terça-feira, 16 de junho de 2009

Blumdia!

JAMES JOYCE

ULYSSES

II.4 - [Calypso]

O Sr. Leopold Bloom comia com prazer as vísceras de
animais e aves. Ele gostava de espessa sopa de miúdos,
castanhosas (1) moelas, um estufado coração assado,
fatias de fígado fritas com migalhas de pão, fritas as ovas
de galinhas. Mais do que tudo ele gostava de rins de
carneiro grelhados que davam a seu paladar um fino aroma
de leve perfumada urina.

Rins estavam na mente dele quando ele se movia leve-
mente na cozinha, ao preparar o desjejum dela numa
arqueada bandeja. Na cozinha um ar e uma luz gélidos
mas além das portas uma gentil manhã de verão plena-
mente. O que fez que ele se sentisse um pouco faminto (2).

Os carvões estavam em brasa.

Outra fatia de pão e manteiga: três, quatro: certo. Ela
não gostava de prato cheio. Certo. Ele voltava-se para a
bandeja, levantou a chaleira da chapa e ajeitou tudo sobre
o fogão. Ficou lá, lerda e agachada, o bico saliente. Xícara
de chá logo. Bom. Boca seca. O gato deslizava ao redor
da perna da mesa com a cauda em riste.

-Mingau!

-Ó, aí está, o Sr. Bloom disse, voltando-se do fogão.

O gato num miado de resposta e deslizou novamente ao
redor da perna da mesa, miando. Do jeito que ela faz sobre
a minha escrivaninha. Prr. Coça minha cabeça. Prr.

O Sr. Bloom olhava curioso, gentil, o ágil vulto negro. Fácil de
ver: o macio pêlo lustoso, o alvo botão sob a base da cauda,
os faiscantes olhos verdes. Ele inclinou-se para ela, com as
mãos nos joelhos.

- Leite para as gatinhas, ele disse.

- Mingau! O gato lamentou.

Rotulados de estúpidos. Eles entendem o que dizemos
melhor do que entendemos eles. Ela entende tudo o que quer.
Vingativa também. Querer saber a que eu me assemelho para
ela. Cume de uma torre? não, ela pode saltar sobre mim.

-Morre de medo de galinhas, ele zombou. Com medo de
galilinhas. (3) Nunca vi uma gatinha mais estúpida.

Cruel. A natureza dela. Ratos curiosos nunca guincham.
Parece gostar disso.

- M-mingau-au! O gato altissonante.

Ela piscou os ávidos olhos envergonhados, miando lamurienta
longamente, exibindo dentes brancoleitosos. Ele olhava os
negros sobrolhos estreitando-se com orgulho até os olhos serem
pedras verdes. Então ele foi ao guarda-louça, pegou o jarro que
o leiteiro Hanlon deixou cheio para ele, serviu tépidoborbulhante
leite numa tijela e pousou-a lentamente no piso.

-Gurrhr! Ela lamuriou, apressando-se a lamber.

Ele olhava os pêlos brilhando rijos na fraca luz quando ela
reclinou-se três vezes e lambeu levemente. Saber se é verdade
que se cortar eles depois não caçam mais. Por que? Eles brilham
no escuro, talvez, as pontas. Ou um tipo de sensores no escuro,
talvez.

Ouvia-a lambendo. Presunto e ovos, não. Nada de ovos bons
com esta seca. Requerem pura água fresca. Quinta-feira: não é
um bom dia para um rim de carneiro lá no Buckley's. fritos com
manteiga, um arrepio de pimenta. Melhor um rim de porco lá no
Dlugacz's. Enquanto a chaleira vai fervendo. Ela lambe devagar,
então lambendo até deixar a tigela limpa. Por que línguas tão
ásperas? Para lamber melhor, com todos os poros. Nada que
não possa comer? Ele olhou ao redor. Não.

(...)

(1)nutty- tb. 'louco, insano'
(2)peckish - tb. Irritado, aborrecido
(3)chook - o mesmo que 'chicken', mas duplicado: 'chookchooks'


tradução: Leonardo de Magalhaens


16jun08
Postado por Leituras E Escritas às 12:58

Um comentário:

jamesp. disse...

Bloomsday!!!
Joyce não é necessário?
Abração.