Comunicado No. 38 Frente Naciona de Resistencia contra el Golpe de Estado
Al pueblo hondureño y la comunidad internacional:
1. Denunciamos que horas antes de la farsa electoral de la dictadura militar, sus cuerpos represivos han emprendido una feroz persecución contra organizaciones populares que se han manifestado opuestas al Golpe de Estado.
Ejemplos de ello son el allanamiento y destrozo de la sede de la Red Comal en Siguatepeque; el cerco militar y el amedrentamiento con armas de fuego contra la sede del STIBYS en Tegucigalpa; el cerco militar contra la comunidad Guadalupe Carney en Silín, Colón, y contra la Colonia La Paz, en La Lima, Cortés; y la militarización del centro INESCO del padre Fausto Milla en Copán. De igual manera, nos llama a preocupación el atentado que sufrió el Centro de Derechos de Mujeres de San Pedro Sula, con una bomba.
Asimismo, la acción represiva ha recaído sobre miembros(as) activos(as) de la Resistencia Popular en la víspera de las votaciones, como sucede con la persecución que se ha desatado contra dirigentes de la Resistencia en la Colonia Kennedy y El Reparto, de Tegucigalpa; en Gualala, Santa Barbara; en San Pedro Sula, Cortés; y la captura de la dirigente feminista Merlyn Eguigure, en Tegucigalpa, liberada tras la presión hecha por sus compañeras del Movimiento Visitación Padilla.
También han sido allanados el centro de trabajo del dirigente del Partido Unificación Democrática, Gregorio Baca, de donde se llevaron detenido a su vigilante Humberto Castillo (discapacitado), y el allanamiento de la casa de la hermana de la periodista Percy Durón, de Radio América. Para rematar, el señor Fabricio Salgado Hernández, de la colonia Tiloarque, está en estado crítico tras ser baleado por militares que custodian el Edificio del Estado Mayor, pues el herido tuvo un accidente por los obstáculos que los militares han colocado.
2. Esta violencia muestra el estado de indefensión en que se encuentra el Pueblo Hondureño ante las huestes represivas del gobierno de facto. Retrata también el clima de persecución en que se realiza el circo electoral que inicia el día de hoy. Por ello, el Frente Nacional de Resistencia contra el Golpe de Estado reitera que no existen condiciones para la realización de elecciones limpias y seguras, y que el empecinamiento de este desgobierno en realizarlas solo obedece a su urgencia “lavarle” la cara al relevo de golpistas que surgirá de las mismas.
3. Alertamos al Pueblo Hondureño y a la comunidad internacional, sobre la eventualidad de que esta escalada represiva se incremente en las próximas horas teniendo como marco justificativo la ola de atentados que en forma sospechosa se realizan contra buses, escuelas y edificios públicos, cuya autoría la Policía Nacional atribuye en forma casi automática, irresponsable y tendenciosa a la Resistencia Popular.
4. Por tal motivo el Frente Nacional de Resistencia contra el Golpe de Estado reiteramos que nuestra lucha es PACIFICA y ratificamos nuestro llamado al Pueblo Hondureño para que no participe de la farsa electoral montada por la oligarquía el dia de hoy. A la vez que desmentimos cualquier mensaje con el cual se pretenda crear confusión, diciéndole al Pueblo que la Resistencia llama a votar.
¡RESISTIMOS Y VENCEREMOS!
Dado en la ciudad de Tegucigalpa, M.D.C. 28 de noviembre de 2009
Um observatório da imprensa para a cidade de Bom Despacho e os arquivos do blog Penetrália
domingo, 29 de novembro de 2009
sexta-feira, 27 de novembro de 2009
Caetano X Lula
A luta continua.
Vejam o vídeo explicando parte da polêmica:
Depois disso, Lula disse que esse tipo de crítica é burrice, Caetano mandou carta explicativa ao Estado de São Paulo e disse que a manchete é que foi provocativa e os linguistas gostam da fala de Lula e aplaudem. "Linguistas" virou quase que sinônimo de "petistas". Lula falou que pode falar sine qua non, ou seja, domina latim. A "família Caetano" quis pedir desculpas, Dona Canô mas pois teme a repercussão na política local de Santo Amaro; Lula ligou e perdoou. Reinaldo Azevedo foi ao Jô e protestou contra o perdão. Soube que está circulando um cordel a respeito do caso. Vejamos os novos desdobramentos. Vou se posto o cordel aqui.
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quarta-feira, 25 de novembro de 2009
Reinaldo Azedo no Jô: Show de Bobagens!
Reinaldo Azevedo deu um show de bobagens ontem no Jô. Protestou em nome das mulheres, minorias religiosas e sexuais, sr. anti-politicamente correto e carola que nunca nada fez de efetivo pelas minorias.
O apresentador tentou resistir, mas a ré estava forte. Jô tentou injetar humor num jornalista político que produz textos onde ele é escasso, raso ou de acintoso mau gosto. Desafiador, propõe a Lula estatizar o sistema telefônico, no que Jô reage, amenizando a provocação, temeroso das consequências...Ai que meda, hein?
Ele deu vivas ao preconceito de Caetano Veloso ao chamar Lula de analfabeto, invertendo tudo e dizendo que foi Lula quem ligou para coagir a pobre Dona Canô a pedir desculpas. Oh, Lula maldoso, molusco molestador de velhinhas!
Tio Rei, o jornalismo do Samuel Wainer apoiado pelo Getúlio era muito melhor do que sua militância tucana pseudo-profissional! Tem gente que, por mais que estude, não melhora!
Ele chega a dizer que operaram seu cérebro e só deixaram o tumor, que ele é tão reacionário que é até contra a reforma ortográfica. Repetir como mantra argumentos contrários não os anula, pelo contrário. O rei de coroa de lata está traumatizado pelas verdades que ficam girando em torno de sua cachola oca.
Reinaldo é de direita e reacionário, sim; Ahmadinejad é o governante de um povo que vive uma revolução, ainda que uma revolução islâmica.
Aliás, o ataque de Jô e Azevedo à "reforma" foi o ápice do circo de horror, com a gramática no papel de Mulher Monga. Jô, Reinaldo, não avacalhem nosso trabalho de professores, o acordo é para unificar a GRAFIA, não a língua! Parem de repetir isso (a falácia de que o acordo unifica a fala), pois a gente acaba tendo que explicar isso aos alunos umas MIL VEZES devido às besteiras que vocês, com incrível credibilidade junto aos ingênuos, repetem na televisão!
Ô mídia demo-tucana, Globo e Veja, ô trem que emburrece e deseduca!
O apresentador tentou resistir, mas a ré estava forte. Jô tentou injetar humor num jornalista político que produz textos onde ele é escasso, raso ou de acintoso mau gosto. Desafiador, propõe a Lula estatizar o sistema telefônico, no que Jô reage, amenizando a provocação, temeroso das consequências...Ai que meda, hein?
Ele deu vivas ao preconceito de Caetano Veloso ao chamar Lula de analfabeto, invertendo tudo e dizendo que foi Lula quem ligou para coagir a pobre Dona Canô a pedir desculpas. Oh, Lula maldoso, molusco molestador de velhinhas!
Tio Rei, o jornalismo do Samuel Wainer apoiado pelo Getúlio era muito melhor do que sua militância tucana pseudo-profissional! Tem gente que, por mais que estude, não melhora!
Ele chega a dizer que operaram seu cérebro e só deixaram o tumor, que ele é tão reacionário que é até contra a reforma ortográfica. Repetir como mantra argumentos contrários não os anula, pelo contrário. O rei de coroa de lata está traumatizado pelas verdades que ficam girando em torno de sua cachola oca.
Reinaldo é de direita e reacionário, sim; Ahmadinejad é o governante de um povo que vive uma revolução, ainda que uma revolução islâmica.
Aliás, o ataque de Jô e Azevedo à "reforma" foi o ápice do circo de horror, com a gramática no papel de Mulher Monga. Jô, Reinaldo, não avacalhem nosso trabalho de professores, o acordo é para unificar a GRAFIA, não a língua! Parem de repetir isso (a falácia de que o acordo unifica a fala), pois a gente acaba tendo que explicar isso aos alunos umas MIL VEZES devido às besteiras que vocês, com incrível credibilidade junto aos ingênuos, repetem na televisão!
Ô mídia demo-tucana, Globo e Veja, ô trem que emburrece e deseduca!
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terça-feira, 24 de novembro de 2009
José Serra X Ahmadinejad
A função desse blog é falar das polêmicas culturais e, se possível, provocá-las. José Serra, político do PSDB e "disseminador do bem", criticou em um artigo na Folha de São Paulo o líder do Irã, Mahmoud Ahmadinejad, acusando-o de banalizar o mal, estando Serra claramente inspirado em Hannah Arendt (especificamente, no livro Eichmann em Jerusalém).
A posição de Ahmadinejad foi turbinada pela imprensa, embora penso que desejasse mesmo bater de frente com o Ocidente nesse ponto, uma vez que ele defende os palestinos (e, por isso mesmo, não jogará uma bomba em Isral, pois prejudicaria os palestinos).
Inicialmente, ele dizia que o holocausto um mito. Um mito não representa necessariamente uma mentira. A rigor, todas as nações constroem-se com base em mitos, narrativas, fatos históricos interpretados dentro de um determinado prisma.
Depois, afirmou que existiriam historiadores contra o holocausto, mas que eles foram presos. Estou apenas traduzindo a wikipedia em inglês. Agora, para William Waack da Globo, ele apenas questionou porque o povo palestino precisa pagar por crimes cometidos na Europa (aí a questão fica melhor colocada).
Serra aproveita a chegada (com repercussões negativas) de Ahmadinejad para fazer uma crítica a seus inimigos do governo Lula. Suas estratégias discursivas são: 1) comparar Ahmadinejad e o Irã com o nacionalismo nazista. No entanto, desde sempre quem teve apoio dos colonizadores europeus foram os judeus nacionalistas de direita que fundaram o estado de Israel, os chamados sionistas. 2) Criticar em bloco a política externa de Lula a partir do episódio da visita de Ahmadinejad. Pelo que pude observar, essa estratégia do artigo era, como se fosse combinada, repetida por toda a imprensa ligada indiretamente aos demo-tucanos, ou seja, toda a grande imprensa.
A partir da chegada de Ahmadinejad, Serra prega a aproximação com o governo golpista de Honduras, pois Ahmadinejad seria tão ditador quanto Micheletti. No entanto, embora as eleições que deram o poder a Ahmadinejad possam ser questionadas, Micheletti não enfrentou as urnas e sim tomou o poder juntamente com os militares, expulsando o presidente democraticamente eleito. Ahmadinejad é fruto da revolução islâmica, rebelião popular de fundo nacionalista e religioso que reafirmou a cultura iraniana no final dos anos 70, expulsando o Xá imposto em 1953 pelo Ocidente com a deposição do nacionalista laico Mossadegh. A revolução islâmica derrubou um ditador e possui, sim, mais legitimidade popular do que o regime golpista de Micheletti. O discurso de Serra é estratégia política. Aliás, Ahmadinejad não pode ser acusado de "burocrata dobrado pelo desejo de obedecer" como foi a argumentação de Arendt com relação a Eichmann. Ele é um nacionalista religioso leigo que diz besteiras no que diz respeito aos homossexuais, sim, mas um discurso não-científico que praticamente todas as religiões fazem.
Sou a favor da separação Igreja/Estado, mas não aplico esse princípio ao Irã sem tentar entender o que se passou lá. O estado era monstruosamente corrupto antes da revolução islâmica, assim como antinacional. Ahmadinejad, fruto dessa revolução, não irá atirar uma bomba nos palestinos. Seu discurso foi no sentido de que a política de Israel, de anexar e colonizar novos territórios, não tem futuro a longo prazo. Segundo a Wikipedia, a melhor tradução para a frase que ele disse não seria "varrer Israel do mapa" e sim "o governo de Jerusalém vai ser varrido pelo tempo". Há razões para duvidar do futuro de uma nação muito dependente de uma superpotência como Israel depende dos USA, e com uma relação muito inamistosa com todos os vizinhos mais populosos.
O artigo de Serra, por flertar com os golpistas de Honduras, levanta a mesma dúvida que levantou o artigo de Fernando Henrique Cardoso: diante das péssimas perspectivas de poder para o PSDB nas próximas eleições, será que os pensamentos a respeito de golpe estão ressurgindo nesse partido?
A posição de Ahmadinejad foi turbinada pela imprensa, embora penso que desejasse mesmo bater de frente com o Ocidente nesse ponto, uma vez que ele defende os palestinos (e, por isso mesmo, não jogará uma bomba em Isral, pois prejudicaria os palestinos).
Inicialmente, ele dizia que o holocausto um mito. Um mito não representa necessariamente uma mentira. A rigor, todas as nações constroem-se com base em mitos, narrativas, fatos históricos interpretados dentro de um determinado prisma.
Depois, afirmou que existiriam historiadores contra o holocausto, mas que eles foram presos. Estou apenas traduzindo a wikipedia em inglês. Agora, para William Waack da Globo, ele apenas questionou porque o povo palestino precisa pagar por crimes cometidos na Europa (aí a questão fica melhor colocada).
Serra aproveita a chegada (com repercussões negativas) de Ahmadinejad para fazer uma crítica a seus inimigos do governo Lula. Suas estratégias discursivas são: 1) comparar Ahmadinejad e o Irã com o nacionalismo nazista. No entanto, desde sempre quem teve apoio dos colonizadores europeus foram os judeus nacionalistas de direita que fundaram o estado de Israel, os chamados sionistas. 2) Criticar em bloco a política externa de Lula a partir do episódio da visita de Ahmadinejad. Pelo que pude observar, essa estratégia do artigo era, como se fosse combinada, repetida por toda a imprensa ligada indiretamente aos demo-tucanos, ou seja, toda a grande imprensa.
A partir da chegada de Ahmadinejad, Serra prega a aproximação com o governo golpista de Honduras, pois Ahmadinejad seria tão ditador quanto Micheletti. No entanto, embora as eleições que deram o poder a Ahmadinejad possam ser questionadas, Micheletti não enfrentou as urnas e sim tomou o poder juntamente com os militares, expulsando o presidente democraticamente eleito. Ahmadinejad é fruto da revolução islâmica, rebelião popular de fundo nacionalista e religioso que reafirmou a cultura iraniana no final dos anos 70, expulsando o Xá imposto em 1953 pelo Ocidente com a deposição do nacionalista laico Mossadegh. A revolução islâmica derrubou um ditador e possui, sim, mais legitimidade popular do que o regime golpista de Micheletti. O discurso de Serra é estratégia política. Aliás, Ahmadinejad não pode ser acusado de "burocrata dobrado pelo desejo de obedecer" como foi a argumentação de Arendt com relação a Eichmann. Ele é um nacionalista religioso leigo que diz besteiras no que diz respeito aos homossexuais, sim, mas um discurso não-científico que praticamente todas as religiões fazem.
Sou a favor da separação Igreja/Estado, mas não aplico esse princípio ao Irã sem tentar entender o que se passou lá. O estado era monstruosamente corrupto antes da revolução islâmica, assim como antinacional. Ahmadinejad, fruto dessa revolução, não irá atirar uma bomba nos palestinos. Seu discurso foi no sentido de que a política de Israel, de anexar e colonizar novos territórios, não tem futuro a longo prazo. Segundo a Wikipedia, a melhor tradução para a frase que ele disse não seria "varrer Israel do mapa" e sim "o governo de Jerusalém vai ser varrido pelo tempo". Há razões para duvidar do futuro de uma nação muito dependente de uma superpotência como Israel depende dos USA, e com uma relação muito inamistosa com todos os vizinhos mais populosos.
O artigo de Serra, por flertar com os golpistas de Honduras, levanta a mesma dúvida que levantou o artigo de Fernando Henrique Cardoso: diante das péssimas perspectivas de poder para o PSDB nas próximas eleições, será que os pensamentos a respeito de golpe estão ressurgindo nesse partido?
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sexta-feira, 20 de novembro de 2009
Reflexões Filosóficas Motivadas Pela Vinda de Ahmadinejad
Não vejo problema algum na presença de Ahmadinejad no Brasil. Se ele não vier, não poderemos apresentar a ele nossas críticas ao tratamento dos gays e outras minorias no Irã.
O governo Lula e a nossa diplomacia são bastante pragmáticos e penso que, se fosse apenas provocação aos USA, ele não viria, não. A questão que move essa visita é que existem negócios a fazer com o Irã. Quem pode com o pragmatismo econômico, não é mesmo?
Penso que, se ele tiver mesmo a bomba atômica, isso equilibra o cenário internacional e fará com que o Irã não seja invadido a partir do Iraque, Israel ou do Afeganistão. Parece especulação, mas o complexo industrial-militar não se prende a um liberal como Obama. Age quase que por moto contínuo. Se for interessante que invadam o Irã, o complexo mobilizará seus recursos para invadi-lo; se a escassez de petróleo forçar, ocorrerá uma invasão.
Esse tipo de questão poderia ser pensado com a filosofia política; no entanto, a filosofia política de nosso tempo está viciada, absolutamente alienada ao repetir clichês de Hannah Arendt tais como o conceito de totalitarismo. Meu professor, José Chasin, escreveu um artigo revendo esse conceito, mas sem sucesso. Trata-se de uma praga: a última Veja tachou até mesmo Robespierre de "inventor do totalitarismo". Esse conceito confuso faz com que seja necessário atacar a obra de Hannah Arendt em bloco: detratadora sofisticada do marxismo, tal como provei em um artigo chamado Observações sobre a crítica de Marx em Hannah Arendt, Arendt também me parece equivocada ao ver banalidade em Eichmann. Ela parece ter tolamente acreditado que Eichmann era um burocrata dobrado pelo desejo de obedecer e que qualquer um de nós, cidadão comum, pode de repente tornar-se "MAL". Ora, Eichmann era um nacionalista absolutamente fanático! Como pode Arendt ter acredito em sua defesa naquele tribunal? Até mesmo Eli Wiesenthal não concorda com ela. Aliás, que negócio é esse de mal em si? Deve-se tentar ir para além do bem e do mal!
Outra enorme confusão: desde então, usa-se os conceitos de Arent assim: a Espanha de Franco era autoritária, a Inglaterra é democrática, a URSS era totalitária. Imperialismo, para Arendt, foi só no século XIX. Para Edward Said, Arendt foi teórica comprometida com o imperialismo, pois ela eximia as democracias imperialistas de hoje em dia de qualquer continuidade daquilo que fizeram no século XIX; para ela, imperialismo não era "etapa superior (e parece, insuperável) do capitalismo"...
Em primeiro, façamos um desvio nietzschiano. O que Nietzsche diria desse contexto? Devemos abstrair Heidegger, para quem Hannah Arendt tornou-se morada do ser, na acepção ginecológica do termo. Nietzsche diria que os judeus deixaram a moral dos escravos e de vítimas do imperialismo alemão hitlerista e adquiriram a moral dos senhores, bebendo o leite de loba dos USA e da Inglaterra, aprendendo que o bom é ser amigo do imperador. E Israel fez-se base americana e inglesa no Oriente Médio. O difícil será cair se o império cair. O que é horrível mesmo é que as ex-vítimas, ao desejarem proximidade com o império, viram verdugos: os israelenses construíram muros para cercar as regiões habitadas pelos palestinos, muros que deram a essas regiões aspectos de...guetos! Os próprios palestinos escrevem nesses muros: bem-vindos ao GUETO!
Aliás, hoje se pergunta para quê o julgamento de Eichmann. Nos anos 90, os multiculturalistas afirmaram que toda nação é comunidade imaginária, construída com base em mitos e ficções, entre as quais as respectivas literaturas nacionais. E se aplicássemos essa teorização a Israel, quais seriam seus mitos fundadores? Um deles seria a narrativa bíblica. O outro seria o fato histórico da Shoah interpretado de uma determinada maneira, daí a necessidade do julgamento de Eichmann, praticamente um dos atos fundadores.
Mas vamos refletindo. Enquanto isso, bem-vindo Ahmadinejad, viva a revolução islâmica!
O governo Lula e a nossa diplomacia são bastante pragmáticos e penso que, se fosse apenas provocação aos USA, ele não viria, não. A questão que move essa visita é que existem negócios a fazer com o Irã. Quem pode com o pragmatismo econômico, não é mesmo?
Penso que, se ele tiver mesmo a bomba atômica, isso equilibra o cenário internacional e fará com que o Irã não seja invadido a partir do Iraque, Israel ou do Afeganistão. Parece especulação, mas o complexo industrial-militar não se prende a um liberal como Obama. Age quase que por moto contínuo. Se for interessante que invadam o Irã, o complexo mobilizará seus recursos para invadi-lo; se a escassez de petróleo forçar, ocorrerá uma invasão.
Esse tipo de questão poderia ser pensado com a filosofia política; no entanto, a filosofia política de nosso tempo está viciada, absolutamente alienada ao repetir clichês de Hannah Arendt tais como o conceito de totalitarismo. Meu professor, José Chasin, escreveu um artigo revendo esse conceito, mas sem sucesso. Trata-se de uma praga: a última Veja tachou até mesmo Robespierre de "inventor do totalitarismo". Esse conceito confuso faz com que seja necessário atacar a obra de Hannah Arendt em bloco: detratadora sofisticada do marxismo, tal como provei em um artigo chamado Observações sobre a crítica de Marx em Hannah Arendt, Arendt também me parece equivocada ao ver banalidade em Eichmann. Ela parece ter tolamente acreditado que Eichmann era um burocrata dobrado pelo desejo de obedecer e que qualquer um de nós, cidadão comum, pode de repente tornar-se "MAL". Ora, Eichmann era um nacionalista absolutamente fanático! Como pode Arendt ter acredito em sua defesa naquele tribunal? Até mesmo Eli Wiesenthal não concorda com ela. Aliás, que negócio é esse de mal em si? Deve-se tentar ir para além do bem e do mal!
Outra enorme confusão: desde então, usa-se os conceitos de Arent assim: a Espanha de Franco era autoritária, a Inglaterra é democrática, a URSS era totalitária. Imperialismo, para Arendt, foi só no século XIX. Para Edward Said, Arendt foi teórica comprometida com o imperialismo, pois ela eximia as democracias imperialistas de hoje em dia de qualquer continuidade daquilo que fizeram no século XIX; para ela, imperialismo não era "etapa superior (e parece, insuperável) do capitalismo"...
Em primeiro, façamos um desvio nietzschiano. O que Nietzsche diria desse contexto? Devemos abstrair Heidegger, para quem Hannah Arendt tornou-se morada do ser, na acepção ginecológica do termo. Nietzsche diria que os judeus deixaram a moral dos escravos e de vítimas do imperialismo alemão hitlerista e adquiriram a moral dos senhores, bebendo o leite de loba dos USA e da Inglaterra, aprendendo que o bom é ser amigo do imperador. E Israel fez-se base americana e inglesa no Oriente Médio. O difícil será cair se o império cair. O que é horrível mesmo é que as ex-vítimas, ao desejarem proximidade com o império, viram verdugos: os israelenses construíram muros para cercar as regiões habitadas pelos palestinos, muros que deram a essas regiões aspectos de...guetos! Os próprios palestinos escrevem nesses muros: bem-vindos ao GUETO!
Aliás, hoje se pergunta para quê o julgamento de Eichmann. Nos anos 90, os multiculturalistas afirmaram que toda nação é comunidade imaginária, construída com base em mitos e ficções, entre as quais as respectivas literaturas nacionais. E se aplicássemos essa teorização a Israel, quais seriam seus mitos fundadores? Um deles seria a narrativa bíblica. O outro seria o fato histórico da Shoah interpretado de uma determinada maneira, daí a necessidade do julgamento de Eichmann, praticamente um dos atos fundadores.
Mas vamos refletindo. Enquanto isso, bem-vindo Ahmadinejad, viva a revolução islâmica!
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Carta ao povo brasileiro, por Cesare Battisti
Carta ao povo brasileiro, por Cesare Battisti*
Data: 19/11/2009 - 20/11/2009
AO EXCELENTÍSSIMO SENHOR LUÍS INÁCIO LULA DA SILVA
PRESIDENTE DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL SUPREMO MAGISTRADO DA NAÇÃO BRASILEIRA
"Trinta anos mudam muitas coisas na vida dos homens, e às vezes fazem uma vida toda". (O homem em revolta - Albert Camus)
Se olharmos um pouco nosso passado a partir de um ponto de vista histórico, quantos entre nós, podem sinceramente dizer que nunca desejou afirmar a própria humanidade, de desenvolvê-la em todos os seus aspectos em uma ampla liberdade. Poucos. Pouquíssimos são os homens e mulheres de minha geração que não sonharam com um mundo diferente, mais justo.
Entretanto, frequentemente, por pura curiosidade ou circunstâncias, somente alguns decidiram lançar-se na luta, sacrificando a própria vida.
Minha história pessoal é notoriamente bastante conhecida para voltar de novo sobre as relações da escolha que me levou à luta armada. Apenas sei que éramos milhares, e que alguns morreram, outros estão presos, e muito exilados.
Sabíamos que podia acabar assim. Quantos foram os exemplos de revolução que faliram e que a história já nos havia revelado? Ainda assim, recomeçamos, erramos e até perdemos. Não tudo! Os sonhos continuam!
Muitas conquistas sociais que hoje os italianos estão usufruindo foram conquistadas graças ao sangue derramado por esses companheiros da utopia. Eu sou fruto desses anos 70, assim como muitos outros aqui no Brasil, inclusive muitos companheiros que hoje são responsáveis pelos destinos do povo brasileiro. Eu na verdade não perdi nada, porque não lutei por algo que podia levar comigo. Mas agora, detido aqui no Brasil não posso aceitar a humilhação de ser tratado de criminoso comum.
Por isso, frente à surpreendente obstinação de alguns ministros do STF que não querem ver o que era realmente a Itália dos anos 70, que me negam a intenção de meus atos; que fecharam os olhos frente à total falta de provas técnicas de minha culpabilidade referente aos quatro homicídios a mim atribuídos; não reconhecem a revelia do meu julgamento; a prescrição e quem sabe qual outro impedimento à extradição.
Além de tudo, é surpreendente e absurdo, que a Itália tenha me condenado por ativismo político e no Brasil alguns poucos teimam em me extraditar com base em envolvimento em crime comum. É um absurdo, principalmente por ter recebido do Governo Brasileiro a condição de refugiado, decisão à qual serei eternamente grato.
E frente ao fato das enormes dificuldades de ganhar essa batalha contra o poderoso governo italiano, o qual usou de todos os argumentos, ferramentas e armas, não me resta outra alternativa a não ser desde agora entrar em "GREVE DE FOME TOTAL", com o objetivo de que me sejam concedidos os direitos estabelecidos no estatuto do refugiado e preso político. Espero com isso impedir, num último ato de desespero, esta extradição, que para mim equivale a uma pena de morte.
Sempre lutei pela vida, mas se é para morrer, eu estou pronto, mas, nunca pela mão dos meus carrascos. Aqui neste país, no Brasil, continuarei minha luta até o fim, e, embora cansado, jamais vou desistir de lutar pela verdade. A verdade que alguns insistem em não querer ver, e este é o pior dos cegos, aquele que não quer ver.
Findo esta carta, agradecendo aos companheiros que desde o início da minha luta jamais me abandonaram e da mesma forma agradeço àqueles que chegaram de última hora, mas, que têm a mesma importância daqueles que estão ao meu lado desde o princípio de tudo. A vocês os meus sinceros agradecimentos. E como última sugestão eu recomendo que vocês continuem lutando pelos seus ideais, pelas suas convicções. Vale a pena!
Espero que o legado daqueles que tombaram no front da batalha não fique em vão. Podemos até perder uma batalha, mas tenho convicção de que a vitória nesta guerra está reservada aos que lutam pela generosa causa da justiça e da liberdade.
*Cesar Battisti é escritor e ativista político italiano
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quarta-feira, 18 de novembro de 2009
Reinaldianas Bobagens: vá estudar, Reinaldo Azevedo!
Que linda imagem! Diz tudo...
Recentemente, Reinaldo Azevedo escreveu todo cheio de si em seu blog:
Ô, Gerald Thomas! Volte logo com seu blog para que possa escrever sobre processos de construção de personagem; como é que os atores são convidados, em abordagens digamos, convencionais, a recorrer à memória afetiva para compor os seus papéis.
Mal sabe ele, no entanto, que Gerald Thomas não gosta de Stanislavski, que é o teórico do teatro que propõe o recurso à memória afetiva para compor os seus papéis, como disse num Café Filosófico recente com Contardo Calligaris. Vá estudar Reinaldo! Do Gerald Thomas ele finge que é amigo, mas não entende nada da obra. Tudo o que ele sabe do Gerald é que ele não gosta de Lula, e basta.
Reinaldo Azevedo, dizem, é bom com números. Mas a resposta de Gerald Thomas a ele foi impagável e deu num post chamado Os Idiotas:
Pera ai, Sr. Blogueiro, trocadilheiro nada engraçadinho! Com Fidel ou sem Fidel, com Hitler ou Pol Pot, com ou sem Milosovec, ou Stalin, com ou sem Robert Mugabe ou Idi Amin Dada, não vou aqui comecar a criar um incesto entre blogs. O que seria isso? Um "clogg", um "in-lock"? Enfim, se quizermos comparar crimes humanitários não precisamos de máquinas calculadoras, mas o blogueiro aí da Veja, apesar de querer colocar muitos números e estatisticas em seu blog, acho que falta sexo em sua vida. Você pratica isso por acaso? Está com a vida sexual em dia? Precisa de umas dicas? Esse blogueiro está com os ponteiros no mesmo lugar que Nader: nele próprio!!!!
Os militares brasileiros mataram, toruraram, desapareceram com um monte de gente. Os argentinos, os uruguayos e os chilenos também. Não me venha o senhor aqui com maquinazinha de merda fazer a apologia disso ou daquilo. Isso é tentar reescrever a História de uma das piores maneiras e destruir a dignidade das famílias que sofrem, até hoje, a perda da vida de milhares, digo, milhares de vidas inocentes (muitos estudantes) sacrificadas em nome de nada. Eu disse nada. Em nome da brutalidade pura, do capital estrangeiro, do investimento obscuro, do totalitarismo sem forma, sem idealismo, do regimento militar de ultra direita, financiado e orientado pela CIA. Não acredita ainda? Leia o livro de Philip Agee! Não acredita ainda, vá aos inúmeros livros lançados, na época pela isenta e excelente Amnesty International. E ainda tem gente que defende os militares? Quanta gente imbecil ! Caramba!
Estamos entrando numa nova era ideológica, digamos assim, estamos entrando numa nova era com fome ideológica. Essa fome não tem paladar, devora qualquer coisa que vier, portanto cuidado com a gastrite!. Vivemos numa era cega, sem parâmetros. Qualquer blog pode dizer qualquer coisa, ja que a garotada não tem realmente noção de quem foi Ben Gurion, Malcolm X, James Baldwin, Truman, quem foi Lord Mountbatten ou a porra de Ben Johnson. Não adianta aqui ficar 'name dropping'.
Mas essa nova fome ou era pede um novo tribunal de Nuremberg , como se pudesse haver outro. Não seriam julgados criminosos nazistas. Seriam julgados os Idiotas que escrevem em Blogs. Quem sabe eu mesmo não seria o primeiro réu?
O primeiro réu não sei, mas continuo achando que Reinaldo Azevedo merece esse lugar aí que a imagem (tirada do blog da Dilma) mostrou.
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terça-feira, 17 de novembro de 2009
Glauber 70 anos e o último poema dele
Dia 14 passado, Glauber Rocha faria setenta anos.
O último poema de Glauber, lido de joelhos no palco por sua amiga Norma Bengell:
Não morri na cruz na Sexta-feira da Paixão
e depois do terremoto segui minha volta pelo mundo
Esta é a terceira e definitiva.
Do Palácio Rio Branco raiará a luz do mundo antes do século 3.
O rei da morte será o rei da vida
e o povo pobre será o povo rico
a cruz desaparecerá e os símbolos serão infinitos.
Se o homem continuar a comer os bichos
Os bichos comerão os homens.
A mulher é a terra. O homem, o cosmos.
O homem fecunda o ventre da mulher.
Nove meses depois nascem as flores do mais sagrado fruto
da natureza.
O povo estará unido em torno do grande pajé,
espelho de Deus.
E os signos conjugados criarão o horóscopo
sem destino.
Querer é poder
e assim guiarei as dozes tribos
em direção ao inferno
E das cinzas do Inferno renascerá o Paraíso.
Do livro Glauber, Esse Vulcão, João Carlos Teixera Gomes, p.519, 1997
O último poema de Glauber, lido de joelhos no palco por sua amiga Norma Bengell:
Não morri na cruz na Sexta-feira da Paixão
e depois do terremoto segui minha volta pelo mundo
Esta é a terceira e definitiva.
Do Palácio Rio Branco raiará a luz do mundo antes do século 3.
O rei da morte será o rei da vida
e o povo pobre será o povo rico
a cruz desaparecerá e os símbolos serão infinitos.
Se o homem continuar a comer os bichos
Os bichos comerão os homens.
A mulher é a terra. O homem, o cosmos.
O homem fecunda o ventre da mulher.
Nove meses depois nascem as flores do mais sagrado fruto
da natureza.
O povo estará unido em torno do grande pajé,
espelho de Deus.
E os signos conjugados criarão o horóscopo
sem destino.
Querer é poder
e assim guiarei as dozes tribos
em direção ao inferno
E das cinzas do Inferno renascerá o Paraíso.
Do livro Glauber, Esse Vulcão, João Carlos Teixera Gomes, p.519, 1997
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segunda-feira, 16 de novembro de 2009
Um poema na revista Tiplov
A revista Tiplov, de Portugal, é associada à revista Agulha. Eles reproduziram recentemente um texto meu, as Notas sobre o Teatro de Gerald Thomas.
http://www.triplov.org/
Vale a visita. Olhem que poema maravilhoso que retirei de lá:
CALA-TE!
Maria Estela Guedes
Filo-café «Silêncio ou morte», Incomunidade. Petín, 07.11.09
A vida, esse livro do ser
Lê-se em silêncio.
Mestre, oficia o rito
Que eu apenas respondo ao salmo,
E no resto
Nem respiro.
O silêncio é uma arma de três gumes
Que usamos diariamente
Para calar amarguras
Ou saltando como pumas:
Cala-te! Porque não te calas?
A vida, esse livro do ser
Lê-se em silêncio.
E a outros, se falam, um punhal
Corta sem hesitar a garganta:
Ou silêncio ou morte!
Não o sabias? Então de que te espantas?
Nada incomoda mais que as ciciantes
Preces, as dos que querem ser lidos
Como revistas de moda,
As dos que sabem tudo, tudo censuram,
A todos desautorizam, em altos gritos de arara.
Cala-te! Porque não te calas, charlatão?
Silêncio, que estou a cantar o fado…
Muito barulho fazeis por coisa de nada
E nada em boa justiça se aplica
Aos que bem mereciam a cadeia.
Nem é a autoridade dos que governam impérios
Com a pressão das armas e do dinheiro
A que mais nos ofende com censura
Sim o seu miniatural espelho
De quem nenhuma obra ousou,
Além de poluir o silêncio com mentira.
À luz da nossa vida pessoal, quem mais nos cala
É quem está mais próximo
Mas esse, porque proclama sem cadeira,
Feitos nem actos,
Por excessiva frioleira, mandemo-lo calar
Pois pouco existe, é só fala-barato.
Abençoados os que se calam
A ouvir.
É preciso sabedoria para reconhecer
Que ignoramos
E que outros no seu dizer
Revelam alguma mestria.
Falem-me em silêncio, na língua da erva
Ou na mais cantarolante dos regatos
E das aves que fazem estrugir as folhas secas
Quando as fêmeas se enamoram
Ao ver as danças dos machos.
A vida, esse livro tremendo,
Representa-se devagar,
Em cenário nocturno
Cortado pelo brilho da lua e pelo
Visionar da coruja.
Mais nada é preciso para tocar o astro
Excepto silêncio e cordura.
http://www.triplov.org/
Vale a visita. Olhem que poema maravilhoso que retirei de lá:
CALA-TE!
Maria Estela Guedes
Filo-café «Silêncio ou morte», Incomunidade. Petín, 07.11.09
A vida, esse livro do ser
Lê-se em silêncio.
Mestre, oficia o rito
Que eu apenas respondo ao salmo,
E no resto
Nem respiro.
O silêncio é uma arma de três gumes
Que usamos diariamente
Para calar amarguras
Ou saltando como pumas:
Cala-te! Porque não te calas?
A vida, esse livro do ser
Lê-se em silêncio.
E a outros, se falam, um punhal
Corta sem hesitar a garganta:
Ou silêncio ou morte!
Não o sabias? Então de que te espantas?
Nada incomoda mais que as ciciantes
Preces, as dos que querem ser lidos
Como revistas de moda,
As dos que sabem tudo, tudo censuram,
A todos desautorizam, em altos gritos de arara.
Cala-te! Porque não te calas, charlatão?
Silêncio, que estou a cantar o fado…
Muito barulho fazeis por coisa de nada
E nada em boa justiça se aplica
Aos que bem mereciam a cadeia.
Nem é a autoridade dos que governam impérios
Com a pressão das armas e do dinheiro
A que mais nos ofende com censura
Sim o seu miniatural espelho
De quem nenhuma obra ousou,
Além de poluir o silêncio com mentira.
À luz da nossa vida pessoal, quem mais nos cala
É quem está mais próximo
Mas esse, porque proclama sem cadeira,
Feitos nem actos,
Por excessiva frioleira, mandemo-lo calar
Pois pouco existe, é só fala-barato.
Abençoados os que se calam
A ouvir.
É preciso sabedoria para reconhecer
Que ignoramos
E que outros no seu dizer
Revelam alguma mestria.
Falem-me em silêncio, na língua da erva
Ou na mais cantarolante dos regatos
E das aves que fazem estrugir as folhas secas
Quando as fêmeas se enamoram
Ao ver as danças dos machos.
A vida, esse livro tremendo,
Representa-se devagar,
Em cenário nocturno
Cortado pelo brilho da lua e pelo
Visionar da coruja.
Mais nada é preciso para tocar o astro
Excepto silêncio e cordura.
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quarta-feira, 11 de novembro de 2009
FHC: Um liberal impopular
Leio o artigo de FHC no Estadão e comento aqui. Já li vários livros dele. Diferente de discos antigos de Caetano, livros antigos de FHC não são lidos com prazer: é um tudo um linguajar soporífero, irritante, ora acadêmico, ora bacharelesco. Não é estudado mais na área de Ciências Humanas. A campanha de Geraldo Alckmin não contou com sua pessoinha impopular: conselho de marqueteiros...
Já esse artigo ("Para Onde Vamos") não é sociologia propriamente; é um panfleto de agitação e propaganda a favor de seu partido, o PSDB. Lula não pode escrever artigos assim; os que ele escrevia no Zero Hora me pareciam ser escritos com ajuda de um ghost writer.
FHC fica, então, numa posição de superioridade. O artigo enfeixa inúmeras críticas e palpites, sempre dizendo como "deveria ser", sempre professoral. FHC foi o professor de Lula, e não Brizola. No entanto, o artigo não tem uma teoria geral sobre o governo Lula tal como FHC apresentara em 2002, dizendo que seria parcialmente a volta do "nacional-estatismo", conceito que ele usou e abusou nos anos 70. Ele não acusa Lula de nacional-estatismo, talvez porque tema maus fluidos geiselistas. Para ele, o imperialismo é um tigre de papel: piratas, só na Somália.
Nas queixas dele, genéricas, me espanta a queixa a respeito das compras de aviões para o exército. Todo mundo que eu encontro e que é do exército queixa-se do armamento sucateado, ultrapassado, dos riscos grandes, etc. FHC irritou-se especialmente com isso, por questões freudianas, quem sabe: o pai dele era o general Lêonidas e era ligado a Getúlio Vargas. Esse artigo gorduroso só pode ser entendido à luz de informações de bastidores encontráveis na web: a IV frota americana voltou à ativa, por isso a compra de armamentos no Brasil, fora as bases e a tensão entre Colômbia, Equador e Venezuela, que já valeu a invasão do Equador; isso pode perfeitamente ocorrer na nossa fronteira, por que não?
O autoritarismo, em si, estaria ligado à excessiva proximidade entre governo e Vale do Rio do Doce, governo e MST, e por aí vai. Ele elenca vários exemplos sem nexo.
Quando fala em Dilma, sempre sem citar seu nome, aí é que se sente a alma tinhosa, invejosa e venenosa desse artigo: Dilma é chamada de "claudicante". Só faltou chamar de "câncer no palanque". Impopular, FHC odeia a ideia de ter de negociar com o PT uma nova derrota. FHC teve apoio da máquina em 94, em 98, em seu governo também ocorreu promiscuidade entre o público e privado, corrupção, etc. Vide Daniel Dantas e Eduardo Azeredo. Esse é um artigo que se perde em um narcisismo de pequenas diferenças. FFHH tem uma obsessão com o dedo faltante de Lula. Ele fez campanha com cinco dedos e agora chamou a indicação de Dilma de "dedaço".
FFHH quer uma competição fálica com Lula, quem sabe na suposição de que, assim como não tem um dedo, Lula talvez não tenha pênis...
Existe uma questão de estilo dele que me irrita sobremaneira. Fora imaginar, ao ler esse texto, ele falando essas coisas com aquela boca mole, "de gamela", como dizem seus adversários. Ele usa aspas a torto e a direito: "entreguista", "privatizadas", como se isso não existisse.
A maior preocupação, obsessão mesmo, nesse artigo, é a possível reversão das privatizações via fundos de pensão, sindicatos e governo, a reestatização; no fundo, ele não se preocupa tanto com a sucessão e sim com seu "legado", sua "herança maldita", que é uma possibilidade que, felizmente, surge no horizonte, vide governo Obama.
O pior é quando chega o final do artigo e essa qualificação neoboba de "subperonismo". Perón foi um estadista destacado entre os únicos dessa estirpe da América Latina e ombreia com Bolívar, Vargas, Fidel Castro e outros. Historicamente será sempre mais importante do que Fernando Henrique Cardoso, que desaparecerá e comerá poeira da História. Se Lula é subperonista, Cristina Kirchner, então, é super-peronista, hiper-peronista, Nestor Kirchner, super-hiper-peronista?
Isso me faz lembrar a frase que finaliza a monografia (péssima de se ler) dele em 1964, que contava com o pai do Xyco Buark na banca: subcapitalismo ou socialismo?
Subcapitalismo, né, FHC, subcapitalismo...
E o pior é ele cobrar prévias no PT, sendo que no PSDB elas também não existem e a indicação é, também, através do bico de alguns tucanos da cúpula.
Fica a cobrança: FHC, aqui em Minas queremos prévias no PSDB entre Aécio e Serra!
Já esse artigo ("Para Onde Vamos") não é sociologia propriamente; é um panfleto de agitação e propaganda a favor de seu partido, o PSDB. Lula não pode escrever artigos assim; os que ele escrevia no Zero Hora me pareciam ser escritos com ajuda de um ghost writer.
FHC fica, então, numa posição de superioridade. O artigo enfeixa inúmeras críticas e palpites, sempre dizendo como "deveria ser", sempre professoral. FHC foi o professor de Lula, e não Brizola. No entanto, o artigo não tem uma teoria geral sobre o governo Lula tal como FHC apresentara em 2002, dizendo que seria parcialmente a volta do "nacional-estatismo", conceito que ele usou e abusou nos anos 70. Ele não acusa Lula de nacional-estatismo, talvez porque tema maus fluidos geiselistas. Para ele, o imperialismo é um tigre de papel: piratas, só na Somália.
Nas queixas dele, genéricas, me espanta a queixa a respeito das compras de aviões para o exército. Todo mundo que eu encontro e que é do exército queixa-se do armamento sucateado, ultrapassado, dos riscos grandes, etc. FHC irritou-se especialmente com isso, por questões freudianas, quem sabe: o pai dele era o general Lêonidas e era ligado a Getúlio Vargas. Esse artigo gorduroso só pode ser entendido à luz de informações de bastidores encontráveis na web: a IV frota americana voltou à ativa, por isso a compra de armamentos no Brasil, fora as bases e a tensão entre Colômbia, Equador e Venezuela, que já valeu a invasão do Equador; isso pode perfeitamente ocorrer na nossa fronteira, por que não?
O autoritarismo, em si, estaria ligado à excessiva proximidade entre governo e Vale do Rio do Doce, governo e MST, e por aí vai. Ele elenca vários exemplos sem nexo.
Quando fala em Dilma, sempre sem citar seu nome, aí é que se sente a alma tinhosa, invejosa e venenosa desse artigo: Dilma é chamada de "claudicante". Só faltou chamar de "câncer no palanque". Impopular, FHC odeia a ideia de ter de negociar com o PT uma nova derrota. FHC teve apoio da máquina em 94, em 98, em seu governo também ocorreu promiscuidade entre o público e privado, corrupção, etc. Vide Daniel Dantas e Eduardo Azeredo. Esse é um artigo que se perde em um narcisismo de pequenas diferenças. FFHH tem uma obsessão com o dedo faltante de Lula. Ele fez campanha com cinco dedos e agora chamou a indicação de Dilma de "dedaço".
FFHH quer uma competição fálica com Lula, quem sabe na suposição de que, assim como não tem um dedo, Lula talvez não tenha pênis...
Existe uma questão de estilo dele que me irrita sobremaneira. Fora imaginar, ao ler esse texto, ele falando essas coisas com aquela boca mole, "de gamela", como dizem seus adversários. Ele usa aspas a torto e a direito: "entreguista", "privatizadas", como se isso não existisse.
A maior preocupação, obsessão mesmo, nesse artigo, é a possível reversão das privatizações via fundos de pensão, sindicatos e governo, a reestatização; no fundo, ele não se preocupa tanto com a sucessão e sim com seu "legado", sua "herança maldita", que é uma possibilidade que, felizmente, surge no horizonte, vide governo Obama.
O pior é quando chega o final do artigo e essa qualificação neoboba de "subperonismo". Perón foi um estadista destacado entre os únicos dessa estirpe da América Latina e ombreia com Bolívar, Vargas, Fidel Castro e outros. Historicamente será sempre mais importante do que Fernando Henrique Cardoso, que desaparecerá e comerá poeira da História. Se Lula é subperonista, Cristina Kirchner, então, é super-peronista, hiper-peronista, Nestor Kirchner, super-hiper-peronista?
Isso me faz lembrar a frase que finaliza a monografia (péssima de se ler) dele em 1964, que contava com o pai do Xyco Buark na banca: subcapitalismo ou socialismo?
Subcapitalismo, né, FHC, subcapitalismo...
E o pior é ele cobrar prévias no PT, sendo que no PSDB elas também não existem e a indicação é, também, através do bico de alguns tucanos da cúpula.
Fica a cobrança: FHC, aqui em Minas queremos prévias no PSDB entre Aécio e Serra!
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segunda-feira, 9 de novembro de 2009
Blog de Yoani Sánchez em português: divirtam-se
Pessoal: verifico, hoje, que embora os posts de Yoani Sánchez sejam traduzidos e embora o tradutor frequente o blog do Reinaldo Azevedo, ele aparentemente teme divulgar que os textos dela estão disponíveis também em português, porque o debate em português não está favorável à corrente ideológica deles, que só sabe xingar. Então, aí vai:
http://desdecuba.com/generaciony_pt/
Como o que mais existe lá são difamadores do PT e da esquerda em geral, sugiro que todos os meus leitores dessa orientação e de outras passem lá para fazerem um belo debate. É um blog chat, sem moderação, situado num país pária da comunidade internacional, onde aparentemente vale tudo para insultar o regime cubano. Parece ter um nick do Reinaldo, um tal "Dirceu". Já pensaram que divertido um blog chat com Reinaldo Azevedo, que é o que ele mais teme e proíbe no blog dele? kkk! Então, "petralhas", criem nicks, enfim, entrem lá, DIVIRTAM-SE! Um bom substituto do blog do Gerald, que fechou.
http://desdecuba.com/generaciony_pt/
Como o que mais existe lá são difamadores do PT e da esquerda em geral, sugiro que todos os meus leitores dessa orientação e de outras passem lá para fazerem um belo debate. É um blog chat, sem moderação, situado num país pária da comunidade internacional, onde aparentemente vale tudo para insultar o regime cubano. Parece ter um nick do Reinaldo, um tal "Dirceu". Já pensaram que divertido um blog chat com Reinaldo Azevedo, que é o que ele mais teme e proíbe no blog dele? kkk! Então, "petralhas", criem nicks, enfim, entrem lá, DIVIRTAM-SE! Um bom substituto do blog do Gerald, que fechou.
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Para entender a queda do Muro
PARA (REALMENTE) ENTENDER A QUEDA DO MURO DE BERLIM
Celso Lungaretti
A queda do muro de Berlim, há 20 anos, marcou o fim do chamado socialismo real - a tentativa de construção do socialismo com o descarte de algumas das premissas básicas fixadas por Karl Marx e Friedrich Engels em meados do século 19.
No princípio, os profetas apregoavam uma maré revolucionária que uniria e imantaria os proletários de todos os países, varrendo o planeta. É o que lemos no mais inspirado panfleto político que a humanidade já produziu, o Manifesto do Partido Comunista de 1848.
Levando em conta não só que os trabalhadores do mundo inteiro estavam irmanados pela sina de terem uma substancial parcela da riqueza que geravam (a mais-valia) expropriada pelo patronato, como também que a exploração capitalista havia subjugado países e culturas, submetendo proletários de todos os quadrantes a uma mesma lógica de dominação, os papas do marxismo profetizaram que o socialismo seria igualmente implantado em escala global, começando pelas nações de economias mais avançadas e se estendendo a todas as outras.
O movimento revolucionário foi, pouco a pouco, conquistado pela premissa teórica do internacionalismo, ainda mais depois que a heróica Comuna de Paris foi esmagada em 1871 pela ação conjunta de tropas reacionárias francesas com o invasor alemão. Se as nações capitalistas conjugariam suas forças para sufocar qualquer governo operário que fosse instalado, então os movimentos revolucionários precisariam também transpor fronteiras, para terem alguma chance de êxito – foi a conclusão que se impôs.
A Internacional Socialista, que havia sido fundada sete anos antes, soçobrou principalmente devido ao impacto da derrota da Comuna de Paris sobre o conjunto do movimento operário europeu, mas a semente plantada frutificou na poderosa 2ª Internacional, que aglutinou em 1889 os grandes partidos socialistas consolidados nesse ínterim.
A bonança, entretanto, não fez bem a esses partidos. Muitos dirigentes, deslumbrados com os aparelhos conquistados, passaram a querer mantê-los a qualquer preço, lutando por melhoras para a classe operária do seu próprio país, em detrimento da solidariedade internacional. E teorizaram que o socialismo poderia surgir a partir das reformas realizadas pacificamente e do crescimento numérico da classe média, sem necessidade de uma revolução.
A deflagração da 1ª Guerra Mundial cindiu definitivamente o movimento revolucionário: os reformistas acabaram alinhados com os governos de seus respectivos países no esforço guerreiro, enquanto os marxistas conclamaram os proletários a não dispararem contra seus irmãos de outras nações.
Lênin, Trotsky e Rosa Luxemburgo encabeçaram a reação contra os (por eles designados pejorativamente como) sociais-patriotas e os trâmites para a fundação da 3ª Internacional, contraponto àquela que perdera sua razão de ser.
O socialismo num só país – Em 1917, surgiu a primeira oportunidade de tomada de poder pelos revolucionários desde a Comuna de Paris. E os bolcheviques discutiram apaixonadamente se seria válida uma revolução em país tão atrasado como a Rússia – uma verdadeira heresia à luz dos ensinamentos marxistas.
Para Marx, o socialismo viria distribuir de forma equânime as riquezas geradas sob o capitalismo, de forma que beneficiassem o conjunto da população e não apenas uma minoria privilegiada. Então, ele sempre augurara que a revolução mundial começaria nos países capitalistas mais avançados, como a Inglaterra, a França e a Alemanha.
Um governo revolucionário na Rússia seria obrigado a cumprir tarefas características da fase da acumulação primitiva do capital, como a criação de infra-estrutura básica e a industrialização do país. O justificado temor de alguns dirigentes bolcheviques era de que, assumindo tais encargos, a revolução acabasse se desvirtuando irremediavelmente.
Prevaleceu, entretanto, a posição de que a revolução russa seria o estopim da revolução mundial, começando pela tomada de poder na Alemanha. Então, alavancada e apoiada pelos países socialistas mais prósperos, a construção do socialismo na Rússia se tornaria viável.
Os bolcheviques venceram, mas seus congêneres alemães foram derrotados em 1918. A maré revolucionária acabou sendo contida no mundo inteiro e, como se previa, várias nações capitalistas se coligaram para combater pelas armas o nascente governo revolucionário. Mesmo assim, o gênio militar de Trotsky acabou garantindo, apesar da enorme disparidade de forças, a sobrevivência da URSS.
Quando ficou evidente que a revolução mundial não ocorreria tão cedo, a União Soviética tratou de sair sozinha da armadilha em que se colocara. Devastada e isolada, precisou criar uma economia moderna a partir do nada.
Nenhum ardor revolucionário seria capaz de levar as massas a empreenderem esforços titânicos e a suportarem privações dia após dia, indefinidamente. Só mesmo a força bruta garantiria essa mobilização permanente, sobre-humana, de energias para o desenvolvimento econômico. A tirania stalinista cumpriu esse papel.
A revolução nunca mais voltou aos trilhos marxistas. Como único país dito socialista, a URSS passou a projetar mundialmente seu modelo despótico, que encontrou viva rejeição nas nações avançadas. Nestas, as únicas adesões não se deveram à atuação política dos trabalhadores, mas sim às baionetas do Exército Vermelho, quando da vitória sobre o nazismo.
Tomada autêntica de poder houve em outros países pobres e atrasados, como a China, Cuba, Vietnã e Camboja. E todos repetiram a trajetória para o modelo autoritário do socialismo num só país stalinista.
O grande feito da URSS: derrotar Hitler - Este conseguiu, é verdade, fazer com que a economia da URSS avançasse praticamente um século em duas décadas (as de 1920 e 1930), o que foi fundamental para o país conseguir a proeza praticamente impossível de quebrar a espinha do nazismo.
Pois, é preciso que se diga: Hitler foi vencido na União Soviética, quando comprometeu o melhor da sua máquina de guerra numa derrota contundente.
Ao se retirar, já estava irremediavelmente derrotado. As forças aliadas apenas completaram o serviço.
Mas, a arregimentação autoritária da mão-de-obra só funcionou a contento na etapa da industrialização pesada.
Na segunda metade do século 20, a economia capitalista avançou noutra direção, a da sofisticação tecnológica, da miniaturização, da gestação sôfrega de novas manias consumistas. Informática, biotecnologia, novos materiais, novos processos.
O avanço movido a ganância, com base no talento individual, na pesquisa e na tecnologia, derrotou a economia letárgica da URSS, tornada jurássica da noite para o dia, e sua nomenklatura arrogante que se reservava todos os privilégios.
Comprovava-se a máxima marxista segundo a qual são os países com forças produtivas mais desenvolvidas que determinam os rumos da humanidade.
O bloco soviético desabou como uma fruta apodrecida. Seus países voltaram ao capitalismo e à democracia burguesa.
A China conseguiu manter o sistema político autoritário, à custa de mesclar a economia estatizada com a iniciativa privada. Criou o pior dos mundos possíveis: algo assim como o milagre brasileiro, com a falta de liberdade sendo aceita em função das melhoras materiais proporcionadas pelo regime (e do espírito tradicionalmente submisso dos asiáticos).
Sobrou para os idealistas do século 21 a missão de recolocar a revolução nos trilhos, para que ainda seja cumprindo o sonho original de Marx: não apenas regimes híbridos em países isolados, mas sim o planeta inteiro transformado no “reino da liberdade, para além da necessidade”, em que:
* cada cidadão contribua no limite de suas possibilidades para que todos os cidadãos tenham o suficiente para suprirem as suas necessidades e desenvolverem plenamente as suas potencialidades; e
* o estado desapareça, com os cidadãos assumindo a administração das coisas como parte de sua rotina e a ninguém ocorra administrar os homens, já que eles serão, para sempre, sujeitos da sua própria História.
Engendrarmos uma onda revolucionária capaz de varrer o planeta é tarefa gigantesca? É.
Mas, em relação ao século 19, há uma mudança importante: ela se tornou muito mais necessária, como alternativa à regressão -- talvez, até, à própria aniquilação -- da humanidade.
Pois, salta aos olhos que, mantida a prioridade dos interesses individuais sobre os coletivos, a exaustão de recursos naturais e as catástrofes ecológicas reduzirão drasticamente os contingentes humanos, ou os exterminarão de vez.
A opção a fazermos, como disse Norman O. Brown, agora é entre a vida numa sociedade solidária e harmoniosa, ou a morte sob o capitalismo excludente e predatório.
Postado por Celso Lungaretti às 8:50 AM
Marcadores: capitalismo, Friedrich Engeles, Herbert Marcuse, Joseph Stalin, Karl Marx, Leon Trotsky, Lênin, Norman O. Brown, reformismo, revolução, Rosa Luxemburgo
Celso Lungaretti
A queda do muro de Berlim, há 20 anos, marcou o fim do chamado socialismo real - a tentativa de construção do socialismo com o descarte de algumas das premissas básicas fixadas por Karl Marx e Friedrich Engels em meados do século 19.
No princípio, os profetas apregoavam uma maré revolucionária que uniria e imantaria os proletários de todos os países, varrendo o planeta. É o que lemos no mais inspirado panfleto político que a humanidade já produziu, o Manifesto do Partido Comunista de 1848.
Levando em conta não só que os trabalhadores do mundo inteiro estavam irmanados pela sina de terem uma substancial parcela da riqueza que geravam (a mais-valia) expropriada pelo patronato, como também que a exploração capitalista havia subjugado países e culturas, submetendo proletários de todos os quadrantes a uma mesma lógica de dominação, os papas do marxismo profetizaram que o socialismo seria igualmente implantado em escala global, começando pelas nações de economias mais avançadas e se estendendo a todas as outras.
O movimento revolucionário foi, pouco a pouco, conquistado pela premissa teórica do internacionalismo, ainda mais depois que a heróica Comuna de Paris foi esmagada em 1871 pela ação conjunta de tropas reacionárias francesas com o invasor alemão. Se as nações capitalistas conjugariam suas forças para sufocar qualquer governo operário que fosse instalado, então os movimentos revolucionários precisariam também transpor fronteiras, para terem alguma chance de êxito – foi a conclusão que se impôs.
A Internacional Socialista, que havia sido fundada sete anos antes, soçobrou principalmente devido ao impacto da derrota da Comuna de Paris sobre o conjunto do movimento operário europeu, mas a semente plantada frutificou na poderosa 2ª Internacional, que aglutinou em 1889 os grandes partidos socialistas consolidados nesse ínterim.
A bonança, entretanto, não fez bem a esses partidos. Muitos dirigentes, deslumbrados com os aparelhos conquistados, passaram a querer mantê-los a qualquer preço, lutando por melhoras para a classe operária do seu próprio país, em detrimento da solidariedade internacional. E teorizaram que o socialismo poderia surgir a partir das reformas realizadas pacificamente e do crescimento numérico da classe média, sem necessidade de uma revolução.
A deflagração da 1ª Guerra Mundial cindiu definitivamente o movimento revolucionário: os reformistas acabaram alinhados com os governos de seus respectivos países no esforço guerreiro, enquanto os marxistas conclamaram os proletários a não dispararem contra seus irmãos de outras nações.
Lênin, Trotsky e Rosa Luxemburgo encabeçaram a reação contra os (por eles designados pejorativamente como) sociais-patriotas e os trâmites para a fundação da 3ª Internacional, contraponto àquela que perdera sua razão de ser.
O socialismo num só país – Em 1917, surgiu a primeira oportunidade de tomada de poder pelos revolucionários desde a Comuna de Paris. E os bolcheviques discutiram apaixonadamente se seria válida uma revolução em país tão atrasado como a Rússia – uma verdadeira heresia à luz dos ensinamentos marxistas.
Para Marx, o socialismo viria distribuir de forma equânime as riquezas geradas sob o capitalismo, de forma que beneficiassem o conjunto da população e não apenas uma minoria privilegiada. Então, ele sempre augurara que a revolução mundial começaria nos países capitalistas mais avançados, como a Inglaterra, a França e a Alemanha.
Um governo revolucionário na Rússia seria obrigado a cumprir tarefas características da fase da acumulação primitiva do capital, como a criação de infra-estrutura básica e a industrialização do país. O justificado temor de alguns dirigentes bolcheviques era de que, assumindo tais encargos, a revolução acabasse se desvirtuando irremediavelmente.
Prevaleceu, entretanto, a posição de que a revolução russa seria o estopim da revolução mundial, começando pela tomada de poder na Alemanha. Então, alavancada e apoiada pelos países socialistas mais prósperos, a construção do socialismo na Rússia se tornaria viável.
Os bolcheviques venceram, mas seus congêneres alemães foram derrotados em 1918. A maré revolucionária acabou sendo contida no mundo inteiro e, como se previa, várias nações capitalistas se coligaram para combater pelas armas o nascente governo revolucionário. Mesmo assim, o gênio militar de Trotsky acabou garantindo, apesar da enorme disparidade de forças, a sobrevivência da URSS.
Quando ficou evidente que a revolução mundial não ocorreria tão cedo, a União Soviética tratou de sair sozinha da armadilha em que se colocara. Devastada e isolada, precisou criar uma economia moderna a partir do nada.
Nenhum ardor revolucionário seria capaz de levar as massas a empreenderem esforços titânicos e a suportarem privações dia após dia, indefinidamente. Só mesmo a força bruta garantiria essa mobilização permanente, sobre-humana, de energias para o desenvolvimento econômico. A tirania stalinista cumpriu esse papel.
A revolução nunca mais voltou aos trilhos marxistas. Como único país dito socialista, a URSS passou a projetar mundialmente seu modelo despótico, que encontrou viva rejeição nas nações avançadas. Nestas, as únicas adesões não se deveram à atuação política dos trabalhadores, mas sim às baionetas do Exército Vermelho, quando da vitória sobre o nazismo.
Tomada autêntica de poder houve em outros países pobres e atrasados, como a China, Cuba, Vietnã e Camboja. E todos repetiram a trajetória para o modelo autoritário do socialismo num só país stalinista.
O grande feito da URSS: derrotar Hitler - Este conseguiu, é verdade, fazer com que a economia da URSS avançasse praticamente um século em duas décadas (as de 1920 e 1930), o que foi fundamental para o país conseguir a proeza praticamente impossível de quebrar a espinha do nazismo.
Pois, é preciso que se diga: Hitler foi vencido na União Soviética, quando comprometeu o melhor da sua máquina de guerra numa derrota contundente.
Ao se retirar, já estava irremediavelmente derrotado. As forças aliadas apenas completaram o serviço.
Mas, a arregimentação autoritária da mão-de-obra só funcionou a contento na etapa da industrialização pesada.
Na segunda metade do século 20, a economia capitalista avançou noutra direção, a da sofisticação tecnológica, da miniaturização, da gestação sôfrega de novas manias consumistas. Informática, biotecnologia, novos materiais, novos processos.
O avanço movido a ganância, com base no talento individual, na pesquisa e na tecnologia, derrotou a economia letárgica da URSS, tornada jurássica da noite para o dia, e sua nomenklatura arrogante que se reservava todos os privilégios.
Comprovava-se a máxima marxista segundo a qual são os países com forças produtivas mais desenvolvidas que determinam os rumos da humanidade.
O bloco soviético desabou como uma fruta apodrecida. Seus países voltaram ao capitalismo e à democracia burguesa.
A China conseguiu manter o sistema político autoritário, à custa de mesclar a economia estatizada com a iniciativa privada. Criou o pior dos mundos possíveis: algo assim como o milagre brasileiro, com a falta de liberdade sendo aceita em função das melhoras materiais proporcionadas pelo regime (e do espírito tradicionalmente submisso dos asiáticos).
Sobrou para os idealistas do século 21 a missão de recolocar a revolução nos trilhos, para que ainda seja cumprindo o sonho original de Marx: não apenas regimes híbridos em países isolados, mas sim o planeta inteiro transformado no “reino da liberdade, para além da necessidade”, em que:
* cada cidadão contribua no limite de suas possibilidades para que todos os cidadãos tenham o suficiente para suprirem as suas necessidades e desenvolverem plenamente as suas potencialidades; e
* o estado desapareça, com os cidadãos assumindo a administração das coisas como parte de sua rotina e a ninguém ocorra administrar os homens, já que eles serão, para sempre, sujeitos da sua própria História.
Engendrarmos uma onda revolucionária capaz de varrer o planeta é tarefa gigantesca? É.
Mas, em relação ao século 19, há uma mudança importante: ela se tornou muito mais necessária, como alternativa à regressão -- talvez, até, à própria aniquilação -- da humanidade.
Pois, salta aos olhos que, mantida a prioridade dos interesses individuais sobre os coletivos, a exaustão de recursos naturais e as catástrofes ecológicas reduzirão drasticamente os contingentes humanos, ou os exterminarão de vez.
A opção a fazermos, como disse Norman O. Brown, agora é entre a vida numa sociedade solidária e harmoniosa, ou a morte sob o capitalismo excludente e predatório.
Postado por Celso Lungaretti às 8:50 AM
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sábado, 7 de novembro de 2009
Blogagem coletiva de Reinaldo Azevedo e Yoani
Pessoal, estou participando do movimentado blog geração y, da Yoani Sánchez. Não há como imaginar que esse blog seja sustentando só por uma pessoa. Uma equipe traduz os posts em vários idiomas e existem comentadores fixos, por exemplo, em português do Brasil, que se ocupam, no tom de Reinaldo Azevedo e Olavo de Carvalho, em denegrir Lula, Chávez, Raul e outros e qualquer coisa que de longe cheire a socialismo. Uma equipe ou organização parece estar por trás do blog. Quem será? Pelo anticomunismo furibundo, fiquei temendo ser a CIA. Vejam só a classe do comentador "Dirceu":
Para um esquerdopata, que trata um assassino da família castro ruz de maneira íntima em seu blog, eu (Yoani também) só poderia ser financiado, não posso ter opinião própria fundada em fatos, tenho que estar a serviço dos “yankees imperialista”.
Isto demonstra claramente a mente doentia que eles possuem, junto com a inveja, mesmo porque você sinistro não precisava indicar o blog da Yoani, vez que seu blog é inexpressivo. O fez para chamar atenção à sua insignificância e a de seu blog, citando no post o porco assassino fedido che em filme de Roliude, porque aí sim tem valor os “yankees” do tipo abestalhado Oliver Stone, Seann Penn, Sodenbergh, et caterva.
Continua o conselho:
Vai se roçar nas ostras admirador do fedido fundador da rolha socialista na ilha prisão.
E pior é que, para mim, Lula é neoliberalismo com cesta básica para o povão; FHC era o neoliberalismo puro. Só isso...
Para um esquerdopata, que trata um assassino da família castro ruz de maneira íntima em seu blog, eu (Yoani também) só poderia ser financiado, não posso ter opinião própria fundada em fatos, tenho que estar a serviço dos “yankees imperialista”.
Isto demonstra claramente a mente doentia que eles possuem, junto com a inveja, mesmo porque você sinistro não precisava indicar o blog da Yoani, vez que seu blog é inexpressivo. O fez para chamar atenção à sua insignificância e a de seu blog, citando no post o porco assassino fedido che em filme de Roliude, porque aí sim tem valor os “yankees” do tipo abestalhado Oliver Stone, Seann Penn, Sodenbergh, et caterva.
Continua o conselho:
Vai se roçar nas ostras admirador do fedido fundador da rolha socialista na ilha prisão.
E pior é que, para mim, Lula é neoliberalismo com cesta básica para o povão; FHC era o neoliberalismo puro. Só isso...
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Comentário sobre o último livro de Costa Lima
EXTRA! EXTRA!
Pessoal: esse blog do Ronald Augusto, poesia-pau.blogspot.com, é excelente. Não percam lá o texto Decadência do Império Caetano, que mereceu de Caetano até mesmo uma resposta (sem citar o nome, sempre, pois Caets nunca cita seus adversários intelectuais, assim como Pasquale faz com Marcos Bagno e Sírio Possenti).
sábado, 8 de agosto de 2009
O controle e a afirmação do traidor dilacerado
Sem que isso seja mencionado em seu prejuízo, O controle do imaginário & a afirmação do romance é em princípio um livro voltado para uma audiência acadêmica, já que até certo ponto, para a sua compreensão, se requer o conhecimento de obras anteriores do autor mais afeitas aos cânones da instituição. Mesmo no design da capa se denuncia essa medida de livro — com suas quase quatrocentas páginas — ofertado à cobiça professoral e científica. Os motivos mondrianescos ajustados aos quadrículos coloridos, alguns cortados diagonalmente; a alusão ao concretismo publicitário enquanto estilema gráfico-visual, presente no lirismo de diagrama a evocar as “bandeirinhas” de Volpi, e que, agora, na prateleira das livrarias, exposto ao olhar do leitor compenetrado, dir-se-ia tratar-se de um livro de lógica, de análise das estruturas do discurso, enfim, dessas coisas que demandam anos de dedicação, e que só podem ser levadas a cabo pelo pathos meticuloso de secretários do castelo. Vale dizer, ainda, que a obra aqui resenhada é um prolongamento de análises publicadas — quer em âmbito universitário, quer em comercial — e de cursos que Luis Costa Lima vem apresentando desde a década de 1980. Na “Nota introdutória” (pág. 13), o crítico e professor, refere que José Mário Pereira tomou a iniciativa de patrocinar a reedição de um conjunto de estudos, a Trilogia do controle (2007), que na década de 1980, ele, Costa Lima, escreveu sobre a questão do controle do imaginário.
Por outro lado, O controle do imaginário & a afirmação do romance é de interesse para outros leitores não restritos àquelas instituições de ensino. É uma obra bem escrita, seu refinamento de linguagem não provoca o sono. Agora, se o livro é dedicado à memória de alguns escritores consagrados, e, ao que tudo indica, amigos e interlocutores de Luis Costa Lima, a presente resenha, escrita por alguém que não leu as obras anteriores do autor de que se ocupa, é dedicada à memória do leitor interessado, ou do leitor “malandro” naquela acepção cunhada pelas análises de Antônio Candido acerca de uma determinada forma de romance. O leitor motivado pelo desejo, cujo tempo dedicado à leitura de estudos críticos ou hermenêuticos é o mesmo que dedica à leitura de textos artísticos, isto é, o tempo que dura o prazer textual.
Mas, mesmo num livro em que é patente seu escopo de gosto enciclopédico e seu apetite de scholar, há lugar para a confissão e para a solidariedade corporativa. Fique esclarecido que tais inconfidências aparecem na mencionada “Nota introdutória”, o lugar correto para isso, situado aquém do ponto onde o rigor da análise tenta cancelar o contingente. Assim, Costa Lima admite que este talvez seja o seu último livro apoiado em uma longa pesquisa, pois se encontra em estação provecta, isto é, já não tem idade para essas coisas. E, mais adiante, menciona sua opção por não fazer parte da tribo dos especialistas por constatar a tortura que seria batalhar por manter-se “atualizado em um país em que bibliotecas permanecem um artigo de luxo”, mostrando-se, por sua vez, atento às vicissitudes dos seus colegas universitários.
Mas, continuando, O controle do imaginário & a afirmação do romance se divide em duas partes. Na primeira, Costa Lima situa o leitor no ambiente teórico-contextual do controle, sua proposta é apresentar o “Renascimento italiano como o tempo de que parte não só a hostilidade contra o romance como a motivação para ele”; na segunda e última parte, o autor se dedica ao estudo hermenêutico de romances que são paradigmáticos a propósito do tema eleito, pois é sobre as obras desse período (dos séculos XV e XVI para cá) que por excelência o controle do imaginário é exercido de modo mais severo. Estamos mais ou menos dentro dos limites da Reforma e da Contrarreforma.
Luis Costa Lima não faz uma investigação puramente textual, isolada das condições da sociedade, e tampouco se restringe a questionamentos historicizantes. O estatuto que emerge de sua argumentação e que aponta para a “teoria geral do controle” não é depositário de uma análise meramente sociopolítica. O grande excurso histórico da primeira parte parece contradizer a afirmação anterior, inclusive porque um pouco a contragosto do próprio autor essa primeira parte resultou maior do que o imaginado. Com efeito, o autor procura demonstrar que o controle se plasma sob duas situações. Em primeiro lugar, não é difícil constatar que sempre está implícito alguma forma de controle na estrutura das sociedades, pois estas se assentam sobre regras, “e onde há regras há controle. Mas, Luis Costa Lima anota uma coisa importante: o controle “não assume um aspecto visível e marcante se a instituição ou a sociedade que o ativa não está em crise, ou sob sua iminente ameaça”. O controle do imaginário... investiga então em sua primeira parte como o controle do romance é dependente da crise que afetara tanto a Igreja “enquanto matriz dos valores institucionalizados” como o poder configurado nas cidades-Estados italianas. O ponto de partida da crise que irriga o controle é, portanto, o Renascimento, onde se reitera o mundo antigo como norma, e que se intensifica “com a Reforma e a reação católica, a Contrarreforma e o Concílio de Trento”.
Mas, eu gostaria de voltar à questão quase óbvia que diz respeito à afirmação: “onde há regras há controle”. O estudo de Luis Costa Lima nos permite uma reflexão em perspectiva e em outras direções. O controle está implicado em todas as estruturas sociopolíticas que representam a forma consagrada para normatizar as relações de poder entre os cidadãos. Estas relações se definem por meio de uma ordem que objetiva assegurar as necessidades e os desejos do grupo em detrimento dos do indivíduo. O controle do imaginário se beneficia das relações de força e dominação que estão em jogo quando se estabelece o teatro conflituoso e/ou conciliatório na cena social. Mas o controle, ao contrário da censura, quase nunca é explícito. Para Luis Costa Lima a censura “é de imediato visível e localizável”. Já o controle do imaginário, como foi dito mais acima, não só lhe é gentilmente hostil, mas como que também o motiva.
Essa condição por assim dizer multifária do controle torna-o maleável e capaz de naturalizar-se, e de neutralizar, por exemplo, hoje, as tensões estéticas atinentes ao ficcional. Romances fundamentais, até então criadores de caso e de fervorosos debates como Ulisses, Finnegans Wake, Grande Sertão: Veredas tornaram-se agora obras a respeito das quais não se diz se não o rotineiramente tolerável, e com muita boa-vontade. Elas são escassamente referidas por meio de um discurso em estado de lápide, isto é, as afirmações e/ou negações se prestam, quando muito, a inscrições tumulares e controvérsias de fachada. O resultado é que tanto os que as repudiam quanto os que as incensam, em fim de contas, acabam se encontrando numa zona de intransigência anódina ou de indiferença estética que não gera movimento nenhum. Essas obras que alargaram os limites do romance clássico, segundo a atual dinâmica do controle do imaginário, já estão catalogadas e fartamente interpretadas; não servem mais de insumo ao tacanho realismo desses prosadores para quem a simples menção a um “público refinado” lhes provoca uma cusparada de clichês antidecadentistas. Como diz Luis Costa Lima em entrevista, o controle, — que, em sua análise se refere a jogos de poder dos grupos dominantes ao longo da História — se associa também à lógica de mercado. Com efeito, o mercado busca moldar menos este ou aquele autor em particular do que um modo de escrita que não entre em atrito com o repertório de um hipotético público leitor. O crítico literário Frank Kermode menciona ainda a presença nefasta de um “controle institucional da interpretação”, instância de poder de cuja função se espera a classificação do que é e do que não é canônico, fazendo, assim, em versão secular as vezes da figura do Concílio da Igreja que tinha como atribuição decidir quais os santos passíveis de canonização. Ora, sob esse aspecto a ideia de cânone se funda num modelo de controle que mais aprendemos a apreciar e respirar do que prestar-lhe uma atenção crítica. Cito alguns dos representantes do controle da interpretação: a universidade, a crítica especializada, os grupelhos de beletristas bem relacionados, os ocupantes de órgãos públicos e/ou privados ligados à cultura, etc.
É também na primeira parte de O controle do imaginário & a afirmação do romance que vamos encontrar a interessante análise a respeito da dialética da simulação e da dissimulação como forma de convivência ou de conciliação com o controle. O olhar de Luis Costa Lima procura desvelar “o que se ocultava sob a alegre docilidade dos cortesãos e a resignação dos modestos escribas”. A legitimação dos condottieri assentava-se sobre bases ilegítimas. E porque ilegítimos “tais senhores precisavam compensar traições e crueldades com gestos e requintes de chefes finos. Por exemplo com o estímulo à cortesania”. Baldassare Castiglione, de acordo com o autor, é quem decodifica a gramática e a conduta do cortesão no seu Il Corteggiano (1528), obra escrita entre o humanismo e a Contrarreforma. O cortesão encarna a figura do intelectual e do artista que esposa o compromisso de fazer a mediação entre culturas diversas e disputas palacianas. Seu jogo não se faz num espaço público. Seu jogo dramático assume a forma de um “drama da contenção, contudo não mais a contenção da paixão ou da loucura, e sim a contenção da perspicácia”. Esse personagem apóia o seu discurso em afirmações e contraditas que se fazem acompanhar da marcação de um ridendo, senha de uma metalinguagem a assinalar que suas palavras não devem ser levadas a sério.
Luis Costa Lima define o cortesão como uma ficção externa (isto é, realizada fora do âmbito de uma obra de arte); um esteta, uma ficção ambulante. Um entertainer que dominasse a arte da esgrima. Os condottieri, com sua proverbial obstinação em deixar-se enganar e cobiçosos de ver menos vacilantes as bases de sua legitimação se aproveitavam indiscriminadamente dos serviços dos cortesãos. Com isso também eram chamuscados pelas chamas de sua cortesania cheia de charme. E às vezes acabavam favorecendo aqueles que talvez só merecessem seus desfavores. O cortesão como ficção externa, no entanto, não faz uso de normas preestabelecidas. Segundo Costa Lima, “em vez de normas, por éticas que pareçam” a prática cortesã se decide pela cautela. Esse artista alcoviteiro, se podemos assim dizer, compósito de escritor, secretário do castelo, e conselheiro, situa-se na entrelinha, no intervalo, e cumpre com tamanho virtuosismo os seus vagos afazeres que a impressão causada é a de que faz bem o que faz, mas sem demonstrar o menor esforço; ele se refugia na displicência. Metáfora da arte que sobrevive ao controle, que se aproveita de um cochilo ou outro do sistema e dissimula aquilo que é. No exercício divino e malévolo de sua bouffonerie o artista-cortesão nos demonstra que a dissimulação supõe a “habilidade de não fazer ver as coisas como são”. Reduzir e dissimular são termos dessa estratégia de sacrifício a que se dedica cotidianamente, com o propósito mais secreto de confrontar-se com a ordem social. De acordo com Luis Costa Lima, o cortesão, condenado a fazer falar lateralmente o silêncio da supressão e da autossupressão, presume em perspectiva que o “estilo da perda converte-se em estilo da revanche”. Metáfora do escritor como um traidor dilacerado: “simula-se aquilo que não é, dissimula-se aquilo que é”. A ficção externa como dissimulação na tentativa de convivência e conciliação com o controle acaba por fortificar o centro deste, porquanto as armas de que se serve aquela (astúcia, ambigüidade, embromação e alguma falsidade) são as mesmas de que se aparelham os mecanismos de controle.
Na segunda parte de O controle do imaginário & a afirmação do romance, Luis Costa Lima se detém em alguns romances paradigmáticos que começam a travar uma relação de outra ordem com os processos de controle da imaginação atuantes nas sociedades de corte católicas. Trata-se agora de enfrentar os primeiros lances de uma ficção interna — em oposição ao ridendo da ficção externa do cortesão — que se constitui num como se assumido. O autor detecta neste conjunto de romances (Dom Quixote, As relações perigosas, Moll Flanders e Tristram Shandy) o índice do ficcional como alternativa discursiva — a máscara que se declara máscara —, e não mero jogo de cena e dissimulação. Mas aqui minha fabulação manca, pois das quatro obras investigadas por Luis Costa Lima só pude ler o Dom Quixote. E eu diria apenas o seguinte: a obra máxima de Miguel de Cervantes ajuda a fundar a categoria moderna da “ficção”, que se constitui como um tipo de linguagem que não é nem “verdade” nem “mentira”, senão que tem um estatuto próprio. Em Dom Quixote lemos menos a dissimulação que a simulação da loucura. De outra parte, devo dizer que não tenho tempo nem paciência para a longa leitura que os outros romances exigiriam de mim. Como não costumo ler comentários ou análises de textos que ainda não li, resolvo parar por aqui mesmo. Mas pelo que consegui ver em minha leitura mais curiosa da primeira parte de O controle do imaginário & a afirmação do romance, tenho certeza de que Luis Costa Lima se houve muito bem na interpretação dessas obras clássicas, e na afirmação, por meio delas, da capacidade de o romance bom propor novos esquemas críticos e inventivos na sua relação com o controle.
Postado por ronald augusto às 15:39 0 comentários
Pessoal: esse blog do Ronald Augusto, poesia-pau.blogspot.com, é excelente. Não percam lá o texto Decadência do Império Caetano, que mereceu de Caetano até mesmo uma resposta (sem citar o nome, sempre, pois Caets nunca cita seus adversários intelectuais, assim como Pasquale faz com Marcos Bagno e Sírio Possenti).
sábado, 8 de agosto de 2009
O controle e a afirmação do traidor dilacerado
Sem que isso seja mencionado em seu prejuízo, O controle do imaginário & a afirmação do romance é em princípio um livro voltado para uma audiência acadêmica, já que até certo ponto, para a sua compreensão, se requer o conhecimento de obras anteriores do autor mais afeitas aos cânones da instituição. Mesmo no design da capa se denuncia essa medida de livro — com suas quase quatrocentas páginas — ofertado à cobiça professoral e científica. Os motivos mondrianescos ajustados aos quadrículos coloridos, alguns cortados diagonalmente; a alusão ao concretismo publicitário enquanto estilema gráfico-visual, presente no lirismo de diagrama a evocar as “bandeirinhas” de Volpi, e que, agora, na prateleira das livrarias, exposto ao olhar do leitor compenetrado, dir-se-ia tratar-se de um livro de lógica, de análise das estruturas do discurso, enfim, dessas coisas que demandam anos de dedicação, e que só podem ser levadas a cabo pelo pathos meticuloso de secretários do castelo. Vale dizer, ainda, que a obra aqui resenhada é um prolongamento de análises publicadas — quer em âmbito universitário, quer em comercial — e de cursos que Luis Costa Lima vem apresentando desde a década de 1980. Na “Nota introdutória” (pág. 13), o crítico e professor, refere que José Mário Pereira tomou a iniciativa de patrocinar a reedição de um conjunto de estudos, a Trilogia do controle (2007), que na década de 1980, ele, Costa Lima, escreveu sobre a questão do controle do imaginário.
Por outro lado, O controle do imaginário & a afirmação do romance é de interesse para outros leitores não restritos àquelas instituições de ensino. É uma obra bem escrita, seu refinamento de linguagem não provoca o sono. Agora, se o livro é dedicado à memória de alguns escritores consagrados, e, ao que tudo indica, amigos e interlocutores de Luis Costa Lima, a presente resenha, escrita por alguém que não leu as obras anteriores do autor de que se ocupa, é dedicada à memória do leitor interessado, ou do leitor “malandro” naquela acepção cunhada pelas análises de Antônio Candido acerca de uma determinada forma de romance. O leitor motivado pelo desejo, cujo tempo dedicado à leitura de estudos críticos ou hermenêuticos é o mesmo que dedica à leitura de textos artísticos, isto é, o tempo que dura o prazer textual.
Mas, mesmo num livro em que é patente seu escopo de gosto enciclopédico e seu apetite de scholar, há lugar para a confissão e para a solidariedade corporativa. Fique esclarecido que tais inconfidências aparecem na mencionada “Nota introdutória”, o lugar correto para isso, situado aquém do ponto onde o rigor da análise tenta cancelar o contingente. Assim, Costa Lima admite que este talvez seja o seu último livro apoiado em uma longa pesquisa, pois se encontra em estação provecta, isto é, já não tem idade para essas coisas. E, mais adiante, menciona sua opção por não fazer parte da tribo dos especialistas por constatar a tortura que seria batalhar por manter-se “atualizado em um país em que bibliotecas permanecem um artigo de luxo”, mostrando-se, por sua vez, atento às vicissitudes dos seus colegas universitários.
Mas, continuando, O controle do imaginário & a afirmação do romance se divide em duas partes. Na primeira, Costa Lima situa o leitor no ambiente teórico-contextual do controle, sua proposta é apresentar o “Renascimento italiano como o tempo de que parte não só a hostilidade contra o romance como a motivação para ele”; na segunda e última parte, o autor se dedica ao estudo hermenêutico de romances que são paradigmáticos a propósito do tema eleito, pois é sobre as obras desse período (dos séculos XV e XVI para cá) que por excelência o controle do imaginário é exercido de modo mais severo. Estamos mais ou menos dentro dos limites da Reforma e da Contrarreforma.
Luis Costa Lima não faz uma investigação puramente textual, isolada das condições da sociedade, e tampouco se restringe a questionamentos historicizantes. O estatuto que emerge de sua argumentação e que aponta para a “teoria geral do controle” não é depositário de uma análise meramente sociopolítica. O grande excurso histórico da primeira parte parece contradizer a afirmação anterior, inclusive porque um pouco a contragosto do próprio autor essa primeira parte resultou maior do que o imaginado. Com efeito, o autor procura demonstrar que o controle se plasma sob duas situações. Em primeiro lugar, não é difícil constatar que sempre está implícito alguma forma de controle na estrutura das sociedades, pois estas se assentam sobre regras, “e onde há regras há controle. Mas, Luis Costa Lima anota uma coisa importante: o controle “não assume um aspecto visível e marcante se a instituição ou a sociedade que o ativa não está em crise, ou sob sua iminente ameaça”. O controle do imaginário... investiga então em sua primeira parte como o controle do romance é dependente da crise que afetara tanto a Igreja “enquanto matriz dos valores institucionalizados” como o poder configurado nas cidades-Estados italianas. O ponto de partida da crise que irriga o controle é, portanto, o Renascimento, onde se reitera o mundo antigo como norma, e que se intensifica “com a Reforma e a reação católica, a Contrarreforma e o Concílio de Trento”.
Mas, eu gostaria de voltar à questão quase óbvia que diz respeito à afirmação: “onde há regras há controle”. O estudo de Luis Costa Lima nos permite uma reflexão em perspectiva e em outras direções. O controle está implicado em todas as estruturas sociopolíticas que representam a forma consagrada para normatizar as relações de poder entre os cidadãos. Estas relações se definem por meio de uma ordem que objetiva assegurar as necessidades e os desejos do grupo em detrimento dos do indivíduo. O controle do imaginário se beneficia das relações de força e dominação que estão em jogo quando se estabelece o teatro conflituoso e/ou conciliatório na cena social. Mas o controle, ao contrário da censura, quase nunca é explícito. Para Luis Costa Lima a censura “é de imediato visível e localizável”. Já o controle do imaginário, como foi dito mais acima, não só lhe é gentilmente hostil, mas como que também o motiva.
Essa condição por assim dizer multifária do controle torna-o maleável e capaz de naturalizar-se, e de neutralizar, por exemplo, hoje, as tensões estéticas atinentes ao ficcional. Romances fundamentais, até então criadores de caso e de fervorosos debates como Ulisses, Finnegans Wake, Grande Sertão: Veredas tornaram-se agora obras a respeito das quais não se diz se não o rotineiramente tolerável, e com muita boa-vontade. Elas são escassamente referidas por meio de um discurso em estado de lápide, isto é, as afirmações e/ou negações se prestam, quando muito, a inscrições tumulares e controvérsias de fachada. O resultado é que tanto os que as repudiam quanto os que as incensam, em fim de contas, acabam se encontrando numa zona de intransigência anódina ou de indiferença estética que não gera movimento nenhum. Essas obras que alargaram os limites do romance clássico, segundo a atual dinâmica do controle do imaginário, já estão catalogadas e fartamente interpretadas; não servem mais de insumo ao tacanho realismo desses prosadores para quem a simples menção a um “público refinado” lhes provoca uma cusparada de clichês antidecadentistas. Como diz Luis Costa Lima em entrevista, o controle, — que, em sua análise se refere a jogos de poder dos grupos dominantes ao longo da História — se associa também à lógica de mercado. Com efeito, o mercado busca moldar menos este ou aquele autor em particular do que um modo de escrita que não entre em atrito com o repertório de um hipotético público leitor. O crítico literário Frank Kermode menciona ainda a presença nefasta de um “controle institucional da interpretação”, instância de poder de cuja função se espera a classificação do que é e do que não é canônico, fazendo, assim, em versão secular as vezes da figura do Concílio da Igreja que tinha como atribuição decidir quais os santos passíveis de canonização. Ora, sob esse aspecto a ideia de cânone se funda num modelo de controle que mais aprendemos a apreciar e respirar do que prestar-lhe uma atenção crítica. Cito alguns dos representantes do controle da interpretação: a universidade, a crítica especializada, os grupelhos de beletristas bem relacionados, os ocupantes de órgãos públicos e/ou privados ligados à cultura, etc.
É também na primeira parte de O controle do imaginário & a afirmação do romance que vamos encontrar a interessante análise a respeito da dialética da simulação e da dissimulação como forma de convivência ou de conciliação com o controle. O olhar de Luis Costa Lima procura desvelar “o que se ocultava sob a alegre docilidade dos cortesãos e a resignação dos modestos escribas”. A legitimação dos condottieri assentava-se sobre bases ilegítimas. E porque ilegítimos “tais senhores precisavam compensar traições e crueldades com gestos e requintes de chefes finos. Por exemplo com o estímulo à cortesania”. Baldassare Castiglione, de acordo com o autor, é quem decodifica a gramática e a conduta do cortesão no seu Il Corteggiano (1528), obra escrita entre o humanismo e a Contrarreforma. O cortesão encarna a figura do intelectual e do artista que esposa o compromisso de fazer a mediação entre culturas diversas e disputas palacianas. Seu jogo não se faz num espaço público. Seu jogo dramático assume a forma de um “drama da contenção, contudo não mais a contenção da paixão ou da loucura, e sim a contenção da perspicácia”. Esse personagem apóia o seu discurso em afirmações e contraditas que se fazem acompanhar da marcação de um ridendo, senha de uma metalinguagem a assinalar que suas palavras não devem ser levadas a sério.
Luis Costa Lima define o cortesão como uma ficção externa (isto é, realizada fora do âmbito de uma obra de arte); um esteta, uma ficção ambulante. Um entertainer que dominasse a arte da esgrima. Os condottieri, com sua proverbial obstinação em deixar-se enganar e cobiçosos de ver menos vacilantes as bases de sua legitimação se aproveitavam indiscriminadamente dos serviços dos cortesãos. Com isso também eram chamuscados pelas chamas de sua cortesania cheia de charme. E às vezes acabavam favorecendo aqueles que talvez só merecessem seus desfavores. O cortesão como ficção externa, no entanto, não faz uso de normas preestabelecidas. Segundo Costa Lima, “em vez de normas, por éticas que pareçam” a prática cortesã se decide pela cautela. Esse artista alcoviteiro, se podemos assim dizer, compósito de escritor, secretário do castelo, e conselheiro, situa-se na entrelinha, no intervalo, e cumpre com tamanho virtuosismo os seus vagos afazeres que a impressão causada é a de que faz bem o que faz, mas sem demonstrar o menor esforço; ele se refugia na displicência. Metáfora da arte que sobrevive ao controle, que se aproveita de um cochilo ou outro do sistema e dissimula aquilo que é. No exercício divino e malévolo de sua bouffonerie o artista-cortesão nos demonstra que a dissimulação supõe a “habilidade de não fazer ver as coisas como são”. Reduzir e dissimular são termos dessa estratégia de sacrifício a que se dedica cotidianamente, com o propósito mais secreto de confrontar-se com a ordem social. De acordo com Luis Costa Lima, o cortesão, condenado a fazer falar lateralmente o silêncio da supressão e da autossupressão, presume em perspectiva que o “estilo da perda converte-se em estilo da revanche”. Metáfora do escritor como um traidor dilacerado: “simula-se aquilo que não é, dissimula-se aquilo que é”. A ficção externa como dissimulação na tentativa de convivência e conciliação com o controle acaba por fortificar o centro deste, porquanto as armas de que se serve aquela (astúcia, ambigüidade, embromação e alguma falsidade) são as mesmas de que se aparelham os mecanismos de controle.
Na segunda parte de O controle do imaginário & a afirmação do romance, Luis Costa Lima se detém em alguns romances paradigmáticos que começam a travar uma relação de outra ordem com os processos de controle da imaginação atuantes nas sociedades de corte católicas. Trata-se agora de enfrentar os primeiros lances de uma ficção interna — em oposição ao ridendo da ficção externa do cortesão — que se constitui num como se assumido. O autor detecta neste conjunto de romances (Dom Quixote, As relações perigosas, Moll Flanders e Tristram Shandy) o índice do ficcional como alternativa discursiva — a máscara que se declara máscara —, e não mero jogo de cena e dissimulação. Mas aqui minha fabulação manca, pois das quatro obras investigadas por Luis Costa Lima só pude ler o Dom Quixote. E eu diria apenas o seguinte: a obra máxima de Miguel de Cervantes ajuda a fundar a categoria moderna da “ficção”, que se constitui como um tipo de linguagem que não é nem “verdade” nem “mentira”, senão que tem um estatuto próprio. Em Dom Quixote lemos menos a dissimulação que a simulação da loucura. De outra parte, devo dizer que não tenho tempo nem paciência para a longa leitura que os outros romances exigiriam de mim. Como não costumo ler comentários ou análises de textos que ainda não li, resolvo parar por aqui mesmo. Mas pelo que consegui ver em minha leitura mais curiosa da primeira parte de O controle do imaginário & a afirmação do romance, tenho certeza de que Luis Costa Lima se houve muito bem na interpretação dessas obras clássicas, e na afirmação, por meio delas, da capacidade de o romance bom propor novos esquemas críticos e inventivos na sua relação com o controle.
Postado por ronald augusto às 15:39 0 comentários
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sexta-feira, 6 de novembro de 2009
Caetano: a burrice desse cara tem me consumido...
Adoro Caetano. Acho um grande músico, ícone de geração, gosto dele sólido, gasoso, líquido, etc.
Só que, de vez em quando, acho ele burro. No blog dele, Obra em Progresso, cansamos de dizer para ele que não se deve dizer que o Lula é analfabeto, que ele é perfeitamente um falante, coisa e tal. Eu, Eduardo Luedy, uma linguista, o Sírio Possenti, todos explicamos que falar isso é preconceito, é ideologia, não uma observação científica, coisa e tal.
Mas agora, em plena época de eleição, lá vem o bonitão repetir a mesma coisa que disse antes no blog, numa formulação ainda mais agressiva. Lula seria analfabeto, grosseiro e cafona em comparação com Marina. Não seria melhor ele explicitar que acha FHC sexy, fino, chique, muito elegante? Aécio também é? É aquela coisa. Um leitura pós-moderna, meio Zelberto Zel, de Casa Grande & Senzala: o mestiço pernóstico da varanda gritando:
Bate! Mas bate de cinto Pierre Cardin que é mais chique! O bonito é borrar tudo com nossa mestiçagem, não é, Demétrio Magnoli?
Tava pensando.
Dizer que Lula é "analfabeto" é como dizer que Caetano é "bicha". Não é verdade, mas é um contágio com um universo do qual se está próximo ou com o qual sua imagem pública apresenta pontos de contato.
Só que, de vez em quando, acho ele burro. No blog dele, Obra em Progresso, cansamos de dizer para ele que não se deve dizer que o Lula é analfabeto, que ele é perfeitamente um falante, coisa e tal. Eu, Eduardo Luedy, uma linguista, o Sírio Possenti, todos explicamos que falar isso é preconceito, é ideologia, não uma observação científica, coisa e tal.
Mas agora, em plena época de eleição, lá vem o bonitão repetir a mesma coisa que disse antes no blog, numa formulação ainda mais agressiva. Lula seria analfabeto, grosseiro e cafona em comparação com Marina. Não seria melhor ele explicitar que acha FHC sexy, fino, chique, muito elegante? Aécio também é? É aquela coisa. Um leitura pós-moderna, meio Zelberto Zel, de Casa Grande & Senzala: o mestiço pernóstico da varanda gritando:
Bate! Mas bate de cinto Pierre Cardin que é mais chique! O bonito é borrar tudo com nossa mestiçagem, não é, Demétrio Magnoli?
Tava pensando.
Dizer que Lula é "analfabeto" é como dizer que Caetano é "bicha". Não é verdade, mas é um contágio com um universo do qual se está próximo ou com o qual sua imagem pública apresenta pontos de contato.
quinta-feira, 5 de novembro de 2009
New York, New York ou: o ataque do homo telenovelicus de sapatos verdes
Lúcio Emílio do Espírito Santo Júnior
Embora intitulado New York, New York, nome da famosa de canção de Sinatra que enaltece a grande cidade norte-americana, o clima nesse romance de Denny Yang não é de exaltação nem de otimismo em relação a essa cidade.
Muito pelo contrário. O personagem central, um introspectivo e desenraizado ator teatral que, após umas “férias prolongadas” onde desligou-se do mundo, busca um lugar no mundo numa cidade com praia que, aparentemente, poderia ser o Rio de Janeiro, é mais um lugar onde o ator vaga, desempregado, confuso e com problemas de identificação. Marcado o nome do romance com o nome de um lugar, o romance não se situa em lugar algum, não citando, com freqüência, praticamente nenhuma cidade a não ser New York.
A narrativa gira em torno da sofrida tentativa do protagonista em adaptar-se à vida social depois das férias prolongadas – que bem pode ser uma metáfora para um processo de enlouquecimento ou uma estadia numa clínica de recuperação. A televisão joga um importante papel em sua tentativa de voltar à realidade e não se confundir, ajudando-o a se comunicar com o mundo novamente. E é através da TV que esse personagem deslocado entra em contato com o grande evento do século XXI, a queda das Torres Gêmeas em onze de setembro de 2001.
Se o romance se organizasse em torno desse acontecimento, poderíamos dizer que esse é um romance de geração. Quando o personagem precisa de relaxamento e integração, o mundo reage no sentido contrário, entrando em seu momento de maior tensão, insegurança e conflito após a Guerra Fria. É um grande acontecimento, mas em tudo regressivo: os Estados Unidos despem o discurso universalista da globalização e assumem, nesse estágio histórico, um discurso agressivamente nacionalista. Embora os terroristas fossem sauditas, é o miserável e devastado Afeganistão que sucumbe vítima de uma invasão punitiva dos Estados Unidos. Todos esses fatos não escapam à visão do protagonista, que, ao contrário de muitos, não se exalta em paixão patriótica norte-americana naquele momento.
A narrativa encena a enorme reversão de expectativas, de positivas em negativas, daquele momento: o texto lembra José Agrippino de Paula em sua densidade, no uso das aspas americanas e em seu discurso indireto, repleto de referências a atos cotidianos, embora sem a referência ao mundo das celebridades e sem a violência presentes em PanAmérica, por exemplo. A forma como Fabiano, oponente do jovem ator, é apresentado, denota a antipatia que lhe provocam as telenovelas, produto artístico cujo naturalismo é negado na descrição anti-naturalista de um protagonista de uma delas, conforme se pode ler na passagem abaixo:
“Como ele”? É um que tem uma pinta no rosto e usa sapatos verdes? E apontei com meu dedo na bochecha direita. “A pinta...” ela disse ao padeiro. “Todo mundo conhece ele pela pinta”, e o padeiro concordava, sorrindo (YANG, 2008, p. 60).
Embora a TV jogue um papel importante para que o protagonista se reintegre à vida cotidiana, é Fabiano, vaidoso ator de novelas, que faz um papel desintegrador junto da mulher que o protagonista ama, Aline, curiosamente também o nome de uma história em quadrinhos de Adão Itussuragai transformada, recentemente, em minissérie televisiva onde Aline é uma mulher que namora dois homens.
Os tais sapatos verdes, citados no fragmento acima, são curiosamente da maior importância no decorrer do romance. Um dos motivos-guia desse New York, New York, suponho, é o ponto de virada, a súbita reversão de expectativas positivas quase alucinatória: Os Estados Unidos vão ocupando o Afeganistão, o caso do ator com Aline tornar-se cada vez mais trágico: ele vai a uma festa de um artista plástico chamado Tom e acaba por encontrar o “homem dos sapatos verdes”, Fabiano (o namorado de Aline), com outra mulher, o que paradoxalmente põe a perder o relacionamento de Aline com o protagonista.
No final do romance, o desejo de ir para Nova Iorque, lugar onde ocorreu o trágico ataque citado no decorrer do romance, é afirmado, também numa virada surpreendente. O ator nega-se a fazer novela, e, muito diferente das narrativas naturalistas de um André Takeda, por exemplo, a narrativa de Denny Yang encena essa negação, tanto em suas personagens quanto na sua estética. Não fica claro, ao final do texto, nem mesmo se New York vai conseguir sustentar alguma utopia, mas é melhor do que a atopia até então colocada.
Embora intitulado New York, New York, nome da famosa de canção de Sinatra que enaltece a grande cidade norte-americana, o clima nesse romance de Denny Yang não é de exaltação nem de otimismo em relação a essa cidade.
Muito pelo contrário. O personagem central, um introspectivo e desenraizado ator teatral que, após umas “férias prolongadas” onde desligou-se do mundo, busca um lugar no mundo numa cidade com praia que, aparentemente, poderia ser o Rio de Janeiro, é mais um lugar onde o ator vaga, desempregado, confuso e com problemas de identificação. Marcado o nome do romance com o nome de um lugar, o romance não se situa em lugar algum, não citando, com freqüência, praticamente nenhuma cidade a não ser New York.
A narrativa gira em torno da sofrida tentativa do protagonista em adaptar-se à vida social depois das férias prolongadas – que bem pode ser uma metáfora para um processo de enlouquecimento ou uma estadia numa clínica de recuperação. A televisão joga um importante papel em sua tentativa de voltar à realidade e não se confundir, ajudando-o a se comunicar com o mundo novamente. E é através da TV que esse personagem deslocado entra em contato com o grande evento do século XXI, a queda das Torres Gêmeas em onze de setembro de 2001.
Se o romance se organizasse em torno desse acontecimento, poderíamos dizer que esse é um romance de geração. Quando o personagem precisa de relaxamento e integração, o mundo reage no sentido contrário, entrando em seu momento de maior tensão, insegurança e conflito após a Guerra Fria. É um grande acontecimento, mas em tudo regressivo: os Estados Unidos despem o discurso universalista da globalização e assumem, nesse estágio histórico, um discurso agressivamente nacionalista. Embora os terroristas fossem sauditas, é o miserável e devastado Afeganistão que sucumbe vítima de uma invasão punitiva dos Estados Unidos. Todos esses fatos não escapam à visão do protagonista, que, ao contrário de muitos, não se exalta em paixão patriótica norte-americana naquele momento.
A narrativa encena a enorme reversão de expectativas, de positivas em negativas, daquele momento: o texto lembra José Agrippino de Paula em sua densidade, no uso das aspas americanas e em seu discurso indireto, repleto de referências a atos cotidianos, embora sem a referência ao mundo das celebridades e sem a violência presentes em PanAmérica, por exemplo. A forma como Fabiano, oponente do jovem ator, é apresentado, denota a antipatia que lhe provocam as telenovelas, produto artístico cujo naturalismo é negado na descrição anti-naturalista de um protagonista de uma delas, conforme se pode ler na passagem abaixo:
“Como ele”? É um que tem uma pinta no rosto e usa sapatos verdes? E apontei com meu dedo na bochecha direita. “A pinta...” ela disse ao padeiro. “Todo mundo conhece ele pela pinta”, e o padeiro concordava, sorrindo (YANG, 2008, p. 60).
Embora a TV jogue um papel importante para que o protagonista se reintegre à vida cotidiana, é Fabiano, vaidoso ator de novelas, que faz um papel desintegrador junto da mulher que o protagonista ama, Aline, curiosamente também o nome de uma história em quadrinhos de Adão Itussuragai transformada, recentemente, em minissérie televisiva onde Aline é uma mulher que namora dois homens.
Os tais sapatos verdes, citados no fragmento acima, são curiosamente da maior importância no decorrer do romance. Um dos motivos-guia desse New York, New York, suponho, é o ponto de virada, a súbita reversão de expectativas positivas quase alucinatória: Os Estados Unidos vão ocupando o Afeganistão, o caso do ator com Aline tornar-se cada vez mais trágico: ele vai a uma festa de um artista plástico chamado Tom e acaba por encontrar o “homem dos sapatos verdes”, Fabiano (o namorado de Aline), com outra mulher, o que paradoxalmente põe a perder o relacionamento de Aline com o protagonista.
No final do romance, o desejo de ir para Nova Iorque, lugar onde ocorreu o trágico ataque citado no decorrer do romance, é afirmado, também numa virada surpreendente. O ator nega-se a fazer novela, e, muito diferente das narrativas naturalistas de um André Takeda, por exemplo, a narrativa de Denny Yang encena essa negação, tanto em suas personagens quanto na sua estética. Não fica claro, ao final do texto, nem mesmo se New York vai conseguir sustentar alguma utopia, mas é melhor do que a atopia até então colocada.
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Do blog Cena dois
4 de novembro de 2009
Samuel Beckett
Imagem interessante postada no blog
http://imagesvisions.blogspot.com/ de hoje.
A foto é de Vik Muniz.
“Abro a porta da cela e vou. Estou tão curvado que só vejo meus pés, se abro os olhos, e entre minhas pernas um punhado de poeira escura. Me digo que a terra está apagada, ainda que nunca a tenha visto acesa. (pausa) É assim mesmo (pausa) Quando eu cair, chorarei de felicidade”, disse Clov.
O trecho acima é do livro Fim de Partida, escrito pelo genial Samuel Beckett (1906-1989). Nascido na Irlanda, Samuel Beckett foi dos mais influentes escritores do século 20, com uma obra que inclui contos, poesia, romances como Malone Morre e peças como Esperando Godot. Recebeu o Nobel de literatura em 1969.
Os pais de Samuel Barclay Beckett eram protestantes. Ele estudou na escola real em Enniskillen (onde Oscar Wilde também havia freqüentado). Foi lá que começou a aprender o francês, uma das suas línguas preferidas.
Excelente atleta, Beckett foi jogador de tênis e boxeador. Embora gostasse de esportes, sua atenção estava voltada aos estudos acadêmicos. Aos 17 anos entrou para a faculdade, e se aprofundou nos textos literários.
Outro assunto que influenciou o escritor, nos seus tempos de estudante, foi o cinema de comédia de Buster Keaton e Charlie Chaplin. Depois que se formou, Beckett viajou a Paris onde se encontrou com James Joyce, que se tornaria a sua maior referência literária.
Além de ter sido um dos assistentes favoritos de Joyce, Beckett construiu uma sólida amizade com o autor de Ulisses. Inspirado pelo círculo literário, de uma Paris repleta de novidades culturais, Beckett tinha encontrado nele a sua falange, que orientaria toda a sua obra.
Forçado a voltar a Irlanda, para resolver problemas pessoais, Beckett retorna a Paris em 1932, e por lá fica um bom tempo escrevendo novelas, contos e poesias. Nessa época, o escritor desenvolve uma voz própria e saí das sombras de Joyce para dar o seu próprio salto.
Por um bom período o escritor chegou a residir em Londres, com a intenção de fazer dinheiro, mas foi em Paris que ele se estabeleceu. Quando a cidade foi invadida em 1941, Beckett e Suzanne (sua esposa) juntaram a resistência e foram obrigados a refugiar-se no sul da França.
Com o fim da guerra Beckett se estabelece com Suzanne em Paris. A partir daí foram centenas de trabalhos realizados. Em 1977 começou a ter problemas de saúde, prejudicando sua produção literária.
No dia 17 de julho de 1989, ele perde Suzanne. O baque foi grande. No mesmo ano, 22 de dezembro, Beckett morre, deixando uma obra de inigualável valor artístico.
O livro Fim de Partida (Cosac & Naify; 176 páginas, R$30,00) peça em um ato, tem quatro personagens. Eles “giram em falso” entre a vida e a morte, numa decadência cinzenta que se arrasta sem chegar ao fim.
O livro é elegante, com capa dura e sobrecapa. A tradução é de Fábio de Souza Andrade. O interessante do Fim de Partida é a habilidade do texto que, ao estabelecer um jogo que contempla um desfecho “fácil”, com vitoriosos ou derrotados, se apóia em repetições e diálogos fragmentados.
Comungo com o escritor Bernardo Carvalho quando diz que gosta de literatura, e não de escritores. Abro uma exceção apenas para a figura de Beckett. Todas as suas fotos me dão a impressão de que ele era cauteloso na legitimidade humana. Me parecia extremamente honesto e franco, sem as afetações que sujam as auras de muitos escritores por aí.
Postado por Luiz Penna às 08:15
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Samuel Beckett
Imagem interessante postada no blog
http://imagesvisions.blogspot.com/ de hoje.
A foto é de Vik Muniz.
“Abro a porta da cela e vou. Estou tão curvado que só vejo meus pés, se abro os olhos, e entre minhas pernas um punhado de poeira escura. Me digo que a terra está apagada, ainda que nunca a tenha visto acesa. (pausa) É assim mesmo (pausa) Quando eu cair, chorarei de felicidade”, disse Clov.
O trecho acima é do livro Fim de Partida, escrito pelo genial Samuel Beckett (1906-1989). Nascido na Irlanda, Samuel Beckett foi dos mais influentes escritores do século 20, com uma obra que inclui contos, poesia, romances como Malone Morre e peças como Esperando Godot. Recebeu o Nobel de literatura em 1969.
Os pais de Samuel Barclay Beckett eram protestantes. Ele estudou na escola real em Enniskillen (onde Oscar Wilde também havia freqüentado). Foi lá que começou a aprender o francês, uma das suas línguas preferidas.
Excelente atleta, Beckett foi jogador de tênis e boxeador. Embora gostasse de esportes, sua atenção estava voltada aos estudos acadêmicos. Aos 17 anos entrou para a faculdade, e se aprofundou nos textos literários.
Outro assunto que influenciou o escritor, nos seus tempos de estudante, foi o cinema de comédia de Buster Keaton e Charlie Chaplin. Depois que se formou, Beckett viajou a Paris onde se encontrou com James Joyce, que se tornaria a sua maior referência literária.
Além de ter sido um dos assistentes favoritos de Joyce, Beckett construiu uma sólida amizade com o autor de Ulisses. Inspirado pelo círculo literário, de uma Paris repleta de novidades culturais, Beckett tinha encontrado nele a sua falange, que orientaria toda a sua obra.
Forçado a voltar a Irlanda, para resolver problemas pessoais, Beckett retorna a Paris em 1932, e por lá fica um bom tempo escrevendo novelas, contos e poesias. Nessa época, o escritor desenvolve uma voz própria e saí das sombras de Joyce para dar o seu próprio salto.
Por um bom período o escritor chegou a residir em Londres, com a intenção de fazer dinheiro, mas foi em Paris que ele se estabeleceu. Quando a cidade foi invadida em 1941, Beckett e Suzanne (sua esposa) juntaram a resistência e foram obrigados a refugiar-se no sul da França.
Com o fim da guerra Beckett se estabelece com Suzanne em Paris. A partir daí foram centenas de trabalhos realizados. Em 1977 começou a ter problemas de saúde, prejudicando sua produção literária.
No dia 17 de julho de 1989, ele perde Suzanne. O baque foi grande. No mesmo ano, 22 de dezembro, Beckett morre, deixando uma obra de inigualável valor artístico.
O livro Fim de Partida (Cosac & Naify; 176 páginas, R$30,00) peça em um ato, tem quatro personagens. Eles “giram em falso” entre a vida e a morte, numa decadência cinzenta que se arrasta sem chegar ao fim.
O livro é elegante, com capa dura e sobrecapa. A tradução é de Fábio de Souza Andrade. O interessante do Fim de Partida é a habilidade do texto que, ao estabelecer um jogo que contempla um desfecho “fácil”, com vitoriosos ou derrotados, se apóia em repetições e diálogos fragmentados.
Comungo com o escritor Bernardo Carvalho quando diz que gosta de literatura, e não de escritores. Abro uma exceção apenas para a figura de Beckett. Todas as suas fotos me dão a impressão de que ele era cauteloso na legitimidade humana. Me parecia extremamente honesto e franco, sem as afetações que sujam as auras de muitos escritores por aí.
Postado por Luiz Penna às 08:15
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quarta-feira, 4 de novembro de 2009
Yoani, o Hype da imprensa demo-tucana
Pessoal: o pessoal da nossa área, literatura e ciências humanas, tem mesmo é que reclamar, protestar, desde Cuba, Honduras ou Bom Despacho. Taí o blog mais comentado dos últimos tempos, o da Yoani, blogueira cubana:
http://www.desdecuba.com/generaciony/
Ela é simpática e quer reclamar como eu reclamo. Ótimo. O que me irrita é o apoio e a festa que se faz em torno dela na imprensa do Brasil. Os blogs não eram uma moda amadora, pornográfica, tosca, sem credibilidade? De repente, quando se fala da Yoani, viram uma janela pura de liberdade! O nosso Congresso não era sujo como pau de galinheiro, papagaio de americanos? De repente, como convidou Yoani e o regime cubano proibiu-a de vir, nosso congressinho sórdido virou reunião de vestais, quase celestial! OOOh!
Hersch Basbaun disse no Provocações do Antônio Abujamra que não sabe que caminhos perseguir para ter sua obra de contista e romancista reconhecida. A Yoani aponta o caminho, Hersch: você precisa levar a água para o moinho onde ela está levando. É isso.
Ela ganhou o prêmio Ortega Y Gasset por que mesmo? Escreveu algum ensaio como os de Ortega Y Gasset? Não! Ganhou o prêmio por puxar saco de americano, CARAJO!
O problema mesmo é que Yoani, escrevendo de um lugar onde não existe a imprensa mainstream, quer ser mainstream, quer o apoio dessa imprensa brasileira demo-tucana. Não conhecendo o ground, ela quer simplesmente sair do underground, afinal. Nada contra ela, acho que o papel dela é importante, o que me irrita é a súbita mudança de discurso na imprensa ao falar dela; o tom para falar dos blogs, por exemplo, no suplemento Pensar, coordenado por João Paulo do Estado de Minas, costumeiramente azedo e agressivo para falar de blogs, de repente torna-se doce, róseo, melífluo para falar do blog-hype de Yoani...ah, pelo amor de Deus, vão se danar, quem vocês pensam que enganam?
Peçam a ela para ficar uma temporada de colunista não-remunerada no Digestivo Cultural do Julio Daio Borges e no suplemento Pensar do Estado de Minas. Aliás, fica essa sugestão para o Raul em Cuba. Yoani precisa levar um choque de capitalismo aqui, precisa provar a gaiolinha invisível do imperialismo de que Che Guevara falou no filme do Steven Sondenberg, experimentando outros deliciosos rituais de poder além dos de Hamm e Clov. Ela é muito bobinha; vai ver que o estado deu muito para ela de mão beijada, ficou como os "sociais-liberais" brasileiros temem que fiquemos, daí as privatizações. Chamem ela para vocês sacanearem nas redações como sacaneiam as estagiárias do calcanhar sujo, fazendo teste do sofá! Chamem, chamem!
Yoani é jóia, mas bem limitadinha. Nós temos aqui muita estudante de Letras escrevendo melhor, com uma visão melhor. Mas ela quebra o galho; como disse, onde não tem imprensa oficial, como ela iria ter visão a respeito da alternativa? Vejam aí embaixo: ela pensa que Beckett é teatro do absurdo. Mandem ela ir conversar com Gerald Thomas a respeito! kkk! Que surpresas o mundo capitalista lhe reserva, queridinha!
Estamos en medio del festival de teatro y eso ayuda a escapar de la aburrida programación televisiva y las limitadas opciones recreativas –casi todas en pesos convertibles- de la noche habanera. Guiados por el drama y la comedia, intentamos disipar los problemas cotidianos, las desazones y las dudas que este guión del absurdo en que vivimos nos genera. Pero en esas salas en penumbras no siempre se logra la evasión, sino que pueden encontrarse las claves para volver sobre nuestra realidad y reinterpretarla.
El sábado se exhibió en el pequeño local del teatro Argos –calle Ayestarán esquina a 20 de mayo- la obra de Samuel Beckett “Final de partida”. Fuimos temprano para alcanzar espacio en las rústicas gradas de madera. Créanme que estar casi dos horas sin apoyar la espalda y sobre una dura tabla sólo se puede resistir si se trata de una magnífica puesta en escena. Pues bien, la de antenoche era del tipo que hace olvidar los calambres y el dolor en la cervical. Y no porque moviera al divertimento o a la risa, sino por generarnos esa angustia que nos mantiene en vilo, esa desazón humana que nos hace reparar en todo lo que nos falta.
Un anciano ciego y agonizante mantiene una relación de maltrato y sumisión con su sirviente, al que encierra en la rutina y el chantaje. Sobre una silla de ruedas, el caprichoso convaleciente quiere controlar todo lo que ocurre y utiliza los ojos de su súbdito para estar al tanto. Una enfermiza gratitud y la incapacidad de imaginar otras circunstancias de vida, hacen que Clov esté atado a su amo Hamm y que posponga el día de alcanzar su independencia. Desde una sucia ventana se ve el mar, señal de todo lo vedado que existe afuera, de todo lo que nos está prohibido experimentar.
Caminamos luego hasta la casa, traspasados por el desasosiego que nos dejó la puesta en escena. Fueron demasiado fuertes las paredes pintadas de negro, los gritos del déspota reclamando atención y asomarnos –con tanta crudeza y familiaridad- a “la naturaleza incalificable de las relaciones de poder, su misterio y su ritual de culpas, chantajes, imposiciones, perdones, manipulaciones…”*.
* Palabras de Carlos Celdrán, director de Argos Teatro, en el catálogo de la obra “Final de partida”, interpretada por Pancho García, Waldo Franco, José Luís Hidalgo, Verónica Díaz.
http://www.desdecuba.com/generaciony/
Ela é simpática e quer reclamar como eu reclamo. Ótimo. O que me irrita é o apoio e a festa que se faz em torno dela na imprensa do Brasil. Os blogs não eram uma moda amadora, pornográfica, tosca, sem credibilidade? De repente, quando se fala da Yoani, viram uma janela pura de liberdade! O nosso Congresso não era sujo como pau de galinheiro, papagaio de americanos? De repente, como convidou Yoani e o regime cubano proibiu-a de vir, nosso congressinho sórdido virou reunião de vestais, quase celestial! OOOh!
Hersch Basbaun disse no Provocações do Antônio Abujamra que não sabe que caminhos perseguir para ter sua obra de contista e romancista reconhecida. A Yoani aponta o caminho, Hersch: você precisa levar a água para o moinho onde ela está levando. É isso.
Ela ganhou o prêmio Ortega Y Gasset por que mesmo? Escreveu algum ensaio como os de Ortega Y Gasset? Não! Ganhou o prêmio por puxar saco de americano, CARAJO!
O problema mesmo é que Yoani, escrevendo de um lugar onde não existe a imprensa mainstream, quer ser mainstream, quer o apoio dessa imprensa brasileira demo-tucana. Não conhecendo o ground, ela quer simplesmente sair do underground, afinal. Nada contra ela, acho que o papel dela é importante, o que me irrita é a súbita mudança de discurso na imprensa ao falar dela; o tom para falar dos blogs, por exemplo, no suplemento Pensar, coordenado por João Paulo do Estado de Minas, costumeiramente azedo e agressivo para falar de blogs, de repente torna-se doce, róseo, melífluo para falar do blog-hype de Yoani...ah, pelo amor de Deus, vão se danar, quem vocês pensam que enganam?
Peçam a ela para ficar uma temporada de colunista não-remunerada no Digestivo Cultural do Julio Daio Borges e no suplemento Pensar do Estado de Minas. Aliás, fica essa sugestão para o Raul em Cuba. Yoani precisa levar um choque de capitalismo aqui, precisa provar a gaiolinha invisível do imperialismo de que Che Guevara falou no filme do Steven Sondenberg, experimentando outros deliciosos rituais de poder além dos de Hamm e Clov. Ela é muito bobinha; vai ver que o estado deu muito para ela de mão beijada, ficou como os "sociais-liberais" brasileiros temem que fiquemos, daí as privatizações. Chamem ela para vocês sacanearem nas redações como sacaneiam as estagiárias do calcanhar sujo, fazendo teste do sofá! Chamem, chamem!
Yoani é jóia, mas bem limitadinha. Nós temos aqui muita estudante de Letras escrevendo melhor, com uma visão melhor. Mas ela quebra o galho; como disse, onde não tem imprensa oficial, como ela iria ter visão a respeito da alternativa? Vejam aí embaixo: ela pensa que Beckett é teatro do absurdo. Mandem ela ir conversar com Gerald Thomas a respeito! kkk! Que surpresas o mundo capitalista lhe reserva, queridinha!
Estamos en medio del festival de teatro y eso ayuda a escapar de la aburrida programación televisiva y las limitadas opciones recreativas –casi todas en pesos convertibles- de la noche habanera. Guiados por el drama y la comedia, intentamos disipar los problemas cotidianos, las desazones y las dudas que este guión del absurdo en que vivimos nos genera. Pero en esas salas en penumbras no siempre se logra la evasión, sino que pueden encontrarse las claves para volver sobre nuestra realidad y reinterpretarla.
El sábado se exhibió en el pequeño local del teatro Argos –calle Ayestarán esquina a 20 de mayo- la obra de Samuel Beckett “Final de partida”. Fuimos temprano para alcanzar espacio en las rústicas gradas de madera. Créanme que estar casi dos horas sin apoyar la espalda y sobre una dura tabla sólo se puede resistir si se trata de una magnífica puesta en escena. Pues bien, la de antenoche era del tipo que hace olvidar los calambres y el dolor en la cervical. Y no porque moviera al divertimento o a la risa, sino por generarnos esa angustia que nos mantiene en vilo, esa desazón humana que nos hace reparar en todo lo que nos falta.
Un anciano ciego y agonizante mantiene una relación de maltrato y sumisión con su sirviente, al que encierra en la rutina y el chantaje. Sobre una silla de ruedas, el caprichoso convaleciente quiere controlar todo lo que ocurre y utiliza los ojos de su súbdito para estar al tanto. Una enfermiza gratitud y la incapacidad de imaginar otras circunstancias de vida, hacen que Clov esté atado a su amo Hamm y que posponga el día de alcanzar su independencia. Desde una sucia ventana se ve el mar, señal de todo lo vedado que existe afuera, de todo lo que nos está prohibido experimentar.
Caminamos luego hasta la casa, traspasados por el desasosiego que nos dejó la puesta en escena. Fueron demasiado fuertes las paredes pintadas de negro, los gritos del déspota reclamando atención y asomarnos –con tanta crudeza y familiaridad- a “la naturaleza incalificable de las relaciones de poder, su misterio y su ritual de culpas, chantajes, imposiciones, perdones, manipulaciones…”*.
* Palabras de Carlos Celdrán, director de Argos Teatro, en el catálogo de la obra “Final de partida”, interpretada por Pancho García, Waldo Franco, José Luís Hidalgo, Verónica Díaz.
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Vejo Máico Jéquison no computador...
Vi This is it, trailer do último filme de Michael Jackson, no G-diet (www.blog-filho.blogspot.com), onde agora estão os participantes do blog do Gerald Thomas, que foi fechado.
Eu me lembro de Michael dançando suspenso entre zumbis e mortos-vivos. Logo ele também se juntou a eles e hoje é um morto-vivo que sempre retorna, cuja imagem e voz saem até pelas torneiras, fazendo com que Jô Soares, que é gordinho e não sabe dar os passos do mundo da lua de Jackson, sinta ciúme e deseje sua desaparição, dissolução.
O Muro de Berlim acabou há vinte anos, Claude Lévi-Strauss, ontem. Michael Jackson fica com seu fantasma eletrônico por aí, cobrando ingressos. Eu me lembro dele dançando em suspenso num clipe de suspense. Ele andava na lua, mas eu não dava importância, pois acho suas canções ganchudas & melosas difíceis de escutar, fora que elas saem pelas torneiras. Após suas coreografias imitadas por todo mundo, Michael quis fazer história e, num vida-clipe, colocou-se no pedestal de Stálin. Quando eu vi, pensei, vai dar merda. E deu. Logo, tiraram Michael de lá acusado de pedófilo, na base da sapatada. A mídia castrou-o quimicamente e ele só renasceu já morto, para a posteridade.
Do boy não se perde nem o berro: grava-se em disco, em DVD, faz-se videoclip, etc.
Eu me lembro de Michael dançando suspenso entre zumbis e mortos-vivos. Logo ele também se juntou a eles e hoje é um morto-vivo que sempre retorna, cuja imagem e voz saem até pelas torneiras, fazendo com que Jô Soares, que é gordinho e não sabe dar os passos do mundo da lua de Jackson, sinta ciúme e deseje sua desaparição, dissolução.
O Muro de Berlim acabou há vinte anos, Claude Lévi-Strauss, ontem. Michael Jackson fica com seu fantasma eletrônico por aí, cobrando ingressos. Eu me lembro dele dançando em suspenso num clipe de suspense. Ele andava na lua, mas eu não dava importância, pois acho suas canções ganchudas & melosas difíceis de escutar, fora que elas saem pelas torneiras. Após suas coreografias imitadas por todo mundo, Michael quis fazer história e, num vida-clipe, colocou-se no pedestal de Stálin. Quando eu vi, pensei, vai dar merda. E deu. Logo, tiraram Michael de lá acusado de pedófilo, na base da sapatada. A mídia castrou-o quimicamente e ele só renasceu já morto, para a posteridade.
Do boy não se perde nem o berro: grava-se em disco, em DVD, faz-se videoclip, etc.
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terça-feira, 3 de novembro de 2009
Um poema de Cláudia Isabel
Aquí
es donde se extravió
tu cuerpo de nube
Aquí
en mis manos de viento
perladejanis.blogspot.com
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tu cuerpo de nube
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en mis manos de viento
perladejanis.blogspot.com
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Brevíssima Explosão de Júbilo
Brevísima explosión del júbilo
Mater Dei, ora pro nobis pecatoribus
Llegan
flotando las monjas
leves despojos
sobre las olas del día.
Con su hábito de náufragas medusas
vienen, con suaves ponzoñas,
son cartas perdidas que el viento aleja,
memorandos mal hechos
del puño y letra de dios.
Las monjas tienen alma de carabelas
y sin muelles donde atracar
bogan con velas desplegadas,
vagan perdidas oteando desde el palo mayor.
Cuando veo a una monja
-cuando veo su inmaculado papel-
¡deseo decirlo!
¡cómo voy a callarlo!
me entran unas ganas enormes
de extender su hoja,
de amansar sus pliegues
y escribir
escribir incansable sobre él.
F.E.
Publicado por Fabricio Estrada en 12:45 0 comentarios Enlaces a esta entrada
Mater Dei, ora pro nobis pecatoribus
Llegan
flotando las monjas
leves despojos
sobre las olas del día.
Con su hábito de náufragas medusas
vienen, con suaves ponzoñas,
son cartas perdidas que el viento aleja,
memorandos mal hechos
del puño y letra de dios.
Las monjas tienen alma de carabelas
y sin muelles donde atracar
bogan con velas desplegadas,
vagan perdidas oteando desde el palo mayor.
Cuando veo a una monja
-cuando veo su inmaculado papel-
¡deseo decirlo!
¡cómo voy a callarlo!
me entran unas ganas enormes
de extender su hoja,
de amansar sus pliegues
y escribir
escribir incansable sobre él.
F.E.
Publicado por Fabricio Estrada en 12:45 0 comentarios Enlaces a esta entrada
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domingo, 1 de novembro de 2009
Do blog do Atila Roque
As nossas tristezas
Ontem conversando com uma grande amiga, especialista em segurança pública, entrei em contato com uma enorme tristeza. Uma tristeza que já tinha de certa forma sido expressa no comentário do meu amigo, irmão, escritor e poeta, Alexandre Brandão, o Xandão, no post abaixo. Ela passou os últimos dias vendo e revendo as fitas com as cenas que flagraram a chocante indiferença dos policias diante da vítima ainda agonizante, mais preocupados em predar os predadores que tinham acabado de ferir mortalmente o coordenador social do Afroreggae, Evandro João da Silva. O que ela viu e a deixou ainda mais chocada não foi apenas a frieza abjeta dos policiais diante de mais uma morte inútil. Assistindo ao registro visual dos muitos minutos, quase uma hora, em que Evandro fica ali estendido na calçada, ela se deu conta da indiferença coletiva, patológica, que nos adormece os sentidos diante da tragédia humana. As pessoas passam, olham e seguem, sem que ninguém se aproxime daquele ser humano no chão para verificar se ainda vive. Ninguém usa o celular para chamar imeditamente uma ambulância que, sabemos, chegou quase uma hora depois do acontecido. Ninguém derrama uma lágrima pela tragédia do Evandro, a tragédia de todos nós, no momento em que ela acontece. As circunstâncias que a cercam são um testemundo eloquente da nossa miséria existencial. Estamos nos tornando piores a cada dia se continuamos a acordar e dormir com essas tragédias como se fossem apenas um fato como outro qualquer, capaz de gerar, no máximo, mais uma tocante e necessária manifestação do Movimento Rio da Paz. Enquanto isso a polícia parece seguir o padrão de combater o terror com mais terror, levando vidas inocentes pelo caminho, a mãe de apenas 24 anos com o bebê no colo ou o menino de 15 anos que mal merece manchete nos jornais. A minha amiga, acostumada a dureza do seu ofício, contou que chorou muitas vezes diante daquelas imagens. Chorou por todos nós.
(Atila Roque, 28/10/2009)
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Ontem conversando com uma grande amiga, especialista em segurança pública, entrei em contato com uma enorme tristeza. Uma tristeza que já tinha de certa forma sido expressa no comentário do meu amigo, irmão, escritor e poeta, Alexandre Brandão, o Xandão, no post abaixo. Ela passou os últimos dias vendo e revendo as fitas com as cenas que flagraram a chocante indiferença dos policias diante da vítima ainda agonizante, mais preocupados em predar os predadores que tinham acabado de ferir mortalmente o coordenador social do Afroreggae, Evandro João da Silva. O que ela viu e a deixou ainda mais chocada não foi apenas a frieza abjeta dos policiais diante de mais uma morte inútil. Assistindo ao registro visual dos muitos minutos, quase uma hora, em que Evandro fica ali estendido na calçada, ela se deu conta da indiferença coletiva, patológica, que nos adormece os sentidos diante da tragédia humana. As pessoas passam, olham e seguem, sem que ninguém se aproxime daquele ser humano no chão para verificar se ainda vive. Ninguém usa o celular para chamar imeditamente uma ambulância que, sabemos, chegou quase uma hora depois do acontecido. Ninguém derrama uma lágrima pela tragédia do Evandro, a tragédia de todos nós, no momento em que ela acontece. As circunstâncias que a cercam são um testemundo eloquente da nossa miséria existencial. Estamos nos tornando piores a cada dia se continuamos a acordar e dormir com essas tragédias como se fossem apenas um fato como outro qualquer, capaz de gerar, no máximo, mais uma tocante e necessária manifestação do Movimento Rio da Paz. Enquanto isso a polícia parece seguir o padrão de combater o terror com mais terror, levando vidas inocentes pelo caminho, a mãe de apenas 24 anos com o bebê no colo ou o menino de 15 anos que mal merece manchete nos jornais. A minha amiga, acostumada a dureza do seu ofício, contou que chorou muitas vezes diante daquelas imagens. Chorou por todos nós.
(Atila Roque, 28/10/2009)
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