segunda-feira, 29 de setembro de 2008

Gênio da Raça

IstoÉ, 2/9/1981

ZUENIR VENTURA

Histórias de Glauber Rocha, o artista das metáforas. De sua infância inquieta às turbulências políticas, do desencanto estético à morte patética, inexplicada

Quando subiu ao céu, no sábado, dia 22, Glauber Rocha com certeza terá gritado: "Foi um complô da CIA e da KGB. Me mataram, São Pedro!" Todos devem ter rido, como se ria sempre que o cineasta repetia acusações desse tipo. Ou quando garantia que ia morrer aos 42 anos. Ou quando advertia a mulher contra agosto, "mês das grandes tragédias brasileiras, vide Getúlio". Ou quando acreditou na abertura porque o ex-presidente Geisel era, como ele, protestante. Polêmico e escandaloso, Glauber, que filmava, escrevia e falava por metáfora, além de lançar nas telas as desvairadas, geniais imagens que costumava criar, podia ter visões ampliadas da realidade – o que, no cinema, lhe dava a merecida fama de gênio e, na vida, a lenda de louco.

Supersticioso e profético, Glauber Rocha mais uma vez pode ter enganado as aparências: morreu aos 42 anos, foi enterrado um dia antes do dia da morte de Vargas e dois dias após o aniversário de Golbery, o "gênio da raça", como dizia. E, ao que tudo indica, não há tanto absurdo no que teria dito a São Pedro. Se é improvável que tenha havido um complô, é possível que o cineasta tenha morrido em conseqüência de uma conjugação de imperícia e negligência médica. Glauber pode ter chegado ao Rio praticamente morto por falta de um tratamento adequado em Lisboa.

Ás 19 horas da última quinta-feira, dia 27, o médico Pedro Henrique de Paiva, que uma semana antes recebera Glauber desenganado, no Aeroporto do Galeão, reuniu uma centena de colegas na Clínica Bambina, no Rio, para formalizar uma denúncia: o relatório "estritamente confidencial" dos dois médicos que o trataram no Hospital CUF, de Lisboa, comprovaria que "houve imperícia, mais do que negligência", no tratamento de Glauber. Amigo do cineasta, e seu médico nos últimos quatro anos, Paiva baseou-se nos seguintes pontos:

Apesar de três dias de internação em Sintra e dezoito em Lisboa, com vários exames e radiografias feitas, "não houve formação de diagnóstico de certeza", isto é: não se soube nunca ao certo o que Glauber tinha. Foi tratado a princípio como tendo pericardite, depois tuberculoso, depois câncer. Enquanto isso, germinava um processo infeccioso que nos últimos cinco dias devastou o organismo do doente.

Glauber viajou doze horas sem acompanhamento de um médico – só de um enfermeiro – e, mais grave, sem tomar soro ou oxigênio. Ao chegar, às 7h20m de sexta-feira, dia 21, teve que ser levado para o posto de atendimento do próprio aeroporto, onde lhe foi aplicado soro e uma dose de cortisona. "Seus lábios eram uma crosta", informa Paiva. "Ele estava completamente desidratado. Se não aplicasse aquela medicação de emergência, ele não chegaria ao hospital – ou chegaria morto. Aliás, ele chegou ao aeroporto praticamente morto."

Parco em certezas médicas, o relatório dos médicos portugueses não economiza insinuações. Por exemplo: o agravamento da doença é atribuído à ingestão de drogas no hospital. Paiva acha que a alegação, classificada de "infamante" e "policial" pelos amigos do cineasta, pretende desviar a atenção do que importa. "Os médicos que o atenderam não conseguiram descobrir o que Glauber tinha".

Glauber deveria voltar ao Brasil na sexta-feira, dia 21, mas sua mulher, a colombiana Paula Gaetán, conseguiu antecipar de um dia o embarque. É ela quem conta: "Às 3 da tarde de quarta-feira, 19, cheguei ao hospital e vi o olhar de Glauber estranho, apagando, como se não estivesse me vendo. Resolvi que ele deveria vir naquela mesma noite. Telefonei para o cônsul Félix Faria, mas ele soube que o avião de quarta-feira não tinha os equipamentos médicos necessários. Marcou então a viagem para o dia seguinte, quinta. Os médicos continuavam insistindo em que ele deveria ficar lá porque faltavam ainda algumas análises, mas não conseguiam explicar aquele olhar estranho. Diziam que era 'prostração'. Quando pedi que viesse um médico conosco, disseram que não havia necessidade e indicaram um enfermeiro. Ninguém sabia que ele tinha septicemia".

Já no domingo anterior, dia 16, quando o cantor e compositor Fagner, que também se encontrava em Portugal, retornou ao Brasil, Paula tentou convencer Glauber a vir junto. "Mas ele estava muito feliz", conta ela. Tinha muitos projetos e convites: de Nova York, Londres, Escócia, San Sebastian, Biarritz e Marrocos. Entre os projetos estava um filme sobre Napoleão, através de uma leitura, se assim se pode dizer, de Lampião. Outro projeto era a ópera "O Guarani". "Ele pensava tirar todas as cadeiras do Municipal e fazer ali uma floresta cheia de índios. Fagner seria o Peri", diz Paula.

Da hora da chegada até a hora da "morte cerebral", às 4 horas madrugada de sábado, dia 22, Glauber não chegou a ter momentos de lucidez: teve apenas, como diz seu médico, "percepções de realidade". Gozou a elegância do produtor Luís Carlos Barreto. Estranhou quando Paula, para testar o seu grau de consciência, informou que Cacá Diegues estava com Nara Leão no quarto. "Mas se eles estão separados...", disse. E às 7 horas da noite, antes de entrar em coma, perguntou: "Pedro Henrique, eu vou morrer?" O médico mentiu.

A primeira providência de Paula Gaetán, viúva, foi recomendar que o caixão ficasse aberto. "Quero que todo mundo olhe o Glauber morto. Ele vai ser velado como um dos maiores homens do Brasil". (Depois ela me diria: "Vi muita gente olhando o corpo com grande complexo de culpa".) Outra recomendação transmitida por Cacá Diegues era que as coisas não se tornassem "morbidamente tristes". Não foram. Houve até momentos engraçados, como o início do enterro. Ao ver o caixão sendo levado por uma Kombi preta, fechada, Luís Carlos Barreto correu e gritou: " Pára aí, Glauber vai ficar p... da vida". Gustavo Dahl, outro dos numerosos cineastas presentes, apoiou: Deixa ele ir pegando sol". O caixão foi então passado para uma caminhonete aberta.

Nas 24 horas entre a morte e o enterro, três imagens impressionavam: a contida serenidade de Paula Gaetán, a mulher, a inconsolável dedicação de Norma Bengell, a atriz, e o dilaceramento desespero de Lúcia Andrade, a mãe – que orava, cantava e chorava o último dos seus três filhos. O velório de Glauber Rocha foi o derradeiro espetáculo dirigido por Glauber Rocha. Como num filme dele, tudo foi improvisado. O Museu de Arte Moderna, escolhido a princípio para a exposição do corpo, foi logo abandonado porque ia parecer reedição. Lá Glauber filmara, com grande escândalo para a família do morto, o seu premiado "Di", sobre o velório de Di Cavalcanti.

O Parque Lage, sugerido em seguida por Aloísio Magalhães, secretário da Cultura do Ministério da Educação, pareceu o lugar ideal. Ali Glauber filmara, em 1967, "Terra em transe", transformando o pátio interno neoclássico em Palácio Alecrim, sede do governo de um país chamado Eldorado. Na noite do velório o pátio virou cinema e até as 3 horas da madrugada pôde-se ver vários filmes de Glauber, inclusive uma incrível entrevista filmada. Na tela o Glauber vivo – incômodo, corajoso, provocador – girava a sua metralhadora contra tudo e todos: "Todos os diretores do Cinema Novo me traíram". Na platéia, chorando ou segurando o choro, encontravam-se todos os diretores do Cinema Novo. Atrás, a poucas metros, o Glauber morto, com uma serenidade no rosto jamais vista. Não havia dúvida: era tudo um filme de Glauber Rocha. Aquela confusão de ficção e realidade não podia existir de outra maneira.

Com a morte de Glauber, o Brasil perde o maior agitador cultural depois de Oswald de Andrade e possivelmente um gênio. Há um ano, quando seria mais fácil falar mal dele, houve um jantar na casa de Maria Clara Mariani, filha do banqueiro Clemente Mariani, em homenagem a Violeta Arraes, irmã do ex-governador de Pernambuco Miguel Arraes. Glauber não compareceu, mas foi servido como tema na mesa em que estavam Caetano Veloso, Gilberto Gil, Gustavo Dahl, Hélio Pellegrino, Arnaldo Jabor. Discutiu-se, e na sobremesa saboreou-se um amplo e irrestrito acordo: se existia algum gênio no Brasil, ele era Glauber Rocha. "Ele é", proclamou Dahl, "maior que Villa-Lobos, maior que Portinari, só comparável ao Aleijadinho". Jabor completou: "Ele nos resgata a todos". Pellegrino surpreendeu: "Ele é um provocador. É um parteiro da verdade". Caetano apoiou. "Ele está certo. Quem tem que ser moderado é político. Até para que nós, artistas, possamos ser radicais". E no entanto, todos daquela mesa, como de resto de muitas outras onde se sentam intelectuais ou artistas, já tinham sido criticados, denunciados ou acusados publicamente por Glauber.

Já em fins da década de 50, quando Glauber ainda não tinha nenhum filme importante – seu primeiro longa-metragem, "Barravento", é de 1962 – e quando o Cinema Novo dava os primeiros passos, seu criador, Nelson Pereira dos Santos, dizia que o movimento na verdade não existia. "O Cinema Novo só existe quando o Glauber está no Rio." Daí até a morte, muitas coisas na cultura brasileira só existiram quando Glauber estava por perto. Com um filme como "Deus e o diabo na terra do sol", que está sempre entre os dez melhores de todos os tempos, numa seleção feita pelo Museu de Arte Moderna de Nova York, outro como "Terra em transe", que tem treze prêmios no estrangeiro, e um carisma que transformou em seus fãs monstros sagrados como Buñuel, Godard, Pasolini, Rosselini, Bertollucci, Orson Welles ou Fritz Lang, Glauber foi até a morte o nosso artista mais importante - e o mais irritante.

"Mantenho essa espécie de chama para não aceitar o conformismo como lei", justificava-se. E admitia que não queria que a razão interviesse. "É uma forma de liberar Deus e o Diabo ao mesmo tempo. Solto os meus demônios interiores para cima do mundo. Não quero que eles habitem em mim". Se essa língua solta ou – para usar o seu psicanalês – essa "desrepressão das pulsões interiores" pôde, no plano da arte, criar obras-primas, no plano da convivência política atraiu para ele mais inimigos à esquerda do que à direita.

Graças ao mais famoso de seus pronunciamentos – ou prenunciamento -, Glauber acrescentou à fama de louca a de profeta. Na área da cultura foi o primeiro a enxergar a luz no fim do túnel, como se dizia na época. Em 1974, ainda na Europa, mandou para mim, na revista "Visão", uma entrevista apostando na abertura do general Geisel, apoiando os militares e classificando o general Golbery de "gênio da raça", ao lado de Darcy Ribeiro. Quando recebi a carta-entrevista, relutei em publicá-la. Achei que Glauber estava realmente louco e ia ser linchado, politicamente. Foi Cacá Diegues quem me convenceu da publicação, contra a opinião dos que, muitos, achavam, para variar, que não era a hora.

As reações a essa declaração correram o mundo através de moções e manifestos de repúdio distribuídos em congressos e festivais internacionais. Em várias línguas, Glauber foi acusado de ter aderido ao sistema e ter-se vendido ao governo. Houve até quem anunciasse o preço: "O Jaguar", queixava-se Glauber, "chegou a publicar no 'Pasquim' que eu tinha recebido 6 milhões de cruzeiros do Ney Braga (então ministro da Educação) para filmar passeatas para a polícia". Darcy Ribeiro acha que, da mesma maneira que a esquerda brasileira foi incapaz de compreender a obra de Gilberto Freyre – "dez vezes mais importante do que a de Euclides da Cunha" – não teve sensibilidade para perceber que Glauber nunca foi um cínico. "Ele não tinha pele, só carne exposta."

Um dos exemplos dessa capacidade de sofrer fisicamente os males do país ocorreu quando morreu o ministro Petrônio Portella. Vendo na morte do articulador da abertura uma metáfora do fim da distensão, Glauber adoeceu. "Civicamente deprimido", como alegou, internou-se numa casa de repouso em Itatiaia durante duas semanas.

Apesar de dizer que seus filmes eram sempre de esquerda – "A esquerda sou eu", costumava gritar – suas relações com os comunistas oscilavam muito. O primeiro prêmio que recebeu, por "Barravento", foi da Checoslováquia, e um dos maiores elogios, por "Deus e o Diabo", foi de Che Guevara, que classificou o filme de "tão importante para a América Latina quanto o 'Dom Quixote' é para a Espanha". Em compensação, em 1964, esse mesmo filme, candidato mais forte ao grande prêmio do Festival de Cannes, perdeu para o saltitante "Guarda-chuva de Cherburgo". A escolha foi decidida pelo presidente do júri, um soviético que ficou chocado com a violência do filme, "muito subversivo".

Quatro anos depois, "Terra em transe" obteria um prêmio em Cannes, mas provocaria grande reação na esquerda carioca. O filme escapou das mãos da polícia, que tentou apreendê-lo, mas não das ferozes patrulhas culturais da época. Fernando Gabeira, em debate público, chegou a sugerir que o filme, por ser "fascista", fosse queimado, pois um personagem dizia que tinha "fome de absoluto". Glauber não tinha queixas de Gabeira por isso. Mas acusava o ex-guerrilheiro de, quando estava em Cuba, tê-lo denunciado ao governo de Fidel como maconheiro e de, em seguida, tê-lo convidado para uma expedição suicida ao Brasil.

"Chegamos a Havana às 3 horas da tarde", contava Glauber, "e às 7 da noite Marcos Medeiros e eu recebíamos no hotel a informação, trazida por um agente cubano, de que Gabeira, cujo codinome era Inácio e o apelido Gabería, tinha-nos entregado como maconheiros". Em seguida, e sem saber do vazamento da informação, Gabeira teria marcado um encontro para propor que Glauber voltasse ao Brasil para assaltar um banco. O cineasta levou um susto: "Essa não é a minha e, além do mais, eu seria morto". Glauber recordava que custou a compreender – até que Gabeira disse, com todas as letras: "É isso aí. A revolução precisa do cineasta Glauber Rocha morto".

Mas atenção. Como costumava advertir Darcy Ribeiro, lembrando o protestantismo de Glauber: "Ele é a Bíblia. Fala por profecia e por parábola. Não vamos interpretá-lo ao pé da letra". Paulo Emílio Salles Gomes, o mais respeitado teórico do Cinema Novo, não teve dúvidas em garantir: "Glauber Rocha é profeta alado. Profeta não tem obrigação de acertar, sua função é profetizar". Glauber não fez outra coisa. A pelo menos duas pessoas – a Paulo César Saraceni em 1961 e a Paula mais recentemente – ele avisou que morreria aos 42 anos de idade. Orlando Senna, um de seus grandes amigos, acha que "essa premonição era tão real que ele se preparou para isso: seu último livro é um testamento". Aliás, a mesma impressão teve Mário Carneiro, o diretor de fotografia de "Di". Quem conta é sua amiga Vivi Nabuco: "Há quatro meses, quando acabou de ler o livro, Mário me disse chorando: Glauber vai morrer".

São intermináveis as histórias de premonição em Glauber. Entretanto a declaração pela qual foi chamado de profeta não era uma premonição. Era do conhecimento de alguns dirigentes cubanos, se não do próprio Fidel Castro. E todos, inclusive o ex-guerrilheiro Régis Debray, teriam concordado com a sua análise que considerava irreversível a abertura política iniciada por Geisel. "Evitei contato pessoal com Fidel", dizia ele, "porque não queria assumir compromissos políticos, mas enviei-lhe um relatório em que explicava a complexidade do quadro brasileiro e o papel que estava reservado a Geisel. Acho que esse relatório contribuiu inclusive para a desmobilização guerrilheira".

Glauber nessa época custava 950 dólares ao governo cubano, que o convidara para realizar um documentário. Hospedado na suíte 1925 do Hotel Habana Libre, com regalias diplomáticas, o cineasta tinha à sua disposição uma grande biblioteca sobre o Brasil. Ali ele encontrou o livro "Geopolítica do Brasil", do general Golbery. "No começo não gostei", me contou ele, "mas logo depois percebi que havia uma questão lingüística: o que ali figurava como anticomunista não era uma crítica ao socialismo, mas ao modelo soviético. E mais: existia ali dentro um projeto de Brasil terceiro-mundista. Era uma carta de navegação para o futuro". Segundo Glauber, os cubanos a princípio ficaram surpresos, mas acabaram convencidos, o mesmo ocorrendo com Arraes e João Goulart. "Por isso", surpreendia-se, "é que não entendi a reação. Quando dei aquela declaração, achei que estava declarando o óbvio".

Quase sempre ampliadas por hipérboles, as imagens de Glauber costumavam ser encobertas por um humor que, quando levado a sério, produzia curiosos curtos-circuitos na comunicação. Antes de embarcar para Veneza, no ano passado, em cujo festival apresentaria "A idade da Terra", estava empenhado numa campanha de Constituinte com Figueiredo, "mas contanto que Figueiredo seja coroado imperador". Seu projeto político previa, além do mais, que a solução para o país só viria quando Golbery e Darcy, os dois "gênios da raça" da entrevista a "Visão", se juntassem: "Eles são a cara e a coroa do mesmo país. Falta ao Darcy a visão militar e ao Golbery a visão antropológica. Além do mais, os dois nomes terminam em y".

Uma piada, mas também uma crença. Glauber não brincava com coincidências. Em 1974, durante o movimento dos capitães portugueses, viajou 50 quilômetros à noite para consultar um vidente. Queria saber se o que estava acontecendo lá não poderia acontecer no Brasil. Mais recentemente, visitou, em Brasília, outra vidente, Tia Neiva, e os dois chegaram à conclusão de que Figueiredo estava montando pouco, daí a crise. "O cavalo de Figueiredo é diferente do Incitatus de Calígula, do Bucéfalo de Alexandre e do famoso cavalo branco de Napoleão", explicava Glauber. "Só ele é capaz de dar o salto tríplice que salvará o Brasil: o salto da saúde, da educação e do trabalho. Se ele der esse salto tríplice, será coroado imperador."

O maior cineasta brasileiro gostava mesmo era de política. Ele esperava fazer 50 anos (havia momentos em que acreditava poder chegar a essa idade) para se dedicar inteiramente à atividade político-partidária. "Se eu quisesse ganhar dinheiro, eu ia ser empresário ou me dedicaria inteiramente à indústria de comunicação", dizia. "Mas eu não quero ter as doenças da burguesia: senilidade sexual e câncer." Às vezes se lamentava por não ter sido lembrado: "É incrível como ninguém me descobriu para a política". Se vivo, ele se surpreenderia mais ao ver que políticos como Golbery, por quem tanto apanhou, não se lembraram de telegrafar lamentando a sua morte.

"A política e a poesia", disse um personagem, "são demais para um só homem". Ainda bem. Fica o poeta. Como ele mesmo costumava dizer, "vão se esquecer do Lênin, mas não do Maiakovski". Exatamente. Da mesma maneira como um dia, talvez, vão lembrar-se de Golbery como uma metáfora, ou melhor, como uma hipérbole do maior cineasta brasileiro – esse, sim, um gênio da raça.

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