terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

Zizek, Caetano, Gatão de Meia Idade, etc

Ouvi Zizek falar na TV Cultura ontem e gostei, achei muito instigante. Caetano hoje falou que nem gosta tanto de Zizek, queria mesmo é ironizá-lo ao falar dele no blog.

A Revista Piauí, há algum tempo, trouxe uma matéria com Zizek no Rio e registrou que seu discurso oscila e com frequência ele dá uma volta em torno de si mesmo, o que foi criticado, aí pela web, no meu amigo e excelente jornalista Laerte Braga. E que, normalmente, jamais faz isso: os textos dele são diretos como o punho de Cohn em The Sun Also Rises.

Zizek é lacaniano e marxista e um apaixonado intelectual e por isso ele passa paixão. Isso é importante: os alunos, ao nos verem entusiasmados ou apaixonados, correm o risco de se apaixonar, ainda que, muitas vezes, seja um risco remoto.

Estar apaixonado para mim é diferente das certezas revolucionárias vibratórias com as quais se deleitou, nos anos rebeldes, o Ferreira Gullar, por exemplo. Esquerda, volver, Gullar! Tem de ter cuidado, pois discurso conservador assim o Jorge Bornhausen também faz. E os integralistas brasileiros, que agora não usam mais a sigma verde e sim um cruzeiro do sul azul e branco. Tudo muda, até o integralismo!

O filósofo esloveno vê tudo quanto é filme, desde o Clã das Adagas Voadoras até Clube da Luta. Ele diz que, se a pessoa falar que Clube é fascista, ele é um liberal. O filme é um bom teste, segundo Zizek. E ele acha que nossas telenovelas tais como Escrava Isaura e os filmes chineses de luta mostram que "outra indústria cultural" é possível. Eu morri de rir em outra passagem, quando ele diz que, se seu pai te proibir de namorar, isso não é problema. Mas se ele te disser: que tipo de homem vc é, não pegou mulheres? Isso é meio caminho andado para vc virar impotente. Ele comenta a cena de Clube da Luta onde o protagonista se martiriza: gozar implica em algum prejuízo. Devemos lutar contra o imperativo do inconsciente de gozar, gozar sempre, pois para o Zizek a ideologia está é aí. Acho que aí é um bom ponto de vista para se analisar a indústria cultural brasileira, a Axé Music, por exemplo. Ela sempre proclama: GOZA BRASIL!

O poder é afrodisíaco. Sem tesão, como dizia Roberto Freire, não há solução.

Outro ponto que me chamou a atenção foi a posição dele em relação a Stálin: ele relativiza esse comunista, que virou unanimidade entre liberais, direita, esquerda e extrema-direita: um "canalha" a quem sempre alguém se refere. No entanto, Zizek defendeu Stálin do conceito de totalitarismo de Hannah Arendt, onde cabe tudo: nazismo, comunismo, imperialismo. Edward Said, por exemplo, julga Arendt teórica do imperialismo. Francis gostava de Arendt. Há ruído aqui....Sinceramente, já escrevi um artigo para mostrar que esse conceito foi retirado do vocabulário do marxismo, para significar as filosofias da totalidade e virou algo grotesco, monstruoso: totalitarismo.

Zizek exemplifica que os prisioneiros do Gulag escreviam, obrigatoriamente, um telegrama de felicitações no aniversário de Stálin. Alguém já imaginou judeus em Auschwitz enviando um telegrama a Hitler? Dá para sentir a diferença?

E Zizek parecia estar se dirigindo a Caetano e à sua defesa da Axé Music quando falou: "detestou carnaval. O Gulag foi um grande carnaval, uma inversão da ordem. Um dia você é ministro, outro é espião, um dia você é banqueiro, outro prisioneiro mendigando comida. Eu quero ordem". Maria Rita Kehl, Vladimir Safatle e outros são brilhantes mas, a meu ver, foram ofuscados por esse intelectual brilhante que é o Zizek.

Pior do que o balaio de gatos insuportável do totalitarismo, é mania dos filósofos de chamar quem eles não concordam de irracionalista, tal como Afonso Romano de Sant´Anna a respeito dos que defendem Battisti. Ah, sim o Enigma Vazio...vou ler a resenha de Marcelo Coelho. Mas o título me parece "Elvira, a Morta Virgem". A gente já sabe quem morre no final. A arte contemporânea é um enigma, ou seja, algo que pede decifração; mas, para Afonso, não é preciso, é fátuo, decifrar essa arte. A arte contemporânea, poderia dizer ele num paradoxo wildeano, é uma esfinge sem segredo. Para fazer o que ele quer fazer, acho que o crítico deveria dizer: não gosto de Duchamp, mas gosto de Maria Martins, e a partir de agora vou lutar pela consagração e canonização de Santa Maria Martins, a escultora e mulher de um diplomata que amou Duchamp em todos os sentidos.


Caetano voltou a discutir o debate na Folha Ilustrada. Contrera falou sobre isso em seu blog: para ele, foi como ver o caderno Mais! ao vivo. Mas era a Ilustrada, Contrera! Há muito não vejo o triunvirato Cacá/Gullar/Caetano no Mais! Contrera é muito cansado e entediado para debater esse grupo de nordestinos enérgicos de maneira pertinente. Que o deixassem subir ao palco. Aí veríamos. O poder não corrompe: com ele, as pessoas se revelam...show man por show man, Ferreira Gullar é bom mas acho que prefiro Gerald Thomas. O Thomas é desvinculados da baixa política escrota do Brasil, como mostrou em sua última postagem no blog e jamais cogitaria apoiar Roseana Sarney para presidente. O encontro dos cinquenta anos de Ilustrada era mais uma celebração de quem venceu e por isso não cabia muito a crítica e a teoria de uma Maria Rita Kehl, por exemplo.

Uma crítica cultural séria no Brasil começará de onde Gilberto Vasconcellos a deixar. O insight dele de que o cinema de Glauber é uma resposta ao Adorno e suas críticas ao cinema é GENIAL. Realmente, os adornianos precisam ver e analisar Glauber: alô alô Rodrigo Duarte & Douglas Garcia!


Vi um filme de madrugada esses dias e era assim: Gatão de Meia-Idade. Há uma referência no filme ao teatro do Gerald: o cara de meia idade chama uma moça mais nova para ver um pornô, mas ela quer ir ver a peça do GT. Um diálogo memorável do filme. quando o gatão transou uma super-executiva. Transcrio livremente. Minutos antes, ele perguntara pelo "size" do pênis:

--Eu tenho que ir.
--Outro homem.
--Rodrigo. Reinaldo. José. Fábio.
--Quatro?
--Marido e três filhos.
--Você não me disse que era casada.
--Muda algo?
--Eu faria fantasias com a dissolução da família brasileira.
--Só porque sou casada, não posso trepar com qualquer um?
--Eu sou qualquer um?


Isto posto, transcrevo algumas frases que me chamaram a atenção essa semana:

"Seja a diferença que você quer ver no mundo".
"O futuro é uma velha desdentada tomando milk-shake".

Um comentário:

Henrique Hemidio disse...

Tentei assistir o Zizek no Roda-Viva inteiro ontem mas, juro, o inglês dele tava me dando nos nervos, então fiquei só com a primeira parte... Não entendi aquele lance de reformulação do comunismo, e creio, menos ele do que eu... Deu uma boa resposta no internauta que perguntou a respeito do uso da filosofia na crise econômica... Sim, as pessoas acham que os filósofos devem saber de tudo.