Ontem, Romeu e Julieta, atores que na vida real estão trepando loucamente, apelaram com o diretor Oswald Thomas, que insiste, nos ensaios, em colocá-los recitando os textos sem emoção alguma.
A história dos dois atores foi se misturando com a de Romeu e Julieta, tal como se os dois fossem Felipe Camargo e Vera Fischer apaixonando-se num amor incestuoso ao viverem Édipo e Jocasta, amor da Globo ao dinheiro e ao apoio do Estado. É interessante saber que Caetano Veloso também partilha desse amor e que a Veja sofre desse amor rejeitado.
Dante (Felipe) é tão bom em resolver problemas dessa ordem que até heterossexualizou o jovem Romeu, que desabrochara ao interpretar Julieta: "ah, meu sonho era interpretar Julieta..." Ainda bem que não rolou um cross-dressing. Romeu chegou até a perder a virgindade heterossexual com Julieta.
"Romeu e Julieta são apenas personagens!" Gritou ele com a atriz.
"Não! Eles são jovens apaixonados!"
Pior é que, embora o olhar da minissérie seja totalmente contra o Oswald Thomas, acho que nisso ele está certo. Ninguém deve viver exatamente aquilo que está vivendo numa representação no palco. Afinal, arte é representação, construção, fingimento. Hamlet algum resistiria ao realismo da Globo. Se eu fosse adaptar Hamlet para a Globo ia tirar um sarro com o realismo da novela, ia colocar ele como um esquizofrênico ouvindo a voz do fantasma de Leonel Brizola, chamando-o de traidor e homossexual e atormentando-o com o aviso de que o usurpador Roberto Marinho matou Getúlio Vargas.
Dante quer Macbeth nu e isso será um momento-chave para o final da peça, que é hoje. O ator parece que entrará em parafuso com essa orientação de Dante, pois ele e esse ator são inimigos mortais. Parece-me que Zé Celso fez um Ham-let (nos anos 90) onde o fantasma do pai de Hamlet aparecia nu.
Soube que Bárbara Heliodora reprovou as traduções de Shakespeare usadas na série, assim como mostrou não gostar dessa comparação dela com o Bárbaro nem com a do Oswald/Gerald Thomas.
Em Retrato de Dorian Gray, de Oscar Wilde, acontece algo assim: a atriz, até então talentosa, representa uma Julieta monstruosa, desastrosa, horripilante. A cena do balcão mostra-se tão ruim que Dorian Gray sente nojo dela, uma moça bonita que ele está seduzindo. Ao final da peça, a atriz, até então relutante, diz-se loucamente apaixonada por Dorian e por isso fez o papel tão mal. Horrorizado, Dorian rejeita-a por sua horrenda interpretação e deixa-a só, desesperada.
Essa passagem ilustra a relação arte/vida para Oscar Wilde: não se representa paixão se você está tomado por ela. A arte é artifício, faz-se a partir da falta, do falso. Eu concordo, pelo menos em relação aos conceitos realistas retrôs da Globo (e, por extensão, da O2 e de Fernando Meirelles).
A Globo está mais para Shakespeare in Love, roteiro caça-níqueis do Tom Stoppard para garantir o caviar nosso de cada dia, onde Shakespeare vivia Romeu e Julieta e duelava com o Conde de Essex. Já o Shakespeare histórico dedicou sentidos poemas ao Conde (que era seu mecenas), poemas que levaram muitos críticos, entre os quais Oscar Wilde, a suspeitarem que os dois eram amantes.
Nenhum comentário:
Postar um comentário