Laerte Braga
Carlos Alberto Brilhante Ustra, coronel reformado do Exército brasileiro não difere em nada de nenhum dos carrascos nazistas nos campos de concentração espalhados por países da Europa durante a Segunda Guerra Mundial. Comandante do DOI/CODI
Janaína de Almeida Teles, Edson Luís de Almeida Teles, César Augusto Teles, Maria Amélia de Almeida Teles e Criméia Alice Schimidt de Almeida, todas vítimas de crime de tortura (hediondo), ajuizaram Ação Declaratória no fórum de São Paulo contra o carrasco Brilhante Ustra.
O juiz Gustavo Santini Teodoro julgou procedente o pedido para decidir que entre as vítimas e Brilhante Ustra “existe relação jurídica de responsabilidade civil nascida da prática de ato ilícito gerador de danos morais”. Condenou o réu às custas e despesas processuais e honorários advocatícios. A decisão do juiz cinge-se a três dos autores, César Augusto, Maria Amélia e Criméia Alice.
“Ato ilícito gerador de danos morais”, na espécie, é tortura.
Para o carrasco, em sua defesa, além dos benefícios da lei de Anistia, a negativa da prática de tortura. Ustra é autor do livro “Rompendo o silêncio, a verdade sufocada”. Tenta negar as barbáries e atrocidades praticadas rotineiramente no DOI/CODI de São Paulo e desqualificar os que o denunciam como um dos monstros mais perversos e cruéis da ditadura no Brasil.
Ligado à Operação Condor (nome dado a operação que uniu os açougues das ditaduras do chamado Cone Sul - Brasil, Argentina, Paraguai, Uruguai e Chile), foi parte ativa em seqüestros e assassinatos de líderes da oposição a esses regimes. Sem entranhas e sem a menor noção de qualquer coisa que diga respeito ao ser humano como tal, Brilhante Ustra passeia sua impunidade de forma ostensiva e arrogante, características que carrega desde que praticava tiro ao alvo em alvos imobilizados pela violência dos cárceres ditatoriais, por estupros, algemados e indefesos.
A prática de tortura pelo regime dos generais já havia sido reconhecida pela Justiça brasileira no processo movido por Clarice Herzog contra o Estado pela morte de seu marido Wladimir Herzog, mas nunca um dos carrascos havia sido apontado com precisão como agora Brilhante Ustra.
Os presos mortos no DOI/CODI de São Paulo eram entregues às famílias em caixões lacrados e com o aviso que haviam sido vítimas de atropelamento. E nem todos. muitos figuram como desaparecidos.
A decisão do juiz Santini não significa perspectiva de condenação de Brilhante Ustra pelos crimes praticados contra cidadãos sob sua responsabilidade e guarda no sombrio período ditatorial, já que a lei da Anistia busca proteger criminosos como o coronel. Mas incide em responsabilidade civil, o que, na prática, vale como reconhecimento da contumácia odiosa e vergonhosa da tortura.
É um passo expressivo na luta pela abertura dos arquivos da ditadura. Indispensáveis a que os brasileiros das gerações presentes tenham idéia da estupidez e da boçalidade que governaram o Brasil entre 1964 e 1984. E principalmente para desmoralizar o “patriotismo” de figuras abomináveis como Brilhante Ustra. É aquele que o pensador inglês Samuel Johnson chama de “último refúgio dos canalhas”.
Serve para que se possa conclamar à reflexão sobre o período da ditadura militar, oriunda de um golpe contra um governo constitucional, o de João Goulart, ele próprio assassinado pela Operação Condor. A tortura hoje não mudou no que diz respeito às formas e meios, mas usa métodos ditados pelos avanços tecnológicos, sobretudo os da Comunicação.
Cria um mundo em que algozes e vítimas assentam-se à mesma mesa e nenhum dos dois tem ânsias de vômito. É o quem faz e quem deixa fazer.
As Forças Armadas brasileiras resistem à abertura dos arquivos da ditadura com o argumento que o passado deve ser esquecido e que as atitudes dos militares foram necessárias à democracia. Mas a deles. A que implantaram pela força das armas e pela truculência de gente como Brilhante Ustra, escoimado em instrumentos ditos legais como o Ato Institucional número cinco, o famigerado AI-5.
A decisão do juiz Santini, malgrados os limites estabelecidos pela lei da Anistia, escancara uma porta e cria a perspectiva para que famílias de vítimas desaparecidas da ditadura possam continuar lutando para que seus mortos sejam devolvidos e possam ser sepultados de forma decente. E torturados postos na cadeia.
Há quilômetros de distância entre a decência dos presos políticos e a canalhice de torturadores.
Torturadores são os “heróis da covardia”. Brilhante Ustra não é mais que isso.
Um Pastinha da vida, mas é preciso que sejam mostrados em sua dimensão real. A de canalhas.
A decisão coincide com os 41 anos do assassinato de Ernesto Chê Guevara por esbirros do nazi fascismo na Bolívia. Lá já deram a volta por cima, aqui ainda não. Brilhante Ustra está solto.
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