Criado conforme o modelo original, partido nazista no Brasil foi “se amolecendo, se abrasileirando, se tropicalizando”, diz pesquisadora
Carlos Haag
Quando se fala em nazistas no Brasil, a imagem que nos vem à cabeça é de um bando ridículo de gaúchos louros levantando o braço direito em meio à fumaceira de um churrasco. Em verdade, a presença nazista foi menos folclórica e de uma importância política notável, em especial para a consolidação do Estado Novo varguista, que completa, neste ano, 70 anos. Nazismo tropical? “O partido nazista no Brasil”, tese de doutorado de Ana Maria Dietrich, recém-defendida na Universidade de São Paulo, traz novas luzes sobre um velho chavão. Pesquisando em arquivos alemães, entrevistando antigos militantes do partido no país e até as filhas do Führer tupiniquim, Hans Henning von Cossel, o chefe da célula nazista brasileira, Ana descobriu que mesmo o nazismo é passível de tropicalização quando abaixo do Equador. “Essa tropicalização ocorreu de acordo com as nuances que a realidade brasileira impôs ao nazismo. Assim foi possível aos alemães e descendentes ao mesmo tempo comemorar o aniversário de Hitler e uma Festa de São João, tomar cerveja alemã e comer canjica”, explica a pesquisadora.
Esse é o lado anedótico do nazismo à brasileira, mas há fatores mais importantes e igualmente desconhecidos: o partido nazista brasileiro funcionou por dez anos no país, atuando em 17 estados brasileiros (incluindo-se improváveis Bahia, Pará e Pernambuco), com 2.900 integrantes, um contingente só superado pelo partido na Alemanha. Dos 83 países que tiveram uma “filial” do NSDAP hitleriano, o Brasil ocupa o primeiro lugar, na frente da Áustria, país natal do Führer. Aliás, antes mesmo de Adolf chegar ao poder, em 1933, o partido nazista já existia por aqui. Em 1928, antecedendo em cinco anos a ascensão de Hitler, foi criado um grupo em Benedito Timbó, Santa Catarina, não só a primeira célula estrangeira do país, como a primeira do movimento nazista no exterior. Assim como o comunismo preconizava sua internacionalização, nazistas, seus rivais, queriam o mesmo. “O partido nazista no Brasil era para a Alemanha muito mais importante do que para o Brasil. Enquanto o governo brasileiro não se incomodou por dez anos com sua existência, o governo hitlerista fez dele o representante do povo alemão em território brasileiro e as ações contra este partido tinham conseqüências diretas nas relações com o Brasil”, observa Dietrich. Sua articulação e controle eram feitos pela Auslandorganisation der NSDAP (Organização do partido nazista no exterior, ou A.O.), cujo chefe, Ernst von Bohle, estava diretamente subordinado a Rudolf Hess, o segundo da hierarquia nazista, e tinha o mesmo status de dirigentes como Joseph Goebbels. O mandamento central da A.O. era a manutenção do Deutschtum, a “germanidade”, dos alemães no exterior, que não deveriam se misturar com os estrangeiros ou usar a língua local. “Em contrapartida, como solidariedade a Gastland (terra de hospedagem), os países onde estavam as comunidades de alemães, não era permitida aos partidários a participação na política local. Os nazistas deveriam se manter neutros com relação à política interna e não poderiam divulgar suas idéias aos nativos”, nota a pesquisadora.
A propaganda apelava à responsabilidade do alemão no exterior com sua pátria. “A Alemanha de Hitler resgatava e oficializava o sentimento de ‘pertencimento’ do povo alemão à nação alemã, cujas origens remontam ao pangermanismo e ao anti-semitismo eliminacionista germânicos manifestos desde a segunda metade do século XIX”, afirma a historiadora Maria Luíza Tucci Carneiro, diretora do Laboratório de Estudos sobre a Intolerância, da Universidade de São Paulo (USP). A eleição de Hitler, em 1933, contou com preciosos votos desses “hóspedes”, inclusive brasileiros. A suástica, porém, não abrigava todos. Um dos fatores da tropicalização, observa Dietrich, era que os “alemães puros” eram considerados superiores aos teuto-brasileiros, a geração nascida nos trópicos. Essa divisão seria a perdição nazista: “A criação de um movimento fascista à brasileira, o integralismo, se expandiu e despertou fascínio na comunidade teuto-brasileira, com inúmeras adesões, pois, na década de 1930, o integralismo atraiu, pelo seu conteúdo ideológico, muitos alemães e descendentes, em especial os ‘desprezados’ pelo nazismo internacional por suas origens mistas”, nota a autora.
Mas, como tudo que é nazista, há situações folclóricas. Num espírito digno dos nazistas hollywoodianos de Indiana Jones, houve expedições do Reich ao Brasil, visto como um laboratório racial, com o objetivo de verificar as condições de colonização da raça branca em terras tropicais. Em 1936, lembra Dietrich, o Instituto Tropical de Hamburgo enviou um grupo de cientistas germânicos para estudar as populações alemãs que viviam no Espírito Santo. Receberam auxílio do governo brasileiro e apoio de Henrique da Rocha Lima, segundo a pesquisadora, saudado pelos nazistas como “nosso velho amigo, o professor”. Rocha Lima (que recebeu uma comenda das mãos do Führer) participou ativamente dos estudos sobre a febre amarela com Oswaldo Cruz e esteve à frente de Manguinhos, quase levando um Nobel por seus estudos sobre uma variante de tifo transmitido por piolhos aos combatentes em trincheiras. O resultado da pesquisa capixaba mostrou que “a raça ariana poderia sobreviver bem nos trópicos, desde que evitada a mistura com a população local”. Dentro do espírito do Lebensraum (a busca do “espaço vital” via expansionismo militar), o Brasil tinha potencial, embora, nas palavras do próprio Führer, “não vamos desembarcar tropas e conquistar o Brasil com armas na mão. As armas que temos, para a ação no exterior, são as que não se vêem”. A Amazônia igualmente interessava ao Reich. Entre 1935 e 1937, outra expedição percorreu o rio Jari até a fronteira com a Guiana Francesa, resultando num documentário sobre o “enigma do inferno da mata”, feito pela UFA, o célebre estúdio cinematográfico alemão. Houve a “tentativa de fazer amizade entre alemães e índios”, sem falar nas caixas de peles de animais, esqueletos, fósseis e milhares de artefatos arqueológicos levados para a Vaterland, em sigilo, para análise posterior. Até hoje uma cruz de madeira amazônica, com a suástica, marca o lugar onde está enterrado Josef Greiner, intérprete do grupo nazista.
Segundo Dietrich, o partido brasileiro tinha ligação direta com o Reich e designou Hans von Cossel para chefiar a célula nacional, a partir de São Paulo. Ele viajava com freqüência para a Alemanha, onde foi apresentado a Hitler e elogiado por Joachim von Ribbentropp, o ministro das Relações Exteriores do III Reich, como “um dos mais bem afortunados e confiáveis chefes nacionais do NSDAP que comanda o maior grupo nacional da A.O.”. Em 1938 teve o privilégio de ganhar uma festa de despedida organizada pelo vice de Hitler, Hess. Cossel chegou ao Rio em 1931, como adido cultural à embaixada alemã e impressionou seus chefes a ponto de ser indicado à chefia do grupo, em 1934, no lugar de um colega corrupto, graças a sua capacidade de transitar com facilidade entre brasileiros e alemães, como por sua familiaridade com os estadistas Vargas e Hitler. Ana Dietrich, na Alemanha, conseguiu entrevistar as filhas de Cossel que revelaram ser ele “muito bem visto por Vargas, que lhe deu de presente uma pintura sua com uma bela moldura”. Elas também contaram à pesquisadora que, ao deixar o Brasil, em 1942, após o rompimento do Estado Novo com o Eixo, Cossel, convidado a trabalhar no Ministério das Relações Exteriores, declinou e foi servir na Marinha. “Meu pai disse que os olhou e afirmou: ‘Nisso não colaboro’. Ele também nos disse que não se impressionara com Hitler e só enviava relatórios a ele. O partido nazista no Brasil foi algo diferente. Como meu pai entrou, as pessoas acham que ele sabia de tudo, mas não foi assim. No exterior, as pessoas são mais alemãs porque existe um sentimento de pátria”, afirmou Gisela von Cossel. Memórias familiares nem sempre são confiáveis. “A relação de Cossel com Hitler e Vargas (que, em carta ao Führer, o chamava de “grande e bom amigo”) tem um caráter especial que mostra a amplitude do movimento nazista no Brasil. Não era apenas um movimento de colonos ‘saudosistas’, e sim algo que interferiu nos grandes escalões de poder da sociedade”, prefere acreditar, com razão, a pesquisadora.
E quanto à questão judaica? Como agiram os nazistas brasileiros em relação a uma comunidade que, nos anos 1930, tinha 40 mil integrantes? “A convivência de alemães com judeus era rara, só há poucos registros. O anti-semitismo local era um discurso importado, ou seja, na prática ele quase inexistia (embora tenha existido) e, na teoria, ele existia na publicação de artigos contra judeus. Mas o tom era de luta entre os ‘judeus de lá’ contra os ‘alemães de lá’”, diz Dietrich. O “racismo tropical” era mais forte contra os negros e mestiços, classificados como “brasileiros” de forma pejorativa. Há mesmo casos hilários sobre casamentos “étnicos”, como o de um colono catarinense que resolveu “importar” uma noiva ariana, apenas para descobrir que se casara com uma mulher “feia e com uma perna mais curta do que a outra”. Há outros, mais sintomáticos, como o de Roland Braun, da diretoria do partido nazista em São Paulo, que se casou com uma brasileira e batizou sua filha brasileira de Irene. “Igualmente, não houve, ao contrário do que se costuma afirmar, um isolamento dessas comunidades, rurais ou urbanas, que interagiam com a sociedade local e absorviam hábitos e costumes desta.”
O Reich fazia “vista grossa” para esses pecadilhos tropicais, já que a comunidade brasileira, além dos serviços diplomáticos informais que fazia para a Vaterland, igualmente era fonte de recursos: “Morando no Brasil desde 1924, Otto Braun coordenava toda uma série de transações proibidas de câmbio e, ao ser preso, em 1942, forneceu detalhes de como se faziam espionagem e fraudes financeiras no Brasil por meio do Banco Alemão Transatlântico, que transferia dinheiro da comunidade para bancos suíços, que depois eram enviados à Alemanha”, revela Dietrich. A verdadeira face tropical do nazismo, porém, foi política e acabou sendo um “presente” para o Estado Novo: a relação entre nazistas e a Ação Integralista Brasileira (AIB), de Plínio Salgado, com suas camisas verdes e seu “anauê”. “O integralismo pode ser visto como importante característica do nazismo tropical por ser algo extraordinário que não estava nos planos originais da organização do partido nazista no Brasil”, explica Dietrich. O canto de sereia integralista era doce: “Se tu fosses alemão serias Nacional Socialista. És brasileiro, inscreve-te, portanto, nas Legiões Integralistas e vem vestir a camisa verde dos que se batem pelo bem do Brasil”. Só que, enquanto a AIB, como movimento nacionalista, não concordava com o nacionalismo alemão (embora, com fins de propaganda, se apresentasse como a solução viável para a materialização do Deutschtum tropical), o nazismo não queria a assimilação da comunidade alemã no Brasil. “Caracterizando-o pejorativamente como nativista, o NSDAP era totalmente contrário a que os alemães e seus descendentes se filiassem à AIB, pois se achava que isso iria afetar a germanização do Brasil. Sob a visão do III Reich, o integralismo destacava principalmente a questão racial, visando melhorar a raça com a diminuição de negros e índios e o aumento de europeus. O governo nazista chamava isso de ‘lusitanização’, encarada como ameaça ao Deutschtum.”
Visto com desprezo pelos alemães de Berlim, conta a pesquisadora, o integralismo tornou-se um anátema após a patética tentativa de golpe contra Vargas, em 1938, com a suspeita de participação de nazistas brasileiros. Além de desobediência aos ditames da Alemanha, o putsch tupiniquim também deixava o Estado alemão numa saia-justa indesejável com o governo brasileiro, ao qual procurava, sem sucesso, agradar, mesmo ciente de que Oswaldo Aranha era o chanceler de Getúlio. Este preferia virar o jogo em favor dos Estados Unidos, que considerava parceiros mais valiosos do que a Alemanha, embora, nos anos 1930, o comércio entre tedescos e brasileiros fosse o dobro do feito com os ianques. Plínio Salgado, de pedra no sapato do ditador brasileiro, virou pedregulho nas botas de Hitler por um erro de cálculo de Berlim. “Por culpa da proibição de descendentes de alemães de entrar no partido, este perdeu uma de suas maiores forças no Sul, onde a comunidade alemã mais expressiva era de teuto-brasileiros. Assim, houve uma reação ao nazismo segregacionista, líderes não foram aceitos e o integralismo se tornou a opção viável”, analisa a historiadora. Tomando do próprio remédio, o nazismo tradicional errou no passo de ganso para a sua versão tropical. O movimento conservador, direitista e nacionalista de Salgado atendia ao que os alemães nascidos no Brasil queriam, mas eram alijados pela Vaterland.
No fim das contas, ao vencedor, muitas Kartoffel. Diante do imbróglio que envolvia nazistas e integralistas, Vargas pôde, sem problemas, colocar várias organizações na clandestinidade, inclusive a célula do NSDAP no país. “Afinal, entre 1938 e 1942, dentro do projeto de nacionalização do Brasil almejado por Vargas, o alemão passa de perigo ideológico, pela divulgação do ideário nazista, para perigo étnico, como alienígena ao ‘Homem Novo’ que se desejava construir. Com a entrada do Brasil, na Segunda Guerra Mundial, em 1942, ao lado dos Aliados, o perigo vira ‘militar e ideológico’”, observa a pesquisadora. Vargas estava com o melhor dos mundos políticos graças à inabilidade de nazistas e integralistas. Dessa forma, não precisava mais se preocupar com indivíduos que venerassem Hitler, e não a ele. Ao mesmo tempo, nota, pôde canalizar a seu favor toda a demanda autoritária, xenófoba e nacionalista desses grupos. Bastava fazer com que se sentissem vinculados ao Estado Novo, e não ao III Reich. Lá estava, para todos, um chefe “pai da nação”, anticomunista, adepto da ordem, do progresso e das massas.
O mesmo ocorreu entre a Itália de Mussolini e a AIB. “A ação fascista, que de início apoiou Salgado, foi muito útil à direita nacional ao popularizar as idéias autoritárias e estimular muitas pessoas a uma maior simpatia em relação ao Estado Novo”, observa o historiador João Fábio Bertonha, que, em seu doutorado, trabalhou com a contrapartida italiana da tese de Ana Dietrich. Os fascistas, melhores políticos do que os germânicos, por um longo tempo fizeram um jogo duplo com Vargas e seus inimigos, os integralistas, apostando em ganhar em quem vencesse no futuro. Como o que houve com os nazistas brasileiros, foram os filhos de imigrantes italianos que optaram pelo apoio total à AIB, ao contrário de seus pais ou avós, italianos natos, que eram fascistas à Mussolini. Também, como no caso alemão, havia uma preocupação étnica implicada no apoio ao movimento de Salgado e, após 1938, um total descrédito na capacidade revolucionária dos integralistas. A italianidade falava mais alto, como a germanidade. Aqui Salgado deu-se melhor, pois antes de ser esquecido recebeu grandes somas de dinheiro vindas de Roma. Curiosamente, a poderosa burguesia paulistana, fervorosa apoiadora do fascismo italiano, fechou seus cofres ao integralismo. “Sobraram os descendentes italianos que, influenciados por esse contexto político-nacional, por seus problemas de aceitação na sociedade brasileira como filhos de imigrantes e pelo clima geral de apoio às idéias de direita, suscitado pela propaganda italiana, poderiam ter sido cooptados pelos fascios, mas acabaram, dada a sua aculturação e o desejo de serem vistos como brasileiros e de participar da política brasileira ativamente, por aderir à AIB”, nota Bertonha. Quando essa se quebrou, dirigiram seu entusiasmo ao similar nacional que estava no poder: o varguismo. Nazismo que acabou em “feijoada”?
Há quatro variáveis que demonstram a tropicalização do nazismo no Brasil: o racismo tropical, ou seja, além dos judeus, houve preconceito contra outros grupos, como os negros e mestiços, que estavam mais em contato com o partido; a possibilidade de casamentos interétnicos e certa resistência da população local ao germanismo, já que até o diretor da célula nazista paulista, Roland Braun, era casado com uma brasileira e muitos alemães diziam se ‘sentir em casa’ na Gastland nacional; a presença do integralismo que distorceu a lógica do modelo; e a mistura de hábitos, já que, ao contrário do preconizado, não houve a formação de guetos teutônicos, mas uma interação com a sociedade local, em que os alemães absorviam hábitos e costumes”, enumera Dietrich. Ainda assim, as estratégias de propaganda desenvolvidas surtiram efeito sobre os colonos do Sul, que, observa Tucci Carneiro, “se tornaram apáticos à política brasileira com tendências ao auto-enclausuramento”, conforme documentou um jornal da colônia nazista: “Somos 1 milhão de alemães no Brasil. Somos um exército sem soldados, uma igreja sem torre, aceitai o desafio agora. Vós fostes chamados para serem líderes deste povo, pois sois o povo mais inteligente desta terra”. Igualmente a colônia alemã estava fragmentada em relação aos judeus. “Getúlio Vargas cercou-se de germanófilos convictos, políticos e intelectuais que não ocultavam seu fascínio pelas conquistas empreendidas pela nova Alemanha”, observa Tucci Carneiro. Parte da comunidade alemã no Sul do Brasil acreditava que reproduzia, em “microrregionalidades”, a sua “velha Alemanha” agora reavivada pelo Führer.
Essa aproximação dos teutos com a cultura original provocou um isolamento lingüístico e cultural que, durante o Estado Novo, foi combatido pelas autoridades políticas que interpretavam essa postura como “erosão do espírito de brasilidade”. Segundo a pesquisadora, esse discurso nacionalista não apenas serviu para combater os quistos raciais, mas também para encobrir valores racistas e anti-semitas sustentados pela elite política que falava em “promover o homem brasileiro, defender o desenvolvimento econômico e a paz social do país”. A professora lembra que o conjunto de decretos nacionalistas e xenófobos promulgados em 1938 pelo Estado Novo, assim como a Polícia Política, serviu para legitimar a ação repressiva e preventiva contra aqueles que, segundo o discurso oficial, eram considerados como elementos ameaçadores para a composição racial e para a ordem política brasileiras. “Quem eram os elementos corrosivos da nação brasileira? Os judeus tornados apátridas pelos nazi-fascistas. Somavam-se a essa ‘escória’ os comunistas, os ciganos, os negros, tratados como párias da humanidade.”
Assim, segundo Tucci Carneiro, a postura de neutralidade de Vargas ante os países do Eixo era uma fachada, uma máscara adequada aos grandes estadistas coroados pelos louros do fascismo. “Essa leitura possibilita compreender o árduo processo de gestação dos direitos humanos no Brasil. A história do Brasil contemporâneo ainda está para ser escrita trazendo a público a postura omissa do governo brasileiro diante da questão judaica. O Brasil, a partir de 1937, editou uma série de circulares secretas proibindo a concessão de vistos aos judeus e facilitando a entrada de ‘arianos puros’.” Há várias cartas anônimas em arquivos do Deops com denúncias de desembarque de judeus nos portos do Rio e Santos. Assim como a historiadora descobriu uma carta do chanceler de Vargas, Oswaldo Aranha, que, como presidente das Nações Unidas, criou o Estado de Israel: “Nela, Aranha afirma a importância de se criar Israel justamente para evitar a migração de mais judeus e pôr fim à entrada ‘indesejada’ deles no Brasil”, conta Tucci Carneiro. A união de chucrute e feijoada certamente provocou indigestões históricas que merecem ser recuperadas.
Revista da FAPESP
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