Sartre e Dostoiésvki: Deus, um Delírio?
A escrita desse texto me foi motivada por uma questão da UFMG em 2007, sobre moral e religião e a frase “se Deus não existisse, tudo seria permitido”, que está nos Irmãos Karamázov, do Dostoiévski. Ela está também na obra de Jean Paul Sartre, na palestra O Existencialismo é um Humanismo.
Não encontrei essa frase literalmente em Dostoiévski, mas esse tema é recorrente na palestra acima citada e publicada em Os Pensadores. Essa frase era uma censura recorrente na crítica cristã ao existencialista, conforme ele mesmo disse:
“e do lado cristão, censuram-nos por negarmos a realidade e o lado sério dos empreendimentos humanos, valores inscritos na eternidade, só nos resta a estrita gratuidade, podendo assim cada qual fazer o que apetecer, e não podendo, pois, do seu ponto de vista, condenar os pontos de vista e os atos dos outros” (SARTRE, 1978, p. 3).
Para o existencialismo ateu, tal como preconizado por Heidegger e os existencialistas franceses, não há nenhuma natureza humana, visto que não há Deus para a conceber. Existe também o existencialismo cristão de Jaspers e de Gabriel Marcel. Sartre diz que seu existencialismo é mais coerente: não há mais nada no céu inteligível, o homem será antes de mais nada o que tiver projetado ser.
Para Sartre, que nesse ensaio se coloca como continuador de Descartes e Kant (de Descartes, na filosofia do sujeito, do eu penso logo existo) e o imperativo categórico (não fazer aos outros o que você não quer que seja feita com você). Para Sartre, o indivíduo que mente está atribuindo um valor universal à mentira. Nossos atos têm de poder ser universalizados. Quando agimos de determinado modo, ligamos a nós mesmos toda a humanidade. Para Sartre, tudo se passa como se, para todo homem, toda a humanidade tivesse os olhos postos no que ele faz e se regulasse pelo que ele faz.
Na palestra, Sartre comentou que já foi tentado, nos anos 1880, fazer uma moral laica, atéia. E o problema é que os valores da moral que permitem organizar a sociedade precisavam ser fundados num “céu inteligível”, ou seja, numa essência ou natureza humana. Para Sartre, existe o bem a priori, não existe uma consciência perfeita e infinita para pensar o bem. O homem, ser que não possui essa essência pronta, precisa se fazer, está livre, ou melhor, condenado a ser livre. Não sei bem a quem Sartre está se referindo, mas tenho certeza que também Nietzsche começou a procura de uma filosofia sem Deus. Por volta de 1888, ocorreu o éfondrement (afundamento) e ele deixou de produzir filosofia.
Dostoiévski era um escritor russo eslavófilo, ou seja, era contrário às influências estrangeiras na Rússia. No entanto, não percebemos essa posição no decorrer do romance, que narra as diferentes posições religiosas e culturais da Rússia no final do século XIX através dos quatro filhos de um empresário fanfarrão sem auto-estima, Fiódor Pávlovitch, “um velho palhaço”. Os filhos são oriundos de dois casamentos diferentes e foram criados de maneira diferente. Mítia (Dmitri) possui uma formação liberal ocidental que conflita com a de Aliéksei, criado por criados místicos e que deseja se tornar monge. Mítia tem uma visão de mundo parecida com de Ivã. Esses dois últimos fazem parte da juventude russa que, no final do século XIX, reunia-se em bares para discutir liberalismo, socialismo e se Deus existe.
Conta-se, então, de Ivã, um episódio onde a frase atribuída a Dostoievski não apareceu literalmente, mas provavelmente foi retirada dessa passagem:
“Há cinco dias, numa reunião em que se achavam sobretudo senhoras, declarou ele solenemente, no curso duma discussão, que nada no mundo obrigava as pessoas a amar seus semelhantes, que não existia nenhuma lei natural ordenando ao homem que amasse a humanidade; que se o amor havia reinado até o presente sobre a terra, era isto devido não à lei natural, de sorte que se destruía no homem a fé em sua imortalidade, não somente o amor secará nele, mas também a força de continuar a vida no mundo. Mais ainda, não haverá então nada de imoral, tudo será autorizado, até mesmo a antropofagia. Não é tudo: terminou afirmando que para cada indivíduo – nós agora, por exemplo – que não acredita nem em Deus, nem em sua imortalidade, a lei moral da natureza devia imediatamente tornar-se o inverso absoluto da precedente lei religiosa; que o egoísmo, mesmo levado até a perversidade, devia não somente ser autorizado, mas ser reconhecido como a saída necessária, a mais razoável e quase a mais nobre (Dostoiévski, 1973, p. 57).
Mais adiante, no romance, essas idéias de Ivã foram respondidas: mesmo sem Deus, bastaria seguir uma ética da virtude e tudo estaria normatizado e regrado. Com “ética da virtude”, parece-me que a referência era a uma ética com a de Aristóteles, baseada na harmonia, no equilíbrio, na justiça e nas virtudes (bondade, verdade, honestidade, etc.).
E o "estado da arte" hoje em dia, ou seja, responderemos, com a tecnologia, se Deus existe ou não? Ainda não avançamos nada nesse sentido. No entanto, cada grupamento humano se apóia em seu Deus, especialmente em situações de conflito: no início da invasão do Afeganistão, em 2001, tanto Bush quanto Bin Laden fizeram proclamações falando em Deus. Deus fica sendo, então, argumento ideológico que dá suporte a um projeto de poder.
Um comentário:
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