástrofe? Então está totalmente errada.








segunda-feira, 16 de setembro de 2013

Sobre Grover Furr

No blog do doido do Conde, participa um tal de Ignácio responsabilizando Stálin pelo fim da alternativa honesta ao socialismo.

Equívoco: o fim da alternativa cabe a Gorbachev, o estadista-desastre. Stálin é que temos que estudar para poder saber da alternativa socialista.

Grover Furr é apresentado, também, como um "comunista". Ora...Furr diverge do leninismo. Na entrevista que mandou para Glauber Ataíde, explica que o leninismo foi o caminho entre o capitalismo e o capitalismo (no entender dele). E que China, Vietnã e Cuba seriam países capitalistas que usam uma fina máscara, hiper-exploradores. Argumentando com ele, ele me disse, citando Crítica do Programa de Gotha, que os trabalhadores precisariam estar vivendo bem para caracterizar um socialismo.

Algumas Notas sobre Hobsbabwn e Zizek

Leio ainda algumas continuações da polêmica no blog do Conde e no blog do Bertone. No entanto, não considero interessantes as colocações desses intelectuais. Bertone repete tiradas panfletárias, como "o comunismo está morto", "só um mau caráter defenderia Stálin", etc. O Conde também me dá tédio. Alguém se chama "Zé das Linguiças" e se renomeia na web como nobre, com cabeça colonizada, como "Conde" sei lá das quantas. Ridículo.

Só um colonizado poderia chamar a brava luta do povo da Coreia pela libertação da brutal colonização japonesa de encontro de "nacionalismo e totalitarismo", como faz Bertone. Não seja bobo, meu caro, os coreanos sofriam de fome, comendo raízes e plantas, uma vez que desde 1910 os japoneses tomavam as terras dos coreanos e os obrigavam à semiescravidão.

Basta olhar um artigo muito bem argumentado como o de Mark Tauger, nessa minha última postagem para a o Felipe, para notar o alto nível da pesquisa nos países desenvolvidos, onde há pesquisadores efetivamente comprometidos com a verdade, intelectuais efetivamente objetivos. Aqui no Brasil, infelizmente, colonizados vomitam clichês da Guerra Fria.

Só um fascista poderia chamar Hobsbawn de "stalinista". Hobsbawn, como mostrou Cristiano Alves num artigo, combate Stálin e o calunia, difama. E quem é antistalinista costuma ser também russofóbico, como muito bem observa ele. Isso fica confirmado nos linques de Bertone, falando que a "alma russa gosta de sofrer". Ora...gosta de sofrer? Que bom argumento! Com ele pode-se apoiar até uma invasão nazista, não é?

Zizek e Hobsbawn são marxianos, ou seja, intelectuais que cultuam Marx, tirando dele tudo o que é revolucionário. Não é à toa que Zizek é esloveno. Na Iugoslávia vicejou um tipo especialmente danoso de revisionismo no Pós-Segunda Guerra, esse tipo de revisionista que fala em "autogestão" e que é altamente disseminado nas universidades, adquirindo sua alta expressão em Lukács (o iniciador dessa vertente, que começou a falar em comunismo de conselhos e espontaneísmo já nos anos 20), Mészaros e Zizek. O centro de seu argumento é que Stálin e Mao seriam pouco radicais, pois deveriam ter "ido além do capital". Eles seriam, então, mais radicais que Stálin e Mao, o que é puro truque e diversionismo. Esse revisionismo é especialmente disseminado nas universidades e na militância brasileira. É muito difícil um militante ou professor universitário que não fale em "autogestão" como solução para tudo.

Como lembrou Glauber Rocha, no Brasil mesmo os  intelectuais são colonizados pela ideologia norte-americana. E o que se nota é que os revisionistas são vistos como revolucionários.









domingo, 15 de setembro de 2013

Resposta ao Felipe sobre as críticas de Tauger


 O Felipe, de Petrópolis, leitor do blog, indaga  sobre as críticas de Tauger aos soviéticos.
 O artigo de Tauger do qual estou falando está aqui

Ele fala de causas organizacionais, políticas e econômicas para a má colheita de 1932. A argumentação dele não nega a fome (os suprimentos priorizavam a cidade e não o campo) e nem os problemas tais como a requisição das colheitas por parte das autoridades. A fome apenas se estendeu da cidade para o campo. A exportação de grãos para o exterior, que mesmo se fosse terminantemente proibida não teria evitado a fome, era um problema que ele também discutiu. Ela era, no entanto, um problema tão grave que, em anos anteriores, foi preciso entregar de volta a colheita aos produtores e não exportá-la para evitar que passassem fome.

A presença da fome e da baixa produtividade dos trabalhos dela resultante reforçou a oposição à liderança de Stálin. Passou a existir, no politburo, uma maioria contra as políticas de Stálin, fator que gerou a plataforma de Riutin e outras plataformas de oposição.

Membros do partido e da administração se opuseram aos racionamentos e requisições de grãos. Para evitar essa forte oposição às suas políticas, o regime teve que fazer expurgos no Cáucaso e no norte da Ucrânia e, no ano seguinte (1933) estendeu esse expurgo a toda a União Soviética.

 No último parágrafo ele comenta que, embora a baixa colheita de 1932 tenha sido uma atenuante, ele ainda escreve que as privações e sofrimento das populações no início dos anos 30 eram responsabilidade do regime soviético (elas aconteceram também em outras regiões soviéticas, russas inclusive, o que descarta a hipótese do tal genocídio ucraniano). A fome teria sido resultado de uma política econômica fracassada, a "revolução a partir de cima". As consequências da coletivização e da industrialização forçada foram piores do que geralmente é assumido. Mas para ele, a hipótese do genocídio está descartada, a má colheita de 1932 fez a fome inevitável. Porém, ele não verifica intencionalidade nas mortes por fome então ocorridas.

sexta-feira, 13 de setembro de 2013

Um "Conde" maluco me ataca

Estou sendo atacado por um tal "conde". O blog dele é esse. O nível é fraco e provavelmente estou falando com um pseudônimo.

Ou você é nobre francês? Loppeux...a nobreza francesa acabou depois da revolução. Os que existem têm os títulos dados por Napoleão. Ou seja: são burgueses que compraram títulos, etc.

O Cristiano já me advertiu a seu respeito e eu já vi alguns de seus vídeos.  É sempre escatologia pura. Você foi até educado comigo, no entanto. Eu sabia que debater com você daria nisso, por isso fiz uma piada. Eu peço desculpas pela piada e te digo que, pelo menos, você, pelo menos foi honesto e transcreveu a postagem usando argumentos.

Vejo seu aperto ao dizer que Mark Tauger é um "radicalzinho de esquerda numa universidade biboca dos USA". Ora...USA tem muita universidade biboca? Não, ele é um grande especialista em fome. E ele faz inúmeras críticas aos soviéticos. A diferença dele com você é que ele está interessado na verdade.

Você, que poderia buscar argumentos mais refinados contra o comunismo, como por exemplo comparar com o messianismo judaico, etc, prefere o tipo mais barato de anticomunismo, que é falar dos milhões de mortes, etc.

Pois então! Os próprios historiadores norte-americanos estão desmentindo essas mentiras da qual você tira seu sustento, para seu desespero! Você vai ter que estudar mais e arrumar melhores argumentos.

Conquest não nada genial, ele, segundo Furr, pega toda e qualquer fonte anticomunista, mesmo a mais desprezível e a mais torpe. Ele acaba, então, com a credibilidade dele enquanto historiador. A obra de Conquest, mesmo desmentida, ainda assim merece o aval de Anne Applebaum. Applebaum e Montefiori também são politizados, são ligados ao sionismo, se é que Bertone não sabe. E ele gosta também de Arendt, outra que faz coisas nessa linha...

Mas ele nunca chega ao baixo nível de seu amigo Olavo de Carvalho. Olavo pode até fazer algo interessante a respeito de Aristóteles (mas eu não acho nada demais naquele papo dos quatro discursos, ele exagera, como sempre, não tem importância, não), que vociferando clerical-fascismos jamais será lido e respeitado. E ele mesmo sabe disso e confessou, no bate-papo com Lobão, que exceto dois alunos, ninguém lê seus livros de filosofia. Coitado! Será que você lê, Conde?

E Hitler não chegou ao poder pelo voto. Ele não obteve maioria. Daí, foi indicado por Luddendorf e pela social-democracia, Kautsky inclusive. A mesma social-democracia que um Bertone supõe representar, pelo visto...

Mesmo Paulo Francis chamava 1984 de "dramalhão de horror". E eu duvido que o livro possa até existir na Coreia do Norte; esse material que Bertone postou é todo anticomunista. Ele é bróder seu, não meu e do Cristiano. Ele combate apenas superficialmente o fascismo, ele guarda todo seu ódio para o comunismo. A principal objeção dele ao Olavo, no fundo, no fundo, é que o Olavo é militante e não pretende manter algum charme e aparências. É alguém brutalmente vulgar.  Mas Bertone também passou ao insulto ao ser contrariado. Ele é seu primo ideológico, não nosso. O vídeo da BBC era pura guerra ideológica, preparando para a guerra propriamente dita.

E ninguém me paga. Vocês da direita é que são pagos. Cristiano mesmo observou algo muito interessante: vocês da direita têm dinheiro e se ajudam, enquanto políticos do PCB, que eu saiba, não têm ajudado blogueiros comunistas. Olavo tem um tal "True Outspeak" nos USA, já vi ele dar uma de Paulo Francis no Manhattan Connection...Lembra que um dia Caio Blinder disse que o partido republicano era o partido  do bolso de Francis? Será que Olavo não seria o mesmo caso? Porque já ouvi dizer que Mídia sem Máscara é a CIA mascarada.




quarta-feira, 11 de setembro de 2013

O orgulho de buscar a verdade: carta a Bertone Sousa

Meu caro professor Bertone Sousa:

O tom do seu artigo contra o Cristiano e a censura por você praticada em seu site me obriga a me manifestar no meu blog. 

Você, quem sabe para fazer bonito para seus leitores, deletou meu linque para o debate em inglês sobre o holodomor. Era um linque da wikipedia. Ele contextualizava para seus leitores, entre os quais devem estar seus aluninhos, quem é Mark Tauger, um professor da West Virginia que, especialista em fome, acredita que a fome de 1933 teve causas naturais. 

Você também deletou, em nome do combate a algo que para você é radicalismo, meu resumo do novo paradigma: Stálin é democrata, Trotsky colaborou com os nazis, Kruschev mentiu.

Eu faço essa postagem não pensando em você, pois você é vaidoso em excesso. Penso nos seus alunos. Eles imaginam que 1984 é arma anticomunista, que deveria estar sendo vendido na Coreia do Norte. Ora, esse é um livro de ficção. Será que ele é "contra o totalitarismo em geral"? Eu penso que não. Ele é contra o socialismo científico.

Nossa desavença gira, na verdade, em torno de um ponto: você não quer admitir que desconhece que há debate acadêmico em torno da União Soviética no exterior, você tem vergonha de admitir que não sabia disso e está espantado. Por isso, vocifera politizando ao máximo a discussão.

Em primeiro, não sou exatamente "um jovem stalinista", como você me qualifica. Sou simpatizante do maoismo. Sou professor universitário como você e acredito que o professor Grover Furr e a nova geração de historiadores americanos estão mudando o paradigma pós-Guerra Fria. Eu sinto orgulho em estar, junto ao Cristiano, à frente dessa mudança de paradigma no Brasil. Sinto orgulho de buscar a verdade. Suponho que você leia em inglês. Se não lê, aprenda e leia aqui um texto de Grover Furr, professor de Montclair State University, aqui, cai como uma luva para contextualizar as bobagens que você escreveu para o Cristiano em seu site .


terça-feira, 20 de agosto de 2013

Bilhete Sobre as Manifestações

Caro Italo Coutinho:

Lendo seu artigo Pescar o Peixe é Fácil, que você já comentou que gostaria que eu "debulhasse", assim como posta reiteradamente, comento o seguinte: eu acho um artigo que entendeu pouco ou nada das manifestações.

Primeiro, você se equivoca ao pensar que o objetivo do Movimento Passe Livre era somente baixar vinte centavos da passagem. O objetivo do movimento sempre foi transporte público gratuito para todos. Não acho que o objetivo é "tupiniquim, piegas, chinfrim, safado". Muito pelo contrário. No final de seu artigo, você é conivente com a safadeza do empresário que dá cano em seu público: "que pena do Fred". Pena nada. 

Essa analogia de "pescar peixe", sinceramente, é que eu penso que não explica nada. Nem tudo na vida se explica usando o powerpoint, Italo.

Ainda mais se tratando das já históricas Jornadas de Junho. O que posso adiantar é que, de agora em diante, estão ganhando destaque movimentos e coletivos não alinhados nem com o PT e nem com o PSDB: Rede Ninja, Jornal Nova Democracia, Movimento Passe Livre, os anarquistas do Black Block, os maoístas do MEPR.

Como você está em simbiose com a mídia das corporações, de extrema-direita, assim como seu olhar é de uma classe média bastante tradicional, fica evidente que mesmo o pacto social lulista lhe repugna, mas essas manifestações são sintoma de que esse pacto social, esse projeto de conciliação de classe, está falido, mas continuará vigente, por inércia, ainda muito tempo. Assim, você só tem como ver "safadeza" em uma militância de esquerda não cooptada. Mas as manifestações não param. E já são história.

segunda-feira, 5 de agosto de 2013

Gell-Horny & Hemingway

Hemingway e Gellorn é um filme centrado na história de amor de Ernest Hemingway com Marta Gellhorn, jornalista e escritora representada por Nicole Kidman.  O filme, realizado para a TV, mistura documentário e ficção, tanto em termos de imagens históricas das guerras quanto na estética pela qual opta, com Nicole Kidman falando diretamente para o espectador: "Amor? Devemos?" O charme da frase, em inglês, entre tragadas de cigarro, é intraduzível, pois marca a fragmentária estética modernista que influenciou Gellhorn e Hemingway.
Embora com esse filme o desejo tenha sido tirar a história de Gellhorn da sombra de Hemingway, o filme foi totalmente dominado por sua figura e por imagens retiradas de sua ficção, como o grande plano geral do espadarte, que evidentemente representa Hemingway, pois quando ele morre, ao final, o espadarte reaparece num mar de sangue. Outras imagens surgem: ao separar-se de Hemingway, Pauline Pfeiffer comenta o episódio em que Hemingway mediu seu pênis com Fitzgerald, verificando que o de Fitzgerald era menor, episódio mencionado posteriormente em Paris é uma Festa (mas com outra leitura: Fitzgerald, ansioso, é quem teria mostrado o membro para exame de Hemingway).
A guerra joga um papel central nas vidas de Hemingway e Gellhorn. A imagem dos dois fazendo sexo selvagem em uma forte cena em meio a um bombardeio deixa bem claro que Hemingway é visto como mais que um homem: ele é um touro, uma força da natureza. Depois da Guerra da Espanha, onde os principais inimigos de Hemingway são os russos que interferem na Espanha e um crítico que questiona sua masculinidade excessiva e a supõe duvidosa (Max Eastman) nunca mais Hemingway e Gellhorn conseguem encontrar sua paz, ou melhor dizendo, uma guerra tão excitante. E eles tentaram: II Guerra Mundial, Finlândia e, finalmente, China. Na China os problemas se multiplicam e Hemingway tem uma crise de ciúmes quando Gellhorn fica encantada com Chu En Lai. Nessa altura, é o namoro de Gellhorn com o comunismo que os afasta. Depois disso, a vida de Gellhorn torna-se uma espécie de tourada sem um touro. O tom desse filme, com relação  a Hemingway, é azedo. Ele não aparece sob uma boa luz: é fanfarrão, vive bêbado e puxando brigas, termina por traí-la, busca jogar com o governo, tornando-se mais patriótico para evitar que o governo pensasse que ele estava ligado ao comunismo (critica ela). Gellhorn consegue ir bem além de ser mera nota de pé de página na vida de alguém, mas esse alguém praticamente domina, como um fantasma, praticamente toda sua obra. Hemingway e sua obra foram figuras dominantes na vida de Gellhorn e foram ainda marcantes, trinta anos depois da morte de Hemingway (apresentada no filme como complementar à morte de Gellhorn, através da imagem de um corvo).


sexta-feira, 2 de agosto de 2013

Uma Vida em Cartas: George Orwell

A Companhia das Letras acaba de lançar algumas das cartas de George Orwell, Uma Vida em Cartas. Algumas delas saíram na Revista Piauí. 

Nelas, Orwell mostra porque tende ao maniqueísmo em Revolução dos Bichos e em 1984. Ele vai à Espanha e passa a torcer claramente pelo POUM e por Trotsky. E passa a militar por eles, sem medo de exagerar e mentir, agindo não como repórter que olha os dois lados e registra os fatos, mas como partidário apaixonado dos trostquistas e anarquistas. Ele nem sequer reconhece que houve um levante contra a frente popular (ou seja, contra o governo espanhol) em maio de 37, por exemplo, atropelando os fatos. 

George Orwell mentiu em suas cartas ("Espero sair com vida para escrever", Revista Piauí_81) a respeito da não-existência da conspiração entre trotsquistas e franquistas. A conspiração existiu, há evidências. Vejam uma prova abaixo, uma transcrição de um julgamento na Alemanha nazista:
No início de 1938, durante a Guerra Civil Espanhola, o acusado obteve a informação, graças à sua capacidade de oficial, de que uma rebelião contra o governo local vermelho no território de Barcelona estava sendo preparado com a co-operação do serviço secreto alemão. Esta informação, com colaboração de Pöllnitz, foi transmitida por ele para a Embaixada da Rússia Soviética, em Paris."
Pöllnitz" era Gisella von Pöllnitz, uma recente recruta da "Orquestra Vermelha" (Rote Kapelle), rede anti-nazista de espionagem soviética que trabalhou para a United Press e que "empurrou o relatório através da caixa de correio da embaixada soviética" (Brysac, resistindo a Hitler: Mildred Harnack e a Orquestra Vermelha. Oxford University Press, 2000, p 237).
A prova está num livro que reúne os julgamentos no terceiro reich, de autoria de Norbert Haase: Haase, Norbert. Das Reichskriegsgericht und der Widerstand gegen die nationalsozialistische Herrschaft. Berlin: Druckerei der Justizvollzugsanstalt Tegel, 1993). O parágrafo relevante está na página 105.

terça-feira, 23 de julho de 2013

Carta a Flávio Paranhos sobre Porcos Comunistas

Antes de ler essa carta, sugiro aos leitores que leiam o artigo Porcos Comunistas

É curioso como basta surgir uma crise social para reaparecer as ofertas de livros como A Revolução Traída, de Trotsky e A Revolução dos Bichos, de Orwell. Teve quem ofereceu-os juntos num mesmo pacote, por ocasião das manifestações. Acho altamente revelador isso. Ambos servem como antídoto para a possível atração que os trabalhadores venham a ter pela revolução russa.

Primeiramente, não foi porque associou "porcos" e "comunistas" que esse livro (A Revolução dos Bichos) demorou a ser publicado.  T. S. Eliot mandou a Orwell uma crítica onde apontou que, de acordo com a narrativa, a fazenda precisava era de mais porcos, uma vez que eram tão mais inteligentes que os outros. E apontou que a Inglaterra era aliada da União Soviética na guerra, que não tinha acabado (era 1943) e aquele tipo de crítica era irresponsável, podendo favorecer o nazismo.

Por outro lado, você (Flávio) analisou corretamente a mensagem principal do livro, que de certa forma é o argumento também de A Revolução Traída, de Trotsky, sobre a revolução russa. Sumarizando, pode-se dizer que o marxismo-leninismo seria um belo ideal no papel, mas quando colocado na prática gera tiranias horríveis. Adotá-lo seria próprio de ingênuos. Somos no fundo "todos porcos" no mau sentido. A seguir, você dissocia os demais socialistas dos "stalinistas" --como se  isso não fosse levar o artigo para "o caminho dos porcos". Depois você ainda associa a tirania às demais experiências socialistas...é....mas sem "stalinismo" --melhor diria, sem Marx e Lênin --elas foram poucas nesse século XX...

Os erros do socialismo foram, segundo você, "de fora para dentro". O socialismo esbarra na "natureza humana", que seria "egoísta, vaidosa, invejosa violenta, nepotista". Se for assim, Dr. Flávio, um coronel do interior seria o mais puro representante da natureza humana, seu mais belo exemplar. Não posso deixar de pensar em Odorico Paraguaçu, que para você é o ser humano em sua face mais pura.

E, finalmente, você abstrai o contexto histórico. Ora, isso também é altamente questionável nesse livro!

Leia o artigo de Valdirene Leite:


FICÇÃO E HISTÓRIA EM A REVOLUÇÃO DOS BICHOS

Valdirene Leite[1]

RESUMO


Nesse texto buscamos um outro olhar não-convencional, sobre o texto A Revolução dos Bichos. Partimos do pressuposto de que George Orwell não apresenta uma narrativa objetiva sobre a União Soviética ao utilizar essa narrativa histórica como base para sua fábula. Nossa hipótese é que a fábula é trotsquista e anticomunista. E assim ela foi utilizada durante a Guerra Fria. Apesar disso, mesmo a esquerda continua a prestigiar o texto e não o aborda em termos mais críticos. Ao analisar que narrativa histórica é essa que Revolução dos Bichos aborda, notamos que é preciso repensar o seu uso em sala de aula, utilizando uma bibliografia a respeito da União Soviética e buscando ser mais objetivo, em especial sobre as dicotomias pobres entre Trotsky e Stálin que o texto A Revolução dos Bichos traz.


Palavras-chave: Orwell, Revolução dos Bichos, história, União Soviética, ficção, fábula


1 INTRODUÇÃO


            O livro A Revolução dos Bichos, de autoria de Eric Arthur Blair (mais conhecido pelo pseudônimo de George Orwell) (1903-190), apresenta, através de uma fábula onde os animais falam, uma crítica política totalizante a respeito da revolução russa, supomos, desde 1917 até 1943. O texto, publicado em 1945 no Reino Unido sob o nome de Animal Farm, foca principalmente o governo de Stálin, adotando a hipótese (de origem trotsquista) de que foi durante esse governo que a revolução se perverteu e se burocratizou.
            Nossa hipótese é que a fábula de Orwell apresenta as posições antissoviéticas de Trotsky de forma ilustrada (e vai mais além). Por exemplo: a coletivização de 1933-34 é representa pela situação do moinho de vento. O entusiamo de Bola de Neve pela construção do moinho de vento e a oposição de Napoleão representaria a situação e a discussão na União Soviética na altura de 1926, quando os trotsquistas propuseram a coletivização e ela foi rejeitada.
            Assim, esse artigo buscará lançar um outro olhar sobre a obra de Orwell, considerando que o objetivo de Revolução dos Bichos, de George Orwell, foi traçar paralelos entre o governo do porco Napoleão e o de Stálin, na União Soviética. O objetivo aqui será entender e criticar esses paralelos, assim como entender quais eram, historicamente, as posições de Trotsky e de Stálin, representadas, na fábula, por Bola de Neve e Napoleão, respectivamente. A contraposição entre os dois será objeto de debate nesse artigo. O livro não é isento: tende a defender Bola de Neve, que era Trotsky. Pesquisando sobre história e ligando aos acontecimentos do livro, pode-se dizer que Bola de Neve é Trotsky, Napoleão é Stálin, o animalismo é o comunismo.


2 Ficção e história em A Revolução dos Bichos


A hipótese a ser articulada nesse artigo é de que Revolução dos Bichos não é uma alegoria neutra do autoritarismo e sim uma ficção carregada de uma ideologia partidária, ou seja, o narrador onisciente toma partido deliberadamente das explicações históricas de Trotsky sobre a revolução russa. Atualmente, essas explicações históricas são totalmente hegemônicas no Ocidente e formam o chamado paradigma histórico da Guerra Fria. Somente agora, nos anos 2000, esse paradigma está sendo questionado por historiadores norte-americanos como John Arch Getty, Mark Tauger e Grover Furr, e outros russos como Yuri Zhukov, assim como ingleses, como Harpal Bar, dentre outros. Como o artigo é sobre literatura, nos concentramos em recontar a história sem citar exaustivamente esses historiadores e autores, cujas obras estão disponíveis na bibliografia (BAR, 1998, p. 12).
Essa pesquisa permite articular história e literatura e fazer uma leitura, sob um novo olhar, da narrativa de Orwell, uma vez que ela está profundamente atrelada a uma determinada versão da história. Optou-se, nesse trabalho, por lançar um outro olhar, vendo essa narrativa de acordo com outra hipótese sobre a história: a hipótese da vertente maoísta do marxismo-leninismo. Segundo essa vertente, a negação do marxismo-leninismo não ocorreu em 1929 (ou seja, não ocorreu com Stálin) e sim em 1956 (ao tempo de Kruschev). A comparação entre as figuras históricas e os personagens foi a seguinte, segundo Olgário Vogt:

O animalismo O socialismo ou o comunismo
O Solar dos Bichos União Soviética
O canto Bichos da Inglaterra A Internacional Socialista
Os porcos A burocracia soviética
Os homens A burguesia
Os animais O proletariado
Sr. Jones O Czar Nicolau II
O Velho Major Marx10
Napoleão Stálin
Bola de Neve (Snowball) Trotsky
As ovelhas A massa alienada
Os cachorros A polícia política (KGB)
Sansão (Boxer) O trabalhador iludido
O corvo Moisés A Igreja Ortodoxa
O porco Garganta (Squealer) A propaganda
A bandeira verde com o chifre e o
casco
A bandeira soviética com a foice
e o martelo (VOGT, 2007, p. 4).

Em Revolução dos Bichos, a narrativa histórica de Trotsky sobre os acontecimentos é uma constante em todo o livro. O processo opera do seguinte modo: a coletivização, por exemplo, é apresentada como sendo a passagem que se refere ao moinho de vento na Fazenda Animal. A divergência entre Bola de Neve e Napoleão representa a forma como a coletivização foi motivo de polêmica entre o grupo de Trotsky e o de Stálin. Tal passagem é comentada nos seguintes termos em A Revolução dos Bichos:

Bola de Neve estudara atentamente alguns números atrasados da revista O Agricultor e o Criador de Gado, encontrados na casa grande, e andava com a cabeça cheia de planos de invenções e melhoramentos (...). Napoleão não fazia projetos próprios, apenas dizia com toda calma que os de Bola de Neve não dariam em nada e parecia aguardar sua vez. De to das as divergências, nenhum foi tão grave quanto a do moinho de vento (ORWELL, 2007, p. 43).

A narrativa histórica aqui visada é a coletivização da agricultura russa nos anos 30. O problema era o seguinte: embora depois da revolução russa houvesse o fim do latifúndio, continuaram existindo uma classe de fazendeiros ricos (os kulaks) e pequenos proprietários empobrecidos. A solução sugerida por Lênin era a criação de fazendas de produção coletiva. A partir da recusa dos kulaks em vender grãos ao governo soviético, a coletivização começou, em 1926, ainda incipiente.
No entanto, de forma inconseqüente os trotsquistas sugeriram que a coletivização fosse adotada rapidamente. O verdadeiro objetivo da oposição de esquerda era infringir uma derrota ao poder soviético; a coletivização naquelas circunstâncias, quando ainda estava apenas em seu início, provocaria novos e mais violentos boicotes por parte dos kulaks e poderia ser derrotada por eles, pois provocaria desabastecimento e fome. A idéia foi recusada, mas entre 1933-34, depois de uma grande fome na Ucrânia, quando a coletivização já estava adiantada, ela foi posta em prática. Os fazendeiros ricos foram, então, derrotados. A forma como a história aparece em A Revolução dos Bichos dá a entender que Stálin (“Napoleão”) era uma criatura maldosa que apenas roubou as ideias de Trotsky (“Bola de Neve”). As seguntes palavras serviram para finalizar a questão do moinho de vento (que refigura o fato histórico da coletivização):

Garganta explicou aos outros bichos, em particular, que Napoleão nunca fora contra a construção do moinho de vento (...). Aí estava a esperteza do camarada Napoleão (...). Ele fingira ser contra o moinho de vento, apenas como manobra para livrar-se de Bola de Neve, que era um péssimo caráter e uma influência perniciosa (ORWELL, 2007, p. 51).

            Assim, uma versão histórica do livro de Orwell que oculta que os trotsquistas, em 1926, quiseram colocar, prematuramente, o poder soviético contra os kulaks, o que causaria sua derrota. A conclusão que se tira é exatamente a contrária: a coletivização foi uma idéia de Trotsky roubada por Stálin. Outro indício da tomada de partido é como a polêmica entre a revolução permanente (Trotsky) e a revolução em um só país (Lênin e Stálin) é apresentada:

Além da disputa sobre o moinho de vento, havia o problema da defesa da granja. Eles bem que sabiam que (...) segundo Napoleão, o que os animais deveriam fazer era conseguir armas de fogo e instruir-se em seu emprego. Bola de Neve achava que deveriam enviar mais e mais pombos e provocar a rebelião entre os bichos das outras granjas (ORWELL, 2007, p. 45).

Acima, a controvérsia entre a revolução permanente e a revolução em um só país é apenas esboçada de forma pouco compreensível. A revolução em um só país foi teorizada por Lênin como conseqüência do próprio capitalismo (a chamada lei do desenvolvimento desigual), afirmando que dificilmente o socialismo venceria em vários países ao mesmo tempo e que era necessário construir o socialismo assim mesmo, mas sem deixar de ajudar a desenvolver o socialismo nas demais nações. Já Trotsky retomava, a propósito da revolução permanente, idéias que ele já apresentara em 1906, quando estava no partido menchevique em oposição a Lênin e aos bolcheviques. Ele condicionava a vitória da revolução na Rússia à vitória da revolução na Europa.
Pode-se dizer que o dilema proposto por Trotsky era aventuras militares ou derrotismo: a Rússia deveria mandar tropas para a Alemanha, ou seja, exportar a revolução ou retornar ao que havia antes de outubro de 1917, entregando o país a um regime burguês. Essa visão foi chamada de bonapartista em seu tempo e rejeitada pela maioria do partido. Não obstante, Trotsky passou a chamar Stálin e seu grupo de bonapartista e fazer uma campanha cada vez mais furiosa contra o poder soviético, culminando em sua expulsão do partido e do país em 1929.
E assim a narrativa prossegue: o papel de Bola de Neve na batalha do Estábulo é a discussão sobre o papel de Trotsky na revolução russa (Krupskaia e Stálin acreditavam que John Reed, autor de Dez Dias que Abalaram o Mundo, exageraram ao dar um papel preponderante a Trotsky). Trotsky aceitou a revolução russa de outubro como condição de que ela fosse o estopim da revolução européia.
            O episódio da fome na Granja dos Bichos é outro exemplo de apresentação da história da revolução russa, e, em especial do período Stálin, sob a mesma luz. Possivelmente o episódio simboliza a grande fome na Ucrânia entre os anos 1932-33, causada por fatores climáticos naturais e que tornou necessária a coletivização, privilegiando os camponeses pobres em detrimento dos kulaks. Esse episódio da fome é descrito nos seguintes termos na fábula de moral antistalinista:

Napoleão bem sabia dos maus resultados que poderiam advir, caso a verdadeira situação alimentar da granja fosse conhecida, e resolveu utilizar o Sr. Whymper para divulgar uma impressão contrária (ORWELL, 2007, p. 64).

            O que ocorreu não foi uma tentativa do governo da URSS de esconder o fato da fome e sim a ampla divulgação da fome por nazistas alemães e reacionários da Polônia e da própria Ucrânia como sendo causada intencionalmente pelo governo da União Soviética como forma de exterminar o povo ucraniano, o chamado “holodomor” (em ucraniano, morte por fome). O pesquisador e historiador Mark Tauger, de West Virginia, estudou recentemente a questão e concluiu que a fome não foi causada pelo governo e sim por fatores naturais. Antes da coletivização, sucediam-se ondas de fome em razão das más colheitas na Ucrânia. Tal fato, no entanto, foi abundantemente usado para fazer propaganda antissoviética. Mais adiante, surge, na Revolução dos Bichos, uma passagem que se referem às conspirações zinovievistas-trotsquistas:

Subitamente, descobriu-se um fato alarmante. Bola de Neve estava freqüentando a granja à noite, em segredo ! (...). Napoleão decretou uma ampla investigação sobre as atividades de Bola de Neve. Com seus cachorros na atitude de alerta, saiu e fez uma cuidadosa inspeção nos galpões da fazenda, com os outros animais a segui-lo a uma distância respeitosa. (...). Bola de Neve vendeu-se a Frederick, da Granja Pinch Field, que neste mesmo instante está planejando atacar-nos e tomar nossa granja! (...) Foi o tempo todo, agente de Jones! (ORWELL, 2007, p. 69).

O texto acima só pode ser corretamente entendido se for apresentada a narrativa histórica do período do governo de Stálin ao qual essa passagem se refere: embora Trotsky tivesse se exilado do País, ainda tinha grupos fiéis a ele na União Soviética, assim como, desde 1932, ele havia formado bloco junto com Zinoviev, Kamenev e Bukharin. Começaram a acontecer inúmeros atentados e sabotagens pelo país, causando muitas mortes, entre as quais a do prefeito de Leningrado, segundo na hierarquia soviética. A partir de um esforço de investigação, chegou-se ao grupo de Trotsky, Zinoviev e Bukharin, que ainda tinha muitos integrantes em altos escalões do estado. Os acusados foram processados nos famosos Julgamentos de Moscou, julgamentos abertos à imprensa internacional e muitos, como Bukharin, foram fuzilados, outros, como Radek, foram condenados à prisão.
De acordo com o historiador norte-americano John Arch Getty, os expurgos que produziram os famosos Julgamentos de Moscou foram mais para poder organizar um sistema de poder que era caótico do que um exemplo de totalitarismo, de acordo com textos como Origens dos Grandes Expurgos (livro inédito em português), do historiador norte-americano Arch Getty. De acordo com esse historiador, até essa época, se alguém era expulso do partido, bastava uma autocrítica verbal para poder voltar. Não foram apresentados, até hoje, documentos comprovando a tortura dos acusados e as falsificações dos chamados Julgamentos de Moscou. E existem, pelo contrário, evidências demonstrando que os julgamentos foram justos. Comentou o historiador Grover Furr (também inédito em português), de Montclair State University (New Jersey) a respeito desse assunto:

Durante a última década, muita evidência documental emergiu dos arquivos formais soviéticos para contradizer o ponto de vista canônico desde o tempo de Kruschev de que os réus, nos Processos de Moscou e na conspiração militar do “Caso Tukachevsky”, foram vítimas inocentes forçadas a fazer confissões falsas. Nós publicamos e escrevemos um grande número de trabalhos ou, ao pesquisar para publicar, podemos dizer que agora temos forte evidência de que as confissões não eram falsas e que réus dos Processos de Moscou pareciam ter sido verdadeiros em confessar as conspirações contra o governo soviético (FURR, 2010, p. 7).

Portanto, a narrativa histórica que Revolução dos Bichos supõe não é a mesma que todos os historiadores registram, ou não é neutra como muitos imaginam. Dentre as revelações nos julgamentos, ficou esclarecido que desde 1925 já existiam contatos entre Trotsky e Von Seekt (representante do estado maior da Alemanha); os contatos prosseguiram e se tornavam mais intensos quando da subida do nazismo ao poder. Hitler às claras anunciou seu ódio ao bolchevismo e a necessidade que o povo alemão tinha de invadir a Ucrânia para conquistar “espaço vital”.
            Jamais foi dito, portanto, que o papel de Trotsky foi negado. Ele foi é objeto de denúncias e revelações. As conspirações, em A Revolução dos Bichos, são tidas como falsas, ou seja, são mostradas como provocações criadas por Napoleão para que ele pudesse conquistar o poder através do terror. Tal constatação pode ser lida no fragmento a seguir:

--Alerto a todos os animais desta fazenda para que mantenham os olhos bem abertos. Temos motivos para pensar que alguns agentes secretos de Bola de Neve estão ocultos entre nós neste momento (ORWELL, 2000, p. 71).

            A partir daí são descritas imagens de execuções que seriam, no entanto, imotivadas e sem nenhum sentido a não ser perverterem os ideiais e a utopia, reforçando a autoridade tirânica de Napoleão (“Stálin”). Pela natureza da relação entre os porcos e Napoleão, pode-se dizer que eles representam Bukharin, Zinoviev e Kamenev:

[Os animais]eram os mesmos que haviam protestado quando Napoleão abolira as reuniões dominicais. Sem mais demora, confessaram ter realizado contatos secretos com Bola-de-Neve desde o dia de sua expulsão e haver colaborado com ele na destruição do moinho de vento (...). Ao fim da confissão, os cachorros estraçalharam-lhes as gargantas e Napoleão, com voz terrível, perguntou se algum outro animal tinha qualquer coisa a confessar. As três galinhas que haviam liderado a tentativa de reação sobre os ovos aproximaram-se e declararam que Bola-de-Neve lhes aparecera em sonho, instigando-as a desobedecer às ordens de Napoleão. Também foram degoladas (...). E assim prosseguiu a sesão de confissões e execuções, até haver um montão de cadáveres aos pés de Napoleão e um pesado cheiro de sangue no ar, coisa que não sucedia desde a expulsão de Jones (ORWELL, 2007, p. 73).

Assim, reforça-se a tese de que o marxismo-leninismo é idealismo ingênuo e que, quando praticado, leva a uma terrível tirania. Acima, pode-se notar a leitura dos expurgos dos anos 30 e dos Julgamentos de Moscou como o fuzilamento dos verdadeiros revolucionários.
            A teoria que Orwell apresenta, resumidamente ao final do texto, é que as teses “stalinistas” destruíram as idéias de Marx. Essa mensagem é comentada quando a narrativa trata das distorções nos pensamentos do personagem Major. O cavalo Sansão, por exemplo, pode ser associado ao Bukhárin, ou seja, era um velho companheiro de Stálin. Por fim, o fato final é a Conferência de Teerã, onde debatiam Roosevelt, Churchill e Stálin. A narrativa de Orwell iguala soviéticos e as potências capitalistas nessa conferência. No entanto, nessa época o nazismo ainda não tinha sido vencido. Parece-nos, inclusive, que mesmo que o nazismo esteja representado nessa fábula por Frederik, da Granja Pich Field, pode-se dizer que faltou a Orwell uma melhor compreensão da ameaça que representava o nazismo, em sua pressa de criticar a União Soviética.
            Na Inglaterra atual, assim como no Brasil, é muito comum a presença da obra de George Orwell nas escolas, onde ele é elogiado como um gênio literário, assim como é celebrado como um escritor na linhagem de Swift e outros. A fábula costuma ser lida como sobre “o totalitarismo em geral”.
No entanto, estudos como os de Stephen Spender e Jodi Bar analisam que aquilo que é de fato avaliado em provas (quando o livro é cobrado na Inglaterra) é a habilidade de regurgitar clichês da Guerra Fria. Para que a narrativa de A Revolução dos Bichos funcione, é preciso concordar com a assertiva de que, embora os governantes de hoje sejam ruins, expulse-os e teremos uma nova tirania ainda pior. Esse é, de fato, o pressuposto desse texto. Embora hoje seja tido como crítica ao totalitarismo em geral, o texto de fato tem sido utilizado como propaganda contra Stálin e a União Soviética.
Um leitor, ao ler Revolução dos Bichos, passa a pontificar a respeito da história da União Soviética, embora na prática não esteja tendo acesso a uma versão preocupada com a realidade objetiva. Na prática, está apenas repetindo a versão de Trotsky dos acontecimentos da revolução de outubro e do período Stálin (mas sem saber que a narrativa é partidária). E a versão de Trotsky é a adotada, em geral com ainda mais exageros negativos, pelo chamado paradigma histórico da Guerra Fria, ou seja, o paradigma adotado pelas universidades norte-americanas nos anos 40 e 50, tendo em vista combater ideologicamente os seus inimigos no campo das democracias populares e socialistas.
            E porque o texto seria ainda tão popular e tão recomendado, se a Guerra Fria, na qual ele foi largamente incentivado, tendo sido até objeto de uma adaptação para desenho animado patrocinada pela CIA, terminou em 1989? O fato é que o comunismo ainda é uma ameaça para a sociedade burguesa, com ou sem Guerra Fria. É preciso refutar as calúnias nos livros de Orwell e orientar a juventude a buscar uma visão mais objetiva, distante dos clichês da Guerra Fria, a respeito do que se passou na União Soviética.


3 REVOLUÇÃO NA REVOLUÇÃO DOS BICHOS


            Os textos que foi possível encontrar na bibliografia brasileira respeito de A Revolução dos Bichos (Teoria e suas implicações: compreensão da utilização doAnimalismo na Revolução dos Bichos e do marxismo na URSS de Stálin, de autoria de Felipe Fontana, Olgário Vogt) não buscam questionar o paradigma histórico da Guerra Fria, pelo contrário, o confirmam e o acentuam. Em geral, o tom de celebração em torno de Orwell, o mito, é geral. Fontana se baseia em Marilena Chauí, Simone Weil e José Paulo Netto (Chauí e Netto tendem bastante ao trotsquismo) para concluir que o marxismo, no Leste Europeu, tornou-se uma ideologia (no sentido de produzir falsa consciência). Tanto Fontana quanto Vogt não buscam novas pesquisas históricas nem suspeitam da mensagem claramente partidária que é transmitida em Revolução dos Bichos.
Olgário Vogt vai no mesmo sentido, supondo que Orwell está criticando “o totalitarismo em geral”. Mais precavido do que Fontana, diante das evidências do uso da obra de Orwell na Guerra Fria, Olgário insiste em afirma que Orwell era um esquerdista e o defende, afirmando que ele desejava um socialismo “independente”.
Orwell é apresentado, nos livros didáticos ingleses, como um “herói”, um jornalista “independente”, “objetivo”, “imparcial”, assim como é visto como exemplo de intelectual engajado em causas sociais. Nos últimos anos, no entanto, têm sido fortes os questionamentos acadêmicos a respeito do antissemitismo, homofobia e racismo presentes em seu texto. Como escreve a respeito Alberto Escusa:

De todos os traços que tinha Orwell, teria que acrescentar alguns que não se comentam e que tiveram grande peso em suas atitudes políticas, como sua fobia contra os homossexuais, seu extremo conservadorismo e seu racismo escondido. Toda a combinação de experiências vividas e concepções sociais nebulosas e abstratas, junto de suas fobias, foram levando rapidamente Orwell a posições marcadamente direitistas, ainda que seguisse formalmente sendo um escritor esquerdista. Um dos traços mais desconhecidos do escritor foram suas manias de perseguição. Segundo Isaac Deutscher, que o conheceu pessoalmente, Orwell vivia em um estado de angústia (...). Essa atitude, junto de sua incapacidade de perceber de maneira científica e realista as questões sociais e políticas, o empurraram a converter-se em um colaborador direto do imperialismo inglês.Até o final de sua vida, em 1949, decidiu colaborar com pleno conhecimento de causa com os serviços britânicos de inteligência, o Foreign Office, ou concretamente com o departamento de investigação de informação (IRD) ao qual lhe entregou uma lista de 135 pessoas suspeitas de serem simpatizantes ou companheiros de viagem dos comunistas. Nesta lista, ao lado dos nomes, anotou os principais defeitos de cada um, revelando a natureza racista e homofóbica de Orwell, que tinha interesse em mostrar traços pessoais dos acusados (ESCUSA, 2012, p. 22).

O antiimperialismo de Orwell, que sempre os comentadores afirmam que teria advindo de suas experiências como policial na Birmânia, também tem sido posto em questão. Outros elementos de sua trajetória têm sido desmistificados: de origem na classe média alta, Orwell tinha uma arrogância típica das classes superiores inglesas; rejeitava o socialismo realmente existente, mas propondo em seu lugar um “socialismo” vago, que se confundia com desapego cristão. Ele também pregava contra os “marxistas dogmáticos”, no sentido de valorizar a classe média e considerá-la parte dos proletários, assim como propunha o resgate do heroísmo físico, o cavalheirismo, dentre outros valores que ele julgava que estavam sendo esquecidos pelos intelectuais (e que também se aproximam dos valores da classe média inglesa de onde ele se originou). Para escrever seus livros, passou algum tempo, embora bastante rápido, entre os pobres em Paris e Londres, assim como foi, de passagem, às regiões do Norte da Inglaterra. Sobre os pobres tirava conclusões dizendo que sua grande diferença era o “odor”.
Orwell foi à Espanha como jornalista e participante do pequeno grupo de linha trotsquista POUM. No entanto, seu conhecimento da situação política na Espanha era pequeno e seu principal foco era fazer um livro. Orwell colaborou, com o livro Homenagem à Catalunha, para fortalecer a versão dos anarquistas e dos trotsquistas de que a União Soviética e a Frente Popular foram os responsáveis pela derrota da República na guerra civil. O título do livro celebra um levante de anarquistas e trotsquistas contra a frente popular que, na época, foi considerado uma punhalada pelas costas que favoreceu a Franco e a Hitler.
Assim como em A Revolução dos Bichos, Orwell tomou partido pelo trotsquismo Acontece que o trotsquismo é a base de boa parte do anticomunismo ocidental e dos ataques feitos à URSS durante a Guerra Fria.
            Outro ponto que tem sido ressaltado são os conteúdos anticomunistas presentes na obra, principalmente em seus últimos anos de vida, em plena Guerra Fria. Surgiu a denúncia que Orwell trabalhou, durante a II Guerra, como informante do estado inglês, fazendo listas de artistas que simpatizavam e militavam a favor do comunismo. O ensinamento que fica ao final da leitura de A Revolução dos Bichos é que os homens não são melhores do que os animais. A “natureza humana” decide tudo.
Os valores afirmados em um texto devem ser buscados a partir dos valores afirmados ao seu final. Deve-se, então, analisar a cena final, que se refere à Conferência de Teerã, representa o momento em que se reuniram Roosevelt, Churchill e Stálin:

Se vossas senhorias têm problemas com vossos animais inferiores, nós os temos com as nossas classes inferiores (...). Doze vozes gritavam, cheia de ódio, e eram todas iguais. Não havia dúvidas, agora, quanto ao que sucedera à fisionomia dos porcos. As criaturas de fora olhavam de um porco para um homem, de um homem para um porco e de um porco para um homem outra vez; mas já era impossível distinguir quem era homem, quem era porco (ORWELL, 2007, p. 118).

            Orwell age como se estivesse criticando uma esquerda oficial apoiada pela União Soviética e que, junto aos capitalistas e igual a eles, estivesse repartindo o mundo. No entanto, qual era o contexto histórico no ano de 1943 em que Orwell terminou Revolução dos Bichos e tentou publicar esse escrito antissoviético? Os nazistas haviam invadido a União Soviética e matado milhões de russos, arrasando o país. Já havia acontecido a maior batalha da guerra, Stalingrado, mas não se sabia quem venceria o conflito, se a Alemanha nazista ou os soviéticos. Mas o que queria Orwell com seu Revolução dos Bichos? Ele ambicionava acabar com o “mito” da União Soviética como estado socialista. Mas a quem beneficiava, em 1943, essa postura de Orwell? É curioso como se esquece tão facilmente no Ocidente como a vitória foi obtida com enormes sacrifícios pelo povo soviético e pelo exército vermelho.
            Se em 1943 ainda havia atitudes reticentes quanto à posição de Orwell, a ofensiva contra o socialismo em 1945 as desfez e o mundo ocidental passou a ter uma postura favorável com relação a ele, chegando até ao ponto de mistificá-lo. Os espiões de guerra nazistas foram aproveitados por serviços de guerra norte-americanos, como por exemplo, o general alemão das SS Reinhard Genhlen, cuja rede de espionagem passou inteiramente aos norte-americanos e passou a agir no Leste da Europa. Essa rede foi uma das responsáveis pela rebelião antissoviética em Berlim em 1953 e na Hungria em 1956.
            Em A Revolução dos Bichos, o porco Napoleão é caracterizado como grande, feio, com expressão agressiva e descrito como tirânico, rude, hipócrita, vaidoso, ou seja, (“Stálin”). Bola de Neve é mostrado como jovem, bonito, com expressão inteligente e os seguintes atributos: articulado, inovador, brihante, estrategista, modernizador, idealista (“Trotsky”). Não seria a hora de questionar esse tipo de dicotomia pobre que termina sendo passado como aula de literatura e história? Não chegou a hora de quebrar com esse corporativismo trotsquista que tem protegido Orwell de ser criticado nesses últimos cinqüenta anos?
            Nossa hipótese, portanto, foi de que A Revolução dos Bichos é libelo antissoviético e trotsquista, utilizado largamente como propaganda anticomunista, ao ponto mesmo de servir de base para desenhos animados patrocinados pela CIA. George Orwell, ao escrevê-lo em 1948, estava claramente obcecado por seus escritos antissoviéticos.


CONCLUSÃO


            Embora seja muito estudada e lida em sala de aula e na escola, A Revolução dos Bichos é um livro que ainda pede uma releitura crítica. A narrativa histórica na qual ele se baseia é uma narrativa fortemente partidária do anticomunismo, baseada principalmente em Trotsky, embora ele não a apresente assim. Ele é lido como narrativa neutra que é capaz de engajar e de politizar a juventude. Isso precisa ser questionado e uma visão mais objetiva, que não repita, meramente, os clichês da Guerra Fria sobre o período Stálin precisa ser abordada em sala de aula. No Brasil, os trabalhos disponíveis sobre Revolução dos Bichos, com os textos de Felipe Fontana e Olgário Vogt, fixam-se totalmente no mito Orwell, celebrando sem maiores críticas o “clássico”, repetindo elogios a respeito de sua biografia e vida, mas sem aprofundar-se em sua obra. No entanto, na Inglaterra, novos estudos sobre Orwell o fazem aparecer sob uma outra luz: antissemita, homofóbico, anticomunista que chegou a trabalhar como informante do estado em plena Guerra Fria e delatar outros escritores. Igualmente, historiadores como Grover Furr, Arch Getty, Yuri Zhukov e outros estão repensando a narrativa do tempo da Guerra Fria. Como a narrativa sobre a coletização russa dos anos 30 está sendo repensada, é importante verificar como ela foi apresentada em A Revolução dos Bichos. E ela foi apresentada do ponto de vista trotsquista e antissoviético. O texto constrói uma dicotomia pobre entre Stálin (“Napoleão”) e Trotsky (“Bola de Neve”). Não há dúvidas de que o texto tomou claro partido por Trotsky e o anticomunismo. No entanto, os estudiosos brasileiros nunca mostram isso, pelo contrário, dão à hipótese da neutralidade da narrativa o caráter de verdade inquestionável. Nesse trabalho, adotamos a hipótese maoísta, ou seja, de que o abandono do marxismo-leninismo pela União Soviética aconteceu em 1956.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


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ESCUSA, Alberto. Quien fué realmente George Orwell? ¿Quién fue realmente George Orwell? Los mitos orwellianos: de la Guerra Civil española al holocausto soviético. Disponível em: . Acesso em 13 de outubro de 2012.


FONTANA, Felipe. A Revolução dos Bichos (Teoria e suas implicações: compreensão da utilização doAnimalismo na Revolução dos Bichos e do marxismo na URSS de Stálin. Revista Urutágua, n. 21, mai./jun/jul./ag. de 2010.


FURR, Grover. Evidências da Colaboração de Trotsky com a Alemanha e o Japão. Disponível em: . Acesso em 13 de outubro de 2012.


_______________. Stalin e a luta pela reforma democrática. Disponível em: . Acesso em 17 de outubro de 2012.


GETTY, Arch. The Origins of the Great Purges: The Soviet Party Reconsidered, 1935-1938. New York: Cambridge University Press, 1995.


ORWELL, G. A Revolução dos bichos. Trad. por: Heitor Aquino Ferreira. 4 ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2007.


TAUGER. B. Tauger, The 1932 Harvest and the Famine of 1933, Slavic Review, Volume 50, Issue 1 (Spring, 1991), 70-89,


VOGT, Olgário. A Revolução Russa através da Revolução dos Bichos. Revista Ágora, Vol. 13, n. 1, 2007.



[1][1] Aluna do Curso de Letras (Fasf/UNISA, polo Luz/MG. RA: 2708931