Resposta a Rafael Freitas

Rafael: essa resposta sua para mim tem afirmações estranhas, mas tudo bem.

Em primeiro, você me responsabiliza por universalizar um modo de produção indevidamente. No entanto, Portugal colonizou o Brasil e estabeleceu aqui um modo de produção. Existiam grandes plantações de cana de açúcar para exportação, por exemplo. E existiam capitanias hereditárias gerenciadas por nobres portugueses.

A teoria de Ignácio Rangel, respondendo a Jacob Gorender na Revista Civilização Brasileira, é que Portugal não tinha como exportar um modo de produção mais avançado para o Brasil. Ele exportou o escravismo e o feudalismo (esse último sendo o modo de produção em que Portugal ainda vivia, embora já existisse uma economia mercantil).

Nos anos 60 o advogado e líder das Ligas Camponesas Francisco Julião registrou a presença, aqui, ainda, do cambão, um imposto do grande fazendeiro ao camponês, semelhante à corvéia europeia. O camponês era obrigado a trabalhar vários dias de graça. No Nordete brasileiro também foi registrado o direito de pernada, ou seja, o direito do dono de terras de passar a primeira noite dos recém-casados com a esposa do camponês. Foram também registrados castigos humilhantes. 

Você me acusa de me alinhar com o discurso pós-moderno, logo a seguir. No entanto, abstrair a presença dessas relações atrasadas é que leva a minimizar os problemas do país. O PCB chega, a partir desse tipo de erro, a dizer que o PT está fazendo uma revolução capitalista, o Brasil "está virando um país imperialista!" Que erro grotesco. E chegou a ser dito em rede nacional!

O Brasil tem, sim, uma economia composta de monopólios --mas são voltados para o exterior, dominados por potências estrangeiras, assim como existe modernização no campo, mas sempre no sentido de modernizar o latifúndio em termos de tecnologia. Mas a exploração é feudal. Há casos de trabalhadores morrendo de exaustão, trabalhando horas e horas sob a vigilância de capangas brutais, assim como ainda há casos de trabalho escravo.

Quanto ao livro de Cássio, até o ponto em que entendi, quer igualar positivamente Vargas e Lula em termos de avanços para os trabalhadores, no sentido de um "governo popular" e não nesse sentido que você dá, de reprodução de relações burguesas.

A grande mudança que se deu é que agora existe a UDN de macacão (PT) compartilhando o estado em tensão constante com os quadros de um partido herdeiro da UDN tradicional (PSDB), o que gera crescente tensão, pois compartilham o estado, usam das mesmas práticas corruptas e denunciam uns aos outros.

Lula "não é líder e nem é carismático". Como assim? Claro que é, carismático seria no sentido de "ter o dom da graça", no sentido de ser comunicativo, uma figura paternal, canalizando anseios populares. Max Weber é pós-moderno ou é um autor do início do século XX? Não acho que esse conceito seria "idealista", ou seja, seria um elemento religioso. Essa análise é materialista, sim. Infelizmente, o socialismo celestial de Gerson é idealista. Ele conta com as divisões do Papa, eis o problema.

Aqui não se trata de eurocentrismo, mas justamente o contrário. Não há como pensar o país sem verificar seu enorme atraso. Os teóricos do PCB dos quais você se aproxima estão justamente "revendo" essas teorias e negando o atraso. Além de negarem a tese de que o Brasil é semifeudal, devido ao fato de seu estado ter nascido como uma colônia portuguesa, eles vão ainda mais longe e julgam que o Brasil tem multinacionais que predam outros países.

Falta a eles a teoria do capitalismo burocrático: embora nosso capitalismo seja similar aos do primeiro mundo, ou seja, a economia é composta de monopólios, ele é associado a resquícios coloniais que ele só busca modernizar (latifúndio), assim como suas multinacionais são voltadas para fora, associadas ao capital externo.

Assim, embora sejamos grandes exportadores de alimentos, a fome ainda é o nervo exposto de nossa sociedade.